Muitos entraves burocráticos que consomem nosso tempo e energia. Brunno Constante
Brunno Constarte é de São Paulo e mudou-se há quatro anos para Lisboa, onde reside com a sua família. Com mais de uma década de experiência no mercado de distribuição digital, é um nome de referência na indústria musical internacional. Formado em Jornalismo, trocou as redações pelos streams e hoje atua como A&R na Symphonic Distribution, em Portugal. Passou por marcas gigantes como MTV, MixTV, KondZilla e Believe, onde desenvolveu um olhar apurado para novos talentos e tendências do mercado. Especialista em estratégias de lançamento e promoção, Brunno ajuda os artistas independentes a alcançarem audiências globais.
Brunno Constante
Eu circulo intensamente pela cidade. Minha preferência é por deslocamentos a pé, mas incorporei o uso da bicicleta como uma solução inteligente para evitar o trânsito intenso. Aproveito particularmente o relevo plano da região central, o que torna os trajetos de bike não apenas viáveis, mas também eficientes, assegurando que eu chegue pontualmente aos meus compromissos. No que se refere ao transporte público, o metrô se consolidou como minha opção principal, nunca tem muita gente e não demora muito para chegar aos destinos em um lugar tão pequeno. Acostumado com São Paulo, pegar o metro aqui é uma experiência sempre tranquila.
Quais são os problemas mais gritantes de Lisboa?
Desde que cheguei em Portugal, o problema mais evidente e desafiador que observei é, sem dúvida, a questão da habitação. A especulação imobiliária é intensa e, na minha percepção, ainda falta uma fiscalização rigorosa e mecanismos eficazes de regulação por parte do poder público. Essa realidade ficou muito clara quando morei ao lado de uma grande imobiliária; eu via com frequência apartamentos sendo vendidos para estrangeiros que nem sequer visitavam o país. Eles compravam pelos sites, tratando o investimento com uma naturalidade similar à de adquirir uma peça de roupa online. Para nós, imigrantes, soma-se a isso a complexa burocracia para regularizar documentos e a falta de um suporte que proteja o locatário, o que acaba concedendo um poder desproporcional aos proprietários e deixa quem aluga em situação de vulnerabilidade.
De modo geral, como vê a situação da população imigrante na Grande Lisboa?
A maior parte da população imigrante que reside na Grande Lisboa é formada por pessoas trabalhadoras, que buscam ardentemente a regularização documental, pagam seus impostos em dia e pretendem viver de forma honesta, dentro da legalidade. A realidade, porém, esbarra em uma burocracia excessiva e na carência de informações claras e acessíveis por parte do governo. Isso cria uma situação paradoxal: muitos imigrantes contribuem de forma significativa para economias como a da Segurança Social, mas em troca recebem pouco ou quase nada em termos de direitos e suporte, ficando à margem de benefícios e de uma integração social mais efetiva.
Que lugares escolheria como modo de Memorialização da presença brasileira? Porquê?
A presença brasileira é marcante e visível em praticamente todos os cantos de Lisboa. É possível ouvir sotaques brasileiros que vêm desde os locais mais simples até aos ambientes mais sofisticados. Acredito que a verdadeira Memorialização dessa presença deveria ser feita por meio de ações práticas do governo, com canais de atendimento que realmente funcionem e resolvam as situações dessas pessoas que não apenas vivem e contribuem economicamente aqui, mas que também desejam integrar-se plenamente à sociedade. Isso significa ir além da questão tributária e permitir que tenham voz ativa e participação no cotidiano e nas decisões da comunidade.
Sente que os brasileiros estão a ter mais voz no espaço público na cidade?
Embora haja numericamente muitos brasileiros em Portugal, nossa representatividade e influência em espaços públicos de discussão e decisão ainda não correspondem ao nosso volume populacional. Isso se deve, em grande parte, aos entraves burocráticos que consomem nosso tempo e energia, e também à desinformação. Muitas vezes, não sabemos como ou onde buscar orientação para participar mais ativamente da vida cívica, o que acaba silenciando nossa voz coletiva e limitando nossa capacidade de advocacy e de reivindicação de direitos.
Lisboa é uma cidade difícil para os imigrantes?
Como imigrante brasileiro, Lisboa é uma cidade de adaptação relativamente facilitada por alguns fatores-chave: a língua portuguesa, a existência de uma comunidade brasileira consolidada que serve como rede de apoio inicial, e o clima ameno, que é bastante favorável. Para quem busca recomeçar e oferecer uma qualidade de vida melhor para a família é, de fato, um destino muito atraente. As principais dificuldades, contudo, residem na complexa burocracia para documentação, na escassez de informações claras e no enorme desafio relacionado à habitação, onde os preços elevados e a baixa oferta se tornam os maiores obstáculos para uma estabilidade plena.
