A experiência da participação neste evento de indefinida colocação historiográfica, quer pela denegação que oficialmente o caracterizou, quer pela radical reformulação geopolítica do país que a partir dele se engendrou com a descolonização, tornou a guerra colonial um dos mais recalcados e complexos, mas também um dos mais trágicos eventos da contemporaneidade portuguesa que ainda hoje nos interroga.
30.03.2019 | por Margarida Calafate Ribeiro
Através do trabalho de Louise Narbo podemos interrogar esta relação de quem herda o olhar de um passado através de um outro. Ela sugere que o olhar do outro, que comporta em si certas capacidades, interfere na visão de quem o herda; que esse olhar, diminuído ou amplificado, pode nublar, embaciar, deformar a visão de quem o recebe; mas pode ao mesmo tempo constituir o motivo pelo qual o herdeiro desse olhar se interroga sobre essa visão que não é exclusivamente a sua, mas que também já não pertence exclusivamente àquele que lhe transferiu o seu olhar.
23.03.2019 | por Fátima da Cruz Rodrigues
Seja alimentada pelos problemas económicos cada vez mais profundos, pela sensação de complacência por parte de uma elite cultural, convencida de que a paz na Europa, depois de tanta destruição, seria mais ou menos um dado irrevogável, ou mesmo apenas por causa da crueldade humana básica, não pode ser ignorada por mais um momento: o tempo dos assassinos está de volta para nos assombrar e, na sua raiz, encontra-se uma nostalgia pós-imperial renovada, impulsionada por uma negação intencional, vergonhosa e desavergonhada, do passado imperial da Europa.
17.03.2019 | por Paulo de Medeiros
Como no dia da memória, o fracasso confirma que não será uma tecnicidade que salvará um passado definitivamente perdido, mas uma compaixão humana transformada em consciência histórica, ainda toda por construir, diante de um passado abjeto e terrível. Este será o único antídoto capaz de manter enterrado, no seu horrível refúgio, o monstro de um passado de brutalidade ilimitada, que não se deixa narrar. Pelo menos temporariamente, no entanto.
12.03.2019 | por Roberto Vecchi
Os pesquisadores afirmam que o massacre decorrente da colonização europeia levou ao abandono de imensas áreas de terras agrícolas, que acabaram sendo reflorestadas. A recuperação da vegetação tirou CO2 suficiente da atmosfera para resfriar o planeta. Este período de resfriamento costuma ser chamado nos livros de história de “Pequena Era do Gelo” – uma época em que o Rio Tâmisa, em Londres, costumava congelar durante o inverno no hemisfério norte.
25.02.2019 | por Oliver Milman
Quando a literatura busca transmitir a experiência da violência, o resultado está determinado pela distância entre quem escreve e a realidade traumática referida. Existem, no entanto, constantes entre as representações artísticas da memória feitas pelas testemunhas directas dos acontecimentos e aquelas reelaboradas pelos seus descendentes (as chamadas pós-memórias).
24.02.2019 | por Felipe Cammaert
Zenith assegurou que Fernando Pessoa «escreveu aquelas coisas citadas» e que isso «desqualifica o seu nome para ser associado a iniciativas da CPLP. O seu pensamento evoluiu, felizmente, e em 1935 não teria subscrito àquelas afirmações..., mas também não chegou a renunciá-las. Aliás, pode nem se ter recordado de as ter escrito. Escreveu-as, porém, e compreendo e concordo com a revolta das pessoas cuja dignidade feriu.»
18.02.2019 | por Eurídice Monteiro
Importantes ainda são os estudos de Lévy-Strauss, do grupo da “decolonality” latino-americana como Eduardo Viveiros de Castro, Walter Mignolo, Aníbal Quijano, ou de antropólogos como Aparecida Vilaça, Yvone de Freitas Leite, Elisa Loncon Antileo, Pedro Niemeyer Cesarino, ou líderes índios como Ailton Krenac. Estes últimos, ao mesmo tempo que denunciam o extermínio das línguas nativas, também as estudam, tentam registá-las quando tal ainda é possível.
17.02.2019 | por António Pinto Ribeiro
A acção principal decorre, saltitante entre quatro ilhas de Cabo Verde - Sal, São Vicente, Santo Antão e Santiago, sendo recortada por episódios desenrolados de Norte a Sul de Portugal, e suavemente pontuada por anotações de uma Índia por descobrir, denunciando um desejo iminente de continuação do enredo pela Ásia.
Partir para voltar. Este mote, ecoando numa busca por voltar a casa, transformou-se num relato urgente de lições apreendidas, num momento de abertura total à sincronicidade do Universo. Que os Mestres de Esquina que conduziram a autora nesta jornada, possam agora acompanhar o leitor também.
12.02.2019 | por Ana Pracaschandra
O neologismo “artivismo” terá sido introduzido nos anos 1960 para dar conta das manifestações contra a guerra do Vietname, assim como dos movimentos estudantis e de contra-cultura. Nesse sentido, Guy Debord teorizou sobre o situacionismo em seu livro A Sociedade do Espetáculo (1967), onde apontava para a necessidade da superação da política e da arte, para sabotar as diretrizes do capitalismo e, assim, dar um novo saber a arte e, por conseguinte, à vida. É apenas em meados de 1990, com a revolução da internet, que o termo volta a aparecer no vocabulário crítico para ilustrar não apenas uma prática de arte política, mas para reavaliar o que se considera política e arte, numa reactualização do conceito de Debord.
12.02.2019 | por Fernanda Vilar
O contínuo desaparecimento de importantes segmentos da memória artística e cultural do nosso país, bem como a falta de atenção à grande parte da actual “cultura viva” não são metáforas catastrofistas: são factos que assistimos dia após dia, sem dizermos nem fazermos nada com medo de sofrer represálias até mesmo quando, na verdade, a culpa é colectiva e chamamos à responsabilização de todos.
09.02.2019 | por Adriano Mixinge
Num povo dito de brandos costumes, e que dispõe de um discurso oficial no qual os problemas de discriminação racial tendem a não se colocar, falar de um humor racista afigura-se excessivo, além de epistemologicamente contraproducente. Porém, basta efectuar uma breve pesquisa no Google para confirmar a resiliência dos herdeiros de «Parafuso», traduzida na irradiação e popularidade das anedotas racistas.
07.02.2019 | por Marcos Cardão
Não pode haver lusofonia em conjugação (ou em simultaneidade) com ‘portugalidade’. Ambos os termos são hiperidentitários, remetendo para uma mesma origem, uma vez que a ‘portugalidade’ pressupõe um sublinhado de alegadas características portuguesas, conceção referida exclusivamente a Portugal, enquanto a lusofonia, se bem que na sua etimologia remeta para ‘luso’, abrange outros países que falam o português, abarcando por isso um lastro que vai para além do seu significado imediato.
06.02.2019 | por Vítor de Sousa
ontem como hoje, não é difícil encontrar exemplos que mostram que a esquerda e o marxismo foram tanto mais transformadores quando articularam uma crítica de classe e uma crítica antirracista do mundo em que vivemos. Se o PCP ainda hoje insiste na necessidade de ler Marx com Lenine, é também porque a memória positiva do encontro entre movimento operário e movimento anticolonial subjaz tanto à história da disseminação mundial do comunismo como à Revolução de Abril de 1974.
27.01.2019 | por José Neves
Dizer que o racismo se manifesta de forma sistémica, e que a polícia é parte desse problema, não é a mesma coisa do que dizer que todos os polícias são racistas ou que todos os portugueses são racistas. É isso o que as associações anti-racistas vêm dizendo há muito tempo, num esforço pedagógico admirável mas que muitos preferem ignorar, e que até agora não tem tido grande efeito junto das instituições do Estado que deveriam garantir que episódios como o de domingo no Jamaica, de segunda-feira no centro de Lisboa, ou de há duas semanas, no Cacém, não voltem a repetir-se.
25.01.2019 | por Pedro Schacht Pereira
A actual geração de activistas, que já nasceu em Portugal ou cá cresceu, coloca novas questões na agenda do movimento negro feminino em Portugal. Recuamos no tempo... recuamos séculos... falta contar esta história.
21.01.2019 | por Cristina Roldão
Os nómadas podem ser entendidos em diversos contextos, nómadas na acepção antropológica, nómadas como um novo conceito na filosofia e nómadas como um conceito real e metafórico para novas práticas artísticas, tanto no sentido real como metafórico. Na acepção real refere-se à arte existente entre os povos nómadas, ao passo que o uso metafórico diz respeito à apropriação do nomadismo em novas criações artísticas e teatrais.
11.01.2019 | por Knut OveArntzen
É indesmentível que o ano de 2018 não só conheceu avanços consideráveis no debate como assistiu a tomadas de posição políticas de uma clareza pouco usual. O caso alemão é, neste particular, um dos mais interessantes.
05.01.2019 | por António Sousa Ribeiro
Apesar do papel social dos museus ter um crescente escrutínio público, muitos museus europeus de arqueologia e etnografia continuam a deter nas suas colecções objectos de outras culturas adquiridos em contextos coloniais e imperiais, em situações de desigualdade entre os coleccionadores, investigadores ou curiosos europeus e as comunidades locais. Esta é uma história com quase dois séculos.
04.01.2019 | por Filipa Cordeiro e Rui Mourão
Nas duas últimas décadas têm vindo a irromper no campo artístico obras e discursos que vêm sinalizando a urgência de questionar a presença do património artístico e cultural dos africanos, asiáticos e latino-americanos na Europa, problematizando e apelando para o fim deste “exílio forçado” como o designou um historiador senegalês, que representava o Ministro da Cultura do Senegal, Abdou Latif Coulibaly, no colóquio “Sharing Past and Future – Strengthening African-European Connections”, realizado no passado mês de Setembro, em Bruxelas, e organizado pelo AfricaMuseum e pelo Egmont – Royal Institute for International Relations.
23.12.2018 | por António Pinto Ribeiro e Margarida Calafate Ribeiro