Talvez o conteúdo, essa lembrança que se quer resgatar, esteja espelhada no espaço físico da galeria, no intenso vermelho como o sangue marcado, infligido, por qualquer uma daquelas figuras vangloriadas nos seus respetivos monumentos. No entanto, pretende-se resgatar uma lembrança que não temos, uma memória que não fora ainda construída – tal como a dupla, remetida a um Silêncio Coletivo. É este o anúncio que se pretende comunicar - a descolonização iminente, urgente, denunciando-se a criminosa normalização das suas pontas soltas. Mateus Nunes, no texto de acompanhamento da exposição, expõe-nos a operação desse drama, aqui, pelos artistas, de forma pertinente: “Uma das formas mais eficazes e provocativas de declarar a obsolescência de ideias e imagens não é descartá-las, mas virá-las do avesso”.
Vou lá visitar
08.06.2022 | por Miguel Pinto
Djam Neguin, artista caboverdiano multifacetado provocativo e irreverente, brinda-nos e surpreende com nova composição. “Badio Branku” como título, manifesta uma capacidade sintética de todo um conteúdo e narrativas contemporâneas daquilo que enfrentamos nas nossas sociedades, sedentas de africanidade como processo emancipatório.
Djam canta a um “espelho invertido”, uma máscara de quem não se quer ver. E sobretudo acusar-se. O existencialismo fala-nos do fardo que é a nossa própria liberdade, na simetria de uma responsabilidade que nem sempre é assumida na mesma medida. Amílcar Cabral falou disso, quando projetou e defendeu a criação do “homem novo”, que pensasse pela sua “própria cabeça”. Um ser livre. Um homem que se pode dar ao luxo de se ver e de ser visto, humanamente, sem “lágrimas de cor”.
Palcos
07.06.2022 | por Valdevino Santos Bronze
Sabemos que vivemos numa sociedade estruturalmente racista, com escassa representatividade da mulher negra nos vários setores importantes e relevantes da sociedade. Cada vez mais é notória a invisibilidade que a mulher negra sofre na sociedade. A mulher negra é o pilar da sociedade, pois é ela que limpa as cidades, no entanto, são marginalizadas ao nível da empregabilidade, de tratamento em setores públicos, de valorização e ascenção profissional, entre outros.
Então, tornar o "Chá de Beleza Afro" um dos maiores eventos de afroempreendedorismo e networking feminino de Portugal, vai não só mostrar às mulheres negras e racializadas, que elas têm um lugar de referência onde podem discutir as suas problemáticas, mas acima de tudo, um ambiente seguro onde podem promover os seus negócios, promover-se a si. Pretendemos que seja uma espécie de Websummit de mulheres negras.
Cara a cara
03.06.2022 | por Alícia Gaspar
Acho que existe um preconceito, não só na sociedade, mas no meio artístico também. Não podemos ter em conta que um personagem tenha a cor de quem a representa, a não ser para certos personagens históricos, que impliquem zelar pelo que escreveu o autor. Qualquer personagem é feito por qualquer outra pessoa, só que, infelizmente, quem dirige ou coordena as companhias, ao pensar num espectáculo não pensam nos actores negros, sejam africanos ou afrodescendentes.
Não existe esse pensar de que há no meio artístico português actores negros. Quando se pensa tendencialmente, os pápeis são característicos digamos.
Cara a cara
27.04.2022 | por Sílvia Milonga
Numa altura em que quase que nos obrigam, como mulheres negras, a manifestar e a reclamar a nossa “Identidade”, como se tudo o que escrevemos, falamos, desenhamos, pintamos e fazemos tem de ser africano esbarro-me com a explosão de cores da expressão de Nalia Agostinho onde me revejo, apenas, como mulher. Também revejo um universo feminino de décadas com várias outras parceiras de caminhada nas lágrimas, gargalhadas, partilhas, conversas, dúvidas e certezas.
Ou apenas tentarmos abraçar um imbondeiro e simplesmente sentir-me nua e livre como as obras “Colibri” e “Corpos Insubmissos”.
Vou lá visitar
25.03.2022 | por Magda Burity da Silva
A publicação, a 26 de agosto de 1789, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que estipulava que todos os homens eram livres e iguais, é um marco incontornável. O documento abriu novas expectativas, rapidamente defraudadas no que respeita aos mulatos e aos negros de São Domingos. Prova disso foram a tortura e a execução de Vincent Ogé, em 1791. Ogé deixou Paris, onde trabalhou com Julien Raimond6, e liderou uma revolta em São Domingos, próximo de Le Cap. Para o efeito, contou com o apoio dos Amis des Noirs, e foi instigado e apoiado por Thomas Clarkson, tendo, inclusive, recebido armamento em Inglaterra. Ogé, mulato livre nascido na ilha de São Domingos, liberal, apelou a interesses comuns de brancos e mulatos, ambos proprietários de escravos. Esta postura não o salvou de ser barbaramente torturado e executado. Antes de morrer, Ogé pediu clemência. A sua morte inflamou o debate sobre a questão colonial em França.
A ler
16.03.2022 | por Mariana Carneiro
Cada contexto nacional tem a sua especificidade histórica. Se os arquivos históricos visuais dos EUA são indissociáveis da escravatura oitocentista ou da segregação recente, as imagens de pessoas negras nos arquivos portugueses, como nos franceses, britânicos ou alemães são inseparáveis de uma história recente em que a cronologia do colonialismo coincidiu com a da fotografia nas suas múltiplas formas de reprodução – postais, livros, jornais e folhetos.
Nos últimos anos têm sido muitos os académicos, artistas, curadores e arquivistas – muitos deles negros e da diáspora africana – a abordarem criticamente a relação entre visualidade e negritude, entre imagens e racismo, entre direito a representação no espaço público como modo de justiça racial e social; ou, as muitas implicações éticas em lidar, hoje, com os legados visuais do passado.
Neste ciclo de conferências, iremos ouvir e debater com algumas destas vozes.
Vou lá visitar
14.03.2022 | por vários
quase “tudo” gira à volta da mulher, ou seja, é ela o pilar da família. Ela é mãe, muitas vezes mãe solteira cujo marido ou pai dos filhos a abandonou para ir viver com outra(s) mulher(es), ela é dona de casa em todos os sentidos, isto é, educa sozinha os filhos, faz os deveres de casa quando os filhos ainda não têm autonomia para ajudarem, é ela que trabalha e, na maioria das vezes, é com o salário dela que os filhos comem, se vestem e vão para a escola. A mulher foi, desde sempre, a pedra basilar da sociedade cabo-verdiana, assumindo-se ainda com mais força enquanto tal nos momentos de maiores dificuldades a nível nacional, quando os homens, devido ao flagelo da imigração por causa da seca e da falta de recursos do país, tiveram de se aventurar por outros destinos, sendo que muitos esqueceram a família, que ficou para trás na forma de um grande peso deixado nas costas das mulheres, as quais se viram obrigadas a assumir todos os papéis que deveriam ser partilhados com o marido/pai dos filhos.
Mukanda
21.01.2022 | por Ednilson Leandro Pina Fernandes
Não havendo um levantamento das fontes relevantes para a história da presença negra em Portugal – tarefa que urge iniciar – partilho aqui o meu encontro fortuito com uma série documental produzida pelo Ministério das Colónias, à guarda do Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa, Portugal), que ilumina aquela presença, paradoxalmente invisível.
A ler
05.01.2022 | por Cláudia Castelo
O artigo descreve três obras artísticas audiovisuais ('Ilusão', 'Bustagate' e 'Eu Não Sou Pilatus', produzidas respectivamente pelos artistas Vitória Cribb e Welket Bungué, entre 2019 e 2020) para debater como elas tratam, cada uma à sua maneira, o tema da repetição da violência contra corpos negros no ambiente numérico das redes; invocando uma análise qualitativa e estética dos procedimentos empregados nos vídeos e também dos locais em que eles foram disponibilizados, explora-se a hipótese, seguindo Hui (2021), de que a arte joga luz sobre a irracionalidade do racismo viabilizado por algoritmos e assim pode constituir uma necessária aproximação ao sublime, ao não-racional.
A ler
17.12.2021 | por Eduardo Prado Cardoso
A história de consumo do Outro, foi fulcral para garantir à igreja um plano estratégico de massacre da carne negra, uma carne amaldiçoada pelo olhar diabólico do mundo europeu com a marca de Caim que só seria expurgada através do trabalho servil, da entrega de si ao serviço do outro. Um corpo carne, um corpo máquina, um corpo deforme, um corpo de talho, pronto para um consumo voraz. Um corpo que serviu de suporte para manter toda a produção da sociedade europeia. Um corpo que ainda serve como cargueiro forte para elevar prédios, construir mansões ou servir de deleite sexual. Um corpo que é ainda é alvo, Um corpo sem política. Um não-corpo.
Mukanda
23.09.2021 | por Rodrigo Ribeiro Saturnino (ROD)
Poder declarar-me mulher negra, é fazer visível o laço invisível da minha ancestralidade, identidade legítima e que me aceita, esfera onde eu deixo de ser bastarda. Nela eu sou filha, sou humana, tenho voz e tenho o amor e a aceitação daqueles que se reconhecem em mim, por vezes nos meus cabelos crespos, por outras vezes na cor da minha pele, mas sempre nas nossas histórias de resistência e conquistas.
Mukanda
12.07.2021 | por Aline Djokic
Estava a escrever para o amigo branco, mas tirei um pouco de tempo para ti. Resolvi que era melhor começar por falar contigo, por estares aqui mais perto de mim. Mas antes amigo preto, peço que não faças veto a que eu comece pelo amigo panafricanista guineense. Não penses que é nacionalismo, é apenas comodismo, porque eu o conheço melhor e tenho com ele mais espaços de encontros em comum…
Hmmm, sabes que mais, mudei de ideias, acho que vou deixar o guineense para último, típico, tipo que é mais específico.
Mukanda
24.05.2021 | por Marinho de Pina
Corpos que se levantam diariamente às 4 da manhã; corpos invisíveis numa sociedade onde são a base da pirâmide; corpos que sofrem diariamente violência obstétrica por serem consideradas “não merecedoras” de um direito fundamental; corpos que deixam os seus filhos sem amparo todos os dias em busca do sustento; corpos sem direito a lazer devido a insuficiência económica; corpos que sofrem diariamente múltiplas opressões e agressões, corpos incapazes de cuidar da sua saúde mental, uma vez que é esperado deste corpo força, destreza e resiliência.
Mukanda
24.05.2021 | por Neusa Sousa
Se repararmos nas entrelinhas «do viver», a Morte não tem um padrão, embora, ao longo dos tempos, Ela tenha sido usada como arma para assassinar, sobretudo, corpos pretos nos mais distintos lugares e situações! Tentar padronizá-la e dominá-la é um ato falho, mas é possível percebê-la nos discursos políticos! Somos muito novos neste lar que chamamos de Terra. Eu tento lembrar disto todos os dias. Tento mesmo! Embora eu esqueça, muitas vezes, da minha insignificância e ignorância diante desta grandeza terráquea que não consigo mensurar.
Corpo
26.04.2021 | por Lauro José Cardoso
Hoje, encontramo-nos ainda em pleno processo de aprendizagem. A invisibilidade pode omitir e silenciar, mas não pode extinguir. E sim, podemos “desaprender” o colonialismo; mas primeiro, para que assim seja, as suas marcas e efeitos terão de ser confrontados. A desmemória do colonialismo é uma doença política - uma doença para a qual ainda não foi encontrada a cura. Ao contrário das palavras proferidas pelo assassino de Bruno Candé, não existem mais senzalas às quais se possa regressar. Mas, alinhado com o tema que hoje nos trouxe aqui, “reckoning”, ou reconhecimento, para se desaprender o colonialismo, e para que nos descolonizemos a nós próprios, assim como ao mundo à nossa volta, o passado tem de ser confrontado.
A ler
05.04.2021 | por Patrícia Martins Marcos
Esse tal de André Tontura vendeu ódio contra os tugas ciganos e os tugas pretos e os pretos que não são tugas, e lucrou com muitos votos, ele mandou uma tuga preta chamada Jassine para a sua terra, mas os chefes tugas disseram: "Pá, isso é normal, é liberdade do expressionismo alemão". Liberdade do Expressionismo alemão é um estilo inventado por um tal pintor chamado Hitler. Mas não acabou bem, porque virou nazismo. Mas “está tudo bem assim e não podia ser doutra forma”, como dizia o antigo chefe tuga Salazar, os chefes tugas de hoje lavaram essa ação do tonto do André Tontura.
A ler
21.02.2021 | por Marinho de Pina
Com curadoria de Alexey Artamonov, Denis Ruzaev e Ines Branco López, “Os olhares em confronto” é um ciclo que faz parte do programa da 14ª edição do Lisbon & Sintra Film Festival. Organizado entre Lisboa e Sintra, de 16 a 23 de novembro, este evento consiste na exibição de vários filmes/documentários sobre temas como feminismo, emancipação feminina, sexualidade, etnia, pobreza, infância, negritude, identidade, memória coletiva e saúde mental.
Afroscreen
21.11.2020 | por Alícia Gaspar
Transitar pelo contexto sócio-histórico e pelo interior do pensamento social e filosófico, com particular atenção à filosofia africana, tendo como principal meta ressignificar e permitir que os novos sujeitos sociais releiam e reinterpretem a sua própria história; reconhecer a desterritorialização da epistemologia cravada a partir dos gregos e da filosofia europeia; e, por fim e talvez o mais importante; buscar uma ruptura da continuidade epistemológica, de modo a reconhecer, na anterioridade histórica dos africanos e dos negros da diáspora, os seus valores e a contribuição histórica que eles proporcionaram à humanidade.
A ler
09.07.2020 | por vários
O filósofo Severino Ngoenha questiona em que momento teria surgido a arte e literatura moderna moçambicana e sugere influências do Movimento do Renascimento Negro. Este artigo dá seguimento a este exercício a partir da obra de José Craveirinha.
A ler
15.04.2020 | por Leonel Matusse Jr.