o autor resolveu extravasar a substância do livro, em si assaz inócua e inofensiva pois que ratificador do consenso ou, pelo menos, da opinião amplamente maioritária actualmente existente na sociedade caboverdiana das ilhas e diásporas quanto à natureza crioula da identidade cultural caboverdiana e porque largamente descritiva do que o autor considera as expressões arquipelágicas mais relevantes da crioulidade caboverdiana, para nas entrevistas acima referidas tentar recuperar as ultrapassadas teses sobre a suposta diluição de África na crioulidade caboverdiana e da orfandade continental do nosso arquipélago.
A ler
05.03.2024 | por José Luís Hopffer Almada
O que fizemos ao certo, nós que não iniciamos nenhuma revolução industrial, nem explodimos a bomba atómica? Nós que não distribuímos o agente laranja e muito menos o chlordécone? Nós os habitantes de um país cuja única guerra foi exatamente para recuperar um bioma, preservar vidas e o direito à respiração? O que fizemos nós, os resistentes da terra, para que ela nos condenasse? De facto, como dizia alguém, um dos crimes do colonialismo foi alienar-nos de tal modo a ponto de acreditarmos que a nossa simples existência constituía/constitui em si, uma aberração.
Mukanda
21.02.2024 | por Apolo de Carvalho
Vemos, na atual situação mundial, que a literatura pode ser usada como muito bem entendem os poderes públicos e privados, num sistema capitalista e global, em que ela circula segundo as regras da indústria e do comércio, como qualquer elemento de lucro e capitalização, concorrendo com a salsicha. Não tenhamos ilusões, que a palavra pode matar ou perder o sujeito nos labirintos da subvida.
A ler
07.02.2024 | por José Luis Pires Laranjeira
Daí que, em todas as suas modulações, seja incandescente o percurso de José Luiz Tavares, sem receio da polémica e do sarcasmo quando é preciso, mas também generoso e de uma grande justeza ética. E lembremos aqui a advertência de Wallace Stevens: «a nobreza da poesia “é uma violência interior que nos protege da violência exterior”». E mais não se peça a José Luiz Tavares, porque é daqueles que transporta o fogo e isso, a prazo, é o que dá conforto e fertilidade à morada dos homens. O resto é o gosto fátuo das farófias.
A ler
26.01.2024 | por António Cabrita
Este artigo debruça-se sobre a tentativa da unificação de Cabo Verde e Guiné-Bissau entre os anos de 1975 e de 1980. Apresento uma breve explicação sobre a concepção do PAIGC no domínio da unidade Guiné-Bissau-Cabo Verde. Demonstro como a declaração da independência da Guiné-Bissau (1973) e Cabo Verde (1975) vai determinar a estrutura do PAIGC e, por conseguinte, as figuras para liderarem os dois novos estados soberanos. Falo do percurso da unidade e do golpe de estado de novembro de 1980 (Guiné) e da criação de Partido Africano para Independência de Cabo Verde (PAICV). Evidencio algumas lições para a construção da unidade africana atualmente.
A ler
24.01.2024 | por Lumumba H. Shabaka
Ai noites de Assomada
dos prantos em Fundura
suplicando pelas almas redivivas
pelas vozes exuberantes nos jardins
da Praça Estrela na Praça Camões
na Praça do Rossio na Praça Figueira
no Largo Martim Moniz no bairro da Mouraria
no bairro da Alfama nas colinas da Graça
no Canecão no Conde Barão no Lontra
no Coquenote no Cave Adão
no Monte-Cara lá na Dedês
na Casa de Cabo Verde...
Mukanda
19.12.2023 | por José Luís Hopffer Almada
Plano sobre a avenida Marginal: os turistas calcorreiam-na em passeio, os caboverdianos em trabalho. A acumulação de imagens vai criando um olhar paralelo, de um mundo que interage mas mutuamente se desconhece. Começamos então a descortinar uma linha de leitura do filme. Os dois mundos são-nos dados a ver num certo maniqueísmo, notoriamente assumido pelos realizadores. De um lado, a resiliência dos ilhéus e a sua capacidade de aproveitar os parcos recursos. Os caboverdianos lutadores que resistem aos constrangimentos que os fustigam, cuja vida difícil é atenuada por relações interpessoais de solidariedade e de alguma alienação. Aqueles que têm de colaborar no jogo do turismo como uma das escassas indústrias e emprego que se lhes oferece. Noutro lado do espelho, os turistas que ali passeiam, também alienados na sua lógica desterritorializada: tanto faz estarem naquela ilha específica como noutro lado qualquer, não apreendem grande coisa da cultura local, mantendo apenas relações comerciais com aquele lugar. Podem vibrar muito e até apaixonar-se ou mudar de vida, mas podem sempre escolher.
Afroscreen
17.12.2023 | por Marta Lança
A poesia de José Luiz Tavares exige um modo esquivo de dizer ou de se dizer; diz-se sempre num como se fosse – desembaraçado da realidade suposta e das funções pragmáticas da linguagem que pretende servi-la. Se de um segredo se trata, a poesia há de ser íntima e inocente, avessa ao vozear deôntico da praça pública; e se o universo é coisa ubíqua, haverá outra cidade ou outra praça onde ressoa, ecoando, o seu segredo comum.
A ler
06.12.2023 | por Rui Guilherme Silva
Para mim, enquanto pessoa e cidadão caboverdiano, mas sobretudo como irmão mais novo, o exemplo do meu irmão David permanece marcante e indelével tanto como juristas que somos como também como poetas, ensaístas e estudiosos da caboverdianidade que também somos, em especial no que respeita à sua impoluta integridade moral, ao seu gosto pelo saber e pelo conhecimento e à sua intimorata pugna pela nossa afro-crioulidade e por uma caboverdianidade multidimensional no entendimento da diversidade das suas matrizes e das suas acttuais vertentes culturais.
Cara a cara
05.12.2023 | por José Luís Hopffer Almada
Assistiu ainda jovem adulto
Nas vastas terras angolanas
À devoração do irmão natural
Pela ferocidade das águas impetuosas
E tempestuosas do rio Kwanza
Mukanda
29.11.2023 | por José Luís Hopffer Almada
Um país em busca
Do seu verde nome
Ou, melhor, do verde
Lacrado no seu nome
Ou, muito melhor ainda,
Do lugar verde imaginado
Lavrado e ajuramentado
Com o seu inoxidável nome
No sonho do poema de amanhã
Mukanda
10.11.2023 | por José Luís Hopffer Almada
Todos nós éramos / todos nós fomos / excursionistas ocasionais / esporádicos caminhantes / das ruas sobreviventes / da mítica Cidade Velha
A ler
11.10.2023 | por José Luís Hopffer Almada
sem a diária interiorização do mal-estar devido à localização geográfica da ilha onde se nasceu, se cresceu e se almeja permaneça envolta exclusivamente em salitre e espuma marítima dos mares incógnitos ondulando navegados pelas naus portuguesas das descobertas, assaz distante da Europa, por demais próxima das terras dos pretos da Guiné e dos demais gentios da restante Costa de África,
sem as crenças, a farda, o bivaque, o s de Salazar incrustado aos cinturões dos exercícios para-militares da Mocidade Portuguesa,
sem os inspectores, os agentes e os torcionários da PIDE-DGS
Mukanda
23.07.2023 | por José Luís Hopffer Almada
A reivindicação da liberdade de se apossar soberanamente do processo histórico, como realça o discurso cabraliano, será doravante entendida como sinónima tanto do resgate da dignidade africana do colonizado, por demais vilipendiada no seu direito básico de existir segundo a sua própria historicidade identitária e os seus próprios modelos culturais, como também de todos os pressupostos políticos e culturais da produção desalienada das condições de emergência de um ser humano reconciliado com as suas próprias história e cultura e liberto do estado de subjugação política, do atraso endémico, da miséria, do medo, do sofrimento e da ignorância resultantes da dominação colonial e do correlativo subdesenvolvimento crónico das ilhas.
A ler
30.06.2023 | por José Luís Hopffer Almada
Nereida Carvalho Delgado conta-nos um pouco do seu percurso no teatro que começa em 2004 com a companhia Fladu Fla, na Praia, sua terra natal. Muda-se para São Vicente, onde vai estudar Biologia Marinha e onde fica por nove anos, dando continuidade a formações de teatro numa associação italiana, na comunidade onde vivia, Ribeira de Craquinha. Está em Loulé, no contexto do Festival Tanto Mar, a fazer uma residência artística sobre um tema muito difícil mas com a urgência total em ser falado: a violência e abuso de crianças e adolescentes que, em Cabo Verde, dá-se muitas vezes no seio da família.
Cara a cara
27.05.2023 | por Marta Lança
É com este espírito que continuarei a minha caminhada, agora enquanto emigrante de dupla condição: o que regressa mas sobretudo o que parte em busca de uma vida melhor. O que parte também no ensejo de um dia voltar. Se ca bado ca ta birado, como profetiza Eugénio Tavares no seu poema-canção, que hoje evoco, nesta hora di bai. E nada é mais crioulo do que isso.
Mukanda
05.05.2023 | por João Branco
Náná é o sufixo de Funaná, uma dança e música com origens na ilha de Santiago, música forjada, sobretudo por homens no mundo rural onde as mulheres têm um lugar passivo. A proposta de Djam Neguim consiste numa distorção destas "normatizações" da cultura cabo-verdiana, ainda muito rígida. “Com o meu trabalho tento romper com estas representações folclóricas e turísticas”, refere na nossa conversa que aconteceu pelas plataformas digitais.
Cara a cara
28.04.2023 | por André Castro Soares
orque num país de parcos recursos como Cabo Verde qualquer lei que sobrestime a língua portuguesa traduzir-se-á, com base num jogo de soma zero, na amplificação de obstáculos a real promoção e oficialização da língua cabo-verdiana. Dito de uma forma mais direta: qualquer recurso, simbólico ou material, canalizado à língua portuguesa traduz-se no correspondente que não é transferido a língua cabo-verdiana.
A ler
26.04.2023 | por Abel Djassi Amado
epiphron- ser uma namorada ou namorado de curto prazo de um turista ou emigrante em troca de presentes e favores.
eris - contratar um perito ocidental para legitimar projetos políticos e económicos contenciosos.
eucleia - uma pessoa com uma mentalidade colonial; uma pessoa que acredita que as pessoas pobres e incultas devem ser governadas pela força.
eufeme - uma pessoa que acredita que a vida não traz esperança; uma pessoa que é viciada em álcool adulterado.
A ler
04.04.2023 | por Irineu Rocha
Procuro defender aqui que existe uma especificidade dos processos criativos destes arquipélagos que consiste numa maior sensibilidade às questões ambientais e à coexistência com o Outro, uma vez que, por um lado, são mais dependentes de recursos limitados e, por isso, mais suscetíveis aos desequilíbrios climáticos e sociais e, por outro lado, enquanto pontos de encruzilhada entre diversas culturas, desenvolvem formas criativas de apropriação seletiva que alimentam um imaginário cultural pautado pela riqueza e vitalidade. Veremos, ao longo deste trabalho, como as ilhas são propícias a criar através de elementos de origens diferentes, e pelo seu isolamento, a manter a diversidade cultural ao longo do tempo podendo, assim, constituir espaços de estilos de vida alternativos.
Mukanda
14.03.2023 | por Ana Nolasco