Eusébio é, simultaneamente, o melhor jogador moçambicano de sempre e o melhor jogador português de sempre. A nacionalização de Eusébio, com a sua transladação para o Panteão Nacional, só poderá ser uma matéria tensa. O melhor será devolvê-lo à grande comunidade mundial dos adeptos do futebol e não transformá-lo, mais uma vez, em património nacional.
10.01.2014 | por Nuno Domingos
Mais de 5 mil activistas do planeta acorreram à selva para discutir com os zapatistas um conjunto de acções internacionais. Sindicalistas, anarquistas, terceiro-mundistas, ecologistas e alguns astronautas viveram durante uma semana nas aldeias de Oventic, La Garrutcha e La Realidad. Foi nesta última que se deu a conferência de imprensa final. Os jornalistas aproveitaram a ocasião para perguntar a Marcos qual era a sua reacção às declarações do então líder do Partido dos Trabalhadores, Lula da Silva, que se manifestava contra os movimentos de guerrilha e achava que a conferência intergaláctica tinha querido concorrer com o Fórum de São Paulo, encontro de partidos de esquerda de todo o mundo que organizava o PT. Marcos olhou com cara de espanto para os jornalistas, "Fórum de São Paulo? Não conheço, julgava que a gente concorria com os Jogos Olímpicos de Atlanta". Nesta altura, como agora, as revoltas não se decretam, fazem-se, e às vezes acontecem. A força dos zapatistas não estava nas suas armas, mas nas suas ideias e nas populações indígenas que são o próprio movimento.
07.01.2014 | por Nuno Ramos de Almeida
Porquê que é que em Angola, país de muitas línguas, os escritores apenas utilizam o português? Procurando contrariar o fenómeno, ao longo do ano de 2013 surgiram várias iniciativas online, criadas por jovens que olham para as tecnologias como um desafio para a promoção e salvaguarda das línguas nacionais. Um projecto ainda em fase inicial que promete fomentar a aprendizagem das línguas nacionais angolanas de uma forma inovadora, sem custos e ao alcance de todos que tenham acesso à internet é o Evalina, uma página de Facebook onde são disseminados conteúdos, estímulos à aprendizagem e lições sobre línguas nacionais. Até à data de publicação deste artigo havia lições de umbundu, a segunda língua mais falada a seguir ao português, e de kimbundo.
02.01.2014 | por Global Voices (Vozes Globais) e Mário Lopes
Olhando para um mapa, ele descreve a fronteira entre a Namíbia e Angola como «uma terra desconhecida e por descobrir». Ousa referir-se a Angola como «sobretudo terra incógnita» e até como um país em «isolamento». Estas descrições são inconcebíveis
27.11.2013 | por Lara Pawson
Em São Tomé, em inícios de década de 1930, vários jornais que tinham sobrevivido à queda da República, cessavam a sua publicação. Por esse tempo, rejeitando qualquer concertação política com os ilhéus e, até, com os colonos, as autoridades do Estado Novo dispensaram-se de propaganda no exíguo território, que o poder colonial manteria vergado aos interesses dos roceiros. Decorreriam anos até surgir, em 1947, um órgão oficioso, A Voz de S. Tomé. Monolítico e visado pela censura, redigido por curiosos, tornar-se-ia o único periódico onde, além dos pálidos reflexos da vida local, se estampava uma propaganda cinzenta do regime e da metrópole, ao mesmo tempo que também se decantava uma leitura do mundo. Ora, ao invés do que se imediatamente se imagina quando se pensa num jornal, A Voz de S. Tomé serviu para perpetuar o isolamento.
18.11.2013 | por Augusto Nascimento
Nestes apontamentos atentar-se-á nas relações entre o curso da política e diversos planos das vivências religiosas em São Tomé e Príncipe desde o século passado. Levando em conta a história recente, avaliar-se-á o multifacetado papel da religiosidade na actual configuração política e social do arquipélago.
23.10.2013 | por Augusto Nascimento
Os sírios e libaneses não vieram para o Brasil expulsos pela fome, mas sim, em sua grande maioria, perseguidos pelo Império Otomano, por razões de crença religiosa, já que eram cristãos vivendo em território muçulmano. Assim, aportaram aqui famílias de classe média, com vocação urbana – o oposto dos italianos e alemães, pobres, camponeses, analfabetos. Destacam-se, em diversas gerações, nomes como Emil Farhat, Jamil Almansour Haddad, Salim Miguel, Mário Chamie, Manoel Carlos Karam, Jamil Snege, Carlos Nejar, Foed Castro Chamma, Waldyr Nader, Raduan Nassar, Nagib Jorge Neto, Milton Hatoum e Alberto Mussa.
17.10.2013 | por Luiz Ruffato
De que forma as teorias feministas no contexto latino-americano “traduzem” e descolonizam a crítica pós-colonial? Que tipos de mediação são necessários nessas traduções feministas e latino-americanas do pós-colonial? Quais são seus limites? Estas são algumas indagações a respeito das tendências teóricas contemporâneas dentro do feminismo que explorarei a seguir na tentativa de mapear – necessariamente de forma abreviada – possíveis rumos para os estudos de gênero e feminismo no contexto latino-americano/brasileiro.
08.10.2013 | por Cláudia de Lima Costa
Quanto mais avançava na colonização do mundo exterior, tanto mais o homem branco precisava ajustar a si mesmo, e quanto mais assim se ajustava, mais precisava colonizar o mundo. Os senhores do autodomínio, que tinham vertido sangue no Novo Mundo, lançavam agora seu olhar abstrato e utilitário para o continente europeu. A colonização externa das culturas não-européias se reverteu directamente em colonização interna do próprio mundo. Na medida mesma em que promovia a capitalização da produção e a industrialização, o colonialismo também destruía o modo de produção agrário da antiga Europa e impelia a parcela empobrecida da população para as fábricas, então com jornadas de trabalho de 14 horas e bárbaro trabalho infantil.
03.10.2013 | por Robert Kurz
Pretendemos examinar o papel da mulher portuguesa na construção do Império Colonial Português através da análise da sua última obra, o romance O Mato (1972). Tendo em conta a centralidade e importância de uma das personagens femininas de O Mato - personagem esta que revela ambivalência em relação ao espaço colonial em que se move – é interessante abordar tópicos como o papel da mulher no espaço colonial e a relação entre mulheres brancas e africanos, bem como a alteração do papel tradicional da mulher no contexto colonial. Mais especificamente, o contexto colonial que nos interessa, o mato, pode ser considerado o espaço marginal do Império. Em última instância, queremos ampliar as perspectivas de se olhar o colonialismo português como um colonialismo predominantemente masculino e perceber a forma como a mulher foi instrumento fundamental na construção do projecto colonial.
30.09.2013 | por Sandra Sousa
Argumentamos no livro que os dois termos são impróprios, que a América "Latina" também é indígena, africana e asiática, da mesma maneira que a América supostamente "anglo-saxã" é também indígena, africana e asiática. O projeto de nosso livro é ir além dos estados-nação etnicamente definidos, para uma visão relacional, transnacional das nações como palimpsésticas e múltiplas.
25.09.2013 | por Emanuelle Santos e Patricia Schor
O Estado, seja no Brasil como no Peru ou em Portugal ou na Alemanha, está impregnado do Capital. Os governos são associações de empresários ou advogados dos grandes negócios com as empresas privadas. Daí a tese de Slavoj Zizek (entrevista ao L’Humanité.fr, 5.8.2013) que faz aqui todo o sentido: o poder do Estado deve ser tomado porque “eu não quero ser apenas alguém que é mobilizado todos os dias para uma manifestação”.
03.09.2013 | por António Pinto Ribeiro
A beleza tropical que passeia abundante e farta nas paisagens da nossa Guiné só encontra paralelo no tecido colorido que carateriza a nossa multiplicidade cultural e étnica. É como se a beleza da Natureza procurasse uma expressão análoga na criação humana dos sentidos do mundo. Esta tem sido a combinação que, desde menino, alimenta o meu imaginário. Um arco-íris de cores intensas e variadas que embelezam, ao mesmo tempo, as matas e as pessoas. O mais interessante desse imaginário é que, no maior tempo do meu tempo, pude vislumbrar sua tradução literal no quotidiano das memórias e das vivências.
02.09.2013 | por Dautarin da Costa
A relação global etno-racial do projecto imperial do Norte Global vis à vis o Sul Global – metáfora da exploração e exclusão social – é parte da relação global capitalista. Esta hierarquização de saberes, juntamente com a hierarquia de sistemas económicos e políticos, assim como com a predominância de culturas de raiz eurocêntrica, tem sido apelidada por vários investigadores de ‘colonialidade do poder’. Uma das expressões mais claras da colonialidade das relações de poder acontece com a persistência da colonização epistémica, da reprodução de estereótipos e formas de discriminação.
A entrada no século XXI, porém, exige uma etnografia mais complexa, que torne visíveis alternativas epistémicas emergentes. Um dos elementos mais críticos desta etnografia é a estrutura disciplinar do conhecimento moderno.
02.09.2013 | por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses
Perguntávamos a um moçambicano albino se tinha alguma anedota sobre portugueses, riu-se, chegou um português aqui a Maputo e surpreendido com tudo isto perguntou a um moçambicano com um ar simpático e bem parecido como se chamavam os filhos da puta em Moçambique, meu senhor, nós não os chamamos, eles é que vêm sozinhos de Lisboa. E lá estávamos nós, dois filhos da puta em Maputo 38 anos depois da independência 20 anos depois da guerra civil, a velha bêbada aos berros, os olhos dela raiavam sangue e miséria, dá-me um mulato, dá me um mulato ou dinheiro meu filho da puta.
24.04.2013 | por João Maria Gusmao + Pedro Paiva
Atribuindo-lhe uma função supletiva, alguns dirão que o futebol ajuda a compor um quadro de normalidade num país avassalado pelo fantasma da resolução violenta dos conflitos políticos. Tal ideia não estará errada, mas pode igualmente sugerir-se que o futebol denota o pulsar quase normal de uma sociedade que parece viver à margem dos conflitos e absorvida num comunitarismo e numa solidariedade capazes de fazer com que os conflitos políticos sejam amortecidos nos contextos e dinâmicas da vida dos bairros populares. Na verdade, como que se evidencia um fosso entre as pendências e os processos políticos, por um lado, e o curso de actividades sociais, por outro, como se tais níveis não se intersectassem, o que, sabemo-lo, constitui uma impossibilidade. Ainda assim, a vida na cidade de Bissau parece absolutamente pacífica (tornando como que estranhas e/ou turísticas as aparições das patrulhas da ECOMIB) e o futebol corre livremente.
05.04.2013 | por Miguel de Barros e Augusto Nascimento
Além da sistematização do luso-tropicalismo, Um brasileiro… fornece-nos informação parcelar sobre a viagem de Gilberto Freyre pelos territórios ultramarinos portugueses, elementos para o estudo da recepção do seu pensamento em Portugal e nas colónias portuguesas e para o conhecimento da sua rede de sociabilidades neste país.
31.03.2013 | por Cláudia Castelo
Num plano sobretudo interno à sociedade caboverdiana das ilhas, a componente culturalista afro-crioula, porque vivenciada por caboverdianos de diferentes origens raciais e sociais, e subsistente como parte irrenunciável da caboverdianidade, como componente essencial da identidade crioula, no arquipélago e na diáspora.
28.03.2013 | por José Luís Hopffer Almada
Os especialistas nos estudos da literatura caboverdiana parecem estar de acordo quando, na sua esmagadora maioria, vêm asseverando que pouco eco tiveram na obra dos literatos das ilhas sahelianas anteriores ao movimento político-literário caboverdiano da Nova Largada a negritude e outros movimentos literário-culturais similares, como o renascimento negro norte-americano, o indigenismo haitiano, o negrismo cubano, aliás, amplamente dissecados por Manuel Ferreira, na sua "Introdução" a No 'Reino de Caliban' e n'O Discurso no Percurso Africano, e, mais recentemente, por Pires Laranjeira, no livro 'A Negritude de Língua Portuguesa'.
28.03.2013 | por José Luís Hopffer Almada
Não obstante a origem colonial-escravocrata da sociedade crioula sedimentada nas ilhas, escassos são os traços de africanidade e de negritude na poesia caboverdiana da época anterior à Nova Largada. A que se deve o (aparente) paradoxo? Será porque a Negritude, tanto nas suas dimensões teóricas césaireana e senghoriana de resgate dos valores das civilizações negro-africanas e/ou de matriz afro-negra, e da dignidade do homem negro (negro-africano e afrodescendente), como na sua feição de obra literária e cultural, foi um fenómeno sobretudo francófono (tal como a teoria da African Personality foi sobretudo afro-anglófona), ainda que dinamizadas na Europa e nas diásporas crioulas e negro-africanas por intelectuais originários da África Negra e das Antilhas?
27.03.2013 | por José Luís Hopffer Almada