Estória verdadeira com poeta de verdade

A subir a rua dei-lhe encontro mesmo ao virar da esquina. Um poeta português de verdade, vivo, reverenciado. Dos poucos que entram nos Jornais das Letras. Poeta lido pelas pessoas que avançam poesia dentro. Membro de júris. Reverenciado, sim.

Ele aqui, parece à espera.

Lembrei logo a pergunta que tenho de dizer há tanto tempo. Ondé mesmo a rua desse JL, não é esta pergunta não, isso se descobriu já no Google. Mas a outra, a outra. 

Lhe olhei bem disposta , ele sorriu também, então:

- Poeta tenho uma pergunta… posso?

- Sim Claro Diga.

- Não se encontra literatura africana por aqui, sem ser a dos autores ‘lop, a maior parte editaram já tinham nome na Europa, uns só a Caminho, outros, não sei… é porquê mesmo?

- É que é outro mundo, sabe.

- Fora dos cinco ninguém. Bom, esse agora óptimo do Adriano Mixinge, num capítulo começa só: Adoro mulatas. Fantástico. Lá dentro tem Nástio Mosquito também. Desculpe, lhe estou a ocupar toda a pergunta. Os livros:  fora dos cinco, nada. Bom,  Soyinka com dificuldade, graças a Deus agora a menina do Biafra, aliás Nigéria Chimananda Ngozi Adichie, estilei eu, edição tão boa D. Quixote já viu? 

- É que é outro mundo. Um mundo lá deles. 

- Até breve, poeta.

Andei, andei mais, pensava outra vez que inacabei a conversa, falta de coragem, se visitasse outras erudições o poeta não ia se desfazer ou contaminar, nada, este é um poeta puro-puro, falta de coragem aqui eu… éh…, entro na livraria. E madrinha do céu, anjinhos protectores, minhas miondonas, meus kalundus … Na primeira mesa, logo ali o último livro do poeta. Aquele mesmo próprio poeta!! Abri. Um belo poema ao amor que encontrei logo, e exactamente ao lado aqui mesmo virado ao olho, espanto meu afinal… lá vem África tão felizmente longe-longe, bem congelada lá na época que caçou todo o imaginário, quem diria ainda preso aqui, criadas e cantáridas, meninos brancos desejosos e abandonados. 

O depois da iÁfrica terá morrido, seu passado existido teria não.  

Não se sabe – zumbis, cenário, palco, intervalo, alívio, reverso, personagens mudas, ecos, ecos – não se sabe. O que interessa é que está bastante longe mesmo. Ébola e isso. Heart of Darkness, azul ultramarino, memórias amadas, coincés entalados aí, até poetas.

 

(Sim Claro Disse. Ouviste ou não? Ler-ler, sobretudo ler. Na verdade, que sabemos nós da erótica de Conrad?)

 

 

 

 

por Branca Clara das Neves
A ler | 24 Setembro 2014 | África, poeta