Kuiam bastante!

Kuiam bastante! Cabo Verde e Guiné-Bissau já nem entram na categoria de rebeldes, são mesmo BANDIDOS! Esqueceram tudo e se entregaram de corpo e alma no kriolo! Conheci um assimilado que um dia me perguntou: mas kriolo não é português mal falado? Ai nha mãe!forti gana dal dôs bafatada… só pá dôdo… Não, kriolo não é português mal falado, kriolo é resistência, reinvenção, subversão e resiliência. Kriolo é a prova de que os antepassados estavam muito a frente mentalmente, apesar de todas as vozes que dizem o contrário.

02.05.2023 | por Aoaní d'Alva

Manifestamo-nos por mundos despatriarcais e deshierárquizantes

Manifestamo-nos por mundos despatriarcais e deshierárquizantes A Academia (com A maiúscula e no singular) é para nós um campo de disputa e aí estamos, sem dúvida, posicionadas(os) todos e todas nós que ousamos entrar nele, dialogar com ele, desafiá-lo, habitá-lo e/ou co-construí-lo a partir da prática cotidiana. Muitas(os) de nós ocupamos este espaço por decisão e convicção e sabemos minuto a minuto o que estamos enfrentando. É por isso que o manifesto “Todos sabemos” nos ressoa e interpela quando afirma que o extrativismo epistêmico é estrutural e não apenas um evento isolado na academia. Quando afirma que a Academia é hierárquica e hierarquizadora e que promove a acumulação de poder por aqueles que estão no topo. Muitos deles, nos últimos tempos, têm sido acusados de abuso e assédio moral e sexual.

28.04.2023 | por várias

GIZ, livro de poesia de Gisela Casimiro

GIZ, livro de poesia de Gisela Casimiro O livro mais duro. É o meu único nome, são uns quantos diminutivos, é o que ficou depois de passar pela Erosão. O giz vem do calcário. É o resto de uma pedra enorme que carreguei e ainda carrego, apenas de outra forma. Paisagem e pó.

27.04.2023 | por Gisela Casimiro

TODAS SABEMOS

TODAS SABEMOS Perante o atual debate público suscitado pela divulgação do capítulo “The walls spoke when no one else would: Autoethnographic notes on sexual-power gatekeeping within avant-garde academia”, publicado no livro Sexual Misconduct in Academia: Informing an Ethics of Care in the University (Routledge 2023), expressamos a nossa total solidariedade para com as autoras e demais vozes vindas a público, assim como para com todas as pessoas sujeitas a abusos de poder e outras formas de violência em contexto académico e fora dele. Este documento é uma contribuição coletiva e inacabada para um debate em curso.

14.04.2023 | por várias

IV Encontro de Cultura Visual

 IV Encontro de Cultura Visual Face à impossibilidade de reparar a brutalidade da violência colonial (Mbembe 2021) – a ocupação, a espoliação, o etnocídio, o desenraizamento, os raptos, as violações, o epistemicídio, o saque em grande escala, e o extrativismo – é preciso, ainda assim, fazer a sua “necrologia” (Hicks 2020), insistir no gesto de reparação, através de uma “ética da incomensurabilidade” (Tuck & Yang 2012), parte essencial de um processo de cura e cuidado permanentes.

28.03.2023 | por Ana Cristina Pereira (AKA Kitty Furtado) e Inês Beleza Barreiros

Arquipélagos criativos: arte, design e artesanato nas ilhas atlânticas lusófonas

Arquipélagos criativos: arte, design e artesanato nas ilhas atlânticas lusófonas Procuro defender aqui que existe uma especificidade dos processos criativos destes arquipélagos que consiste numa maior sensibilidade às questões ambientais e à coexistência com o Outro, uma vez que, por um lado, são mais dependentes de recursos limitados e, por isso, mais suscetíveis aos desequilíbrios climáticos e sociais e, por outro lado, enquanto pontos de encruzilhada entre diversas culturas, desenvolvem formas criativas de apropriação seletiva que alimentam um imaginário cultural pautado pela riqueza e vitalidade. Veremos, ao longo deste trabalho, como as ilhas são propícias a criar através de elementos de origens diferentes, e pelo seu isolamento, a manter a diversidade cultural ao longo do tempo podendo, assim, constituir espaços de estilos de vida alternativos.

14.03.2023 | por Ana Nolasco

A arte não tem imunidade

A arte não tem imunidade Em Portugal não temos categorias étnico-raciais legalmente aprovadas. Isso significa que não somos legalmente capazes de identificar desigualdades sociais em termos de raça. Este é um aviso importante de como a sociedade portuguesa funciona e como esse silêncio social da política nos informa que não há interesse ​em identificar esse problema. Mas podemos fazer isso visualmente. Basta olhar quem são as pessoas que estão liderando instituições de arte e curadorias para entender essa lacuna.

13.03.2023 | por Rodrigo Ribeiro Saturnino (ROD)

O homem que via no escuro, A Lisboa de Bruno Candé - PRÉ-PUBLICAÇÃO

O homem que via no escuro, A Lisboa de Bruno Candé - PRÉ-PUBLICAÇÃO Este livro é sobre um homem e sobre como o sítio onde nasceu se espelha naquilo em que se tornou. E acerca de como cada um é capaz de mudar a sua sina. Porque se ela parece traçada para os que nascem na Zona J, uma visita ao bairro mostra a ignorância das nossas suposições. Candé, não sendo um homem com canudo, era um cidadão curioso e um ator em ascensão, que não ascendeu mais porque a paixão pelo teatro consumou-se como profissão já tarde na sua vida. Também isto é reflexo da marginalização que a cidade impõe àquele pedaço de terra, onde Candé viveu e onde a cultura demora a chegar. Demorava mais antes, até Candé e os amigos ajudarem a mudar.

10.03.2023 | por Catarina Reis

Seu corpo absorve as dores do mundo

Seu corpo absorve as dores do mundo São seis horas da manhã e ainda não dormi. A vida não espera, parece que o novo dia já acontece, parece que é preciso seguir, parece que mais um dia é preciso ser forte, parece que mais um dia é preciso ser esteio, apoio, estrutura, vínculo, laço, base, centro, acolhida. Parece que mais um dia é dia de não ser eu mesma e ser esta grande fundação que sustenta o firmamento. Com os pés, procurei o chinelo pelo chão, ainda sentada, ainda meio viva meio morta, ainda nem acabei meu ontem mas já é preciso ser hoje, e é preciso que o hoje seja agora.

02.03.2023 | por Laura Gusmão

Revolta!!! Prefácio a "política Selvagem", de Jean Tible

Revolta!!! Prefácio a "política Selvagem", de Jean Tible Ao pensar a política na rua, na praça, na estrada e na mata, Jean Tible apresenta uma teoria da democracia que a encontra lá onde a polícia e a milícia matam sem medo de consequências jurídicas; lá onde foi assassinada a representante preta e lésbica da favela, do Complexo da Maré; lá onde pessoas pretas e/ou pobres diariamente confrontam a brutalidade policial e a precariedade econômica. Ao fazê-lo, política selvagem nos oferece um ponto de partida para recompor o arsenal disponível para a crítica da arquitetura política liberal, em particular de sua composição mais recente, o Estado-Nação. Essa recomposição pode ser indicada a partir de quatro movimentos, que vejo atuados e sugeridos no livro: focar na revolta como atualização da democracia; ver os comuns como materialização da revolta; adotar subalternos da matriz colonial, racial, cis-heteropatriarcal como figura política central; e a consequente recomposição do Estado-Nação, na qual a repressão aparece como a quarta de suas funções fundantes, ao lado de proteção, preservação e representação.

28.02.2023 | por Denise Ferreira da Silva

Verdades da e na palavra (in)verosímil do louco predilecto da cidade (prosopoema de Nzé de Sant'y Ago)

Verdades da e na palavra (in)verosímil do louco predilecto da cidade (prosopoema de Nzé de Sant'y Ago) o regionalismo e o bairrismo omnipresentes e omniscientes e o seu patriótico e caridoso afã no recrutamento de empregadas domésticas das as-ilhas para que os filhos dos seus patrões não aprendam a falar latim em casa e nunca tenham a ousadia de enunciar rústicos provérbios e poéticas sentenças na língua de Anastási Lópi/Nho Puxim e nas falas ponderosas e metafóricas de Nha Bibinha Cabral, Nha Násia Gomi, Codé de Dona, Sema Lópi, Ano Nobo, Katxás dos Bulimundo, Antero Simas ou Zezé e Zeca de Nha Reinalda e, pior, tenham o vão desplante de pronunciar os seus vocábulos repletos de impenitentes vogais e eminentes "is" esvaziados dos "erres" muito carregados, muito cientes de si e da sua propalada genealogia fidalga e da sua ventosa indumentária ornamentada de consoantes e passos bailarinos.

27.02.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Veracidades (prosopoema de Erasmo Cabral de Almada): excertos sobre a vida e a morte de Amílcar Cabral

Veracidades (prosopoema de Erasmo Cabral de Almada): excertos sobre a vida e a morte de Amílcar Cabral para o reajustamento dos desastres e dos bolores, para a predicação dos ressentimentos de há muito inoculados na carne dos tempos, para a mitigação dos sonhos e das utopias de outrora, dos seus fantasmas elementares, para a subtil decapitação dos seus heróis preliminares, do merecimento da sua vida e obra, das suas palavras exemplares, sempre precursoras, dos seus gestos e actos, sempre lavradores do futuro, ainda e sempre acompanhando os passos e as afrontas de Apili,

30.01.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Samora Machel. Uma biografia. PRÉ-PUBLICAÇÃO

Samora Machel. Uma biografia. PRÉ-PUBLICAÇÃO Samora Machel é recordado como o primeiro presidente de Moçambique e um dos líderes africanos notáveis que foram assassinados, nomeadamente Patrice Lumumba (Congo), Amílcar Cabral (Guiné-Bissau) e Thomas Sankara (Burkina Faso). Para os moçambicanos, foi o chefe da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), o exército guerrilheiro que, contra grandes adversidades, trouxe liberdade à sua pátria; na esfera internacional, no entanto, foi muito mais do que isso. Em toda a África Austral, Samora foi um herói para os oprimidos. Os seus êxitos militares contra um regime colonial apoiado pela África do Sul, a Rodésia, os Estados Unidos e os seus aliados da NATO, reforçaram a sua reputação revolucionária. O seu apoio às forças de libertação do Zimbabwe e ao Congresso Nacional Africano, que se revelou muito oneroso para Moçambique, elevou ainda mais a sua estatura.

25.01.2023 | por ALLEN ISAACMAN e BARBARA ISAACMAN

A (re) construção do cânone literário caboverdiano pelo olhar das antologias (parte 1)

A (re) construção do cânone literário caboverdiano pelo olhar das antologias (parte 1) A escrita de autoria caboverdiana tem já um longo historial. Ela remonta ao século XVI, ainda era Cabo Verde uma terra conhecida dos europeus e africanos há menos de dois séculos, e inicia-se pela lavra de André Álvares de Almada, um mestiço natural da cidade da Ribeira Grande de Santiago de Cabo Verde, feito filho da terra caboverdiana, ainda a crioulidade emitia os seus primeiros vagidos numa sociedade marcada pela estratificação social fundada na escravização dos negros africanos trazidos da Costa Africana vizinha e na omnipotência dos senhores brancos idos de Portugal e de outras terras europeias. Impuro de sangue, porque também descendente de negros, mas perfilhado e adoptado pela família fidalga do pai branco, André Álvares de Almada empreendeu por sua iniciativa uma longa e aventurosa viagem à Costa de África vizinha, então chamada pelos Europeus Rios da Guiné do Cabo Verde e sobre a qual viria a escrever o Padre António Vieira como “correspondendo em Guiné ao Bispado de Santiago”.

02.12.2022 | por José Luís Hopffer Almada

O silêncio é o estampido de uma selva farta

O silêncio é o estampido de uma selva farta Mas então porque o silêncio, por si só, é assim tão vangloriado e enaltecido, enquanto a voz, por sua vez tão demonizada, ou diabolizada como medíocre e menor? Isto ocorre justamente porque o silêncio quando não é dialético torna-se reacionário. E que este teor falacioso e unitário do silêncio, por ele mesmo, é instrumentalizado de forma equivocada e conveniente, porque o silêncio de alguns é o projeto de projeção da voz de outros.

29.11.2022 | por Manuella Bezerra de Melo

Projeto Popular, de Ícaro Lira

Projeto Popular, de Ícaro Lira O sufocamento de vozes insurgentes está todo aqui. Nesses arquivos, fotografias, pedaços de jornal, projetos sociais e manifestações populares. São todos parte da cartografia proposta por Ícaro Lira. Dos estopins causadores das revoltas - não deixando silenciar seus respectivos processos sociais de ruptura – ao esmagamento violento por parte do Estado.

15.11.2022 | por Beatriz Lemos

Uma abordagem crítica do romance “A Última Lua de Homem Grande”, de Mário Lúcio Sousa (parte II)

Uma abordagem crítica do romance “A Última Lua de Homem Grande”, de Mário Lúcio Sousa (parte II) Inserindo vários monólogos de Amílcar Cabral consigo próprio, vazados e lavrados em modo diarístico na sua depois desaparecida, ou, melhor, surripiada agenda azul, o romance 'A Última Lua de Homem Grande' pretende ser ser uma espécie de reconstituição póstuma dessa mesma agenda azul e de eventos marcantes da vida e da obra de Amílcar Cabral, esse Morto Imortal, cujos dilemas, paradoxos, ambivalências e notável coerência do ser e do estar são traçados à saciedade nesse deslumbrante e cativante, mas também trágico perfil social e psicológico de Amílcar Cabral que é o romance A Última Lua de Homem Grande, doravante um marco fundamental do percurso literário de sucesso de Mário Lúcio Sousa que vem, aliás, marcando com um verbo muito próprio e luzente as letras caboverdianas contemporâneas, tornando-se assim por mérito próprio um dos maiores, mais criativos, imaginativos e produtivos escritores

22.09.2022 | por José Luís Hopffer Almada

Uma abordagem crítica do romance “A Última Lua de Homem Grande”, de Mário Lúcio Sousa (parte I)

Uma abordagem crítica do romance “A Última Lua de Homem Grande”, de Mário Lúcio Sousa (parte I) Lido e/ou ouvido o impressionante, poderoso e sempre cativante poema “Kabral ka More”, de Emanuel Braga Tavares (o saudoso Xanon), debrucemo-nos agora e mais detalhadamente sobre o livro que aqui nos traz e que certamente teve a sua génese mais remota nessa primeira vez que Mário Lúcio Sousa resolveu, ainda menino e por inexcedível curiosidade infantil, espicaçada pelos tempos de festiva ruptura com o statuo quo colonial-fascista, copiar (e, certamente, decorar) o poema de Emanuel Braga Tavares e fazê-lo ressoar entre os colegas meninos e os mais adultos da sua vila natal do Tarrafal, poema esse que para sempre mudou a vida dele e de todos nós, crescidos e amadurecidos nesses férteis e irruptivos tempos pós-1 de Maio de 1974.

22.09.2022 | por José Luís Hopffer Almada

O Turista

O Turista No resort, o turista aborrece-se com a vida de papo para o ar, entre mulheres flácidas fazendo selfies, famílias empertigadas, comida monótona, piscina o tempo todo. A zona de animação oferece apenas o desinteresse de casais entediados, ou um grupo de colegas bancários embebedando-se ruidosamente. O ilhéu pouco tem da África com que ele tanto sonhara (à exceção da paisagem impressionante, mas essa assemelhava-se a algum recanto do Brasil). Dos habitantes locais, todos expulsos por um trocos para construirem casinhas e libertarem o ilhéu para os turistas.

01.09.2022 | por Marta Lança

Pré-publicação | Eu, Tituba, Bruxa… Negra de Salem

Pré-publicação | Eu, Tituba, Bruxa… Negra de Salem Começou por me dar um banho no qual flutuavam raízes fétidas, deixando a água escorrer ao longo dos meus membros. Em seguida, fez-me beber uma poção da sua lavra e atou-me à volta do pescoço um colar feito de pedrinhas vermelhas. — Hás-de sofrer durante a tua vida. Muito. Muito. Estas palavras, que me mergulharam no terror, pronunciou-as com calma, quase a sorrir. — Mas vais sobreviver. Isso não me consolava! Ainda assim, emanava uma tal autoridade da pessoa curvada e enrugada de Man Yaya, que eu não ousava protestar. Man Yaya ensinou-me as plantas. Aquelas que dão o sono. Aquelas que curam as chagas e as úlceras. Aquelas que fazem confessar os ladrões. Aquelas que acalmam os epilépticos e os mergulham num bendito repouso. Aquelas que metem nos lábios dos furiosos, dos desesperados e dos suicidas palavras de esperança. Man Yaya ensinou-me a escutar o vento quando ele se levanta e mede as suas forças por cima das cubatas que se prepara para esmigalhar. Man Yaya ensinou-me o mar. As montanhas e os montes. Ensinou-me que todas as coisas vivem, têm uma alma, um sopro. Que todas as coisas devem ser respeitadas. Que o homem não é um soberano percorrendo o seu reino a cavalo.

27.08.2022 | por Maryse Condé