Como documentarista, tenho o privilégio de poder voltar às minhas imagens, e agradecer o olhar que estas pessoas me lançaram, uma e outra vez. Ao longo dos filmes, dos depoimentos e das paisagens, estes sorrisos e estas histórias me acompanham como uma prova de fé.
06.01.2020 | por Rita Brás
A cara dos nossos textos de ontem, a sua voz, é descabida, inepta, ridiculamente grave, esganiçada. Não importa o que se tem para dizer, aquilo que se quer tentar perceber, mas que apenas amanhã seremos justos com o que somos hoje — valentes e livres como nos sonhamos.
Por isso é tantas vezes insuportável ler em voz alta ou regressar ao que se escreveu. A voz do ano passado (da semana passada; de anteontem) é burra ou amarga — e nós tão sublimadas, resolvidas, tão perenes agora.
02.01.2020 | por Djaimilia Pereira de Almeida
Que todos estes acontecimentos do ano de 2019 confiram um novo impulso ao combate contra o racismo, eis o que desejamos e aquilo a que este texto vem, apelando-se nestas linhas ao empenhamento anti-racista de quem se filia na mesma tradição política que nós, a das esquerdas.
26.12.2019 | por vários
Há algo de poético numa cidade entrecortada por um rio, como o Mondego fluindo imperturbável por entre as margens, a partir das quais se esparrama Coimbra. O rio é a imagem da continuidade e da impermanência, o seu tempo tangencia o infinito. As nossas existências, fugazes como as gentes que o atravessam, as pontes que o cortam e as águas que por lá passam, são o sumo da descontinuidade; o nosso tempo é ínfimo se comparado com o do rio.
19.12.2019 | por Lígia Afonso, Agnaldo Farias e Nuno de Brito Rocha
O IRREPARÁVEL, por fim, e sobretudo, aquele que funciona como estruturante do mundo-como-É, assente na irremediável e incompensável operação da usurpação/colonização, que faz do trauma o modo quase unívoco da individuação, assente, no limite, numa proliferação de variadas versões de uma mesma cisão, que separa sujeitos e sujeitades, pervertendo o ciclo da dádiva
13.12.2019 | por Fernanda Eugénio
Durante uma de suas mais recentes estadias junto aos indígenas Wari’, em 2014, Aparecida Vilaça conta que ficou impressionada com aquilo que então considerava ser uma novidade: viu diversas fotografias de seus amigos e parentes Wari’ que preenchiam na parede lateral de um quarto. Era o quarto de Paletó, seu pai indígena, de quem Aparecida foi se aproximando e criando essa relação de parentesco a partir de 1986.
07.12.2019 | por Fábio Zuker
Estas obras, em conjunto, criam uma rede de diferentes abordagens do rural, ao mesmo tempo que chamam a atenção para preocupações ecológicas. Estas obras constituem poderosos significantes num discurso global sobre o regionalismo, constituindo, igualmente, um apelo (poético) à ação no âmbito do nosso ambiente natural.
04.12.2019 | por vários
Keating acumula vestígios da presença irlandesa na Jamaica negligenciados pela historiografia ou desconsiderados pela memória coletiva, inserindo novas vozes na instância arquivística, até agora silenciosas. Ao fazer isto, a artista critica as construções de nacionalidade, colonialismo e identidade dominantes no Ocidente, produzindo uma alternativa às grandes narrativas que moldam a visão do mundo.
18.11.2019 | por Miguel Amado
Poderia ter-se referido ao bronze, que é o mais comum, aquele encostar de braços para comparação, enquanto se anuncia que se vai ficar “da tua cor” ou “mais preta que tu”. Sem contextualização imediata, porém, certas frases podem e irão gerar desconforto. Por vezes mesmo se contextualizadas. Ela poderia, por exemplo, ter referido que, quando alguém nos anuncia e define ora em prol da nossa naturalidade ora da nossa nacionalidade, conforme precisa, isso é privilégio negro.
12.11.2019 | por Gisela Casimiro
Declaramos solidariedade com a deputada Joacine Katar Moreira e apelamos ao sentido de responsabilidade cidadã dos portugueses e das instituições públicas, para que não deixem impor-se a linguagem do ódio e da desconfiança onde deve apenas haver lugar para a vigilância crítica, o debate aberto e a vontade de ir mais longe na construção de um futuro melhor para todos.
09.11.2019 | por vários
Como reaver uma certa efectividade nos gestos dissidentes? Como construir um comum que se levanta? De que forma? O recuo do império é inseparável da potência do contra-poder. (...) Nos momentos de crise dos impérios, o senso comum tende a sofrer alterações muito rápidas e só aí a palavra emancipação ganha a possibilidade de estar em todas as cabeças. É preciso desejar a surpresa de recém-chegadas sensibilidades radicais para que a revolta não nos apanhe ciumentos, rancorosos e ultrapassados.
07.11.2019 | por Maria Ampá
The Garden está a par das imagens domésticas de Deana Lawson. Adão e Eva estão ainda em casa, nesta aldeia do Congo. Mas, na casa de quem? Serão dois amantes deixados pernoitar em casa de amigos? Estarão na casa de todos, que é toda parte e lado nenhum? O que é uma casa, pergunta Eva. Deixa-te de perguntas, meu amor, responde Adão.
28.10.2019 | por Djaimilia Pereira de Almeida
Pensando a relação do humano com as plantas, esta exposição explora diferentes narrativas de mediação tecnológica do reino vegetal. O estudo das plantas como infraestrutura tem suscitado interesse entre a comunidade científica ao longo dos últimos séculos, inspirando gerações de investigadores, bem como o desenvolvimento de tecnocosmologias e sistemas cibernéticos.
14.10.2019 | por Margarida Mendes
Exigimos um posicionamento do Governo Português perante estes crimes contra a humanidade e o planeta. Apelamos ao boicote de todos os produtos provenientes do agronegócio brasileiro e ao cancelamento da vinda de Jair Bolsonaro a Portugal no começo de 2020. Defendemos a entrega incondicional dos territórios indígenas aos seus povos, demarcando as suas terras e fiscalizando essas demarcações contra as invasões ilícitas de madeireiros, garimpeiros e tentativas de grilagem!
25.08.2019 | por Fórum Indígena de Lisboa
O convite para MEXER em “comum”, durante uma semana, convoca-nos a questionar as lógicas de vida rígidas normativas que nos são apresentadas como caminhos únicos para os impasses que vivemos enquanto coletivo humano. O nosso foco é “o comum”, a forma de o construir numa lógica participada gerando alternativas, por agora aparentemente “impossíveis”, mas que se tornam possíveis perante a respiração e o decidir dissipar a confusão.
20.08.2019 | por Hugo Cruz
Se a agressividade do pensamento reaccionário ocorre num país cujos cidadãos ainda há 50 anos eram vítimas de racismo por toda a Europa dita desenvolvida, se tudo isto ocorre num país cujo poder de governo é ocupado por forças de esquerda, é fácil imaginar o que será quando voltarmos (se voltarmos) a ser governados pela direita.
25.07.2019 | por Boaventura de Sousa Santos
Do Haiti mobilizado esse semestre todo pela destituição do seu presidente às jovens do Extinction Rebellion interpelando a Europa rica. E nas lutas pela vida de corpos coletivos no Brasil, que sobrevivem à guerra colonial em curso (Canudos é reencenada desde sempre, clama Zé Celso no barco pirata em Paraty), lutando e criando, resistindo e construindo, em territórios livre e libertos, permanentes e fugazes.
23.07.2019 | por Jean Tible
Embora desapossada do olhar colossal que a navegação espacial lhe trouxe nos anos 70, a ideia de humanidade enquanto espécie converte-se progressivamente em colosso geológico imanente capaz de influenciar ritmos cardinais do mundo, ou pelo menos assim é descrito o seu alcance. Antropoceno é a época geológica da espécie humana, dizem, e a prova são os depósitos sedimentares que se originaram a partir dos anos 50 com os primeiros experimentos nucleares. Ignora-se claro que essa “espécie” foi inseminada artificialmente pelo casamento normativo e cisgénero da modernidade e da colonialismo, e que a visão colossal ainda se crê parada de fora e em frente ao globo, mesmo que, a bom ver, muitxs chafurdem na lama, em especial xs que não foram inclusos dentro dessa ideia unificadora de humanidade.
10.07.2019 | por Ritó aka Rita Natálio
Destruição das estruturas económicas que asseguram a reprodução dos membros da sociedade, destruição dos elos sociais, destruição da diversidade cultural, das tradições e das línguas, destruição dos fundamentos naturais da vida: aquilo que por toda a parte se constata não é somente o fim de certos modos de vida para entrarmos noutros – «destruições criadoras» de que a história da humanidade estaria repleta –, é antes uma série de catástrofes a todos os níveis e à escala planetária que parecem ameaçar a própria sobrevivência da humanidade, ou, pelo menos, a continuação de grandíssima parte daquilo que deu sentido à «aventura humana», para submergir os humanos no estado de «anfíbios».
29.05.2019 | por Anselm Jappe
As análises aqui propostas se atentam aos modos de subjetivação da negritude incluindo o racismo como produtor de subjetividade. Porém, vale demarcar que os processos de subjetivação que produzem práticas racistas não se confundem com a negritude como devir. Em outras palavras, o processo de formar-se negro passa tanto pelo cultivo do devir-negro quanto pela experiência de violência racial.
29.05.2019 | por Janaina Coelho