Rosto soberano - primeira estação (terceira variação)- segundo excerto
À memória do meu tio Mano Lópi, com respeito e admiração
À memória das minhas avós Suzana e Inês (também
chamada Tuna ), dos meus avôs Miguel (também
chamado Sinhô) e David (também chamado Dionísio),
das minhas tias Bia e Nhara e do meu primo-irmão Pira
À memória dos meus mestres de vários níveis de ensino,
dos companheiros e confrades das artes e letras já falecidos
e dos mestres e grandes obreiros da literatura caboverdiana
4
De mim foi-se igualmente:
Um tio que perplexo se afligiu
Com as grandes secas e estiagens
E as devastadoras fomes e mortandades
Que assolaram o seu arquipélago natal
Nos malditos anos quarenta do século XX
E resolveu trilhar os desconhecidos
E penosos caminhos da Terra Longe
De gentes gentios e quiçá também
De gentes inusitadamente gentis
Tal como outros parentes próximos
Oriundos das redondezas da Arribada
Dos Engenhos e da Achada Falcão
Embarcados para Quelimane Rufisque
Dacar Brazzaville Leopoldville e Conacri
Para as famigeradas e amaldiçoadas roças
Das ilhas equatorias do Golfo da Guiné
Para os expectantes e bastas vezes opulentos
Outras vezes desastrosos e belicosos colonatos
Da província ultramarina portuguesa de Angola
Assistiu ainda jovem adulto
Nas vastas terras angolanas
À devoração do irmão natural
Pela ferocidade das águas impetuosas
E tempestuosas do rio Kwanza
Foi maduro e desalentado espectador
E circunspecta testemunha ocular
Das quotidianas e coloniais agruras
Turbações atribulações e humilhações
Dos irmãos negros angolanos
Ouviu insólitas notícias
Da tentativa de libertação
Dos presos políticos angolanos
Reclusos nas masmorras da célebre
Cadeia de São Paulo de Luanda
Da malograda insurreição
Na Baixa do Cassange
Dos trabalhadores forçados nativos
Ditos contratados na enganadora e
Abstrusa linguagem administrativa
Das autoridades coloniais portuguesas
Depois violentamente reprimidos
E impiedosamente massacrados
Pela polícia política recém-instalada
Pela polícia de segurança pública
E pelas tropas colonial-fascistas
Da cruel matança de colonos brancos
E dos seus serviçais indígenas
Por bandos armados de rebeldes
Obnubilados pelo ódio e pela cólera
E da subsequente reacção colonial
Primacialmente caracterizada e marcada
Pelo racismo dos supremacistas brancos
E pela indescritível e inominável violência
Do terrorismo do Estado colonial-fascista
Do início efectivo da luta armada anti-colonial
Nas densas florestas do Mayombe em Cabinda
No norte e no leste da colossal e ubérima
Colónia/província ultramarina portuguesa
A partir das porosas fronteiras dos vizinhos
Países africanos recentemente independentes
E protagonizada por três movimentos político-armados
Sediados nas suas capitais Brazaville Kinshasa e Lusaka
Em circunstâncias e contextos temporais sucessivos
Amiúde enredados em altercações armadas emboscadas
Ataques e assassinatos de combatentes considerados rivais
Adversos opositores e até inimigos a impreterivelmente abater
Tal como ocorrido com a malograda Deolinda Rodrigues
E em ferozes confrontações políticas e ideológicas
Com vista à sua mútua neutralização e eliminação
Constituindo-se os três movimentos rivais e adversários
Assim e ademais em patentes gérmenes incendiários
E alimentando os restolhos e as faíscas da futura
E por demais insana e violenta guerra civil angolana
Todavia logrando um dos mesmos movimentos actuando
Prioritariamente entre o grupo étnico dos Bakongos
Radicados no norte de Angola mas também no antigo
Congo belga comumente chamado de Congo-Kinshasa
E no antigo Congo francês conhecido por Congo-Brazzaville
Fazer-se reconhecer pela Organização da Unidade Africana
Como o único e legítimo representante do povo angolano
Enquanto Governo Revolucionário de Angola no Exílio
Intuiu constatou e ouviu dizer
Do recrusdescimento da luta política clandestina
Nos bairros suburbanos de Luanda nas cidades
E nas vilas distritais nas aldeias e nos sobados
E do concomitante reforço dos aparelhos políticos
Ideológicos e repressivos da Administração Pública
Da Igreja Católica e das demais instituições coloniais
Disseminadas pela imensa vastidão do território angolano
Com o correlativo agravamento das vagas de prisões
E de processos políticos por via do encarceramento
E do julgamento dos presos políticos angolanos
Nas masmorras e nos calabouços de Luanda
E de outras cidades distritais a sua detenção
No deserto de Moçâmedes e a sequente
Deportação de alguns desses prisioneiros políticos
(Mestiços negros brancos e luso-angolanos) para o
Famigerado presídio político na ilha de Santiago
Do longínquo e flagelado arquipélago de Cabo Verde
Eufemisticamente chamado Campo de Trabalho de Chão Bom
Mais conhecido e celebrizado nacional e internacionalmente
Pelo triste nome de Campo da Morte Lenta do Tarrafal
Regozijou-se efusivamente com a Revolução dos Cravos
Eclodida vitoriosamente na madrugada redonda e luminosa
Do 25 de Abril de 1974 sob o signo dos muito celebrados
Três D (de Democracia Descolonização e Desenvolvimento)
E festejado pelos poetas como o dia inicial inteiro e limpo
Para derrubar o obsoleto e famigerado regime colonial-fascista
De António de Oliveira Salazar Marcelo Caetano e Américo Tomás
Instaurar e devolver um regime democrático pleno ao martirizado
Povo portugês subjugado e oprimido por mais de intermináveis e
Longos quarenta anos de obscurantismo medo atraso miséria
Censura prévia regime de partido único polícia política fraudes
Eleitorais impostos pela ditadura do Estado Novo cripto-fascista
Pôr um fim imediato às longas guerras coloniais conduzidas
Contra os povos africanos mediante a conclusão imediata de
Acordos de cessar-fogo e a posterior celebração entre o governo e
As demais autoridades legítimas da renovada República Portuguesa
E os respectivos partidos/movimentos de libertação nacional
(Com preferência e/ou exclusividade para os efectivamente
Presentes no terreno da guerra colonial/de libertação nacional
Enquanto partidos/movimentos político-armados representativos)
De acordos de transição gradual e pacífica para a segura ascensão
Das antigas colónias/províncias ultramarinas portuguesas ao
Estatuto de Repúblicas independentes laicas e democráticas
Plenamente integradas no concerto das nações livres e soberanas
Presenciou no Aeroporto Internacional da cidade de Luanda
As enormes multidões acolhendo e ovacionando o regresso
Triunfal e em festa das prisões políticas colonial-fascistas e do
Exílio na África independente na Europa dividida nas Américas
Dos líderes dos delegados e de outros altos representantes dos
Partidos/movimentos político-armados de libertação nacional
Entusiasmou-se com a conclusão dos Acordos de Alvor
Entre o governo da progressista República portuguesa
E os três partidos-movimentos de libertação nacional
Com vista à constituição de um governo de transição
Moderado por um Alto Comissário português designado
Pelo Presidente da República Portuguesa ouvidas as
Demais entidades políticas soberanas portuguesas
Constituído por ministros e secretários de Estado
Designados em partes iguais pela parte portuguesa
E pelos movimentos político-armados angolanos
E presidido por um Colégio Presidencial co-liderado
Alternadamente por um alto representante de cada um
Dos três movimentos político-armados de libertação nacional
Com vista à organização e à realização de eleições livres
Transparentes e democráticas por sufrágio universal e secreto
Para o encetamento e a conclusão com pleno sucesso
De um processo de transição pacífica num ambiente plural
E num quadro político-partidário legalmente reconhecido
Com vista à acessão em paz tranquilidade harmonia e concórdia
Do secularmente explorado oprimido e martirizado povo angolano
À sua independência nacional e à sua soberania internacional
No solenemente aprazado dia 11 de Novembro de 1975
Processo político depois consabidamente fracassado
E por isso tornado letra morta (se não mortíssima)
E por isso também definitivamente enterrado
Em razão dos inúmeros e mútuos boicotes
Desentendimentos acusações e sabotagens
Entre os diferentes protagonistas consubstanciados
Nos partidos político-armados de libertação nacional
E a suspensão da vigência do mesmo Acordo de Alvor
Pelas autoridades soberanas portuguesas em Agosto de 1975
Vindo tudo a agravar-se e a culminar com a eclosão
De uma sangrenta mortífera e onerosa guerra civil
Entre os beligerantes arregimentados pelos
Três partidos/movimentos adversários e rivais
E a expulsão compulsiva da cidade de Luanda
Das forças político-militares da FNLA e da UNITA
Pelas forças político-militares do vitorioso MPLA
Numa férrea intransigente impiedosa e incondicional luta
Pelo controlo de todos os bastiões do poder político-militar
Sob o olhar aparentemente passivo imparcial e neutro
Do Alto-Comissário luso e das forças portuguesas presentes
E os inelutáveis auspícios das grandes potências mundiais rivais
Na sua feroz luta e na sua atroz competição por cada vez mais
E maiores esferas de influência no âmbito da Guerra Fria
Viu a debandada e a fuga maciça para a metrópole colonial
E para os territórios da África Austral onde ainda imperavam
Regimes políticos e governos de feição abertamente racista
Dos latifundiários e dos demais terra-tenentes dos donos
Dos administradores e dos feitores das grandes plantações
Das grandes empresas agro-industriais comerciais e industriais
E de outras companhias monopolistas coloniais dos grandes
E dos médios funcionários públicos dos empregados de escritórios
De pequenos comerciantes e empresários de artesãos de diversas
Profissões e diferentes ramos de actividade de quadros e de
Técnicos médios de operários especializados de rústicos
Negociantes do mato e dos demais integrantes das antigas
Classes coloniais e dos respectivos descendentes brancos e
Mestiços nascidos crescidos amadurecidos e/ou nativizados
Nas vastas opulentas calorosas e estimadas terras angolanas
E o abandono do amado solo angolano por funcionários públicos
Trabalhadores assalariados pequenos comerciantes industriais e
Proprietários fundiários originários das nossas pequenas pobres
Abandonadas e esquecidas ilhas atlânticas tendo alguns deles
Sido suspeitos e publicamente acusados pelas tumultuosas vozes
Primacialmente das marginalizadas populações dos musseques
De implicação directa enquanto autores cúmplices ou auxiliares
Nos abusos cometidos e nas exações e medidas repressivas
Perpetradas arbitrariamente contra as subjugadas e espoliadas
Populações nativas (sobretudo as negras e mulatas)
Da ubérima e muito acolhedora terra angolana
Acompanhado por alguns familiares radicados e quedados
Na grande reverdecida e rejuvenescida ilha de Santiago
Assistiu expectante e eufórico no Estádio da Várzea
Da então pacata capital de Cabo Verde a cidade
Da Praia de Santa Maria da Esperança e da Vitória
À proclamação solene da independência política
E da soberania nacional e internacional da nova
E recém-nascida República de Cabo Verde sob os
Triunfantes auspícios da unidade Guiné-Cabo Verde
Na presença do triunvirato dirigente de Cabo Verde
Do triunvirato dirigente da República da Guiné-Bissau
Do primeiro-ministro do governo da República Portuguesa
Dos altos representantes do secretário-geral da ONU
Do secretário-geral da Organização da Unidade Africana
Do Movimento dos Não-Alinhados e de países amigos
Bem como de outras altas entidades estrangeiras
E de um numeroso público nativo em júbilo e em festa
Alegrou-se efusivamente com a proclamação solene
Na data previamente acordada de 11 de Novembro de 1975
Numa expectante e invicta cidade de Luanda duplamente
Assediada por tropas zairenses e por tropas sul-africanas
Da independência nacional e da soberania internacional
Do povo angolano em luta heróica sem tréguas e sem mercê
Contra a potencial subjugação pelos invasores e opressores
Sul-africanos e zairenses e dos movimentos político-armados
Seus aliados apoiantes acólitos cúmplices e auxiliares internos
Congratulou-se aliviado com a contenção às portas de Luanda
Dos mesmos agressores zairenses e sul-africanos e dos partidos
Seus aliados apoiantes acólitos cúmplices e auxiliares internos
Muito por força do decisivo apoio e da fulminante
Intervenção internacionalista dos militares cubanos
Soube na ressaca da proclamação da independência de Angola
Da perseguição política e do súbito aprisionamento de émulos da
Chamada Revolta Activa alegadamente por nas vésperas da eclosão
Na metrópole colonial do golpe de Estado conducente à triunfante
Revolução dos Cravos de 25 de Abril de Abril de 1974 e à
Restauração das liberdades e dos direitos democráticos se terem
Constituído em fracção intelectual liderada pelos irmãos Mário e
Joaquim Pinto de Andrade e por Gentil Viana e Adolfo Maria e em
Manifesto político aberto e público terem pugnado por uma mais
Ampla e efectiva democracia interna na discussão e na aprovação
Das políticas e na condução do destino do partido/movimento
Político-militar então confrontado com uma grave crise interna
Tendo ademais contestado o considerado excessivo autoritarismo
Enunciado e desqualificado como presidencialismo do renomado
Longevo e inamovível líder político-militar do MPLA o médico e
Antigo e reincidente preso político Dr António Agostinho Neto
Bem como dos jovens militantes radicais ultra-revolucionários reunidos
Nos denominados CACs (Comités Amílcar Cabral) depois rebaptizados
E reorganizados na clandestina e ultra-estalinista OCA (Organização
Comunista Angolana) de filiação pró-chinesa-posteriormente de
Filiação pró-albanesa- nos antigos calabouços prisões masmorras
Cadeias e presídios políticos coloniais onde aliás já se encontravam
Encarcerados e em condições sumamente deploráveis e execráveis
Alguns mercenários ocidentais a soldo dos agressores sul-africanos
Bem como os prisioneiros de guerra os presos político-armados e
Os demais opositores políticos das derrotadas FNLA e UNITA então
Em confuso e difuso processo de reconstituição político-ideológica de
Reconstrução organizacional e de redefinição do seu papel do seu
Ideário dos seus objectivos político-ideológicos e da sua inserção
Na nova ambiência cultural social económica e político-ideológica
E no novo contexto nacional e internacional trazidos e espoletados
Pelo malogro da nado-morta República Democrática de Angola
Ingloriamente proclamada no Huambo pela UNITA e pela FNLA
E pela proclamação com sucesso da República Popular de Angola
Na cidade-capital do Estado livre independente e soberano
Recentemente proclamado perante a África e o mundo
Luanda, fotografia de Rui Sérgio Afonso
Sendo a mesma perseguição política protagonizada pela facção
Liderada pelo Presidente Agostinho Neto decisivamente apoiada
Pela então emergente facção de Nito Alves favorável à assunção
Das consignas revolucionárias de uma revolução socialista e da
Imediata implantação em Angola da chamada democracia popular
Também denominada ditadura democrático-revolucionária das
Massas populares trabalhadoras pelo MPLA doravante instado a
Constituir-se em Partido do Trabalho guiado do ponto de vista
Politico e ideológico pelo marxismo-leninismo e a tempestiva e
Solenemente proclamar-se como inequívoco partido de vanguarda
Da classe operária e de todas as classes trabalhadoras em especial
Do campesinato pobre devendo o mesmo partido ser consagrado
Política e constitucionalmente como impreterível força política
Dirigente da sociedade e do Estado e força ideológica orientadora
E mentora de todas as organizações cívicas sociais e de massas
Sendo mais comuns nos líderes e nos mais representativos
Apoiantes da Revolta Activa os recursos ao auto-exílio interno
Consubstanciado num assumido silêncio político público
O mais raro e auto-imposto cárcere clandestino pessoal
Bem como o exílio externo no estrangeiro vário e diverso
Para fugir à implacável ferocidade e às garras penitenciárias
Da polícia política denominada e demonizada como DISA
Sendo por outro lado mais usual contra os militantes da OCA
(Sucessores dos Comités Amílcar Cabral) o recurso ao seu
Aprisionamento e amiúde à sua execução expedita e sumária
Seguiu acabrunhado pelas páginas monocórdicas e oficiosas
Do jornal nacional único e pela Rádio Nacional de Angola
As notícias sobre as discussões as diatribes as acusações as
Dissensões as confrontações e as lutas políticas entre duas novas
Correntes fracções e facões e/ou sensibilidades ideológicas no
Seio do movimento de libertação nacional no poder em Angola
Encabeçadas designadamente por Agostinho Neto e Nito Alves
Cada uma enfaticamente proclamando-se mais revolucionária
Mais marxista-leninista e mais identificada com os verdadeiros
Interesses do povo angolano e das suas classes trabalhadoras
Que a outra sua rival adversária e/ou figadalmente inimiga
Ambas todavia exalando ressumando e fedendo a oca e inócua
Verborreia colhida em incendiárias palavras de ordem políticas
E em elementares manuais de vulgarixzação da doutrina marxista
No seu genuíno e nefasto autoritarismo revolucionário de
Coloração fisionomia pendor e teor afro-estalinista tropical
Vindo tudo a desembocar na expulsão de todos os organismos e
Órgãos dirigentes do partido-movimento no poder em Luanda da
Fracção nitista liderada por Nito Alves José Van Dunem e Sita Valles
E nominalmente considerada mais assumidamente pró-soviética e
Unanimemente classificada como sendo ultra-radical de esquerda
Em razão de a mesma facção se considerar a si própria como mais
Embrenhada na consecução dos propósitos dos objectivos e do
Ideário de uma suposta revolução socialista em Angola e por isso
Como necessária e inevitavelmente mais imbuída na intransigente e
Incondicional defesa das ideologias políticas nominal vociferante e
Dogmaticamente tributárias e sustentadas na apologia de um
Esquerdismo tido considerado e qualificado pelos teóricos e pelos
Ideólogos mais proeminentes notabilizados e credenciados do
Movimento comunista internacional e da facção dominante no
Partido do Trabalho emergente do muito antigo experiente e
Amplo partido-movimento popular de libertação de Angola e
Parafraseando Vladimir Ilich Ulianov o célebre bolchevique Lenin
Como a típica doença infantil e pequeno-burguesa do comunismo
E sequentemente na manifestação popular e num alegado e muito
Controverso golpe de Estado protagonizados por apoiantes da
Facção nitista com efectiva ocupação militar das instalações da
Rádio Nacional de Angola e o assassinato de alguns altos
Dirigentes da facção maioritária apoiante do Presidente da
República Popular de Angola e do partido-estado MPLA-PT
E a contundente fulminante aterrorizadora e sanguinária reacção
Dessa mesma facção decisivamente apoiada por militares cubanos
Vindo tudo a ter o seu conclusivo epílogo e da forma e do modo
Mais trágicos com a derrota total da facção classificada como mais
Aventureirista e a subsequente ordem de execução presidencial à já
Famigerada polícia polícia dos líderes e dos cabecilhas da alegada e
Frustrada intentona político-militar e de todos os reais presumíveis
E imaginários apoiantes e correligionários da facção e corrente
Político-ideológica interna derrotada em toda a linha e doravante
Excluídos de todos os cargos lugares e funções do exercício do
Poder político nas instituições do Partido e do Estado angolanos
Perfazendo o colossal número de algumas dezenas de milhares
Os executados em massa e enterrados em valas e fossas comuns
Sem todavia devidamente considerar e contabilizar o número
Dos presos políticos dos desaparecidos e de outras vítimas
Inocentes e arbitrárias do chamado vituperado e por demais
Rememorado comemorado e celebrizado 27 de Maio de 1977
Constituindo-se essa mesma hecatombe humana -também
Denominado de morticínio purga e holocausto- inapelável e
Irrecusavelmente em genocídio e crime contra a humanidade
Que na sua catastrófica dimensão de desastre humanitário social
Cultural e político-ideológico nos planos nacional e internacional
Viria a manchar para sempre a reputação nacional e internacional
Do regime totalitário de nítido teor socializante e visível feição
Nacionalista revolucionária então instalado em Luanda e dos
Seus mentores e autores mais importantes coadjuvados pela
Famigerada e por demais celebrizada Comissão das Lágrimas e
Executada com inegáveis e execráveis zelo e esmero pela cruel e
Hedionda polícia política do regime de partido único depois extinta
Na sua monstruosa e conspurcada denominação de DISA
Ficando para sempre e de forma indelével e inapagável igualmente
Muito lesada a imagem pública do líder histórico do MPLA-PT e
Presidente da República Popular de Angola bem como e em igual
Medida a sua postura e a sua memória de nacionalista convicto e
De revolucionário impoluto marcados pela coerência e pela
Inteireza da integridade moral e do perfil humanista do também
Poeta Agostinho Neto reputado nacional e internacionalmente
Mesmo depois de em aparente rebate de consciência e penitente
Auto-crítica -ainda que tardiamente- e num gesto propiciador das
Sempre oportunas unidade e reconciliação nacionais o vitorioso
Aclamado entronizado e aparentemente frio tranquilo e sereno
Presidente da República Popular de Angola ter tido o ensejo para
Antes do seu falecimento por doença ocorrida curiosamente na
União Soviética indultar e amnistiar os presos políticos da FNLA da
Revolta Activa e da OCA bem como os sobreviventes das prisões
Políticas e dos ignóbeis massacres perpetrados contra os antigos
Camaradas e companheiros de luta dos vituperados amaldiçoados
E perseguidos integrantes real ou supostamente ou simplesmente
Simpatizantes da chamada fracção nitista do MPLA-PT
E como ouviu atenta e subrepticiamente dizer explanar
E explicar por parte de alguns estudantes universitários
Intelectuais e quadros amigos regressados do estrangeiro
Todos críticos acerbos dos regimes africanos de partido único
Ficou igualmente maculada a tirania sanguinária e etnocêntrica
Do clã familiar do vociferante anti-colonialista anti-neo-colonialista
Anti-imperialista e revolucionário Ahmed Sekou Touré sempre
Efervescente no Camp Boiro e em outros antros de perpetração de
Inomináveis sevícias e de cruel degradação da dignidade humana
Dos opositores e dissidentes políticos e de outros reais imaginários
E inventados autores instigadores fautores cúmplices e auxiliares
De complôs golpes de Estado e inventonas político-militares
Mas que também fez da sua República da Guiné-Conacri
Uma trincheira firme e inexpugnável da prolongada luta
Político-militar diplomática logística e socio-psicológica
Contra o obtuso e retrógrado colonialismo português
Cujo governo central colonial-fascista dirigido por Marcelo Caetano
E cujo chefe político-militar máximo o general António de Spínola
Na parte efectivamente administrada da colónia africana vizinha
Pelas suas forças de ocupação colonial foram responsáveis directos
Pelo planeamento pela organização e pela execução da famigerada
Operação Mar Verde de agressão à República da Guiné-Conacri
Com vista à substituição do seu regime anti-imperialista por um
Regime fantoche e neo-colonialista a cargo dos inqualificáveis
Mercenários traidores da pátria e colaboracionistas enquadrados
Treinados e armados pelo retrógrado colonial-fascismo português
E financiados pelo serviços secretos de várias potências ocidentais
Integrantes da chamada Front de Libératon de la Guinée a
Destruição das bases e das forças militares e logísticas do PAIGC
Estacionadas no porto de Conacri e na zona litorânea de La Miniére
E a eliminação física do seu líder Amílcar Cabral e de outros altos
Dirigentes do movimento de libertação binacional da Guiné-Bissau
E das ilhas de Cabo Verde bem como a libertação dos prisioneiros
De guerra portugueses colocados sob custódia do PAIGC depois
Transferidos para a custódia das autoridades da Guiné-Conacri
Tal como ficou igualmente estigmatizado o despotismo esclarecido
E o populismo revolucionário do regime neo-estalinista tropical de
Coloração maoísta dirigente da República Popular de Moçambique
-Se bem que em menores medida e proporções que em Angola-
Engendrador das aldeias comunais - em infeliz imitação das
Comunas populares chinesas e dos aldeamentos coloniais
Inventados pelas autoridades portuguesas colonial-fascistas em
Recentes tempos de guerra de subjugação do povo moçambicano-
Dos pelotões de fuzilamento de alguns proeminentes adversários
Ideológicos-com destaque para Lázaro Nkavandame Uria Simango
E Joana Simeão - e de outros notórios irredutíveis e visíveis
Inimigos políticos do controverso regime/sistema político ditatorial
De partido único de feição socializante implantado e imposto pela
Antiga vitoriosa e muito aclamada Frente de libertação nacional
Doravante rebaptizada depurada transmutada e auto-proclamada
Como o partido de vanguarda revolucionária marxista-leninista da
Supostamente firme esclarecida indestrutível e inexpugnável
Aliança operário-camponesa e dos famigerados centros também
Denominados campos de trabalho e de reeducação política - em
Macabro e insensato mimetismo dos campos de concentração e
De trabalho forçado de matriz soviético-estalinista celebrizados
Como gulagues -para o compulsivo internamento para a coerciva
Lavagem cerebral psicológica e político-ideológica e a imposição de
Extenuantes trabalhos forçados a indivíduos tidos qualificados e
Criminalizados como associais porque considerados e classificados
Como alegadamente marginais e improdutivos e preponderante
Primacial e prioritariamente a dissidentes e opositores políticos
Muitos deles acusados de serem inimigos do povo e da pátria por
Se terem efectivamente constituído em bandos político-armados
Orientados enquadrados e financiados pelo regime racista ilegal de
Ian Smith e pelo hediondo e criminoso regime do apartheid da
África do Sul para promover a desestabilização da sociedade e do
Estado livre independente e soberano moçambicanos por via da
Disseminação do medo e do terror entre as populações civis e a
Prática de actos de sabotagem contra infra-estruturas económicas
E sociais vitais tais como os meios de transporte rodoviários e
Ferroviários as fábricas os campos de cultivo as escolas os hospitais
Os campos de trabalho e de reeducação política e a perpetração de
Atentados contra as autoridades e os agentes do partido único e
Do Estado como as esquadras policiais e os quartéis militares
Mas tendo também sido exemplar no seu solidário e indefectível
Apoio aos movimentos de libertação nacional zimbabueanos e sul-
Africanos na sua ingente pugna e na sua dura luta contra os por
Demais execráveis regime do apartheid e a dominação racista dos
Obstinados supremacistas brancos e pela total imediata e completa
Emancipação cívico-política económica social e cultural das nações
E dos povos negros da Africa do Sul (Azânia) e do Zimbabué
Tal como permanecerão para sempre famigeradas e inesquecíveis
Para a História pós-colonial e a memória dos tempos vindouros
A execução sumária e sem o devido e requerido processo judicial
Dos comandos africanos bastas vezes suspeitos da prática activa
De crimes de guerra de crimes contra a humanidade e de outros
Crimes contra as populações civis e os combatentes da liberdade
Bem como as torturas as sevícias e o tratamento desumano cruel e
Degradante infligido aos opositores e dissidentes políticos pelos
Torcionários e carrascos do regime político socializante e do Estado
Nacional-democrático-revolucionário de incontornáveis nítidas e
Visíveis feições neo-estalinistas tropicais da unilateralmente
Proclamada República da Guiné-Bissau e quase unanimemente
Considerada como sumamente exemplar nos tempos heróicos de
Outrora da luta político-armada de libertação nacional e social
Luanda, fotografia de Rui Sérgio Afonso
Tal como permanecem para sempre famigeradas
As irrupções repressivas do regime de teor socializante
E nacional-democrático-revolucionário do diminuto
Arquipélago equatorial de São Tomé e Príncipe
Iniciadas com a precoce instauração de facto
E com o devido e benevolente beneplácito
Das autoridades portuguesas de transição
De um regime político de partido único
Com a neutralização política e a expulsão do país
Dos dirigentes e militantes mais proeminentes
Da Associação Cívica independentista Pró-MLSTP
E conotada com um radicalismo de esquerda
De extracção e coloração notoriamente maoístas
E a perseguição pós-colonial de opositores adversários
E dissidentes políticos incluindo altos dirigentes
Do partido/movimento de libertação no poder
E a sua sujeição a torturas sevícias e outros
Tratamentos desumanos degradantes e cruéis
Bastas vezes resultantes em grave lesão
Ou na morte de alguns de entre eles e
E a constrição da maioria deles ao silêncio
E ao exílio político interior ou exterior
Bem como as derivas repressivas
As oscilações esquizofrénicas
E as ocasionais pulsões totalitárias
Do regime de autoritarismo revolucionário mitigado
Nominalmente nacional-democrático-revolucionário
E de teor socializante implantado no tropical seco
Ventoso e semi-árido arquipélago de Cabo Verde
Iniciadas com a instalação e a vigência de facto
De um regime de partido único na sequência do
Encarceramento pelas forças do MFA em Cabo Verde
E por impulso de activistas do PAIGC em alegada
Resposta ao apelo das multidões ululantes colocadas
Em estado de histeria e fúria políticas em razão de
Supostas ameaças de comissão de atentados contra
A vida de altos dirigentes e de outros destacados
Responsáveis políticos vindos da luta político-armada
E da luta diplomática conduzida nas duas Guinés
No campo de trabalho e antigo presídio político
De Chão Bom do Tarrafal da ilha de Santiago
-Ainda que em notório regime de recreio porque isento
Da sua submissão a sevícias torturas e outras formas
De tratamento desumano cruel e degradante-
De dirigentes e de proeminentes militantes
Dos partidos políticos adversários do PAIGC
E da sua inabalável pugna pela independência
Total e imediata e por uma futura união orgânica
Com a República irmã da Guiné-Bissau já então
Constitucional e legalmente consagrada como
Um sistema político organizado em regime de
Partido único tendo o PAIGC como núcleo essencial
E força política dirigente do Estado e da sociedade
E evidenciadas durante o período pós-colonial
Na firme repressão dos protagonistas dos acontecimentos
De 1977 na cidade do Mindelo de 1979 na ilha Brava
E de 1980 na cidade da Praia e na reacção repressiva
Particularmente feroz e desproporcional contra
Os protagonistas dos lamentáveis acontecimentos
De 31 de Agosto de 1981 acusados das práticas de
Diseminação de panfletos boatos e de falsas notícias e
De subversão e atentado contra a segurança do Estado
Na ilha de Santo Antão com prisões arbitrárias dos
Mesmos protagonistas e torturas sevícias e outros
Tratamentos desumanos cruéis e degradantes infligidos
Aos mesmos em flagrante violação dos princípios humanistas
E das normas legais então vigentes e clara e inequivocamente
Consagrados na Constituição da República de Setembro de 1980
Depois revista em Fevereiro de 1981 para consagrar o fim definitivo
E inglório do projecto da união orgânica com a Guiné-Bissau
A dissolução do PAIGC enquanto partido político binacional
E o nascimento do PAICV o seu sucessor em Cabo Verde
Desiludiu-se com o malogro das inúmeras tentativas de
Negociação da paz em Angola em especial do denominado
Acordo de Gbadolite entre o governo do MPLA e a UNITA
Com o alto patrocínio e a mediação do Presidente do Zaíre
E de outros Chefes de Estado africanos no que se refere
Especialmente ao reconhecimento do regime de partido único do
MPLA e à consequente rendição político-militar por parte da UNITA
Como defendiam os negociadores do partido do governo angolano
Com sequente exílio do seu líder político-militar Jonas Savimbi
Ou pelo contrário a realização de eleições presidenciais e
Legislativas livres democráticas pluralistas e transparentes
Com base primeira e fundamento original e primacial
No escrutínio universal igual e secreto de todos os cidadãos
Angolanos adultos como defendiam os representantes da UNITA
Mesmo que assaz céptico saudou intimamente
E entusiasmou-se com a inesperada celebração
Do Acordo Tripartido de Nova York do ano de 1988
Entre as Repúblicas de Angola de Cuba e da África do Sul
Com o alto patrocínio da Organização das Nações Unidas
Da União Soviética e dos Estados Unidos da América
Que previa a retirada definitiva do solo sagrado
Do país irmão martirizado pelas infindáveis guerras
Da totalidade das forças militares estrangeiras
E a proclamação solene da independência política
E da soberania nacional e internacional da Namíbia
Esfuziou-se sinceramente com os Acordos de Bicesse
Que finalmente possibilitaram e abriram portas à realizaçao
Das primeiras eleições livres na sua amada pátria adoptiva
Todavia malogrados e postos em causa muito em razão
Da irrevogável recusa dos derrotados da pugna eleitoral
Em aceitar os nítidos expressivos e inequívocos resultados
Da expressão nas urnas da vontade popular soberana
E tomando como pretexto imediato os massacres de apoiantes
E de altos dirigentes da UNITA em fuga da cidade-capital angolana
Ocorridos por alegada instigação de altos dirigentes e quadros
Do partido/movimento de libertação no poder em Luanda
Na sequência do anúncio oficial dos resultados eleitorais
E a sua persistência na continuação da guerra fratricida
Sempre apoiados pelas potências imperialistas ocidentais
Em sacro conluio e em aliança contra-natura
Com o abjecto hediondo e criminoso
Do ainda sobrevivente mas agónico
Regime sul-africano do apartheid
Conheceu o sucesso económico
Com a camionagem de longa distância
Para o abastecimento das populações
Das cidades e das vilas provinciais
E os negócios paralelos com
Produtos raros e escassos da vasta
E imensamente rica rica terra angolana
Usufruiu com visíveis prazer e fulgor
Da abastança e da prosperidade
De self-made man morador
Primeiramente de um bairro suburbano
E depois de uma cidade colonial de cimento
Sitiada cercada e assediada por musseques
Onde habitam proliferam e pululam a miséria
E a quotidiana fúria na incessante luta
Pela improvável sobrevivência
Viria a falecer na cidade-capital do país
Que o viu amadurecer e fazer-se homem
Presumivelmente envenenado
Enredado que se encontrava
Em inextricáveis intrigas familiares
Tendo-se feito em nós um tio mano
Por sugestiva inoculação do nome
Outorgado pela nossa adorada mãe
-Também ela mana querida e dilecta
Das húmidas gentes das ribeiras-
Ao único irmão-macho sobrevivente
E sempre portador confesso e assumido
Da magnanimidade e da alegria de viver
5
Também de mim se foram:
Duas avós marcadas pela viuvez prematura
E pela longevidade das suas produtivas vidas
Uma materna e a única que conheci em vida
E que foi senhora dos cafezais e das terras
De Fonteana e de terrenos de sequeiro
Em Achada Gomes adquiridos com dinheiro ganho
De riba da água dos mares da mítica América
Pelo marido prematuramente falecido e em mim
E nos meus pseudónimos para a escrita de crónicas
Literárias e de ensaios e outros textos de intervenção
Cultural deixaram a herança e o legado dos seus
Nomes de casa - um deles um nominho neutro
Nas suas ressonâncias de género e o outro
Também um nominho entremeado com o lugar
De nascimento da minha mãe e com uma divina
Fracção do apelido da minha avó paterna -
Acrescidos dos seus apelidos oficiais
De mulher e de homem casados
Tendo sido a mesma avó materna
Irmã legítima de um padre católico
Que deixou vasta descendência
E disseminou o seu apelido
De matrizes judaico-portuguesas
Coloridas de reminiscências étnicas
E raciais inundadas de negritude
Por toda a grande ilha de Santiago
A outra paterna e que ainda se rejubilou
Com o nascimento do seu derradeiro neto
Que tenho o prazer e a subida honra de ser
E que ademais foi senhora e arrendatária
Das férteis terras de Pombal Jaracunda
Cerrado Rabo de Horta e Tanquinho
E do imponente sobrado sobranceiro
Á confluência das águas tumultuosas
E dos leitos secos das longas ribeiras
Dos Engenhos e de Sedeguma na
Grande ribeira que depois de um longo
E sinuoso percurso por povoações várias
Desemboca nos longos meses de secura
Desagua nos pluviosos tempos das as-águas
Gloriosamente na furna e nas belas paisagens
De Águas Belas e no porto e nas praias
Da aldeia piscatória da Ribeira da Barca
Depois todos trabalhados e recuperados
Para o património fundiário familiar
De forma justa definitiva e irreversível
Pela perseverança e pela persistência
Do seu filho varão único e mais velho
Que doou à sua irmã mais nova
A antiga casa de família de Quelém
Onde nascemos todos nós os filhos
Legítimos do afectuosa e carinhosamente
Chamado papai grande de Pombal pelos
Filhos das gentes humildes das ribeiras
E os terrenos de cultivo dela circundantes
Bem assim uma parte da propriedade de
Rabo de Horta a ela adjacente e contígua
Vindo a mesma tia paterna única
A ser depois carinhosa e fraternalmente
Acolhida na doença pela nossa mãe
Na nossa casa da Vila da Assomada
Tendo essa mesma tia paterna aliás tal
Como o nosso severo e rigoroso pai
Herdado dos nossos avós paternos
A alta estatura e a postura vertical
Nela resplandescendo por acréscimo
Da mestiçagem e da miscigenação
Os cabelos lisos negros e sedosos
Mas não a cor da pele a epiderme
E o fenótipo claros de mestiço branco
Herdados pelo nosso orgulhoso pai
Do seu pai branco de ascendência
Bávara corsa judia e portuguesa
E da sua mãe mulata com origens
Próximas na ilha caboverdiana do vulcão
De evidentes matrizes étnico-raciais
Europeias e negro-africanas
Uma tia que se fez menina e moça
Entre as fogosas e rebeladas gentes
Dos Engenhos e das suas rememorações
Da sua heroica revolta contra o latifúndio
Contra a extorsão da renda e da parceria
E os indízíveis abusos dos grandes morgados
E legou à filha primogénita do sétimo filho
Dos nossos pais o seu nome de guerreira
Acrescido das imprescritíveis ressonâncias
Do nome da grande ilha-violão de Santiago
E da minha mãe fez e fez-se
Esteio seguro e trincheira firme
Nas atribulações da velhice
E nos dias e nas noites
Da precoce e longa viuvez
Um primo-irmão também ele
Habitante de Luanda e que
Fez fortuna em terras angolanas
Com os negócios privados
Da agricultura da construção civil
E do abastecimento de água
Às camadas remediadas
E abastadas da população
Da cidade alta e dos seus
Caóticos arrabaldes e subúrbios
Em meio da galopante penúria
Da generalizada mendicidade
Do colapso quase total e geral
Dos serviços públicos e municipais
De fornecimento de água e electricidade
De limpeza e saneamento urbanos
E de abastecimento em produtos básicos
Para o quotidiano sustento das populações
Com as correlatas proliferação e disseminação
De mercados negros e paralelos com destaque
Para o muitíssimo célebre e assaz ilustrativo
Mercado de Roque Santeiro de Luanda
E depois com a queda do Muro de Berlim
A sequente falência no Leste da Europa
Dos pressupostos e preceitos socio-económicos
Culturais e político-ideológicos do impropriamente
Denominado socialismo real a impulsão do dantes
Todo-poderoso e hegemónico império soviético
E a correlativa expansão triunfal a nível global
Do capitalismo dos seus mandamentos sagrados
E das suas imprescrítiveis receitas eufemisticamente
Apresentadas como regras necessárias e essenciais
Indispensáveis para o bom funcionamento em livre
Concorrência de uma eficiente economia de mercado
A renúncia ao ideário doravante considerado utópico
Da construção de uma sociedade socialista em Angola
E concomitantemente ao regime de partido único
E às diferentes versões correntes e sensibilidades
Do marxismo-leninismo tradicional e primacialmente
De feições pendores teores e terrores estalinistas tropicais
Assim propiciando-se a imparável e célere eclosão
Na antiga República Popular de Angola agora pura
E simplesmente rebaptizada República de Angola
De um capitalismo selvagem de rosto mercantil
E o surgimento e a desaforada explosão de uma
Oligarquia extrativista e cleptocrática angolana
De feições burocrático-partidárias e compradoras
Por demais ostensivas predadoras e delapidadoras
Constituída para a sugestivamente chamada
E para a abertamente assumida desenfreada
E acelerada acumulação primitiva do capital
A partir das elites político-militares instaladas
Arrogante e prepotentemente no poder em Luanda
A título de alegado pagamento pelos heróicos actos e feitos
E pelos incomensuráveis sacrifícios supostamente consentidos
Durante a longa luta de libertação nacional anti-colonial
E a dura e duradoura segunda luta de libertação nacional
Contra os agressores zairenses e sul-africanos e os antigos
Movimentos político-armados de libertação nacional
Seus aliados cúmplices e alegados serventuários
Depois posicionados na oposição político-armada
Por isso ditos e severamente desqualificados
Como partidos político-armados fantoches
Também fazendo ele por ser um espectador
Atento astuto astucioso e silencioso dos eventos e
Acontecimentos vivenciados narrados ou ouvidos
Contar pelo meu estimado tio do lado materno
Tomou devida nota da perseguição do cerco
E da aniquilação das últimas colunas
Remanescentes das outrora poderosas
Forças militares do Galo Negro (as FALA)
Da (in)esperada liquidação em combate
Do líder histórico e carismático da UNITA
E a consequente e decisiva derrota final
A rendição incondicional e a debelatio
Dos vencidos da guerra civil de 1975/1976
E dos derrotados do pleito eleitoral de 1992
E deste inusitado modo da inequívoca
Obtenção da sonhada e almejada paz
Finalmente alcançada finalmente conquistada
Todavia prevendo-se magnanimamente
A amnistia o indulto e a renúncia a qualquer
Forma de perseguição política e penal
Contra os lideres e militantes da UNITA
Os seus militares arregimentados nas FALA
Bem como das suas respectivas famílias
E a plena integral e pacífica integração
Dos seus dirigentes militantes apoiantes
Simpatizantes e militares sobreviventes
Na totalidade da sociedade civil
E da vida política cívica cultural social
E económico-empresarial angolanas
Com as devidas garantias e salvaguardas
Constitucionais políticas e jurídico-legais
Dos direitos liberdades e garantias
De todos os cidadãos angolanos
Independentemente da sua filiação
E das suas simpatias político-partidárias
Foi paulatinamente transferindo
Para o país natal os resultados monetários dos
Bens materiais acumulados ao longo dos tempos
Tendo construído na cidade sede do concelho
Onde veio a este mundo e viu a luz do dia
Uma vistosa e imponente mansão
Quiçá em mimetismo e em saudosa
Homenagem dos sinais de luxuosa ostentação
De riqueza dos cobiçados oligarcas angolanos
Vindo a morrer de forma funesta
Na terra que o viu nascer
Provavelmente assassinado
Por homens de mão a soldo
Enviados do longínquo e cativante país
Que fez seu durante várias décadas e onde
Nasceram os seus filhos e as suas filhas
6
De mim também se foram
Para sempre para o nunca mais:
Alguns amigos que incandesceram
De alegria fantasia jogos e brincadeiras
A infância húmida mágica e abrupta
A adolescência faiscando ininterrupta
As imprevisíveis maravilhas e armadilhas
Da paixão e da desilusão amorosas
E a juventude repleta de terra-longe e de
Uma pasárgada feita de estudos de desatinos
De desalentos e de muitíssima boémia
De mim também se foram:
Alguns mestres-escola e algumas
Professoras das primeiras letras
E da titubeante e insistente iniciação
Na composição das palavras da lusografia
Memorizadas em alta sonora e audível voz
Alguns companheiros indefectíveis na rebeldia
E nas primícias literárias do encantatório
E pretensioso verbo juvenil
Alguns poetas e trovadores populares da morna
Da coladera do funaná da talaia-baixo e algumas
Notáveis cantadeiras do batuco do colá sanjon das
Festas de romaria e de outras celebrações tradicionais
Sábias profetisas da finason do rafodjo e do comberso
Sábi majestosas e portentosas soberanas da palavra
Na declinação e na formulação dos abecedários
Da oratura da crioulografia e da universal condição
Das criaturas humanas das nossas ilhas e diásporas
Alguns poetas vates e prosadores eruditos
Mestres exemplares na desassosegada lavra
Do metaforismo redondo na fecunda formulação
Da irritada postulação da fraternidade no livre
Engendramento e na contestatária burilação
Da palavra combativa gerundiva e exacta
Na consubstanciação do fogo e do afago
Do povo das ilhas e diásporas e na dissecação
Das palavras bíblicas do perdão para a eventual
E credenciada superação da morte e a sepultação
Das muitas misérias e atribulações da humanidade
No inusitado (desa) assombro dos olhos oníricos
Da noite com um conhecido gato pardo meditando
Lá no alto dos céus circundantes dos redemoinhos
Das ventanias e das falésias da ilha e do arquipélago
Sobre as muitas configurações e as mais que possíveis
Circunvalações dos signos das fisionomias e das genuflexões
Dos avatares da liberdade da igualdade e da fraternidade