Um conto poético intenso sobre poder, família e vingança no coração de Luanda

Estreado na 75ª edição do Festival de Locarno, “NOSSA SENHORA DA LOJA DO CHINÊS”, do realizador angolano Ery Claver, faz a sua estreia comercial em Portugal a 23 de Fevereiro, com distribuição assegurada pela Cinetoscópio. Mais infos aqui. 

Horários da Sessões:
qui 23 fev | 19h00
sex 24 fev | 21h30
sáb 25 fev | 16h30 - Sessão Especial com a presença do realizador Ery Claver (via zoom) e moderação de Marta Lança.
dom 26 fev | 17h30
seg 27 fev | 21h00
qua 01 mar | 21h00

“NOSSA SENHORA DA LOJA DO CHINÊS”, produzido pela Geração 80, foi filmado inteiramente em Luanda, cidade capital angolana, complexa, com muitas camadas, vários tempos e infinitas formas de viver. Assim também é o filme, que apresenta olhares diferentes sobre um mesmo objeto. Um filme em que uma grande construção importa tanto quanto o corredor da casa, a fé e o poder encontram-se, o silêncio das conversas une-se ao som angustiante da água, o calor do sol conecta-se à luz neon, e um poeta que escreve em mandarim.

O sentimento de perda do casal Bessa e Domingas paira como uma nuvem fúnebre sobre eles e sobre a casa. Zoyo leva-nos para as ruas, na busca inquieta pelo seu fiel amigo. É a santa, este objeto de milagres prometidos pelo comerciante Zhang Wei, que desvenda personagens e acontecimentos e conduz o olhar de uma sociedade entorpecida, com a saudade do que poderia ter sido e sujeita a constantes manipulações políticas e religiosas. Esta grande construção, sem alicerces firmes, débil e inacabada, a Tourada, é a vulnerabilidade do poder evidenciado. O surreal edifício é uma das oito Praças de Touros construídas em África na época colonial, depois ocupado por shows icónicos. Hoje carcomido pelo tempo, abriga salões de beleza, lavadores de carro e bares, sempre à espera da demolição ou da revitalização, planeada e prometida há anos pelo Estado.

O filme, que iniciou as gravações em meio a pandemia de 2020 e propositalmente escolheu filmar com apenas dois atores e uma equipa reduzida, teve nas gravações da Tourada o seu desafio maior de produção, reunindo mais de uma centena de pessoas para voltar a ocupar o espaço com Cultura.

DRAMA | 98 MIN | 2022 | ANGOLA
Argumento e realização: Ery Claver
com: Cláudia Púcuta, David Caracol, Willi Ribeiro e narrado por Meili Li

Sinopse: Quando um comerciante chinês traz para um bairro de Luanda uma singular imagem de plástico sagrado de Nossa Senhora, uma mãe enlutada busca a paz, um barbeiro atento inicia um novo culto e um jovem desorientado busca vingança por seu amigo perdido. 

Este bizarro conto urbano revelará uma família e uma fachada de cidade cheia de ressentimento, ganância e tragédia.

NOTA DO REALIZADOR
ERY CLAVER
Eu vejo estórias em que a câmara capta a realidade, mas a câmara, ao contrário dos olhos, não lagrima, a câmara é uma escrava fria da realidade, não lhe é permitido sonhar. Nossa Senhora da Loja do Chinês significa muito para mim como cineasta, não apenas por ser a minha primeira longa metragem. Este filme define e condensa um impulso que tenho traçado nas minhas últimas curtas metragens: uma alegoria sobre o poder.
A relação que tenho estabelecido com os aspectos da condição humana têm sido uma experiência determinante para a minha construção como cineasta. O filme reclama em seu contexto temas como desejos de vingança, segredos, servidão, abuso, violência, morte, fantasmas, política , fé religiosa, é através do poder que essas bases se manifestam.
“Certo dia, a qualquer hora em Luanda, vejo um contentor cheio de lixo. À sua volta, um grupo de jovens aos empurrões o cortejam, a poeira do carro preto os agride também. Dentro do carro, uma barriga repleta a apertar o volante. Mais à frente um grande placard a anunciar uma igreja, e dentro dela uma mãe ora pela memória da sua filha, um clamor abafado pelo grito mais potente de uma ou outra inocente criança a cantar, que assusta as mãos do pastor da igreja absorto a contar o dinheiro, um troco de outro coitado, que contrariado revolta-se em casa com quem é suposto amar. O vizinho ouve o grito mas diz: ‘Para acabar de construir a minha casa, os materiais, não estou a entender nada, está tudo em chinês’”.
Este filme fala essencialmente sobre o tempo em que vivemos. Se a realidade se permite esse paradoxo, então nós, ficcionistas, andamos a dormir e nem por isso estamos a sonhar. Se a realidade não aceita mentiras, deve pelo menos saber conviver com as alusões, e aludir, ou então imitar a realidade.

por vários
Afroscreen | 23 Fevereiro 2023 | Ery Claver, Geração 80, luanda, nossa senhora da loja do chinês