O ângulo morto da negritude/branquitude enquanto binómio estrutural para se pensar a chamada «cultura ocidental» e a organização da vida social que impõe. Verdadeiramente, não é o problema da raça que se torna complexo. É antes – e, volte-se a sublinhar, por recurso a um dispositivo poético potentíssimo – o problema do trabalho que se complexifica. E complexificando-se o problema do trabalho, complexifica-se, para os revolucionários, o problema da revolução.
A ler
13.05.2025 | por Fernando Ramalho
Pensei neste livro como uma corda de funâmbulo que permite passar de um edifício para outro, entre tempos, espaços, vivências. As estadias de terreno são experiências nuas, que nos retiram do nosso mundo e nos levam para um outro. Implicam transições, com a lentidão adequada, que abrem para iluminações, ou para a obscuridade, saindo da meia-luz das nossas próprias vidas. Por vezes, provimos de mundos em que aparentemente muito é possível, mas pouco acontece, sobretudo além do previsto. Durante as estadias de campo que se distanciam do nosso local habitual, há um desprendimento de nós que nos torna mais aptas à experiência marcante, em que tropeçamos num real que nos era desconhecido ou invisível, numa revelação.
A ler
12.05.2025 | por Paula Godinho
O curso do Português é ousado, veio a galope com um povo que marchava no chão, longe do imperador, distante dos letrados eclesiásticos, matando a sede nas bocas alheias, resvalando-se no que encontrava pelo caminho. Tornou-se, assim, muitas coisas antes de decretar-se português para tornar-se ainda mais coisas ao despencar do cavalo e montar o atlântico. É a língua que rege a gramática, e não ao contrário. Os códigos que registem a história do som das palavras povo. O resto, é só domínio, domesticação e poder. E contra isso teremos sempre a invicta e irresistível língua errada do povo, língua certa do povo.
A ler
10.05.2025 | por Manuella Bezerra de Melo
Conversas em torno da matéria líquida, atentas às suas agências materiais, fluxos históricos e envolvimentos políticos. Estas conversas reflectem sobre como a arte, a literatura e as práticas de escuta situadas podem transformar modos de sentir, conhecer e relacionar-se com a água - reimaginando gestos de cuidado insurgente e de resistência. Entre os temas abordados estão a aquapoética feminista africana, o activismo e as poéticas hídricas na América Latina indígena, bem como a dimensão política das materialidades sonoras em contextos aquáticos.
A ler
09.05.2025 | por Salomé Lopes Coelho
Nestes últimos, o jardim surge precisamente como essa construção colonial (na qual se inclui a estufa), que não deslocou apenas pessoas humanas, mas também plantas e o jardim crioulo aparece como espaço de resistência e criação das pessoas escravizadas e subalternizadas. Porém, na obra de Mónica de Miranda em geral, a memória é um veículo agenciador das presenças e não um dispositivo ao serviço da cristalização de identidades. Um movimento perpétuo que potencializa possibilidades de reescrever histórias e pensar futuros.
Afroscreen
09.05.2025 | por Ana Cristina Pereira (AKA Kitty Furtado)
As demonstrações de apoio ao processo revolucionário burquinabê têm sido inundadas por afetos, demonstrações de fraternidade, e isto não pode ser visto como algo menor. O germe da revolução surge sempre no meio do povo. Sem o povo, não há revolução! Um provérbio burquinabê diz que, “quando os olhos se fecham, a cabeça tomba”. Para que a cabeça não caia, o povo não pode fechar os olhos à sua realidade material, relacional e afetiva. O povo africano unido, decidiu manter os olhos postos em Ibrahim Traoré, para que o imperialismo não o faça cair, para que ele não caia!
Vou lá visitar
02.05.2025 | por Apolo de Carvalho
A música d'A Garota Não traz questionamentos sobre padrões de beleza que são impostos às mulheres, de formas conscientes e inconscientes, que no fim do dia nos adoecem; porque essa música significa, para mim, um manifesto ousado que se propõe a contestar modelos estéticos sob os quais vivemos socialmente; e porque essa música reflete muito do que me inquieta atualmente em relação à forma como lidamos com a nossa própria imagem e das outras pessoas.
Palcos
30.04.2025 | por Leopoldina Fekayamãle
Uma rede de trilhos cruza desde tempos imemoriais planícies, selvas e montanhas na América do Sul. Vão do Brasil ao Chile, passam pelo Paraguai, Bolívia e Peru, unem Atlântico e Pacífico. Pelos Caminhos do Peabiru formaram-se territórios e impérios, veneraram-se estrelas e deuses, viajaram mercadores. Engolida pela colonização, a rota ancestral é agora recuperada por historiadores e arqueólogos, impulsionados por um turismo que ameaça a sacralidade do espaço.
Jogos Sem Fronteiras
30.04.2025 | por Pedro Cardoso
Uma vida sangrando e chorando. Uma vida desfazendo o corpo para entender o corpo, para receber o corpo. Isto é configurado de muitas maneiras. Uma mulher desconectada com sua mulher perde os cabelos, perde escamas, vira boto. E boto é bicho homem, ainda que seja peixe, e ainda que seja fêmea. Uma coisa, meus senhores e senhoras, é uma coisa. A outra é boto, e boto é boto, mulher é mulher, uma escorregadia e o outro não. E chega uma hora que você já fez tanto de conta que é boto que acredita que é boto, fala feito boto, canta feito boto, ama um boto como se amam os botos. Mas o sangue vem e te lembra que você é mulher.
Corpo
30.04.2025 | por Manuella Bezerra de Melo
Este artigo interroga a necessidade e a urgência de reagir aos atos de perpetuação colonial envolvidos nas dimensões patrimoniais, memorialistas e monumentais das narrativas históricas em espaço público. Essas dimensões, plasmadas em inaugurações celebratórias do espírito de aventura da expansão marítima, em retóricas nacionalistas acríticas e em afirmações de uma certa (“Nova”) portugalidade, de algum modo revelam o que a Revolução dos Cravos não conseguiu apagar. Serão os brasões em pedra de calçada portuguesa do Jardim do Império restos nostálgicos coloniais ou perene processo de colonialidade que nunca se dissipou? A disputa pelas narrativas nos espaços públicos servirá para pensar “qual revolução?” cinquenta anos depois?
Cidade
30.04.2025 | por Izabela Tamaso e Paulo Raposo
Uma leitura da obra Do Tempo Suspenso (1998) de Maria Alexandre Dáskalos a partir da perspetiva teórica do in-betweenness (Bhabha, 1994), com o objetivo de decifrar a construção dinâmica de uma determinada identidade africana na poesia, sempre enquadrada pelo contexto pós-colonial, pós-guerra e de diáspora, que não se pode desligar da posição peculiar do sujeito poético entre diferentes lugares de memória (Assmann, 2008), divergentes paisagens de humanidade e variadas terras geoculturais.
A ler
30.04.2025 | por Peilin Yu
O cinema africano, afrodiaspórico e caboverdiano serve também para disputar narrativas – não só sobre África e sobre os africanos, sobre os caboverdianos e sobre as nossas perspectivas plurais, mas também sobre o que é o cinema em si, quem tem o direito de o fazer, quem tem o direito de ver e de ser visto, de falar e de ser ouvido. É um trabalho lento, minucioso, mas necessário. É o trabalho de reinscrever no nosso imaginário coletivo as imagens que nos pertencem, e que, por sua vez, nos transformam. Neste contexto, o futuro do cinema nas ilhas será inevitavelmente arquipelágico, feito de imensas vozes dispersas, mas em constante diálogo entre si, com Cabo Verde e com o mundo, feito de memórias partilhadas, mas reinventadas, de recursos limitados mas de criatividade infinita.
Afroscreen
29.04.2025 | por P.J. Marcellino
Catarina Simão desmonta o passado colonial e interroga o presente. Os materiais expostos são apresentados como vestígios de uma ideologia colonial que subsiste em tantas instituições portuguesas, geralmente de uma forma anacrónica. A presença de objetos africanos em depósitos museológicos, não raras vezes sem mediação crítica, é enfatizada na exposição, sendo talvez um dos aspetos mais contundentes do seu projeto. Questiona-se a própria noção de arquivo, como espaço de conhecimento, saber e devoção e repositório de memória. A exposição é composta por diferentes núcleos, onde o visitante é confrontado com a complexidade dos materiais e é convidado a pensar sobre os mecanismos de exotização e racismo.
Vou lá visitar
25.04.2025 | por Inês Vieira Gomes
Em Portugal, sabe-se tudo sobre o Brasil e no Brasil, fora a época das invasões, a sardinha, o bacalhau e os lindos azulejos, sabe-se quase nada de Portugal. Ah, tem o Cristiano Ronaldo, mas relativamente pouca gente dá grande importância. Se sairmos nas ruas de qualquer cidade de qualquer região do Brasil e perguntarmos se conhecem a Amália, por exemplo, quase ninguém vai conhecer – o que é uma grandíssima pena. E, por causa disto e da real discriminação que a população de imigrantes (e mesmo turistas) brasileiros sofre em Portugal, impulsionada pela crescente da extrema-direita que legitima tudo o que há de podre no comportamento humano, criou-se um movimento de reação através daquilo o que o brasileiro faz de melhor: a zoeira.
Mukanda
22.04.2025 | por Gabriella Florenzano
Um sistema de escrita é apenas uma ferramenta para grafar a língua — e não pode, por si só, “conter” as variedades linguísticas. Escrita não é língua. Se o objetivo é permitir grafar qualquer variedade, então essas variedades devem aparecer com as suas especificidades. Como as palavras apresentam formas distintas em cada variedade, não se pode adotar uma escrita uniforme — como a proposta pelas autoras — sem perdas significativas.
A ler
21.04.2025 | por Eleutério Afonso
Nunca nos consideramos turistas. Porque vamos para os outros mundos com “propósitos nobres”, levamos cultura, espalhamos arte, vamos em busca de luz, procurando mudar o mundo e cuidar do meio ambiente principalmente através de viagens aéreas. Nós não viajamos para consumir folclore ou atraídos por um produto urbano-mercantil criado por um visionário qualquer, nós não fazemos filas para andar cem metros numa espécie de elevador da Bica ou para provar uma queijada de Belém local. Nem fotografias tiramos para as nossas redes sociais. Nós não somos turistas. Nós levamos mais-valias culturais para outras cidades.
Cidade
21.04.2025 | por Marinho de Pina
Junto a isso, eram lançadas mensagens afirmativas que fortaleciam a estética black — que assustava a sociedade (ainda em 2002, as vendedoras negras das boutiques da zona sul do Rio eram obrigadas a alisar os cabelos ou, no mínimo, trançá-los). Reivindicava-se o direito de aspirar à ascensão social. “O primeiro engenheiro negro que conheci foi o Filó; o nosso destino era ter um lugar subordinado” afirma um dos entrevistados.
Palcos
15.04.2025 | por Laura Burocco
A Comissão Científica da DALMACV-PT composta, in casu, por Ana Josefa Cardoso, Dulce Pereira, Alice Matos, Nélia Alexandre e Hans-Peter (Lonha) Heilmair informa que o processo de análise e reflexão sobre o "Manual de Língua e Cultura Cabo-Verdiana" se encontra em curso. Esta reflexão crítica de leitura do manual incide sobre três tópicos: i) Questões Linguísticas; ii. Questões Pedagógico-Didáticas e iii. Questões de Política de Língua.
Vou lá visitar
14.04.2025 | por vários e José Luís Hopffer Almada
Mas a cor é um território. A sexualidade, território. A crença, território. O corpo, território. O género, território. A memória, território. A dança, território. O cabelo, o sonho, o luto, a trauma (seja lá o que isso for), a língua e a linguagem, são todos territórios. Territórios, não propriedades privadas. Mas queremos colocar fronteiras, colocar linhas e marcas em tudo, apesar de todos vivermos em migrações constantes.
Mukanda
14.04.2025 | por Marinho de Pina
O governo angolano entende que apesar deste tipo de disseminação não ser um acontecimento recente, com a existência da Internet tudo se tornou mais rápido e eficaz, sendo insuficientes as “ferramentas tradicionais do direito” tendo em vista o seu combate.
Neste contexto considera-se urgente “a necessidade de se adaptar uma abordagem legal suficientemente abrangente e integrada das informações falsas ocorridas na internet”.
Vou lá visitar
13.04.2025 | por Reginaldo Silva