O caso Amílcar Cabral. Apontamentos críticos a propósito do princípio e do projecto da unidade Guiné-Cabo Verde. PARTE 2

O caso Amílcar Cabral. Apontamentos críticos a propósito do princípio e do projecto da unidade Guiné-Cabo Verde. PARTE 2 Embora defensor e advogado convicto do princípio da unidade Guiné/Cabo Verde, a postura de Amílcar Cabral sobre esta candente questão distinguia-se da de muitos líderes africanos e, até, de alguns militantes e responsáveis políticos guineenses, em cuja óptica Cabo Verde quiçá mais não fosse (ou deveria ser) do que, por assim dizer, um prolongamento meso-atlântico, mestiço e árido das verdes e opulentas ilhas negro-africanas dos Bijagós (como se pode constatar numa entrevista do bissau-guineense de origem caboverdiana Gil Fernandes constante do dossier publicado pela revista Afrique-Asie sobre o assassinato de Amílcar Cabral logo depois da ocorrência desse evento histórico por demais trágico).

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30.01.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Veracidades (prosopoema de Erasmo Cabral de Almada): excertos sobre a vida e a morte de Amílcar Cabral

Veracidades (prosopoema de Erasmo Cabral de Almada): excertos sobre a vida e a morte de Amílcar Cabral para o reajustamento dos desastres e dos bolores, para a predicação dos ressentimentos de há muito inoculados na carne dos tempos, para a mitigação dos sonhos e das utopias de outrora, dos seus fantasmas elementares, para a subtil decapitação dos seus heróis preliminares, do merecimento da sua vida e obra, das suas palavras exemplares, sempre precursoras, dos seus gestos e actos, sempre lavradores do futuro, ainda e sempre acompanhando os passos e as afrontas de Apili,

Mukanda

30.01.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Peru: revolta e poesia

Peru: revolta e poesia A 7 de dezembro do ano passado, o chamado autogolpe falhado do presidente peruano Pedro Castillo e a sua detenção desataram o caos no Peru. Dois meses depois, as manifestações dos apoiantes do antigo mandatário – indígenas, universitários e sindicatos – continuam a ser reprimidas com especial violência. Até hoje, as forças policiais peruanas mataram 54 manifestantes. Sem saída à vista, a poesia insurge-se.

Jogos Sem Fronteiras

28.01.2023 | por Pedro Cardoso

Samora Machel. Uma biografia. PRÉ-PUBLICAÇÃO

Samora Machel. Uma biografia. PRÉ-PUBLICAÇÃO Samora Machel é recordado como o primeiro presidente de Moçambique e um dos líderes africanos notáveis que foram assassinados, nomeadamente Patrice Lumumba (Congo), Amílcar Cabral (Guiné-Bissau) e Thomas Sankara (Burkina Faso). Para os moçambicanos, foi o chefe da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), o exército guerrilheiro que, contra grandes adversidades, trouxe liberdade à sua pátria; na esfera internacional, no entanto, foi muito mais do que isso. Em toda a África Austral, Samora foi um herói para os oprimidos. Os seus êxitos militares contra um regime colonial apoiado pela África do Sul, a Rodésia, os Estados Unidos e os seus aliados da NATO, reforçaram a sua reputação revolucionária. O seu apoio às forças de libertação do Zimbabwe e ao Congresso Nacional Africano, que se revelou muito oneroso para Moçambique, elevou ainda mais a sua estatura.

Mukanda

25.01.2023 | por ALLEN ISAACMAN e BARBARA ISAACMAN

O dia em que deixamos de construir as cidades para os outros

O dia em que deixamos de construir as cidades para os outros Em 2010, combinei encontro com a Margarida Vale de Gato, sua filha Alice e o poeta Rui Costa, na base do Museu de Arte Contemporânea de Niterói (MAC). Dali se mirava a cidade-montanha Rio de Janeiro como o «outro lado». Escrevi no meu bloco de notas da altura: «Niterói tem uma nave de Niemeyer que aterrou na Baía de Guanabara com um museu que espelha o futuro.» A obra, inaugurada em 1996, era de facto a imagem do futuro: fachada futurista, envidraçados de onde se abarcava um pedaço de mundo a 360 graus. Pairando na água, reconhecíamos o modernismo, a arquitetura botava fé no futuro expresso nas formas redondas de «concreto». A sua escala gigante fazia-nos seres minúsculos na fotografia debaixo da nave, fincados no tapete vermelho serpenteante, também ele cimentado. Ao entrarmos no MAC, recordo vagamente uma exposição (creio que do acervo da Coleção João Sattamini, com obras desde a década de 50) de artistas brasileiros que, durante a ditadura militar e civil, tinham sido perseguidos e torturados. Cada obra à sua maneira, transmitia o desejo coletivo de liberdade. Na altura pensei que era assim mesmo, o desejo de futuro não podia prescindir da evocação das trevas, tinha de levar consigo as dores do passado, a ditadura, a «democracia racial», a escravidão, as gritantes desigualdades, os colonialismos todos, e um sem-fim de dores do Brasil.

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25.01.2023 | por Marta Lança

“Não dependo da aprovação de ninguém”. Mães solteiras em Angola

“Não dependo da aprovação de ninguém”. Mães solteiras em Angola Os tempos mudaram e as famílias acompanharam estas mudanças. Hoje, tendencialmente, vai-se valorizando as relações afectivas em detrimento dos modelos de família do passado. Em vez de se alimentar mentalidades retrógradas da nossa sociedade que ainda hoje condenam mães solteiras, temos de compreender o fenómeno e tentar incluí-lo como um dado nas, cada vez mais variadas, formas de ser família, desde monoparental a famílias compostas, passando por pais ou mães do mesmo sexo. Por outro lado, as mães solteiras são consideradas guerreiras, lutadoras, elogiando-lhes o sacrifício e a abnegação, o que não deixa de ser manifesto de uma mentalidade machista, em que a mulher, cuidadora por excelência, "aguenta tudo" e pode perfeitamente abdicar de si. Uma coisa é ser mãe solteira por opção, outra é, como na maioria dos casos, sê-lo porque o homem não assume a paternidade ou é mais um pai ausente. A educação e o trabalho remunerado foram fundamentais para a emancipação da mulher, a partilha das responsabilidades em relação aos filhos também o são, assim como o direito a ser mãe solteira por opção mas com condições.

Corpo

24.01.2023 | por Marta Lança

O caso Amílcar Cabral. Apontamentos críticos a propósito do princípio e do projecto da unidade Guiné-Cabo Verde. PARTE 1

O caso Amílcar Cabral. Apontamentos críticos a propósito do princípio e do projecto da unidade Guiné-Cabo Verde. PARTE 1 Segundo opinião expendida por Onésimo Silveira no ensaio “O Nativismo Cabo-Verdiano: O Caso Amílcar Cabral” (inserto no seu livro A Democracia em Cabo Verde, de 2005), à “deriva literária do nativismo”, que foi o movimento claridoso, ter-se-ia seguido uma nova fase do nativismo de conteúdo essencialmente político e encabeçado por Amílcar Cabral. Essa derradeira manifestação do nativismo caboverdiano transportaria, em si, os gérmenes do anti-nativismo, na medida em que seria de natureza nacionalista e projectada num quadro pan-africanista de unidade Guiné-Cabo Verde. Por esta última razão, ela estaria também pejada das ambiguidades advenientes da teoria cabraliana da reafricanização dos espíritos, alegadamente inoperante para o caso de um povo mestiço, como o é o povo cabo-verdiano.

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22.01.2023 | por José Luís Hopffer Almada

Marxa Cabral 2023: rizistensia I dimokrasia

Marxa Cabral 2023: rizistensia I dimokrasia  A recusa da prática do suicídio de classe sugerida por Cabral por parte daqueles a que Frantz Fanon denominou de elite colonizada, potencializou o neocolonialismo forjado no período da libertação entre a elite nativa e a burguesia colonialista, reproduzido hoje pela elite política, cultural e académica nativa em conluio com a elite transnacional, representada pela classe tecnocrática de topo nas agências do desenvolvimento. Portanto, em termos simbólicos, a Marxa Cabral representa o retorno à fonte na lógica cabralista e potencializa a tomada da consciência das várias formas de violência reproduzida desde o período colonial – exploração, humilhação, deslocações forçadas, condenação à fome –, hoje com uma nova roupagem.

Cidade

18.01.2023 | por Redy Wilson Lima

Bibliotecas Comunitárias em Angola: espaços de cultura, aprendizagem e esperança para além do centro!

Bibliotecas Comunitárias em Angola: espaços de cultura, aprendizagem e esperança para além do centro! Em Angola, nos últimos dois anos e meio, surgiram vários projectos sociais, sem fins lucrativos, ligados à difusão do livro e da literatura no geral. Uma das componentes mais fortes nesses diversos projectos foi a criação de diversas bibliotecas comunitárias, em diferentes regiões do país, pelas mãos de jovens que se foram inspirando uns aos outros. Várias pessoas, em diferentes lugares, às vezes em simultâneo e outras não, foram dando asas à sua imaginação e dentro das suas comunidades criaram bibliotecas comunitárias que têm servido a um número significativo de pessoas, sobretudo crianças e jovens.

Vou lá visitar

18.01.2023 | por Leopoldina Fekayamãle

Sumbala ukexilu wenyo udifangana kala twamukwiva odizwi dya mutu umonekesa okifwa kye kyoso mu kitangelu kiki, à escritora Aida Gomes, em kimbundu

Sumbala ukexilu wenyo udifangana kala twamukwiva odizwi dya mutu umonekesa okifwa kye kyoso mu kitangelu kiki, à escritora Aida Gomes, em kimbundu Amulongesa kutanga kyoso kyakexile hanji ni mivu iwana anga se ukamba kusoneka, mwene utanga ni paya, madivulu ma asoneki majina ma mama: omusoneki wa diyala dijina dye amwixana Dostoevski, omusoneki wa diyala dijina dye amwixana Balzac, omusoneki wa diyala dijina dye amwixana Zola, omusoneki wa diyala dijina dye amwixana Hemingwayi ni musoneki wa diyala wakamukwa hanji dijina dye amwixana Eça. Mwene anga uzola kukala mukwivila mimbu, mimbu ya ukulu kya, mimbu ya ixi ya Brazili, mimbu yatokala mu ngongo ya África ni mimbu mu kifwa kya jazz. Okusangela musoso mu kaxi ka musoso ni kukunguna omatangelu iyi kikalakalu kitenena mukukala “ikalakalu yenda kamwanyu, ikalakalu yabangiwa ni hele ye yoso”.

Cara a cara

17.01.2023 | por Marta Lança, Aida Gomes e Mário Luís Pereira

Ame ndikevelela okuti elivulu eli liya lisalẽha tchimwe tchipongoloka omwenho pokati k'olohulukãyi vyomu omanu valete. Entrevista a Aida Gomes em umbundo

Ame ndikevelela okuti elivulu eli liya  lisalẽha  tchimwe tchipongoloka omwenho pokati k'olohulukãyi vyomu omanu valete. Entrevista a Aida Gomes em umbundo Ndañgo okuti ame ndasonehẽle ale Os Pretos de Pousaflores l'okwivaluka ovikalakala vina vyapitiwa l'owiñgi wo ko Putu, etchi twakala k'anhamo akwĩ epanduvali, ale akwĩ etchelãla toke k'efetikilo ly'anhamo akwĩ etchea kwenda okupungula owiñgi, l'okulimba onhima kw'ovisenge, ale okutepisa ovimbundu l'ovindele kwenda alume lakãyi), etchi ndilaka tchetchi okuti p’okutanga, ava omanu epandu vo vo Ngola lava l'omanu epandu, vo ko Putu, valimbukiwe k'okuvuka kwavo l'okukala kwavo powingi, l'elako, l'usumba.

Cara a cara

17.01.2023 | por Marta Lança, Aida Gomes e Moisés Malumbu

Diário de um etnólogo guineense na Europa (dia 10)

Diário de um etnólogo guineense na Europa (dia 10) Tirando os tugas pretos e os tugas ciganos, todas as outras pessoas da etnia tuga geralmente concordam com isto: a Tugalândia é tudo menos racista. Até o chefe dos polícias tugas, o Manel Vagina da Silva, concorda com isso, ele diz que se há polícias racistas é só um poucochinho e nem sequer são extremistas. Convém que as pessoas não se deixem enganar pelos milhares de mensagens nas contas do facegram dos polícias ou pela forma como tratam os pretos, são só formas exageradas de carinho, é só BDSM… se calhar. E a outra senhora também, a Inês de Castro Maneiros, aquela que já resolveu os problemas coloniais na Tugalândia, garante, com atitude da dona da bola, que aqui não há problemas de colonialidade e “quem não concorda comigo não joga ou eu faço logo uma birra”. Provavelmente ela garantiria que não há racismo também na Almada Negreiros Colonial. Mas eu não entendo a raiva dela, se Almada até tem Negreiros no nome como é que não é colonial? Ou estarei a misturar coisas? Almada, Armada. Se calhar acham que a Almada não pode ser colonial, porque já há muito tempo que correram com os colonialistas árabes de lá, pois, como se vê, só o nome árabe ficou.

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15.01.2023 | por Marinho de Pina

Bienal de Luleå, autodeterminação dos povos originários dos países nórdicos europeus

Bienal de Luleå, autodeterminação dos povos originários dos países nórdicos europeus Há uma longa história de autodeterminação dos povos originários dos países nórdicos europeus que, muitas vezes, escapa aos olhos mesmo daqueles que concentram o seu pensamento crítico em países longínquos. Em vez de definir um tema abrangente para a Bienal, os curadores decidiram guiar o próprio trabalho num processo de escuta e de aprendizagem do contexto local – com o qual ambos não são familiarizados, vindos do sul do país –, formulando quatro princípios para desenvolver a bienal: Pensamento Além da Fronteira (Beyond Border Thinking); Descentralização (Decentering); Imaginação da Terra (Earthed Imagination); Custódia (Custodianship).

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12.01.2023 | por Laura Burocco

Do dever de memória ao direito de não ser um perpetrador - "Memórias em Tempo de Amnésia" de Álvaro de Vasconcelos

Do dever de memória ao direito de não ser um perpetrador - "Memórias em Tempo de Amnésia" de Álvaro de Vasconcelos O autor oferece-nos um testemunho e uma reflexão sobre o fascismo em Portugal e sobre o colonialismo português, pelo dever de memória, a mesma responsabilidade que Primo Levi assumiu ao escrever sobre o holocausto. Porém, ao contrário do autor judeu, que foi juntamente com os seus familiares vítima dos campos de concentração nazi, Álvaro de Vasconcelos não foi vítima do colonialismo; como confessa, foi seu beneficiário. Além disso, a sua condição de homem, nascido num meio privilegiado permitiu-lhe, mesmo durante o fascismo, o acesso a uma liberdade com a qual a maior parte dos portugueses - e sobretudo portuguesas - não podia sequer sonhar. No entanto, Álvaro de Vasconcelos não lamenta “paraísos perdidos” nem no Douro da sua infância, nem na Beira da sua adolescência, nem na Joanesburgo da sua juventude.

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10.01.2023 | por Ana Cristina Pereira (AKA Kitty Furtado)

“O Estado angolano é muito violento, comete atrocidades”, entrevista a Sara Kambinga

“O Estado angolano é muito violento, comete atrocidades”, entrevista a Sara Kambinga A sociedade angolana, diz a jornalista angolana, é profundamente patriarcal e as mulheres sofrem todos os dias. São forçadas a uma tripla jornada, são vítimas de violência obstétrica, sofrem assédio no local de trabalho e todas as tarefas de cuidado recaem sobre elas. Sem falar da violência e desproteção contra as trabalhadoras do comércio informal. "É das coisas mais difíceis de fazer, a luta dentro e fora de casa. É preciso ter um certo cuidado, afinal, somos todos consequência do mesmo sistema. Nós abraçamos uma luta, mas compreendemos a nossa realidade, temos de contextualizar o nosso discurso também. Se formos muito agressivas e radicais acabamos tendo resultados contrários. A pessoa tem de perceber que está a defender uma coisa que não faz sentido para a maioria, para poder convencer a outra pessoa de que há necessidade de mudar, que as visões já não são as mesmas, porque ninguém precisa de ser como antigamente."

Cara a cara

04.01.2023 | por Marta Lança

Le Frére

Le Frére Não o surpreende, habituou-se a tal rejeição nas primeiras horas parisienses. Cede. A carne mais barata do mercado deve ceder. Quando chegou à Cidade-Luz o homem flébil apagou-se. Agradeceu ao pseudo-frére, e sem ser ouvido encolheu-se ainda mais. Entrara naquele restaurante para se alimentar, saíra ainda mais esfomeado. Tu testemunhas toda a humilhação, que não pára por aqui, anotas, o homem flébil não consegue sair dali. Enquanto a porta e o seu estômago rodopiam, a gente mais ágil, mais competente, com mais firmeza, confiança e poder de decisão (e todas essas características que nos permitem vencer neste mundo do excel) continua a entrar. Estás no canto da sala e observas como a miséria do outro é apenas um formalismo incómodo, deve ser ignorado durante as conversas, no fundo é uma chatice, para os que entram, se sentam à mesa e se alimentam.

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04.01.2023 | por Francisco Mouta Rúbio

Louca verdade e outros (in)verosímeis desatinos, paradoxos e incongruências do quotidiano

Louca verdade e outros (in)verosímeis desatinos, paradoxos e incongruências do quotidiano O regime caboverdiano de partido único veio a contradizer, e de forma cristalina e notória, uma pretensa imagem impoluta e moderada que o mesmo vinha construindo e propalando junto das comunidades emigradas e dos seus imprescindíveis parceiros internacionais, dos quais depende, aliás e em grande medida, a mera sobrevivência física das populações das ilhas, assim logrando o mesmo regime a estranha e risível façanha, o por demais inaudito e ostensivo desígnio de se desnudar de falsos pudores e mentirosos alardes e ardores democráticos e, assim, de se desmascarar em si mesmo e a si próprio nas suas flagrantes e manifestas pulsões e perversões totalitárias, deste modo também se comprovando como um autêntico logro e uma verdadeira falácia a sua auto-representação e a sua auto-projecção na opinião pública nacional e internacional como sendo um regime respeitador dos direitos humanos universalmente reconhecidos.

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02.01.2023 | por José Luís Hopffer Almada