A falta de uma estratégia assertiva por parte das entidades que gerem o setor da cultura é gritante e assustadora. Quando se trata de selecionar artistas para representarem o país nas grandes mostras internacionais, temos que definir criteriosamente os parâmetros de seleção daqueles que queremos que nos representem. Representar uma nação é carregar nos ombros o peso da responsabilidade, dos sonhos e da resiliência de um povo. Não há maior carga simbólica para um artista do que estar num grande evento a representar milhares de pessoas com a sua música, pintura, dança, teatro, escultura, cinema, literatura...
Mukanda
02.03.2022 | por Ednilson Leandro Pina Fernandes
Em 2015, participei como espetadora-atuante no Europa em Casa, um projeto da companhia Rimini Protokoll, que acontecia em casa de pessoas que se voluntariavam para receber um conjunto de estranhos para aí fazer desenrolar uma mesa redonda/jogo em torno das ideias de fronteiras da Europa. A ideia meio didática instrutiva sobre os elos e geografia política do espaço europeu, e da nossa dimensão enquanto pessoas ou países nessa geografia. Houve um breve momento de tensão quando nos pediram que definíssemos onde deviam estar as fronteiras em torno da Europa ou da União Europeia. Não as internas mas as externas. Eu disse que não devia haver fronteiras e a atriz que dinamizava a atividade reagiu “Como não? Tem de haver!” Provavelmente este não seria o guião, e ela falou de um ponto de vista particular.
A peça “Conferência de Ausentes”, no TBA (24 a 26 de fevereiro), fez-me regressar àquele momento.
Palcos
01.03.2022 | por Josina Almeida
Isto demonstra o quanto a sociedade em que vivemos nos convida a ser apáticos. A não sentir. É exatamente por não sentir que nós permitimos atrocidades perto de nós. É por não sentir que passamos por um mendigo na rua e continuamos com o nosso caminho, como se essa pessoa não estivesse ali. É por não sentir que vemos acontecer alguma injustiça e ignoramos por não ser nada connosco. É por não sentir que vemos o nosso planeta ser destruído, mas não ligamos por não se passar no nosso país, mas num outro. Não é aqui, mas ali e por isso, não tem nada que ver comigo. Então, uma sociedade que sustenta a vida e isso de se sentir vivo é a possibilidade de ativar toda as minhas potências, sejam elas todas as minhas emoções, os meus sonhos, a minha imaginação e colocar tudo isto em serviço de algo maior, de modo a trazer saúde para todo um sistema vivo.
Cara a cara
25.02.2022 | por Arimilde Soares
Recusando a imagem comum que associa a Quinta do Mocho a um território de pessoas incivilizadas e “sem cultura”, os jovens querem contribuir para o bem-estar do bairro.
Afroscreen
24.02.2022 | por Otávio Raposo
No título, Paulo Tavares dá o tom de seu ensaio ao perguntar: “Lucio Costa era racista?” Em seguida, revê alguns de seus textos cruciais, demonstrando como a questão racial e o colonialismo embasam seu pensamento. Se em 1928, na entrevista que concedeu ao jornal O Paiz, Costa diz que “Tudo é função da raça. A raça sendo boa o governo é bom, será boa a arquitetura. Falem, discutam, gesticulem, o nosso problema básico é a imigração selecionada, o resto é secundário, virá por si”, em 1957, no Relatório do Plano Piloto de Brasília, ele afirma: “Trata-se de um ato deliberado de posse, de um gesto de sentido ainda desbravador, nos moldes da tradição colonial”.
Jogos Sem Fronteiras
23.02.2022 | por Roberto Conduru e Paulo Tavares
O crioulo como uma língua dinâmica foi acompanhando a evolução e desde sempre adotou vocabulários de outras línguas, fenómeno associado às nossas caraterísticas culturais: somos um povo “aberto” ao mundo e àquilo que ele tem para nos oferecer.
“Todas” as nossas manifestações culturais mais tradicionais são o culminar de uma mistura de povos que deram origem ao caboverdiano: a Tabanca, o Batuku, o Finaçon, o Funaná, a Morna, a Coladeira. A nossa forma vestir, a culinária, a pintura, a escultura, a tecelagem, a forma como os nossos escritores escrevem, a forma como nós pensamos e agimos. Cada uma destas manifestações culturais tem uma matriz influenciadora, toda a criação tem uma origem, uma influência. Esta influência está patente na cultura cabo-verdiana e é preciso protegê-la, cultivá-la e deixá-la fazer o seu caminho.
Jogos Sem Fronteiras
22.02.2022 | por Ednilson Leandro Pina Fernandes
As ruas da Quinta do Mocho são locais de intenso convívio. Nelas, as tias vendem maçaroca na brasa, pastéis de milho, torresmo, frango no churrasco, e, claro, bebidas para acompanhar. O sorriso dessas mulheres sinaliza a simpatia que é comum a todo bairro.
Afroscreen
21.02.2022 | por Otávio Raposo
A preservação do meio ambiente marca a exposição Jubileu Bodas de Ouro, de autoria do artista António Gonga, que se apresenta com uma abordagem na base da reciclagem de material usado e desprezado pela maioria dos cidadãos. A amostra enquadra-se nas celebrações dos cinquenta anos de independência dos países africanos, anteriormente colonizados, do Gana à Namíbia.
A ler
18.02.2022 | por Emerson Hossi
Da periferia ao centro de Lisboa, a música transita, e com ela reinventa-se uma cidade a partir de novos saberes, imaginários e pertencimentos promotores de uma cultura negra e africana. Em palco, PekaGboom e Bráulio Pitra saúdam os países africanos de língua oficial portuguesa, conclamando a todos a valorizarem a sua história.
Afroscreen
17.02.2022 | por Otávio Raposo
São artistas que pintam e mostram uma nova Angola, com técnicas e estéticas tão ousadas como os seus discursos e olhar para o cenário artístico. Nas artes visuais angolanas, a produção mais potente vem da periferia, longe do centro onde se encontram as galerias e salas de exposição.
Em outubro do ano passado fui desafiado a sair da minha zona de conforto — a música — para entrevistar os jovens da residência artística ResiliArt que produziram obras para a II Bienal Africana da Cultura da Paz. Aceite a proposta, tornou-se evidente que essa produção artística não está na elite de Luanda e que apenas uma parte destes artistas entra nos grandes centros durante as exposições e não tem acesso às condições de produção e mercado.
Vou lá visitar
16.02.2022 | por Analtino Santos
O empoderamento económico pressupõe que mulheres e homens participem, contribuam e beneficiem dos processos de crescimento, tenham acesso igual às fontes de renda e tenham igual controlo dos recursos produzidos.
Em Angola, as estatísticas nacionais de acesso ao emprego e a fontes de rendimento da população economicamente activa, assim como, as estratégias de desenvolvimento nacional na área do emprego, demonstram um cenário desigual, em que as mulheres têm maior dificuldade no acesso ao emprego formal.
Neste estudo são discutidos alguns dos fundamentos da disparidade salarial entre géneros, isto é, a relação entre as fontes de rendimento e o nível de remuneração por género, por zona geográfica de residência e por nível de escolaridade. São também discutidos o acesso a bens e recursos importantes para a sobrevivência e garantia de autonomia financeira, como sejam, o acesso à terra e a recursos animais.
Jogos Sem Fronteiras
16.02.2022 | por vários
O que é necessário, sugiro, é uma sociologia reparadora, empenhada em desfazer as insuficiências que se alojaram na nossa disciplina e trabalhar para um projecto de reparação e transformação para um mundo que funcione para todos nós, tendo ao mesmo tempo em mente a necessidade de abordar as questões que agora nos confrontam.
A ler
15.02.2022 | por Gurminder K. Bhambra
Pisar palcos internacionais não só era um sonho como uma oportunidade para evoluir enquanto atriz e profissional, até porque ela nunca conseguiu separar os dois mundos. Entre organizar eventos, escrever textos, briefings e sem esquecer as inúmeras viagens, mal teve tempo para os ensaios. Nas poucas vezes que acontecem têm de ser aos fins de semanas, à noite ou online. Vê-se muitas vezes entre um gole de café e uma fala. Dormir? Só depois de tudo estar na ponta da língua.
Cara a cara
14.02.2022 | por Denise Fernandes
Não há ninguém que não tenha feito pelo menos uma experiência de migração. A escala pode ser diferente, tu podes mudar de uma sala de aula para outra, isso é uma migração. Podes mudar de um bairro para outro e isso é uma migração. De uma cidade para outra, de país para país e depois de continente para continente. As emoções associadas são as mesmas, com matizações associadas a escalas absolutamente diferentes.
Jogos Sem Fronteiras
14.02.2022 | por Teatro Manga
Não existem infraestruturas culturais, tanto educativas como promocionais. Por mais que sejam organizados, os artistas plásticos guineenses, na Guiné, vivem num “anonimato” absurdo, onde só se salvará o ajudado. É de certeza uma caricaturada forma de ver a situação. A bem ver, não existe sequer um espaço cultural, onde os artistas poderiam exibir as suas criações. Num país sem nenhum Centro Cultural Nacional, nenhum museu e nenhuma galeria, é complicado estabelecer qualquer que seja diálogo entre o vazio e o público. Anedoticamente, vira um cemitério sem campa. Talvez uma curta história verídica para ilustrar o grau do sofrimento: Encontrei uma senhora que me reconheceu por me ter visto na televisão, dia antes. Depois duma longa conversa sobre o estado das artes na Guiné, disse-me: «Não é que somos todos iguais. O facto de não haver, não significa que somos todos iguais, mas precisamos para a nossa instrução. O silencio expõe a ignorância».
A ler
13.02.2022 | por Sumaila Jaló
Eu questionava muitas vezes isso, no nosso caso a crítica ao fascismo português era também pela defesa da liberdade de expressão, a liberdade de falar, de tomarmos ações políticas, e fazia-me confusão que a liberdade que estas pessoas falavam era a de comprar, de adquirir, e depois todos estes circuitos que aconteciam, até destes bolseiros que podiam ir ao ocidente comprar roupa ou aparelhagens ou walkmans, e depois faziam fortunas quando iam para o Bloco de Leste e vendiam estas coisas. Por outro lado, também vejo que a liberdade está nas mais pequenas coisas.
Palcos
12.02.2022 | por Josina Almeida e Marta Lança
A viagem começa pelo Fortim Del Rei, um dos lugares onde acedemos a uma das mais bonitas vistas do Mindelo, numa panorâmica para o Monte Cara e para a Avenida Marginal. Trata-se de um espaço onde restam apenas ruínas de um Forte construído em 1852, guarnecido e partilhado com sete peças de ferro, fundidos em Londres e que serviu de prisão.
Cidade
10.02.2022 | por Sidneia Newton
O espetáculo EMIGRANTES parte da obra gráfica de Shaun Tan, “The Arrival”, no original, para contar histórias de migração e pensar os processos de adaptação e integração das comunidades migrantes. Recorta uma viagem, várias narrativas de migração e uma ideia para a integração. Não é uma estória, nem história. É um detalhe na vida de tantos. Um passo, um gesto. Inadvertidamente repetidos. No não-lugar do teatro, são comunicados, numa língua que o dicionário não traduz, apenas dá a ver, desenhos de fugas sem mapas. O corpo humano é ampliado por sons que os gestos escondem e o Homem prolongado por sombras que a sua silhueta encobre. Ao público, é dado o papel em branco para traçar a poesia ressonante da sua viagem, papel sem linhas para desenhar a sua história ou para reutilizar e reciclar conforme entenda.
Palcos
09.02.2022 | por vários
Conhecida por misturar o político e o profano e denunciada pelas suas raízes vodu, a música rabòday é o som desafiador - e amplamente popular - de uma nova geração haitiana insatisfeita. As estrelas desta corrente tornam-se surpreendentemente influentes ao transformar as ansiedades do público em hinos para dançar.
Palcos
08.02.2022 | por Susana Ferreira
“O Sistema”, sob curadoria de Katherine Sirois, é a mais recente exposição de Cristiano Mangovo, um artista contemporâneo natural de Cabinda, Angola. De entrada livre, na galeria .insofar, a mostra de obras do artista no estilo de expressionismo figurativo, retrata questões sociopolíticas intrincadas através da liberdade das suas pinceladas e escolha de cores fortes. É assim que decide retratar e endereçar a problemática das hierarquias e o exercício de poder.
Sentados frente a frente conversámos sobre o seu passado, as inquietações que o movem a pintar e a reflexão sobre o que é “O Sistema”, as injustiças causadas pelo mesmo e como o podemos combater. A realidade, ou melhor, os resultados finais são merecedores de serem observados com todo o tempo e minúcia.
Cara a cara
07.02.2022 | por Alícia Gaspar