"Margens Atlânticas" Espaço Espelho d'Água e Cinemateca

“Margens Atlânticas” nasce em Lisboa, do encontro entre Francisco Vidal, artista angolano-cabo-verdiano que explora as identidades africanas e diaspóricas, e Ariel de Bigault, autora e realizadora francesa cujos filmes focam culturas africanas, afro-lusófonas, afro-brasileiras e afro-europeias.

Recriando personagens e situações, Francisco Vidal projecta narrativas para além do espaço e do tempo fílmicos, numa dinâmica de diálogos com outras figuras, memórias, imagens, emoções. Jogando com visuais, rostos e atitudes, contextos e temporalidades, desenham-se circulações transatlânticas. As obras sugerem interações entre expressões artísticas, desenham conexões entre personalidades e patrimónios.

Por diferentes que sejam os seus percursos, os dois criadores partilham diversos pontos de convergência. Para além da forte ligação à música enquanto “respiração, ritmo, vida e pulsação das obras”, a afirmação das culturas africanas e afro-descendentes assim como as diásporas à conquista de espaços, são igualmente temas muito presentes nas obras dos dois criadores.

Inserida no programa da Temporada Portugal-França 2022, “Margens Atlânticas” desdobra-se em duas programações paralelas. 

Produção: Francisco Vidal, Ariel de Bigault, Espaço Espelho d’Água

Montagem da exposição: ATELIER UTOPIAMACHINE

Francisco Vidal- Desenho

Nelo Duarte - Fotografia

Micael Costa - Cenografia

João Evangelista - Escultura

Brenda Segura – Fanzine

Apoio à produção dos videos: Arquipélago Filmes

Montagem dos videos: Ariel de Bigault, Vanessa Pimentel, Diogo Moutela, Eddy Gamboa

Francisco Vidal

Eu quis trabalhar o conceito de story-board feito depois do filme, em contraponto ao feito antes do filme. Fazendo um storyboard depois do filme eu vou perceber qual é a minha leitura dos filmes da Ariel.

No still de Afro Lisboa (1996), com a atriz e historiadora Isilda Hurst, a frase de Miguel Hurst “Ele é um leader africano”, refere-se ao Amílcar Cabral. Orlando Sérgio, General D. e José Eduardo Agualusa lhe respondem, lançando interrogações : será que os afrodescendentes, que residem em Portugal, têm noção das personagens da sua história e cultura?

Esta questão mantêm-se hoje, e a resposta não difere muito das respostas de 1996. Fazer uma leitura através da pintura em 2022 de filmes da viragem do século é para mim importante, pois faz-me entrar no estudo: O que é a imagem e o pensamento contemporâneo dos espaços onde se pratica a convivência de várias culturas e maneiras de perceber o mundo? Essas zonas de fronteira são muitas vezes físicas, mas muitas outras vezes são zonas no tempo e na capacidade da memória. Como foi a passagem de século e de milénio recente.

Seremos nós todos contemporâneos? Penso que é esta a pergunta, numa altura em que estamos de novo na véspera de um conflito mundial entre culturas do século XXI mas totalmente influênciadas pelas contribuições e destruições do século XX.

De que maneira podemos construir objectos que nos permitam ter a capacidade de realmente evoluir?

Nos filmes da Ariel é visível que ela criou pontes; os filmes registram o primeiro encontro entre pessoas que fazem a forma da nossa história contemporânea real e consciente. Esta ferramenta da realização é fortíssima e eu quero estudá-la, com desenho e pintura, como se a estivesse a sublinhar para evidenciar e para no futuro termos ainda mais ferramentas destas, construtivas. Pois são estas armas que acabam com as guerras e os conflitos.

Tenho estudado os filmes da Ariel, e trabalho com ela na forma de co-autoria nas instalações. Para também perceber a fronteira entre o filme e o desenho.

E como esta fronteira se torna uma ponte, uma ferramenta para acabar com os muros.


Ariel de Bigault 

O encontro com Francisco Vidal é um marco importantíssimo para mim. O olhar dele permitiu-me, obrigou-me a ter uma perspectiva sobre o conjunto dos meus filmes.

As obras dele como as minhas realizações nascem muitas vezes de encontros com situações, expressões artísticas, culturais e sociais, personalidades. Esta dinâmica de viagens, pesquisas, diálogos e também olhares admirativos e respeitosos é essencial. Nas obras do Francisco, como nos meus filmes, todos os personagens são heróis.

O projeto é construído a partir do nosso diálogo, com desdobramentos e variações que ainda estão por descobrir. O nosso desafio comum é a criação de post-memórias inéditas: arquivos de memórias porvir. A falta de arquivos afro-lusófonos e afroeuropeus impõe a urgência de registos contemporâneos de figuras, atitudes e ideias que nos juntem na construção do presente e do futuro.

A tenda africana que Francisco Vidal instala à beira do Tejo cria um espaço imaginário de memórias e diálogos.

Os monitores apresentam três séries de videos. Com trechos dos meus filmes, re-editados e também sequências inéditas. Na sala, uma Play List de cenas musicais de artistas afrobrasileiros, africanos, afro-europeus. Na tenda, duas séries: Das Margens… e AfroAtlântico, com sequências de filmes meus do século passado - anos 80 – e outros muito recentes do nosso século XXI. São dois roteiros paralelos. Das Margens… foca as dinâmicas criativas que as comunidades e artistas negros têm lançado das “margens”, onde eram ou são remetidos, para os “centros” das cidades, dos poderes e das culturas. AfroAtlântico desenha ligações entre atitudes e afirmações da consciência e orgulho negro, nas diversas margens do Atlântico.

O diálogo criativo entre nós, começado agora no Espelho d’Agua, vai prosseguir.

Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema 

Para além da exposição no Espaço Espelho D’Água, tem lugar na Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, um ciclo com quase todos os filmes de Ariel de Bigault, entre 19 e 24 de setembro.

24 de setembro, 18h

Esplanada da Cinemateca: Debate das Margens para o Foco

A presenca e a visibilidade ‐ no teatro, televisao e no cinema em Portugal ‐ dos atores, guionistas, encenadores e realizadores originarios das ex‐colonias portuguesas. Percursos e evolucões. Situacao actual. Questionamentos sobre olhares, personagens, dramaturgias, narrativas.

Com Ângelo Torres, actor com longo percurso no teatro (Os Negros, de Rogério de Carvalho, Titus Andrónicus, de Luís Miguel Cintra), na televisao (Pensão Estrela, realizacao de Jorge Queiroga, SIC, Sozinhos em Casa, realizacao de Femando d’ Ávila, RTP) e no cinema (Carga Infernal de Fernando Almeida Silva). É também contador de historias e realizador (Mionga ki Obô - Mar e Selva, 2005)

Miguel Sermão, actor residente do Teatro da Comuna, membro fundador do Teatro Griot. No cinema trabalhou com os realizadores Pedro Costa, Edgar Pera, Luis Galvao Teles, Jorge Silva Melo, Pedro Sena Nunes, Felipe Braganca, entre outros. É também contador de historias e formador.

Guilherme Mendonça trabalha para o teatro, o cinema e a televisao. Dramaturgo ‐ A Geração da Utopia, com o Teatro Griot, Amilcar Geração com Angelo Torres (2022) ‐ colaborou com A Barraca, o Teatro da Cornucopia e a Workhorse Productions, entre outros. É guionista (Sul, Causa Propria). É também professor e tem publicado poesia, teatro e ensaios.

Programa aqui. 

AfroLisboa, 1996AfroLisboa, 1996Fantasmas do Império, 2020Fantasmas do Império, 2020

por Francisco Vidal e Ariel de Bigault
Vou lá visitar | 22 Setembro 2022 | África, Ariel de Bigault, arte, cinemateca portuguesa, cultura, espaço espelho d'água, Francisco Vidal, margens atlânticas, museu do cinema, Portugal, pos-colonialismo, relações internacionais, sociedade