RENDA ACESSÍVEL

On Saturday, 26 July, an unorthodox protest unfolded on Lisbon’s Largo do Intendente. Marchers arrived bearing a coffin inscribed “AFFORDABLE RENT.” Dressed head‑to‑toe in black, with bouquets in their arms and skull masks on their faces, they set a funereal tone that felt equal parts carnival and wake. In their hands glimmered placards whose manifestos, written in Portuguese, formed an elegy for the right to housing:

menos casas acessíveis = mais caixões
fewer affordable homes = more coffins

em Lisboa só chega para alugar um caixão
in Lisbon you can only afford to rent a coffin

o preço da renda mata
the rent price kills

viver é caro, mas não por muito tempo
living is expensive—but not for long

investimentos para os ricos, morte para todos
investments for the rich, death for all

a renda é ao dia, a morte é para sempre
rent is by the day, death is forever

rendimento básico para os vivos
basic income for the living

o galo assado grita de tanto capitalismo
the roast rooster screams from so much capitalism

The action was staged by the Portuguese cell of The Party of the Dead—an art‑activist formation founded in 2017 by members of the St Petersburg collective {Rodina}. What began in Russia has metastasised across borders; when the Russian army’s full‑scale invasion of Ukraine began, many of the Party’s members fled the country yet carried their necropolitical theatre into new geographies.

In an era of ideological decomposition and accelerated neuro‑dopaminergic attractions, the dead return to reconstruct a political body. Lurching out of alleyways like Hollywood zombies, these living corpses bear the stigma of the ever‑excluded: foreigners who do not speak the imperial tongue, who move awkwardly through space, their fractured bodies refusing smooth choreography. Does the pop‑culture wave of zombie films not mirror Europe’s panic over migrant “flows”? The undead possess no home, yet they can temporarily occupy public squares.

Meanwhile Lisbon’s rents soar; investors smell growth and buy still more property, prolonging their own lives through costly pharmaceuticals and medical hardware, while the most vulnerable classes are priced out of shelter. At this vertiginous peak of capital accumulation, the dead assemble as a political bloc to expose the state‑corporate attachment to cadaverous mythologies. The grotesque carnival and black humour of the Party of the Dead extend the lineage of Russian actionist art and its bleak existential literature. Museums feed on the aura of direct political risk, but their vitrines entomb mummies—objects whose function is long lost. If every museum is a necropolis and any artwork dies the moment it enters that mausoleum, the Party of the Dead works pre‑emptively, choosing to die before ever crossing the threshold.

— Ricardo de Kores

 ** 

No sábado, 26 de julho, consumou‑se uma ação insólita no Largo do Intendente, em Lisboa. Os participantes trouxeram um caixão com a inscrição «RENDA ACESSÍVEL». Vestidos de negro integral, com flores nas mãos e máscaras de caveira a tapar o rosto, instauraram uma atmosfera fúnebre de cortejo e crítica. Nas tábuas que erguiam lia‑se:

menos casas acessíveis = mais caixões

em Lisboa só chega para alugar um caixão

o preço da renda mata

viver é caro, mas não por muito tempo

investimentos para os ricos, morte para todos

a renda é ao dia, a morte é para sempre

rendimento básico para os vivos

o galo assado grita de tanto capitalismo

A performance foi orquestrada pela célula portuguesa da Partida dos Mortos, coletivo artístico‑ativista criado em 2017 por membros do grupo pietrogradense {rodina}. Depois de irromper em várias cidades russas, o movimento espalhou‑se pelo exterior quando, com a invasão russa da Ucrânia, muitos dos seus integrantes se exilaram, levando consigo o seu teatro necropolítico.

Na era da decomposição ideológica e dos atrativos neuro‑dopaminérgicos acelerados, os mortos regressam para reconstruir o corpo político. Surgem dos becos como zombies de série B, trazendo consigo o pavor que desperta o grupo excluído: uma massa que não fala a língua da metrópole, suja, tensa, corpo quebrado fora de controlo. Não encarna esta vaga zombie, na cultura de massas, o medo perante o fluxo de migrantes? Os mortos‑vivos não têm casa, mas podem ocupar provisoriamente o espaço público.

Enquanto isso, o preço das casas em Lisboa continua a disparar; os investidores farejam crescimento, compram mais imóveis, alongam as suas próprias existências com fármacos e tecnologia médica dispendiosa, e os estratos mais vulneráveis deixam de poder pagar a renda. Neste instante de velocidade máxima do capital, os mortos unem‑se num bloco político para denunciar a afeição de Estados e corporações a mitologias cadavéricas. O carnaval grotesco e o humor negro da Partida dos Mortos prolongam a tradição do acionismo russo e da literatura existencial sombria. Os museus alimentam‑se da aura de risco político direto, mas nos seus expositores conservam‑se múmias — artefactos despojados de função. Se os museus são necrópoles e qualquer arte morre ao entrar nelas, a Partida dos Mortos joga em antecipação: decide morrer ainda antes de franquear o pórtico do mausoléu.

— Ricardo de Kores

29.07.2025 | por martalanca | crise, especulação, habitação, lisboa

Onde Vamos Morar?:

12 outubro a 18 outubro no Cinema Ideal

Andy Rector, a propósito da edição em DVD de As Operações SAAL, de João Dias, e sobre a privação do direito à habitação, programa o ciclo Onde Vamos Morar?:

Um ciclo de filmes sobre a traição ao direito à habitação. Não se trata de um evento sociológico, trata-se simplesmente de uma seleção de filmes – sete noites no cinema – sobre o problema da habitação, extraídos da história do cinema. São filmes feitos do lado dos oprimidos, dos enganados, dos despejados, dos acossados: pensionistas idosos, jovens desempregados, grevistas, mineiros, pedreiros, biscateiros, alcoólicos, veteranos de guerra a tentar refazer a vida, cozinheiros de cantinas, mães, irmãs, vagabundos, trabalhadores temporários, gente sem casa. Andy Rector

'As Operações SAAL' de João Dias'As Operações SAAL' de João Dias

Programa:

12 out
AS OPERAÇÕES SAAL de João Dias
2007, 127’ Portugal; com a presença do realizador

13 out
LES MAISONS DE LA MISÈRE Houses of Poverty de Henri Storck
1936, 29’ Bélgica; francês com legendas em inglês
MISÈRE AU BORINAGE Misery in Borinage de Henri Storck, Joris Ivens
1934, 34’, Bélgica; francês com legendas em inglês
KUHLE WAMPE ODER: WEM GEHÖRT DIE WELT? A Quem Pertence o Mundo? de Slatan Dudow, Bertolt Brecht
1932, 70’ Alemanha; alemão com legendas em inglês (restaurado em 2020)
duração da sessão: 133’

14 out
THE GOLDEN LOUIS 1909, 7’ EUA; THE USURER 1910, 17’ EUA; ONE IS BUSINESS, THE OTHER CRIME 1912, 15’ EUA – de D. W. Griffith *
filmes mudos, com legendas em inglês – sem acompanhamento musical
IL RITORNO DEL FIGLIO PRODIGO – UMILIATI: CHE NIENTE DI FATTO O TOCCATO DA LORO, DI USCITO DALLE MANI LORO, RISULTASSE ESENTE AL DIRITTO DI QUALCHE ESTRANEO (OPERAI, CONTADINI – SEGUITO E FINE)
O Retorno do Filho Pródigo – Humilhados: Que Nada Feito ou Tocado Por Eles, Nada Saído das Mãos Deles, Resultasse Livre do direito de Algum Estranho (Operários, Camponeses – Continuação e Final)
de Jean-Marie Straub, Danièle Huillet. 2003, 64’ Itália, França, Alemanha
Italiano com legendas em português – Restauro Digital
O NOSSO HOMEM de Pedro Costa
2010, 26’ Portugal (português e crioulo, legendas em português)
duração da sessão 123’

15 out
CHICAGO CALLING! de John Reinhardt *
1951, 75’ EUA – VO Inglês, não legendado
BUNKER HILL de Kent Mackenzie *
1956, 18’ EUA – VO Inglês, não legendado
THE FINAL INSULT de Charles Burnett *
1997, 55’ EUA – VO Inglês, não legendado
duração da sessão: 143’, com intervalo

16 out
MAN’S CASTLE A Vida é um Sonho de Frank Borzage
1933, 75’ EUA; VO inglês, não legendado (Cópia Digital 4K)
ANNUSHKA de Boris Barnet *
1959, 89’ URSS; russso com legendas em inglês
duração da sessão: 164’, com intervalo

17 out
MINGUS de Thomas Reichman *
1968, 58’ EUA; VO inglês não legendado
EL BRUTO O Bruto de Luis Buñuel
1953, 81’ México; espanhol com legendas em português
duração da sessão: 139’, com intervalo

18 out
JUVENTUDE EM MARCHA de Pedro Costa
2006, 155’ Portugal; português e crioulo com legendas em português

11.10.2023 | por martalanca | cinema Ideal, habitação, SAAL

Quem vai poder morar em Lisboa?

Da gentrificação e do turismo à subida no preço da habitação: causas, consequências e propostas.
Um grupo informal de Lisboetas juntou-se à volta de uma preocupação comum: a percepção de uma abrupta alteração das dinâmicas da cidade de Lisboa e sobretudo da grande subida do preço da habitação. Começaram por conversar casualmente sobre o que os preocupava. Essas conversas tornaram-se mais regulares. As inquietações comuns tornaram-se mote para a organização de um debate à volta do tema. Convidaram-se alguns especialistas para discutir connosco este tema a partir de um texto de trabalho redigido colectivamente e de algumas questões-chave. O texto realizado pelo grupo organizador que aqui publicamos é um texto de trabalho, aberto e em formulação. Para mais informações consulte a página do evento no facebook.
Debate: Manuel Graça Dias, José Manuel Henriques, Pedro Bingre do Amaral, João Seixas, Joana Gorjão Henriques I Trienal de Arquitectura Campo Santa Clara, 145,Segunda-feira, 6 de Junho, às 18h30.
Ler texto de apoio à discussão na revista PUNKTO.

06.06.2016 | por martalanca | cidade, gentrificação, habitação, lisboa, turismo

Casalata, MINDELO

O projecto CASALATA iniciou com uma curta-metragem realizada no âmbito da pós-graduação de cinema no  M_EIA - Instituto Internacional de Arte, Tecnologias e Cultura, em Mindelo – Cabo Verde.
Debruçada na problemática do défice habitacional e nas carências dos bairros espontâneos de lata, o projecto evoluiu para uma estratégia arquitectónica viável, com capacidade de acção imediata no panorama da escassez de habitação em Cabo Verde.

CASALATA

12.07.2012 | por franciscabagulho | habitação, Mindelo

1º Congressso Internacional da Habitação no Espaço Lusófono

29.06.2010 | por martalanca | congresso, habitação