O retorno do reprimido: desaparecimentos e reaparecimentos na sociedade do espectáculo

Marta Lança e Nuno Domingos nas Conversas com o público (1 de fevereiro, às 18h, foyer do TMJB)

Oscilando entre a espectacularidade mediática e a ocultação da história, a nossa época dispersa-se, em convulsões, nas exigências cruzadas da compulsiva curiosidade (ou bisbilhotice) e da complexada necessidade de esquecimento. Mergulhamos na vasa dos detalhes mais íntimos dos «casos» ou das «celebridades», fogos-fátuos que duram dias ou semanas, enquanto desviamos os olhos do que surge como desconforme ou incómodo, buscando um anestesiamento para os traumas do passado ou marginalizando as presenças pós-coloniais das nossas cidades. Nesta peça, em especial nas parte IV e V, esta tensão surge muito pronunciada entre o «caso Natascha Kampusch» e a amnésia dos horrores nacionais-socialistas. Para debater as relações entre o visível e o invisível nas nossas sociedades do espectáculo, em que parecer vale tanto ou mais do que ser, teremos connosco Marta Lança e Nuno Domingos.

Bruno Monteiro

Marta Lança (n. 1976) é programadora, tradutora e editora. Termina um doutoramento em Estudos Artísticos na FCSH-UNL onde tem formação em Estudos Portugueses e Literatura Comparada. Os temas de pesquisa passam pelo debate pós-colonial, programação cultural, processos de memorialização, plataformas de discurso e estudos africanos. Criou as publicações V-ludoDá FalaJogos Sem Fronteiras e, desde 2010, é editora do site BUALA. Escreve para publicações em Portugal, Angola e Brasil. Tem experiência em pesquisa e produção de cinema. Trabalhou por longas temporadas em projectos culturais nos PALOP.

Nuno Domingos, Investigador Auxiliar no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Tem trabalhado sobre a história do colonialismo português, nomeadamente em Moçambique durante o período do Estado Novo.  Entre outros temas, tem investigado a disseminação da cultura popular moderna em contexto urbano e as práticas culturais, do desporto à leitura, no contexto colonial e metropolitano. É co-editor da colecção História&Sociedade, nas Edições 70, e da editora Outro Modo.

30.01.2020 | por martalanca | debate, teatro

R-HUMOR de CATARINA SIMÃO

Curadoria de | Curated by Cristiana Tejo
Inauguração: Sábado, 25 de janeiro às 17h
Opening: Saturday, January 25 at 5 pm

26 Janeiro – 5 Abril na Galeria Avenida da Índia
January 26 - April 5 at Galeria Av. da Índia
'Parede espelho', R-Humor 2020, © Catarina Simão'Parede espelho', R-Humor 2020, © Catarina Simão
A exposição R-humor surge da constatação de que apesar da importância do corpo de trabalho desenvolvido por Catarina Simão ao longo de mais de dez anos de criterioso mergulho nos arquivos coloniais de Moçambique, ele ainda não havia sido mostrado de forma coesa numa mostra individual em Portugal. Acreditamos que é urgente aprofundarmos a discussão sobre o passado colonial português e suas ressonâncias na atualidade, além de dar visibilidade a artistas mulheres. Fazer uma mostra de Simão é desafiador, pois trata-se de uma artista investigadora cuja prática baseia-se no questionamento das noções de arquivo em projetos de processos contínuos e lentos, que estão sempre abertos à revisão e que implicam parcerias colaborativas e diferentes formas de apresentação ao público, com displays expositivos que agregam documentação, textos, vídeos, sons e desenhos, sendo os filmes e as videoinstalações a principal forma de expressão de suas pesquisas. Como apresentar para um público diverso uma arte que é investigação tão densa?

R-humor não é uma mostra retrospectiva, mas tece um apanhado de questões e documentos presentes em grande parte das obras da artista a partir de sua mais recente pesquisa sobre o Museu de Nampula (1956), situado no Norte de Moçambique, e seu inventário fotográfico da coleção de arte Makonde, localizado recentemente num museu alemão. O material, que seria o quinto volume dos estudos sobre os Makonde feito pelos antropólogos Margot Dias e Jorge Dias durante o período colonial e que foi preterido por apresentar uma nítida influência da arte dos brancos nas esculturas, é o núcleo central da exposição. Nestes registros, evidencia-se a estratégia transgressora dos artistas colonizados ao utilizarem a sátira, ironia e o humor para retratar os colonizadores (ícones portugueses e agentes do sistema colonial), num jogo disruptivo de posicionar-se criticamente de forma subtil. O nome da exposição conecta as palavras rumor e humor ao partir da constatação da artimanha do que pode ou não pode e como pode ser dito. Na concepção de Catarina Simão refere-se à “circulação de saber que pertence tanto ao domínio público como ao do segredo e se identifica com um tipo particular de violência. Assim, as perspectivas históricas construídas em torno do próprio imaginário que os documentos reproduzem, ao assumir uma consciência da normalização subjacente à construção de um conceito de tempo (histórico, cronológico, evolutivo) armado sobre a ideia de ‘progresso’”.

As obras que compõem a exposição são constituídas de materiais oriundos de arquivos públicos e privados com variados graus de confidencialidade, tais como extratos de informação televisiva propagandística (desde 1930 até 2019) provenientes de Moçambique, Portugal, Alemanha e Estados Unidos. A artista organiza estas informações como um grande índex que deve ser decodificado pelos visitantes.
 
 
 
 

Despite the importance of the body of work Catarina Simão has been developing over the past ten years, carefully diving into Mozambique’s colonial archives, it has not yet been cohesively shown in a solo exhibition in Portugal. In addition to giving more visibility to women artists, we believe that it is urgent to deepen discourse around the Portuguese colonial past and its resonances today. Creating an exhibition of Simão’s work is challenging: she is an artist-researcher whose practice questions the notion of the archive through ongoing and lengthy projects. Her process is always open to review and implies collaborative partnerships and different forms of public presentation. Her exhibition displays include documentation, texts, videos, sound, and drawings, with films and video installations as her main forms of expression. How do we present art with such dense research to diverse audiences?

R-humor is not a retrospective, but it weaves together an overview of the issues and documents present in most of the artist’s works from her most recent research on the Nampula Museum (1956) located in the North of Mozambique, and her photographic inventory of the Makonde art collection, recently located in a German museum. The material comes from the fifth volume of studies on the Makonde done by anthropologists Margot and Jorge Dias during the colonial period. Their research, which forms the central core of the exhibition, was neglected for presenting the clear influence of art by whites on Makonde sculpture. In these records, the transgressive strategy of these colonized artists is evidenced when they use satire, irony, and humor to portray their colonizers (Portuguese icons and agents of the colonial system) in a disruptive game of being critically positioned in a subtle way. The exhibition’s title connects the words rumor and humor when it comes to realizing the trick of what can and cannot be said, and how it can be said. According to Simão, it refers to “the circulation of knowledge that belongs to both the public and secret domains, and that identifies with a particular type of violence. Thus, the historical perspectives constructed around the very imagery that the documents reproduce assume an awareness of the normalization underlying the construction of a concept of time (historical, chronological, evolutionary) reinforced by the idea of ​​‘progress’.”

The works that comprise the exhibition consist of materials from public and private archives with varying degrees of confidentiality, such as extracts from propagandistic televisual information from Mozambique, Portugal, Germany, and the United States (from 1930 to 2019). The artist organizes this information in a large index that must be decoded by visitors.

Programa Público / Public Program 

8 fevereiro, 17h / February 8 at 5pm
Conversa com / Conversation with Leonel Matusse, Tania Adams e Catarina Simão
22 fevereiro, 17h / February, 22 at 5 pm
Conversa com / Conversation with Omar Thomaz, Raquel Ribeiro e Catarina Simão
1 março, 17h / March, 1 at 5 pm
Conversa com  / Conversation with Caio Simões de Araújo e Catarina Simão
7 março, 17h / March, 7 at 5 pmConversa com / Conversation with João Pedro George, Filipa Vicente e Catarina Simão

23.01.2020 | por martalanca | Catarina Simão

‘Raça’, Nação e Classe. Conversa com Mamadou Ba e José Neves

Terça-feira, 14 de Janeiro, às 18h30, na livraria Tigre de Papel | entrada livre
www.facebook.com/events/459286374973544/

É mais importante fazer a crítica do racismo ou fazer a crítica das desigualdades económicas? Mais do que uma resposta a esta pergunta, esta conversa procurará questionar a sua pertinência, abrindo campo a uma reflexão sobre como as esquerdas podem articular a luta de classes e o anti-racismo, bem como sobre a relação entre estas questões e o nacionalismo.

13.01.2020 | por martalanca | classe, Identidade, José Neves, Mamadou Ba, nação, raça

LUMINOSO AFOGADO encenação de Zia Soares a partir de Al Berto

LUMINOSO AFOGADO de Al Berto é a primeira abordagem da companhia a um texto e a um autor português.  A encenadora e actriz Zia Soares revisita Al Berto, com quem trabalhava na altura da sua morte na adaptação e encenação de um texto do autor, “Lunário” – o espectáculo viria a chamar-se “O Canto do Noitibó”. Zia Soares trabalhava na sua primeira encenação e Al Berto no seu último projecto artístico.

Dois anos após a estreia em Lisboa, no Teatro da Trindade, o espectáculo apresentou-se em território africano, integrado na programação do Festival Mindelact 2018, em Cabo-Verde. Esta deslocação implicou uma reconfiguração face a este território, revelando-se essencial um novo olhar que abarcasse uma outra língua, uma outra fala, o crioulo, ela própria uma reconfiguração de outras. É esta nova versão que agora se estreia em Lisboa.

LUMINOSO AFOGADO é uma espécie de linha da sombra, onde num confronto com o espelho, com a morte e com a passagem do tempo, alguém não se reconhece, está entre ser o que é e outro irrecuperável e ausente.

Espectros rompem a barreira entre vivos e mortos, refazem nexos com línguas reconfiguradas a partir de outras, cantadas, carpidas, silenciosas.

Um lugar onde o “silêncio é definitivo”, onde se oscila entre a memória e o esquecimento mais absoluto. Um mergulho onde se suspende a respiração noutro tempo, noutro lugar.

“E no meio deste silêncio uma ideia de voz, uma treva agarrada à memória.

Foi então que dei por mim a existir para lá da tua morte, como se asfixiasse. Mas o passado não é senão um sonho. Uma brincadeira com clepsidras avariadas e algum sangue.”

Al Berto 

Texto Al Berto

Adaptação e encenação Zia Soares

Actores Chullage, Gio Lourenço, Zia Soares

Elocução Chullage, Filipe Raposo

Composição musical Chullage 

Design de luz Eduardo Abdala

Espaço cénico Zia Soares

Movimento Maurrice

Figurinos Inês Morgado, Neusa Trovoada

Design de som soundslikenuno

Fotografia Abdel Queta Tavares, Grace Ribeiro, Pauliana Valente Pimentel

Design gráfico Neusa Trovoada 

Produção executiva Urshi Cardoso

Produção Teatro GRIOT M/16

Agradecimentos: Al Berto, Cristina Pidwell Tavares e família, Rogério Correia, Chalo Correia

Apoios: CML, Espaço Alkantara, Polo Cultural Gaivotas Boavista, PENHA SCO-Arte Cooperativa, CEC-FLUL, FCT, Khapaz, Graça 28, Rádio Afrolis, Lisboa Africana, Casa Mocambo, Cantinho do Aziz

Espaço Alkantara - Calçada Marquês de Abrantes, 99, 1200-718 Lisboa – Portugal

19 FEV – 01 MAR

qua a sáb 21H30 | dom 19H00

RESERVASreservasgriot@gmail.com | 933067810 (seg a sáb das 14h00 às 19h00)

Bilhetes 10€, normal 7,50€, c/desconto 5€, grupos +10 pax

13.01.2020 | por martalanca | Alberto, teatro griot, Zia Soares

Documentário 'Guiné-Bissau: Da Memória ao Futuro' disponível no YouTube

O documentário Guiné-Bissau: Da Memória ao Futuro, realizado por Diana Andringa, foi disponibilizado na plataforma YouTube (link abaixo). Exibido pela primeira vez, na RTP África, no passado dia 24 de setembro é agora possível também assistir ao filme com legendas integrais em Português ou Inglês, acionando para o efeito as devidas definições na plataforma.

Guiné-Bissau: Da Memória ao Futuro é testemunha das esperanças e dos bloqueios que foram construindo o país durante mais de quatro décadas.

Filmado integralmente na Guiné-Bissau, em setembro de 2018, quando se celebravam os 45 anos da independência, o documentário regista os testemunhos de um conjunto de académicos de várias nacionalidades, membros da sociedade civil guineense, artistas e combatentes da luta de libertação nacional que refletem e debatem as memórias e os legados desse passado.

Guiné-Bissau: Da Memória ao Futuro percorre uma ampla viagem reflexiva sobre a imaginação e a construção da Guiné independente, mostrando-nos, também, como a memória pode servir de instrumento à geração do presente para a construção do futuro.

Realizado por Diana Andringa, com guião da realizadora e de Miguel Cardina, o filme foi produzido pela Garden Films e pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, através do projeto CROME - Memórias Cruzadas, Políticas do Silêncio. As Guerras Coloniais e de Libertação em Tempos Pós-coloniais, e contou com apoio financeiro do ICA / Ministério da Cultura de Portugal. 

 

 

13.01.2020 | por martalanca | Amílcar Cabral, Guiné-Bissau, luta de libertação

ZOMBI CHILD de Bertrand Bonello em exibição no Espaço Nimas

com Louise Labeque, Wislanda Louimat, Katiana Milfort

 

França, 2019, 1h43 min

«Aquele imaginário haitiano evoca a escravatura, que é para mim o tema central do filme, mas eu não quis ficar pela evocação, pois há também entre França e o Haiti uma relação histórica de colonizadores e de colonizados»

Bertrand Bonello, em entrevista ao Expresso

Sinopse

Haiti, 1962. Um homem regressa dos mortos para trabalhar no mundo impiedoso das plantações de cana de açúcar. Cinquenta e cinco anos depois, uma jovem rapariga de ascendência haitiana confidencia aos seus colegas um segredo de família, inconsciente das graves consequências deste acto. Uma história de terror contemporânea, baseada na realidade muito concreta do colonialismo francês no Haiti, a sua narrativa despoleta uma reflexão sobre racismo, imperialismo e memória cultural.

«Um filme fascinante, um teen movie com uma espiritualidade invulgar, uma rêverie fantástica que se grava forte na memória. E mais se diz: de toda a produção francesa do ano passado, não houve outro igual» Francisco Ferreira, Expresso

«O verdadeiro zombie não anda a comer pessoas pelas esquinas: no Haiti, é um ser enfeitiçado que vive num limbo entre a vida e a morte. Ponto de partida para a nova longa do francês Bertrand Bonello, A Criança Zombie, um falso filme de género que fala na verdade dos tempos que correm.» Jorge Mourinha, Público

Bertrand Bonello

Bertrand Bonello (Nice, 1968) vive entre Paris e Montréal. O seu primeiro filme, Quelque Chose d’Organic (1998), foi apresentado no Festival de Cinema de Berlim, e o segundo, Le Pornographe (2001) protagonizado por Jean-Pierre Léaud, foi seleccionado para a Semana da

Crítica no Festival de Cannes e recebeu um prémio FIPRESCI. Bonello revelou o seu singular universo em Tiresia (2003), presente na competição oficial do Festival de Cannes. Em 2005, regressa a Cannes com uma curta-metragem, Cindy: The Doll is Mine. De La Guerre (2008), filme cuja banda-sonora é também da sua autoria, foi selecionado para a Quinzena dos Realizadores e para o Festival de Locarno. Bonello esteve no LEFFEST em 2011 com L’Apollonide

- Souvenirs de la Maison Close, em 2012 com Ingrid Caven, Musique et Voix, em 2014 com Saint Laurent, que abriu o festival, e em 2016 com Nocturama, que integrou a competição oficial do festival.

06.01.2020 | por martalanca | haiti, ZOMBI CHILD