O meu intenso empenho na crescente consciência feminista levou‑me a confrontar a realidade das diferenças de raça, de classe social e de género. Tal como me tinha revoltado contra as ideias sexistas acerca do lugar de uma mulher, também contestava o lugar e a identidade das mulheres no seio dos círculos de emancipação feminina; não conseguia encontrar lugar para mim no movimento. A minha experiência enquanto jovem e negra não era reconhecida.
Mukanda
17.09.2018 | por bell hooks
trata-se na verdade de uma peregrinação ao longo do rio Sado em demanda dos rastos de descendentes de escravos negros trazidos para esta zona, para o cultivo do arroz, no século XVIII, que se entrelaça com a vida de outros negros na Europa e da sua própria vida de mestiço, herdeiro de tantas cicatrizes, diásporas e cruzamentos, flagrados em histórias ocultas e silenciadas, em fragmentos dispersos, indícios, fantasmas.
A ler
15.09.2018 | por Margarida Calafate Ribeiro
Esse continuum escravocrata não tolera as brechas criadas e conquistadas – provocando uma tragédia com o Brasil, jogando-o numa espiral recessiva e numa sobreposição de crises (política, econômica, social, existencial). A fome – seu fim como símbolo maior das conquistas do período Lula – volta a rondar muita gente.A austeridade, criminosa em qualquer canto do planeta, ganha outras camadas de perversidade por essas bandas.
Mukanda
13.09.2018 | por Jean Tible
Alguns mamíferos sabem que vão morrer. Estes três sabem que podem morrer hoje.
— O sol tem cores que nunca ninguém viu — diz Ira.
Atrás dele, Ossi abre os olhos. À frente, Aurora, também. De tão colados, a voz vibra nos três.
— Que cores? — pergunta Ossi.
— Cores sem nome, não as conseguimos ver — diz Ira. — Ouvi isto uma vez, lá na cidade.
— Há cores que não conseguimos ver?! — Aurora faz uma pala com a mão.
O sol dá-lhes em cheio. Três corações, seis pulmões, biliões de nervos numa cama de rede, tórax com tórax, boca com nuca, côncavos, recôncavos, convexos. Jovens como a jovem flor do cacto de Alendabar, a praia onde acordam.
Mukanda
12.09.2018 | por Alexandra Lucas Coelho
Hoje, no mundo, os arquivos de Direitos Humanos cumprem um papel fulcral nas sociedades em que se inserem: para além de colaborarem com a Justiça, estes arquivos conservam a memória e permitem que as gerações seguintes revisitem a sua história, a fim de compreender os seus medos e, de assim se colocarem na situação de iniciar um processo de reparação. Pode afirmar-se que estes arquivos, para muitos cidadãos são uma fonte essencial para recordar momentos, que embora não os tenham vivido, os fazem sofrer.
A ler
11.09.2018 | por Ana Tironi
Os filmes com temática afro ainda são um tabu em função da ignorância e insensibilidade de grande parte dos curadores de festivais do Brasil (e, que infelizmente, apesar da crescente busca por visibilidade preta em todas as mídias, ainda permanece). Durante boa parte da trajetória do CAN, ele se consolidou como um espaço aberto para exibição e lançamento dessas obras.
Afroscreen
10.09.2018 | por Clementino Junior
A reconhecida mobilização militante dos comunistas, uma solidariedade internacional dos artistas e na gestão da Festa configuram-na como uma organização profissional e internacional, atributos pouco comuns na programação artística quando esta começou há quatro décadas. A integração de géneros musicais e de reportórios extra-europeus (que hoje erradamente se designa como músicas do mundo) e que muito deve a Ruben de Carvalho, membro do Comité Central do PCP mas que para aqui importa mais como um dos programadores culturais pioneiros em Portugal, enformaram uma programação musical e artística em leque passível de atrair públicos muito diversos.
Vou lá visitar
09.09.2018 | por António Pinto Ribeiro
Estas fotografias permitem visualizar um período da história que moldou, profunda e permanentemente, a nossa contemporaneidade, e que sentimos grande relutância em abordar. Embora representem uma época na qual a fotografia era exclusiva de uma classe dominante, dádiva a que poucos acediam, no processo criativo de Jasse estes retratos são um importante legado. Para além da sua estética apelativa, permite-nos reunir os estilhaços da história hostil de um país, onde os sucessivos episódios traumáticos causaram um apagamento irreversível da memória.
Vou lá visitar
06.09.2018 | por Kiluanji Kia Henda
O que se guarda no espaço íntimo e privado são imagens efetivas ou simbólicas de vivências pessoais, de experiências agradáveis ou dolorosas. A sua evocação remete sempre para a relação discursiva e vivencial, afetiva e familiar entre gerações, guardada e alimentada na esfera doméstica onde os gestos, os afetos, os símbolos, são até mais importantes do que a ordem e o fundamento do discurso.
A ler
01.09.2018 | por Roberto Vecchi
Reconto muito particular da Guerra de Palmares (...) Estes homens e mulheres tomaram os seus próprios destinos nas suas próprias mãos e, contra uma força quase impossível de derrotar, foram capazes de recriar uma vida digna e até feliz, durante algum tempo.
A ler
25.08.2018 | por Pedro Moura
De pai português e de mãe angolana, este oficial de infantaria distinguiu-se em Angola, no século XVII, como comandante militar do exército português, em quatro importantes confrontos armados contra os soberanos angolanos durante a história colonial: a batalha de Ambuíla (1665), a batalha de Mpungu-a-Ndongo (1671), a campanha do Libolo (1679) e a campanha da Matamba (1681). Pretendemos analisar as representações assumidas por este herói colonial, que deu nome a um largo de Luanda e a quem José Mena Abrantes chamou “O Mulato dos Prodígios”, quer no imaginário historiográfico colonial português, quer no discurso nativista e nacionalista angolano.
A ler
17.08.2018 | por Alberto Oliveira Pinto
Temos em comum fazermos parte de contextos que asfixiam as nossas liberdades de ser e sentir; sermos violentadas supostamente por causa da roupa que vestimos e ainda termos de ouvir “puta, assanhada, vagabunda”.
Corpo
10.08.2018 | por Leopoldina Fekayamãle
Segundo um relatório publicado pelo Alto Comissariado para as Migrações, cerca de metade dos 1520 refugiados que chegaram a Portugal entre 2015 e 2017 abandonaram o país. “A saída de tantos refugiados do país é um dos maiores indicadores de que os refugiados são mal recebidos e de que há discriminação”.
Jogos Sem Fronteiras
06.08.2018 | por Marta Vidal
Para muitos jovens, hoje, em Cabo Verde, na Guiné-Bissau, em Portugal, em França, no Brasil, nos Estados Unidos da América, Cabral surge como uma possibilidade de crítica a várias formas de poder, de afirmação identitária e de resistência, confirmando, assim, que a originalidade do seu pensamento e da sua ação residia em articular e contrariar várias dimensões da dominação e da violência, desde o neocolonialismo à discriminação com base no género.
A ler
04.08.2018 | por Sílvia Roque
O relato das viagens de Amílcar Cabral, incontornável líder da luta anticolonial, é aqui, quase, biografia, na exata medida em que conta as experiências do autor num registo novo, que não conhecíamos. Com efeito, este livro compila uma inestimável antologia de alteridade e de construção, na linha da premissa da libertação como ato de cultura e de desafio humanista, preconizados por Cabral, de “aprender, aprender sempre; pensar com as nossas próprias cabeças”.
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03.08.2018 | por António Guterres
Estamos em 2018 e não deixa de ser desconcertante que esta obra só apareça agora. Haverá para tal muitas justificações mas a incapacidade de lidar com a história colonial - que deveria desde há muito ter sido investigada pelo seu avesso - constituiu um obstáculo epistemológico na academia e nos meios artísticos e culturais embalados “para entrar para a Europa”, o que teve como consequência esquecer a África colonizada, o mais recalcado dos temas colectivos de Portugal.
Palcos
25.07.2018 | por António Pinto Ribeiro
Embora hoje impere a ideia de que a imagem que se vende de Portugal e, por arrasto, do Portugal rural, é politicamente neutra, é curioso notar as semelhanças desse Portugal com o país promovido pelo Estado Novo. Mas, mesmo que atribuamos a essa retórica uma neutralidade ideológica, continua a ser possível uma leitura política dessa representação apolítica e da forma como nela são tratadas as tradições e as “gentes”, que, tal como os lugares que habitam, supostamente ainda não foram corrompidas pela civilização. (...) Portugal saltou do "orgulhosamente sós" para "o segredo mais bem guardado da Europa", até chegar ao boom turístico. Mas o campo foi sempre uma paisagem ideológica.
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20.07.2018 | por Bruno Vieira Amaral
Uma das mais importante descobertas a que o projeto do museu das “Descobertas” poderia conduzir seria, assim, a perceção de que os usos da linguagem não são inocentes e de que a gramática da memória tem sempre muito mais a ver com o presente do que com o passado – a perceção, em suma, de que, em toda esta controvérsia, o que está em questão não e simplesmente o que fomos, mas sim o que somos e, sobretudo, o que queremos ser.
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14.07.2018 | por António Sousa Ribeiro
Quarenta e quatro anos depois do final da Guerra, o 10 de Junho, para os antigos combatentes que o comemoram em Belém, é, acima de tudo, o dia em que se reencontram aqueles que um dia combateram juntos em África para homenagearem os seus companheiros que por lá morreram. Em 2018 este encontro repetiu-se pela 25ª vez. Repetiu-se a cerimónia inter-religiosa. Proferiram-se discursos. Leu-se a mensagem enviada pelo Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa que se encontrava nos Açores a comemorar o outro 10 de junho. Adriano Moreira não discursou, mas encontrava-se entre os convidados de honra que, todos os anos, prestam esta homenagem aos combatentes.
A ler
13.07.2018 | por Fátima da Cruz Rodrigues
Aprender da História significa sabermos quando um acto não pode ser repetido e, se for, quando devemos torcer o nariz; não significa ter sensibilidade para as circunstâncias temporais e culturais que justificam certos actos. Significa, isso sim, ter uma ideia bem clara das razões que devem levar todo o indivíduo sensato a condenar uma acção ainda que ela, aos olhos de quem a praticou, ou do tempo em que ela foi praticada, faça todo o sentido. Aprender da História significa reforçar o compromisso com o que sabemos hoje distanciando-nos do que aconteceu ontem.
Mukanda
10.07.2018 | por Elísio Macamo