O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. UNIPOP, Próximo Futuro I Gulbenkian I LISBOA

Maria-Benedita BastoMaria-Benedita BastoEsta comunicação estrutura-se em dois eixos que se cruzarão a dado momento da intervenção. No primeiro trata-se de apresentar uma reflexão sobre o cânone estético moçambicano elaborada durante a luta de libertação moçambicana e publicada em dois jornais de circulação internacionalista, Mozambique Revolution (1969) e Lotus/Afro-Asian Writings (1971), intitulada “The Role of Poetry in the Mozambican Revolution”. O segundo eixo procura analisar as dinâmicas das escritas dos guerrilheiros da Frelimo nos jornais que publicavam nas bases e campos de treino. Em ambos os casos, trata-se de material de arquivo, em parte inédito e/ou muito pouco estudado.

Por circulação internacionalista entendo (numa aparente tautologia) as circulações que visam criar laços desfazendo ao mesmo tempo identidades fixas nacionalistas. É como classificaria então o caso da circulação de ideias e pessoas nos anos 60/70, i.e., nos anos que correspondem ao início da formação dos movimentos anti-coloniais das colónias portuguesas e ao período das lutas de libertação. Iniciadas quando uma grande parte do continente africano já estava independente, estas lutas acabam por se inserir numa ordem mundial diferente sobretudo graças ao impacto que Cuba ( e a América latina) vai ter no conjunto dos modelos e representações da revolução e dos militantes revolucionários. Uma das suas contribuições é, sem dúvida, a sobreposição entre vanguarda estética e vanguarda revolucionária que se traduz, numa estetização acrescida da militância e assim, novas achegas para os temas centrais da arte desde a revolução de Outubro: os pares colectivo/indivíduo, forma/fundo, arte/real, nacional/internacional.

Numa primeira parte, “The Role of Poetry in the Mozambican Revolution”, estabelece uma periodização da literatura moçambicana partindo, sem citar, de Frantz Fanon (um autor incómodo dado o desencontro político ocorrido); na segunda parte apresenta o novo cânone, recorrendo de um modo bastante inesperado à noção situacionista/letrista de “détournement”. Não é assim o território “nacional” mas a circulação internacionalista das representações da luta que enfocam também esta proposição de cânone estético.

Quanto às escritas dos guerrilheiros, irá interessar-me sobretudo pôr aqui em perspectiva a antologia organizada pelas instâncias centrais da Frelimo, em 1971, e os poemas publicados pelos guerrilheiros nos seus jornais locais, poemas que serviram precisamente de material para essa publicação. O que aqui estará em jogo são então as possíveis maneiras de escrever o colectivo e por aqui se vem cruzar o primeiro eixo. Subjacente à antologia está a ideia de uma oposição colectivo/indivíduo que esta obra deveria resolver optando pelo primeiro termo. Nas experimentações estéticas dos jornais, as escritas fazem funcionar uma equivalência entre os dois termos da qual resulta uma outra dinâmica: uma prática revolucionária imprópria que ao mesmo tempo desorganiza e concretiza a militância anti-colonial, na postulação de uma utopia feliz de descolonização do saber. 

Maria-Benedita Basto, Paris Sorbonne/CRIMIC-IMAF

 

A segunda sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas tem lugar no próximo Sábado, dia 1 de Março, às 15h, no Aud.3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. A entrada será livre, mediante inscrição prévia. Consultem a programação.

25.02.2014 | por martalanca | Anticolonialismo, imagem, unipop