
Está hoje em curso um intenso debate sobre as consequências das  transformações tecnológicas para a gestão arquivística e para a  preservação da memória. A transição para um paradigma digital supõe, no  entanto, uma destabilização epistemológica mais profunda,  com repercussões que vão além do eventual impacto ao nível da política  arquivística. Uma transição que implica a nossa própria relação com os  arquivos (pessoais e institucionais) e a sua partilha. É assim a própria  noção de Arquivo, nas suas diversas aceções,  comuns e especializadas, que é interpelada e de certo modo  reconfigurada, quando a realidade do arquivo é literalmente posta em  movimento pelo seu devir digital. Seja na sua aceção de coleção de  traços do passado, de “conteúdo” de arquivo (documentos e registos  propriamente ditos), de estrutura ou ordenação do material de arquivo, a  digitalização veio perturbar totalmente a ordem arquivística da qual  decorrem as significações desta noção. O que é, então, o arquivo, hoje?
Durante os próximos anos, o ciclo O que é o Arquivo? irá  organizar uma série de Laboratórios, encontros de trabalho e de  discussão, onde, de cada vez, esta pergunta será colocada a partir de  práticas e saberes visuais particulares, e de campos de  trabalho e investigação específicos. Neste Laboratório I: Arte/Arquivo  propomos explorar e mapear as relações entre o Arquivo e a Arte na  produção artística contemporânea portuguesa.
Ao longo de três dias, diversos intervenientes na cena artística irão  apresentar diferentes abordagens ao tema e partir de zonas e matérias  distintas, colocando em questão o cruzamento entre a arte e o arquivo:  não só porque, através de um uso específico  de materiais arquivados, interrogam a lógica pela qual os documentos  são vistos nos arquivos tradicionais e institucionais; mas também porque  permitem revelar e auscultar as transformações por que passa o arquivo  quando é objeto das operações da arte.
As três mesas de trabalho que constituem este encontro entre os  artistas e curadores, arquivistas, historiadores ou investigadores,  serão orientadas em cada dia do seu programa por uma pergunta diferente,  colocada a cada vez ao Arquivo.
Programa
 23 de março, 5ª feira
MESA DE TRABALHO 1 | 15h/18h
O que é o Arquivo? Abordagem epistemológica e ontológica
Com as transformações trazidas pelos novos media sociais  deixou de ser claro onde começa e acaba o arquivo ou o que está dentro e  fora dele. O poder do arquivo passou a ser exercido por todos, sendo  que ninguém o possui em particular. Esta “febre  do arquivo” (Derrida, 1995) abre a necessidade de (re)pensar o que é o  arquivo na sua relação com a determinação da produção do que e visível e  dizível, ou seja, em termos foucauldianos, das condições de saber de um  dado momento, o nosso. Trata-se de uma problematização  de natureza política, que põe em questão o que deve ser visível e o que  é esquecido, e que, no campo artístico, interroga o próprio arquivo e  sistema da arte.
Com apresentação de trabalhos por José Luís Neto e Pedro Lagoa. Seguida de discussão com Ana Bigotte Vieira, António Guerreiro, João Oliveira Duarte, Maria Filomena  Molder.
24 março, 6ª feira
MESA DE TRABALHO 2 | 15h/18h
O que pode o Arquivo? Apropriação e reconfiguração de arquivos
O fascínio pelo arquivo manifesta-se quer na exigência de tomar parte  na prática arquivística, através da fundação de toda a espécie de  arquivos e de novos tipos de arquivos, quer na demanda de aceder ao que  (já) está guardado no arquivo. Neste contexto,  as operações que conduzem ao arquivo podem situar-se entre criação e  destruição, crítica e fetichismo, reflexão histórica e desvio artístico.  O arquivo é encarado, mais do que como repositório do passado, como  meio de intervir estética e politicamente no presente.
Com apresentação de trabalhos por Daniel Barroca e Filipa César. Seguida de discussão com José Manuel Costa, Nuno Faria, Patrícia Leal. 
25 março, sábado
MESA REDONDA | 10h/13h
Sintomatologia: o Arquivo na sua relação com as Artes
Estado da Arte das relações entre Arte e Arquivo com apresentações de Ana  Janeiro, Anabela Bravo, Antonia Gaeta, Catarina Simão, Célia Ferreira,  Elisa Noronha, Filipa Guimarães, Isabel Costa, Magna Ferreira, Maria  Ganem, Miguel Bonneville, Rui Dias  Monteiro, Rui Mourão, Sandra Camacho e Stefanie Baumann.
MESA DE TRABALHO 3 | 15h/18h
Quando há Arquivo? A tensão institucional na constituição do arquivo
Como se coloca, ao nível das instituições arquivísticas, a  decisão/definição do que pode e deve ser arquivado? E como se relaciona  este poder com os gestos não institucionalizados de preservação de  objetos, obras, imagens, coleções, movidos pelo desejo,  as obsessões e idiossincrasias singulares, individuais e privadas? Como  se joga o trabalho do artista na transição entre os dois - do arquivo  privado ao arquivo institucional? E como se posiciona, nessa transição, o  museu, enquanto lugar de reflexão sobre  o arsenal de artefactos artísticos, imagens e taxonomias que governam  as suas relações?
Com apresentação de trabalhos por André Amálio e André Guedes. Seguida de discussão com Ana Gandum, Delfim Sardo, Liliana Coutinho.
ENTRADA LIVRE
Para mais informações:
http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt  | https://www.facebook.com/oqueeoarquivo/