Nasceu a Daruê, nova editora em Portugal, e estreia com dois títulos

Estreou esta semana, em Portugal, uma nova editora, a Daruê editorial, novo selo da editora Urutau, que nasce com foco em publicação de pensamento crítico no território Português. Capitaneada pelo experiente editor Wladimir Vaz e pela pesquisadora, curadora e escritora Manuella Bezerra de Melo, a jovem Daruê (cujo nome foi eleito por significar “luta” em língua iorubá) inicia sua jornada em Portugal com pelo menos três linhas editoriais dentro do projeto geral proposto; 1) pensamento crítico brasileiro contemporâneo; 2) traduções em português para obras clássicas ou contemporânea do pensamento crítico 3) e projetos especiais em literatura.

E para começar, anunciaram já dois títulos para o catálogo. O primeiro é o Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico, grande sucesso editorial no Brasil, de autoria do conhecido filósofo Vladimir Safatle junto ao popular psicanalista  Christian Dunker e ao pesquisador Nelson da Silva Júnior. Publicado no Brasil pela editora Autêntica, com cerca de 50 mil cópias vendidas, o livro chega em maio a Portugal pelas mãos da Daruê com o objetivo de fomentar o debate para como o modo de produção neoliberal construiu uma nova forma de sofrimento que se entranhou em nossas vidas ao modo de uma moralidade indiscutível. A obra funciona como antídoto e resposta aos manuais de gerenciamento e motivação, às narrativas de sucesso e coaching, bem como aos discursos que produzem sujeitos estruturados como uma empresa, e verifica as consequências de um conjunto de práticas da contemporaneidade, entre elas a individualização da culpa, o repúdio ao fracasso depressivo, o louvor maníaco do mérito, entre tantas outras que partem do estabelecimento deste sistema de mal-estar próprio do projeto neo-liberal.

O segundo título anunciado pela editora é Alexandra Kollontai e o sexo: contribuições urgentes para o feminismo hoje. Após um hiato de 42 anos, sem publicações em Portugal desde 1981, a autora dos textos aqui selecionados foi a mais destacada revolucionária russa da sua geração, tendo sido a primeira mulher para os Comitês Executivos do Soviets de todo país. Esteve na linha de frente das lutas operárias e camponesas contra o patriarcado amalgamado na sociedade Russa. Sua obra é extensa, e trata dentre outras coisas, do feminismo por uma ótica da mulher trabalhadora, e a partir de temas que vão de amor à revolução, incluindo a relação dialéctica deste estado de coisas; urgente, necessária e atual para pensar o feminismo nos tempos de hoje. O título entra na linha de traduções em português ao pensamento crítico, e quem organiza e assina a obra é a tradutora brasileira Maitê Peixoto, Mestre em História Política e Doutora em História Social pela PUCRS com estágio doutoral na Université paris 1 – Panthéon Sorbonne. A pré-venda dos dois títulos inicia ainda este semestre, com disponibilidade também nas livrarias independentes do País.

 

 

20.02.2023 | par mariadias | editora daruê, editora urutau, manuella bezerra de melo

Já está disponível segundo volume da VOLTA para tua terra

Após edição de sucesso em poesia (2021), 34 autores estrangeiros apresentam seus textos em prosa

Pré-venda.

 

Já está disponível em pré-venda o segundo volume da ‘VOLTA PARA TUA TERRA’O livro, que desta vez contém textos em prosa, une-se ao primeiro volume de poesia publicado em 2021, compondo a coleção publicada pela Editora Urutau, de naturalidade brasileira com sede em Portugal e Galiza. A coleção se propõe a selecionar textos de escritores estrangeiros que residem em Portugal com a temática antifascista, antiracista, antixenofobia e anticolonial a partir de uma open call, e desta vez foram escolhidos 34 contos, crônicas, ensaios e relatos de autoria de escritores de oito países, entre eles Brasil, Italia, Angola, Colombia, Guiné Bissau, Argentina e Espanha.

Este livro inaugura uma nova fase, já que aquilo que pretendia-se apenas um livro cresceu para tornar-se uma coleção, ou um circuito. O editor Wladimir Vaz explica que não era um plano um segundo volume, mas o livro em prosa tornou-se um processo orgânico. “Não pensávamos em uma coleção de antologias, mas após a publicação do primeiro volume de poesia sentimos como ela serviu para estimular as vozes dissonantes que produzem literatura em Portugal, como um abrigo. Temos uma temática urgente e um perfil urgente de escritores que necessitam ter sua voz amplificada neste País”, contou Wladimir Vaz, editor e curador.

A curadora e organizadora Manuella Bezerra de Melo concorda quanto à urgência dos temas propostos. “Os imigrantes são uma grande parcela deste País, entretanto só pensa-se em imigrantes para funções específicas, nunca como produtores de conhecimento, de cultura. A VOLTA nos fez notar o quanto estas temáticas precisam de investimento dentro do campo literário, é um investimento necessário no campo simbólico, e o momento político só nos mostra cada vez mais essencial”, explicou Manuella Bezerra de Melo, organizadora e curadora da coleção juntamente a Wladimir Vaz.

Nas duas open calls foram recebidas centenas de textos, o que só comprova um grande fluxo produtivo de literatura entre imigrantes,  e com este segundo volume, a coleção já textos publicados de 70 escritores oriundos de 12 países, todos residentes em Portugal. A pré-venda segue até o lançamento oficial do segundo volume da VOLTA para tua terra, que está agendado para o próximo dia 15 de outubro, às 14h, no Museu do Aljube - Resistência e Liberdade, instalado na antiga cadeia do Aljube, e hoje, símbolo da resistência antifascista e democrática de Portugal. Também haverá um evento no Norte, ainda sem data nem local.


29.07.2022 | par Alícia Gaspar | antifascismo, antiracismo, editora urutau, literatura, livro, prosa, volta para tua terra

Género, domesticação e imigração contados por uma empregada de mesa em "Um Fado Atlântico"

A editora Urutau apresenta Um Fado Atlântico, novo livro da brasileira radicada em Portugal, Manuella Bezerra de Melo. O livro, publicado em Portugal e Brasil com distribuição para toda Europa, deve gerar algumas polêmicas em território português. Isto porque, a partir de uma personagem comum, uma empregada de mesa, o conto trata sobre questões espinhosas da imigração em Portugal. 


No prefácio que escreveu para o volume de poesia da antologia Volta para tua terra, Manuella Bezerra de Melo afirma que “A imigração é um labirinto”. Esta é a primeira pista para uma possível leitura de Um fado Atlântico, que conta a história de uma mulher imigrante presa neste labirinto. Empregada de mesa precarizada, esta personagem sem nome deixa sua cidade do outro lado do oceano para viver num país que, logo percebe, é muito diferente daquilo que imaginava. O que encontra é o subemprego e o preconceito, e passa por uma dificultosa adaptação onde é preciso muito esforço emocional para reconstruir seu lugar no mundo. 

Um Fado Atlântico é sobre a dimensão de gênero da imigração, principalmente para as mulheres brasileiras, mas também sobre a domesticação e a assimilação a que são submetidas as pessoas imigradas, evidenciando o sofrimento psíquico de alguém que se esforça para tornar-se aquilo que nunca poderá ser por uma tentativa inútil de se encaixar, de ser aceita, ou de minimamente não ser violentamente ferida. 

A autora delimita o livro a um tipo de ficção autobiográfica, género literário que tem sido explorado na produção contemporânea, principalmente no que tange a produzida por mulheres. E para Manuella, literatura e política são impossíveis de se distanciar. “Tudo na vida de uma mulher é político, não há uma fronteira que delimita o que é uma coisa e o que é outra”, explica. 

Segundo antecipa, a personagem do conto tem muito de si: a imigração, o trajeto que percorre, algumas experiências da vida prática. Entretanto a história é ficcional, e não há como ter certeza do que foi inventado e do que é real. “Neste livro, meu pacto com o leitor é deixá-lo livre para imaginar o que disto tudo pode ser da autora e o que pode ser somente dela, da personagem que também narra esta história, mas principalmente o que pode ser de todas nós, mulheres imigradas”, finaliza.

 A ilustração de capa é da artista eslovaca Zuzana Brakociová, e o livro está em venda no site da editora Urutau.

“há os poucos que perguntam de onde sou, o que faço aqui, normalmente as mulheres que, vez por outra, vem a seus papéis de esposa a constranger a imigrante da colônia que serve pratos aos maridos todos os dias. Respondo com educação, sucinta, calada, econômica. Quem era ela, econômica nas palavras. Evito olhar nos olhos para não ser mal interpretada. Respondo olhando para o chão, porque é para o chão olham as empregadas de mesa, e para onde devem olhar, é assim que rege o estatuto internacional deste ofício, principalmente o estatuto das imigrantes que servem mesas em tascas.” 

(Um fado Atlântico, IX, página 28 e 29) 

Minibiografia

Autora de Pés Pequenos pra Tanto Corpo (Urutau, 2019), Pra que roam os cães nessa hecatombe (Macabea,2020) e Um Fado Atlântico (Urutau,2022), Manuella Bezerra de Melo organizou a coleção de antologias VOLTA Para Tua Terra (Urutau, 2021; 2022). Participou de antologias poéticas, entre elas a Um Brasil ainda em chamas (Contracapa, 2022), e tem poemas e contos publicados em revistas literárias no Brasil, Portugal, Argentina, Colômbia, México, Equador e EUA. Para 2022 está previsto também seu primeiro livro de ensaio sobre a nova poesia brasileira no ciclo do Golpe de 2016 pela editora Zouk. É graduada em Comunicação Social com especialização em Literatura Brasileira, mestre em Teoria da Literatura e Literaturas Lusófonas e frequenta o Programa Doutoral em Modernidades Comparadas da Universidade do Minho, no norte de Portugal, onde vive desde 2017.

28.07.2022 | par Alícia Gaspar | Brasil, domesticação, editora urutau, género, imigração, livro, manuella bezerra de melo, Portugal, um fado atlântico