Catumbela das Conchas

(…) Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! A criança velocidava para a vila num curto espaço tempo. A mão pôs-se em fuga. O comboio passa. A chaminé faz fumo. Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! Cavalos e girafas em curso. Corridos de pó. O pé descalço, o chinelo calçado. A criança velocidava para lá do asfalto. Sapatos dos noventa, caídos da mangueira. Pisa lavras da corrente fria de Benguela. Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! A mãe apavorada. As montanhas-russas. Os carroceis: pulos sobre putos. Corridos de pó. Os pais dançavam o merengue; na mão (nas costas) se guardavam os filhos. Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! A criança se abandonava (lá vem um sarilho!). Depois do movimento… lagrima e se mistura no nevoeiro. Catumbela está noturna. Cacimbo. Sapatos dos noventa, quebra-mar dos oceanos. Catumbela era caminho-de-ferro. De ferrugem, de sucata. Olham, vejam, crianças da corrente fria de Benguela. A criança sossegava. – contava os sapatos dos oitenta. GIGANTES. No outro lado da estrada, a vila é praça, o comboio passa, a chaminé faz fumo. A mãe põe a mão na cabeça… estamos perdidos e achados. A criança desviava dos GIGANTES. Velocidava! Velocidava! Uma sacudidura das Acácias. Os carrocéis corridos de pó. Catumbela era caminho de ferro. De sucata! De ferrugem! (…) Seu fôlego folegou… no meio do pé, do passo, tropeça, tropeçou num GIGANTE. -Então miúdo! Vê lá onde pisas. Pisa o chão de um canto único. (aconselhado) Qual é o teu destino? O miúdo apavorado, velocidou de novo… o GIGANTE continuou a dançar o merengue. O cacimbo neblina. O Elefante tromba. A criança esfria e se transformou numa concha. MÃEE!? MÃEEE!? O desencontro (criança lágrima). A lua cissura.  Nos trilhos do litoral sul; Catumbela é gente. Cana de açúcar: rio e cevada. Jacarés de parede de paracuca - ginguba no dente. Cinco angulares por balão. Dia de festa! Canções do Ocidente. Catumbela é caminho. Caminho do tempo. No outro lado do rio, a vila é praça, o comboio passa, a chaminé faz fumo… Catumbela das Conchas, quem é a criança perdida? A mãe aflita, longe da feira, enche os pulmões: Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! Porque me és tão cinzenta? A estação esfumaça, o comboio passa…PARAAAA!!! PARAAA!!! A mãe raquítica, na sofreguidão ordena… o tímpano esperneia. O cérebro arde. - Ouvi bem!!? Eu vou ser interrogado!!? - pergunta o comboio. A progenitora, confusa, procurou nos bolsos o que havia perdido (pensou duas a três vezes, e exclamou com autoridade): Vais ser interrogado. Qual é o teu destino? «Um sopro no sufoco nesta imensidão do nada. E de todas as desesperanças nos trilhos mais bem caminhados, caminho e velocido para lá das montanhas do Dombe Grande.»  Qual é o teu destino? QUAL É O TEU DESTINO? (insiste) – Poesia! – responde o comboio já indignado. Poesia? Isto não é um poema! Qual é o teu destino? (insiste) - Sou imigrante oceanário dos naturais de N’gola. Meu destino é verso. (contrapôs o comboio através da chaminé) CARAMBA!!! Qualléé o teu DES-TI-NOO#$#%#$%? (já enraivecida). O comboio muito sereno volta e responde: - No princípio era Verbo. E o verbo estava unigênito do seu pai, cheio de graça e de verdade. E da razão hoje é descrença. Status quo originário: poesia, mentira ou verso…!? Fez um apagão no olhar da progenitora. A chaminé faz fumo. Catumbela era caminho-de-ferro. De ferrugem, de sucata!! «(…)  Excelentíssimo Srº Comboio, vós demoras-te-hás mais tempo? Vides que nos os passageiros não somos vossa mercadoria.» O comboio trungungado sussurra: E vós que viajam, saber-vos-eis do destino? (os passageiros não são surdos- ouviram!) - Bocoio! Chongorói! Caimbambo! Baia Farta! Oceano Atlântico (e ponto. - disse o passageiro). Catumbela das Conchas. Catumbela das Conhas. A vila é praça, o comboio passa, a chaminé faz fumo. (…) Catumbela está noturna. A mão pôs-se em fuga. — De quem é a criança perdida? (pergunta o jacaré preocupado) É de algum GIGANTE no meio da praça. O comboio passa, a chaminé faz fumo. A criança quis ir para além do nevoeiro. Algodão doce. Por favor. O GIGANTE  olhou-o cá em baixo: — Oh, miúdo! Aqui nada é de borla. Quantos angulares tens no bolso? (em tom de gozo) Levantou a criança, virou-a de cima para baixo. O miúdo viu os sapatos dos GIGANTES de outra dimensão. Lá no fundo os sapatos da sua progenitora: Retrô vintage, bico redondo com uma estampa vermelha e a quatro milímetros um buraco na fivela. Contente, o miúdo ficou. Mesmo ao contrário já não se sentia tão perdido. Oh, GIGANTE! Me põe na altura de meu corpo. Deixa-me seguir meu destino. Não te peço mais algodão doce, seu GIGANTE amargoo!! (o GIGANTE abriu os olhos parecia que ia engoli-lo). A criança escafedeu-se do GIGANTE e velocidou, velocidou (em fuga) com o maior speed que tinha.

O cacimbo nebulou-se. Mãee!!?? Mãee!!?? Nada. A criança virou concha. Sozinha, lagrima! ( Coitadinha. – dizia o mocho bovino- que sofreguidão! ) Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! O rio se levanta, as montanhas russas. Pulos sobre putos. Corridos de pó. O comboio passa, a chaminé faz fumo. O jacaré insiste: Miúdo cuidado com o fogo o ferro e o feitiço. A criança velocidava à procura do nevoeiro dos Gigantes. Mãe!!!?? Mãe!!?? O ferro em brasa a observava. — Então miúdo? Andas perdido. A criança com olhar camuflado abana. Não. Vai te embora ferro em brasa. Não quero ficar vermelho. A minha mãe  já anda aflita. Não sabe o destino do comboio. Nem sabe do meu paradeiro. A criança chorava em prantos. — Coitada! (sentia o ferro em brasa) se aproximando cada vez mais… — Então miúdo, posso-te ajudar a procurar no nevoeiro a tua mãe. A criança chorava em prantos. – Assim com essas lágrimas vais nascer o rio pelos esgotos do oceano. O ferro em brasa aproximou-se de vez e ZÁS! (um silêncio apavorante, o miúdo conheceu o inferno). AAAííí, aíííí, aíííí…aííííí… Aíí…#&%/&#!!!! O miúdo não quis ouvir o jacaré e ficou queimado. Um centímetro de tamanho o Paedernus Irriteus ensinou-lhe uma lição. — Miúdo o jacaré te alertou. Cuidado com o fogo o ferro e o feitiço. — Saí mazé daqui seu queima peles. Pensei que eras mais do que um ferro em brasa. Afinal não passas de um mero insecto. O miúdo nunca mais falou com estranhos. A chaminé fez fumo. Catumbela está noturna. Cacimbo. As montanhas russas, os carrocéis: pulos sobre putos. Cavalos e girafas em curso, carros de círculos corridos de pó. Sapatos dos noventa, quebra mar dos oceanos. Pisa lavras, insectos caídos da mangueira. Crianças da corrente fria de Benguela. Como os nossos pais dançavam o merengue. Catumbela era caminho-de-ferro. De ferrugem! De sucata!  Catumbela é gente. Cana de açúcar: rio e cevada. Jacarés de parede, paracuca - ginguba no dente. Cinco angulares por balão. Dia de festa! Canções do Ocidente. Catumbela é caminho. Caminho do tempo. Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! A criança velocidava à procura do nevoeiro dos GIGANTES. A mãe aflita responsabiliza o destino. O comboio passa, a chaminé faz fumo. A criança velocidava para além do nevoeiro. Sua mãe perdeu os prantos. Pelo caminho da procura encontrou o ferro em brasa. És tu a mãe do miúdo que nasceu o rio pelos esgotos do oceano? Cuidado com o ferro, o fogo e o feitiço. – diz ironicamente (a progenitora sente- lágrima como um cadáver) – Queimaste o inocente!? Queimaste o Inocente!? O ferro em brasa calou-se. Calado… Atirou-se a sí próprio a toxina «pederina» ali ficou matado, estendido. É. Mas, de consciência tranquila. Tinha morto o seu pecado. A mãe continuou nos perdidos e achados. (…) Poesia. Teu olhar enamorado. Passarinha no escuro da calada floresta de sonhos. Um gosto de sol, de amarelinha. Criança avestruz, porco espinho de porcelana. Criança brincadeira, criança brinquedo. Amarelinha. Amarelinho. Me apaixonei pelo seu olhar amarelinho. Amarelinho. Adotei o seu jeito doce e inocente de ser criança, faz lembrar o nascer de uma borboleta…Eu também amarelinho. Amarelei. Amarelo. Amarelada. Amarelinha! Catumbela das Conchas. Catumbela das Conchas. Olha a criança perdida. Qual é o teu destino miúdo? A criança esfria, e… se transformou numa concha. A vila é praça, o comboio passa, a chaminé faz fumo. Catumbela das Conchas! Catumbela das Conchas! Porque nos és tão cinzenta?

por Indira Grandê
Cidade | 24 Abril 2019 | Catumbela, crónica