Floresta Colonial: a eucaliptização de Moçambique

Resmas de papel, de Pedro HermínioResmas de papel, de Pedro HermínioSob o pretexto do «reflorestamento», da «descarbonização» e a troco de «empregos», na última década, a expansão gigantesca da monocultura do eucalipto pela Portucel Moçambique tem levado ao fim das terras comunais e das machambas que garantiam a perene sobrevivência de comunidades rurais, condenadas a viver sem nada e impotentes perante o desenvolvimento do eucalipto.

A floresta eucalipto em Portugal deixou o ecossistema autóctone como uma longínqua lembrança do que fomos territorialmente e culturalmente há mais de meio século atrás. Depois dos grandes incêndios, a Navigator Company – ex-Grupo Portucel Soporcel, detentora da Portucel Moçambique e líder europeia da produção de pasta e papel – enfrentou uma forte contestação ao crescimento da eucaliptização e apostou em Moçambique, aquela que é a sua nova grande exploração, realizada sob o manto e o financiamento da «economia verde». 

 No passado mês de Julho entrou em Portugal a primeira carga de eucalipto oriunda de Moçambique, iniciando a exportação do projecto de 356 mil hectares dirigido pela Portucel Moçambique. A área é três vezes maior do que a área que a Navigator Company controla em Portugal e foi atribuída pelo governo moçambicano em 2009 e 2011 numa concessão renovável a 50 anos. Em nome da redução de emissões de carbono e sob a égide de programas de desenvolvimento, sustentabilidade e combate às alterações climáticas, a fileira moçambicana do eucalipto surge apoiada pelo Banco Mundial através do Programa de Investimento Florestal (FIP: Forest Investment Program) conduzido pela International Finance Corporation (IFC), a quem cabem 20% das ações da Portucel Moçambique. 

O investimento do FIP no âmbito do programa REDD+ (Reducing Emissions from Deforestation and Forest Degradation) em Moçambique, o MozFIP, enquadra-se no Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável e no Projeto «Floresta em Pé». Um orçamento de 47 milhões de dólares anunciado na página do MozFIP, numa combinação de subvenções e empréstimos, e que geograficamente abarca 8,9 milhões de hectares, num total de 16 distritos nas províncias da Manica, Zambézia e Cabo Delgado.  Em 2016, a IFC anunciara um investimento em curso de 30 milhões de dólares e outros 24 milhões a caminho. Até ao final de 2019, o investimento anunciado pela Portucel Moçambique somava já 120 milhões de dólares em 13 500 hectares de eucalipto. Na previsão da Portucel para esta primeira fase, os números poderão chegar a 260 milhões de dólares de investimento; 40 mil hectares de plantação; a construção de uma fábrica de estilha de madeira; e com o objectivo de exportação de um milhão de toneladas, uma faturação anual na ordem dos 100 milhões de dólares. Uma segunda etapa prevê outros 2,3 mil milhões de dólares de investimento, 120 mil hectares de floresta e a uma fábrica de pasta para papel, subindo a parada para uma faturação de mais de mil milhões de dólares anuais.

 

O financiamento à Portucel Moçambique e às grandes empresas florestais pelo FIP surge ao abrigo da «Redução de Emissões no Sector Florestal através de plantações Florestais com Grandes Investidores». Com contribuições globais de 785 milhões de dólares, o FIP resulta num mecanismo florestal do quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima nos países em desenvolvimento, visando a conservação, gestão sustentável das florestas e melhoria dos stocks de carbono florestal. Moçambique é um dos 23 países contemplados, entre o Bangladesh, Brasil, Burkina Faso, Camboja, Camarões, República do Congo, Costa do Marfim, Congo, Equador, Gana, Guatemala, Guiana, Honduras, Indonésia, Laos, México, Nepal, Peru, Ruanda, Tunísia, Uganda e Zâmbia. 

Para o Plano de Investimento Florestal, este modelo empresarial e a atividade florestal de plantação «contribuirá de facto para o sequestro de carbono em toda a geografia em que é implementado» e «os investidores estão também profundamente preocupados com as florestas indígenas que se encontram dentro e em redor das plantações da Portucel, dentro da paisagem do mosaico, e estão a investigar formas de as preservar.» Porém, o relatório de apresentação de 2016 do FIP não esconde que «será exercida uma maior pressão sobre os elementos não plantados da paisagem. Estas terras são actualmente utilizadas para a agricultura, para a madeira, para a produção de carvão vegetal, para lenha, e para uma vasta gama de produtos florestais não lenhosos, incluindo plantas medicinais, bem como alimentos de emergência para serem consumidos durante os períodos de fome. A preocupação é que o aumento da pressão sobre as áreas restantes pode levar a uma perda de benefícios para as comunidades locais dessas áreas, resultando numa redução global da prosperidade se a perda de benefícios das áreas restantes não plantadas superar o complexo de benefícios a serem derivados das plantações.» 

 Nesse cenário, a solução promovida «é o emprego e o emprego secundário para os membros da comunidade» e um novo território moldado pelas chamadas «Novas Florestas Multiusos, com operadores de concessões florestais naturais e utilizadores comunitários, bem como plantações florestais comerciais e a sua interacção com as comunidades». A interacção equaciona «equilibrar as necessidades de desenvolvimento comercial com a preservação de áreas florestais naturais» e acusa as comunidades das más práticas da «agricultura itinerante e as colheitas florestais insustentáveis e ilegais».  De acordo com o modelo empresarial, que ordena o território, «os benefícios para as comunidades virão do envolvimento na plantação de árvores, madeira produção, comercialização e transformação, o que criará oportunidades para os cultivadores de fora para diversificar os meios de subsistência e aumentar a resiliência. A restauração de terras degradadas irá melhorar as funções dos ecossistemas, a viabilidade dos habitats e os benefícios sociais.» Na legitimação do modelo enquanto «participativo e   inclusivo», como país piloto do FIP, Moçambique recebeu 4.5 milhões de dólares americanos do Mecanismo de Doação Dedicado para Comunidades Locais (DGM), uma subsecção destinada a «garantir direitos aos Povos Indígenas e Comunidades Locais». Mas as vozes que se ouvem das comunidades e de diversos grupos moçambicanos contrariam as promessas idílicas do novo modelo territorial.

Terra a troco de uma chapa de zinco

Anabela Lemos, directora do grupo moçambicano Justiça Ambiental (JA!) declarava, em Julho de 2021, que «a Portucel Moçambique afirma que as suas plantações estão a melhorar as condições de vida das comunidades rurais e a trazer desenvolvimento económico para Moçambique. Na realidade, este projeto neocolonialista está a usurpar terra e meios de subsistência a milhares de famílias camponesas, deixando as mesmas sem opções de vida. Enquanto as famílias camponesas perdem tudo que de mais valor tem a Portucel exporta madeira de baixo valor por mais de 11.000 km para abastecer as fábricas da Navigator em Portugal e ainda afirma que está a contribuir para o desenvolvimento das mesmas. As promessas feitas às comunidades de empregos, vidas melhores e infraestrutura aprimorada foram todas quebradas.»

No «papel», a Portucel apresenta-se como uma empresa sustentável, tendo mesmo a melhor avaliação dos últimos anos no ESG Risk Rating 2020, que avalia os riscos relacionados com factores ambientais, sociais e formas de gestão. Na verdade, esta avaliação deveu-se ao acordo estabelecido com o banco BBVA para o lançamento do produto financeiro Papel Comercial Green em Portugal em 2019, ano em que a empresa foi também distinguida pelo Carbon Disclosure Project como líder global na actuação climática corporativa. A semântica ambiental, no caso da Portucel Moçambique apoiada pela organização não governamental internacional World Wide Fund for Nature (WWF), projecta, na sua campanha corporativa «O Nosso Contributo para Moçambique», a imagem de comunidades saudáveis e felizes. A realidade no terreno é bem diferente.

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Tentando divulgar o real impacto do investimento da Portucel em Moçambique, vários grupos moçambicanos têm vindo a registar imagens e testemunhos, e promovido estudos, debates e encontros de informação, utilizando ao máximo os meios disponíveis para combater a desinformação passada para a Europa sobre o Eucalipto nas suas terras, ao mesmo tempo que procuram apoiar e organizar os camponeses. 

Em 2017, a Ação Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU), uma organização da sociedade civil fundada em Outubro de 2007 por jovens estudantes universitários, lançou a campanha «Um Hectare! Uma Folha de Zinco!», registando testemunhos de várias comunidades afectadas pela monocultura de eucalipto.  As histórias recuam a 2010/2011, quando a Portucel iniciou o contacto com as populações para plantar eucalipto em Moçambique com promessas de lhes melhorar a vida. Após os acordos políticos, a empresa contactou os chefes das comunidades para convencer os locais a entregar as suas machambas – terrenos de cultivo familiares – e a trabalhar para a empresa.  Apesar dos valores multimilionários da facturação, os pagamentos eram frequentemente feitos não com dinheiro, mas com chapas de zinco, cimento, comida… 

Num desses registos, Augusto Cassiene, agricultor a quem foram prometidos 50 anos de trabalho, viu nas promessas da Portucel a fuga à pobreza, mas quando começaram os trabalhos começaram os problemas. Não havia equipamento, tendo a empresa dito que quando recebessem podiam ir comprar catanas, botas e luvas para trabalhar. Augusto trabalhou 4 meses na empresa sem receber ordenado ou as chapas de zinco e diz-se derrotado pelos «buscateiros» da empresa.  Augusto entregou 3 hectares que a empresa avaliou em 12 chapas de zinco e hoje, como muitos dos habitantes locais, vê-se obrigado a alugar machambas noutras comunidades. Num sentimento comum de quem perdeu as machambas e o seu futuro como comunidade, conclui desolado: «Eu não ganhei nada. Ele é que ganhou. Eu trabalhei, eu não recebi chapa… Eu perdi». 

Angélica Simão foi uma das camponesas a quem os líderes locais pediram para aceitar entregar as terras comunitárias para plantio de eucalipto. Ao seu lado, no registo vídeo da ADECRU, Araque Simão testemunha o modus operandi da empresa na sua localidade. «Primeiro, tiraram as casas, depois as machambas». A pouca água que servia a comunidade e atraía animais deixou de correr, e agora só ao pé dos eucaliptos se consegue água, nas lagoas de regadio da empresa. «Aqui não tem água. A bomba de água que empresa deixou trabalhou uns meses, ninguém vem arranjar». Quando as terras comuns acabaram, a Portucel começou a pedir as machambas particulares, que não eram pagas, mas trocadas por vencimento, placas de zinco e sementes melhoradas. 

Não satisfeito com a ocupação das terras, este modelo empresarial e territorial aumenta os problemas e a dependência das comunidades locais, ao distribuir sementes melhoradas através do seu Programa de Desenvolvimento Social e ao desviar as águas para optimizar o seu produto. Estes são os primeiros passos para desaparecerem as sementes tradicionais em proveito do mercado dos Organismos Geneticamente Modificados.

Noutro testemunho, Assita Américo recorda como a sua comunidade foi contactada em 2010 pela Portucel. Meses depois já não pensavam na empresa, mas em 2012 a empresa voltou, quando já ninguém acreditava nas suas promessas subjacentes ao pedido para que a comunidade trocasse os terrenos das melhores machambas pelo plantio de eucalipto e por trabalho. Mas, a pouco e pouco, com a pressão social, financiada pela empresa, as pessoas começaram a entregar as suas terras e machambas, e mesmo algumas pessoas que não tinham um hectare pediam dinheiro emprestado para comprar mais terreno e entregar à empresa em troca de emprego, para assegurar o seu futuro e o da geração seguinte. Assita relata que a empresa devastou tudo, machambas activas e saudáveis, e até as provisões de milho para o inverno. «Era tudo perda para a população». Recorda-se do técnico do Ministério da Agricultura apresentar documentos que diziam que eles não estavam a fazer nada com a terra e a empresa sim, pelo que só ia respeitar a empresa. Pois, como as terras não estão registadas, podem fazer o que querem com elas. Sob as ameaças de que não tinham registos e com medo de ir para a cadeia, a comunidade via-se de mãos atadas, enquanto a empresa avançava. «Já não temos saída, estamos a cultivar noutras comunidades. Aqui já ninguém cultiva. Todas essas machambas de eucalipto eram as nossas machambas» diz Assita. 

Verónica Simão tinha uma terra no meio das outras, que foram vendidas. Mantendo a única machamba activa, já não tinha ajuda para a capinar e, sozinha, era muito difícil fazê-lo. Acabou por vender também um hectare com a promessa de 12 chapas de Zinco, das quais só recebeu seis. 

E o papel da sustentabilidade!?

A propósito destes testemunhos, Perito Traquinho, representante da ADECRU, dá como evidente a violação dos direitos humanos e do direito à soberania alimentar.  A subida das queixas de comunidades contra a implementação de grandes projectos de plantio de eucalipto em Moçambique tornou-se impossível de escamotear. Comunidades inteiras perderam as suas terras e habitações para a Portucel, e são várias famílias que perdem a capacidade de gerir as suas vidas. Daí resulta, de acordo com a portuguesa QUERCUS, a exigência, por parte de diversas ONG a trabalhar em Moçambique, de que sejam revogadas as concessões da Portucel Moçambique, face aos impactos negativos que as plantações estão a ter na subsistência e segurança alimentar das comunidades agrícolas rurais, e em cerca de 24 000 famílias que podem ser impactadas pela futura expansão das plantações.

Em 2010, activistas brasileiros da Rede Alerta contra o Deserto Verde registaram a sua visita a Moçambique num vídeo com o nome «Ninguém come eucalipto! Em Moçambique também não!». Aí, Batista Moto, camponês moçambicano, diz que aceitaram as plantações porque são muito pobres e queriam melhorar a sua condição social, mas mais uma vez a verdade foi outra: o trabalho é escasso, sazonal e mal pago, passando a viver muitas vezes nas bermas das estradas que rasgam a nova paisagem de eucaliptos. 

Em 2021, mais de uma década depois, no dia 21 de Setembro, Dia Internacional Contra as Monoculturas, teve lugar o Encontro Internacional «Como Resistir às Plantações de Monocultura», organizado pela ADECRU, a Justiça Ambiental (JA!), a Missão Tabita, a Associação

de Jovens Combatentes Montes Errego, o Fórum Carajás – Brasil, a Fundação Suhode da Tanzânia, Amigos da Terra Moçambique, o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (Brasil) e o Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (WRM). Do evento saiu uma Carta pública alertando para «o perigo real de uma expansão gigantesca de monoculturas de árvores no mundo», sob o falso pretexto de «reflorestamento», denunciando um relatório produzido em 2019 pelo Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) e a WWF-Quénia que identifica uma área de 500 mil hectares em 10 países africanos apta para o plantio de monoculturas de árvores por empresas privadas. 

Ilustração de Álvaro NogueiraIlustração de Álvaro NogueiraEm troca de emails com activistas da JA! ao Jornal MAPA, estes sublinhavam como «a narrativa da Portucel e da indústria de monocultura tem que ser destruída. A Portucel gaba-se imenso das suas largas extensões de terra plantada, gasta fortunas em publicidade para convencer os distraídos que vieram para Moçambique para ajudar os “desgraçadinhos” dos moçambicanos, que têm tanta terra e nem sabem o que fazer com esta. Isto é mentira, é completamente falso. 

A Portucel adquiriu através do Estado terras ocupadas por comunidades locais, terras que servem de meio de subsistência a estas comunidades e depois, por meio de promessas de vida melhor, convenceu-as que, ao ceder as suas terras, teriam empregos e vida melhor. Na realidade, e se se conhece um pouco o processo de aquisição de terra em Moçambique, a Lei protege as comunidades locais, e estas devem ser consultadas e devem concordar com a cedência de terra. No entanto, a grande maioria destas comunidades locais não têm conhecimento da Lei, dos seus direitos, nem tão pouco que podem recusar-se a ceder terra. E, agravando esta falta de conhecimento das Leis e dos seus direitos, há também uma enorme barreira, que é a língua: embora o português seja a língua nacional, não é do domínio de todos, e estas consultas comunitárias devem sempre ser traduzidas nas diferentes línguas locais. Infelizmente, esta falta de educação, de conhecimento e, em muitos casos, de empoderamento comunitário leva à submissão ao governo e aos “chefes”. Todos os processos de consulta comunitária são acompanhados pelos “chefes” e poucos ousam desafiar o que é dito nestas consultas, para além de que são também muitas vezes selecionados os que devem estar presentes e os devem falar. E assim foi com a Portucel.»

Um dos ecos da Carta pública «Como resistir às plantações de monocultura?» foi a peça «Plantio industrial de eucaliptos e pinheiros empobrece comunidades no centro de Moçambique», transmitida pela radio Voz da América, na qual Cade Augusto, morador em Manica, garantiu que «a minha comunidade ficou mais pobre, porque as plantações de eucaliptos fazem sombra às nossas machambas de milho e mapira, definhando as plantas, e a água está a tornar-se cada vez mais escassa, porque essas plantações industriais sugam muita quantidade». Noutro testemunho, Marta Bengala que vira a sua machamba ser ocupada pelo eucalipto em 2013, sendo transferida para uma zona infértil a quase 30 kms de sua casa, referia agora que «as plantações de eucalipto já atingiram a nova machamba e devo ser transferida novamente para um outro lugar, no distrito de Muanza, quase 50 kms mais longe. Como vou produzir e me sustentar?» 

Todo este impacto do investimento da Portucel e de outras empresas de papel nas zonas rurais de Moçambique tem levado os camponeses ao desespero.  As falsas promessas da Portucel são reconhecidas em todas as províncias. 

Na carta pública de 2021, unindo diversas frentes de contestação, é sublinhado que «há anos, estas comunidades resistem às plantações de monocultura de eucalipto das empresas Green Resources em Moçambique e na Tanzânia, da empresa Portucel em Moçambique; da empresa Investimentos Florestais de Moçambique (IFM) e as plantações de monocultura de seringueira da empresa Mozambique Holdings em Moçambique». Pelo que «resolveram romper o silêncio imposto pela pandemia e denunciar mais uma vez que as empresas de eucalipto e seringueira chegaram nas suas terras – em alguns casos há muitos anos atrás – com promessas de desenvolvimento, um futuro com escolas, hospitais, energia e pontes. No entanto, denunciam que nenhuma destas promessas foi cumprida. E pior, os eucaliptos e seringueiras ocuparam e destruíram as terras férteis das machambas e hoje as famílias não têm mais como se alimentar e algumas não tem mais onde morar. Se o eucalipto fosse um alimento, seria bem melhor, mas não é. Além disso, as empresas destroem as árvores nativas e usam produtos químicos que contaminam o solo e a água. Poços e rios secaram e a água potável ficou escassa. Em vez de construir pontes, as empresas destruíram pontes com as suas máquinas pesadas, sem se preocupar em repará-las. As comunidades sentem medo de atravessar as áreas de monoculturas. Mesmo já a ocupar extensas áreas, as empresas querem ocupar ainda mais terras.»

Chegando a uma constatação: «toda esta situação está a causar muito sofrimento, muita fome nas comunidades e afecta de forma particular as mulheres. O Governo abriu a porta para as empresas e investidores e a fechou para o povo. O que está a acontecer é uma nova forma de colonialismo onde a empresa é a novo colonizador das terras». E a um sentido muito claro: «mesmo que as empresas não parem de expandir, mesmo que tentem intimidar e ameaçar, nós comprometemo-nos a continuar a unir-nos na luta contra as monoculturas e a destruição e usurpação de terras; mesmo que as empresas e governos nos insultem, vamos continuar a buscar formas para que as comunidades possam retomar os seus territórios».

Artigo originalmente publicado no jornal MAPA.

por Filipe Nunes e João Vinagre
A ler | 27 Novembro 2021 | comunidades rurais, economia verde, eucalipto, floresta, mapa, moçambique, monocultura, Navigator Company, PorPortucel