Lisboa: A capital mais africana da Europa (1974-80)
Que o tema do racismo esteja de novo no centro do debate público mostra que a memória da colonização africana ainda faz vibrar todas as veias da sociedade portuguesa. E que Portugal não conseguiu ainda completar o ciclo democrático do 25 de Abril, que, de resto, foi pensado e construído por alguns políticos a partir de matrizes culturais e sociais racistas.
Recuemos ao Decreto-Lei 308-A/75, de 24 de junho de 1975. Aprovado pelo IV Governo Provisório, em Conselho de Ministros por Vasco Gonçalves (primeiro-ministro), Álvaro Cunhal, Francisco Pereira de Moura, Joaquim Magalhães Mota, Mário Soares (ministros sem pasta), António de Almeida Santos (ministro da Coordenação Interterritorial), António Arnao Metelo (ministro da Administração Interna), Francisco Salgado Zenha (ministro da Justiça), Ernesto Melo Antunes (ministro dos Negócios Estrangeiros) e Jorge Correia Jesuíno (ministro da Comunicação Social), vinha alterar a lei de nacionalidade portuguesa, até aí assente na tradição do jus soli (ou direito do solo), e instituir o princípio do jus sanguinis (ou direito do sangue).
Segundo o jus soli, vir ao mundo num determinado território confere automaticamente a nacionalidade associada ao local de nascimento, o que faz da nacionalidade uma condição prévia ou anterior à cidadania, não havendo concomitância entre ambas. Já o princípio do jus sanguinis considera que é a descendência que determina a nacionalidade.
Assim, aquele documento, que estabelecia as «normas sobre a conservação da nacionalidade portuguesa pelos portugueses domiciliados em território ultramarino tornado independente», impôs e consagrou o critério de sangue em detrimento do local de nascimento.
Quer dizer: antes do decreto, eram portugueses os que viviam na metrópole e os que habitavam nos então «territórios ultramarinos». Apesar de brancos, negros, mestiços e asiáticos serem ali considerados cidadãos portugueses, a nacionalidade não concedia direitos iguais para todos.
Com a aprovação da nova lei, instituía-se o inverso: após a independência dos territórios ultramarinos, quem neles continuasse a viver perdia a nacionalidade portuguesa e só a recuperariam aqueles que conseguissem provar que tinham ascendência portuguesa ou que, tendo nascido «em território tornado independente», tivessem a sua morada oficial «em Portugal continental ou nas ilhas adjacentes há mais de cinco anos em 25 de Abril de 1974».
Portanto, os cidadãos nascidos em Portugal e ilhas adjacentes conservariam a nacionalidade enquanto aqueles que haviam nascido no Ultramar só a conservariam se pelo menos um avô tivesse nascido na antiga metrópole. Este critério estendia-se ao cônjuge, casado ou viúvo, assim como aos filhos menores.
Quem tivesse nascido nas ex-colónias e nelas residisse à data da entrada em vigor desta lei perdia o estatuto de cidadão português. Porém, mantinham a cidadania aqueles que, tendo ou não nascido na metrópole, viviam em Portugal, antes das independências, há cinco ou mais anos.
A manutenção da nacionalidade portuguesa aos que viviam nas ex-colónias ficava limitada aos que tivessem nascido em Portugal continental — e nos Açores e Madeira — e aos que possuíssem «uma relação especial com o país por via de laços familiares ou por situação de residência superior a cinco anos». Os não brancos podiam adquirir nacionalidade portuguesa, mas ponderosas restrições — nomeadamente a ascendência familiar — dificultavam tal possibilidade.
Muitos dos que antes eram considerados portugueses, por força da Lei n.º 2098, de 1959 (segundo a qual, de acordo com as conceções estado-novistas, eram portugueses todos os que tivessem nascido em território português), deixavam agora de o ser: quem não tivesse um ascendente nascido na metrópole (Portugal continental ou ilhas adjacentes) até ao terceiro grau, ou não houvesse nascido no Estado da Índia, perdia a nacionalidade portuguesa. Ou seja, o decreto ressalvava como exceção os habitantes do antigo Estado da Índia e os descendentes de diplomatas. Isto queria dizer que o estatuto dos descendentes dos nascidos no Estado da Índia era equivalente, para efeitos de obtenção da nacionalidade, ao de quem descendesse dos portugueses da metrópole1.
A lei introduzia assim um fator de desigualdade que marginalizava os portugueses de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Na prática, a reversão legal acima referida, que destituía da nacionalidade quase todos os ex-cidadãos das colónias, pretendia excluir os negros (muitos dos quais assimilados) da sociedade portuguesa, em particular os soldados indígenas ou africanos que se tinham alistado no Exército durante a Guerra Colonial. Nada mais vergonhoso: depois de terem apoiado o Estado português, este abandonou-os e deixou-os à sua sorte, muito provavelmente para serem fuzilados ou torturados pelos exércitos de libertação africanos.
Africanização da Guerra Colonial
Isto leva-nos à conhecida questão da «africanização da Guerra Colonial». A expressão é explicada por João Paulo Guerra:
“O colonialismo português desenvolvia uma linha político-militar propagandística visando levar africanos a baterem-se contra os africanos. A chamada «africanização da guerra» visava suprir deficiências e dificuldades muito reais na mobilização de tropas coloniais em Portugal continental, responder a necessidades objectivas da luta anti-guerrilha e comprometer as populações das colónias na guerra colonial.”2
Segundo Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso, a africanização visava «a criação de clivagens e antagonismos que demarcassem campos de actuação e dificultassem o alargamento das bases de apoio dos movimentos de libertação»3.
Para a investigadora Fátima da Cruz Rodrigues, africanizar a Guerra Colonial «significava aplicar um dos princípios basilares das teorias da guerra “contra-subversiva”: conquistar as populações locais», e assemelhava-se ao jaunissement da força francesa na Indochina (1946-1954), ao recrutamento de soldados locais na Argélia (1954-1962), bem como à vietnamização da guerra norte-americana (1963 e 1973) ou à teoria do same element utilizada pela força britânica na Malásia4.
Em Portugal, a estratégia «contra-subversiva» associada à formação de «tropas africanas» foi aplicada nos três principais teatros de guerra: em Angola surgiram os «Flechas», na Guiné foram constituídos grupos de fuzileiros especiais e em Moçambique os Grupos Especiais (GE) e Grupos Especiais Paraquedistas (GEP).
Em Moçambique, o grande promotor da africanização foi o general Kaúlza de Arriaga, Comandante-Chefe das Forças Armadas naquela então colónia portuguesa, do qual presumivelmente terão partido as ordens para a criação, paralelamente às unidades regulares, dos Grupos Especiais (chegou a haver 85 destes GE), dos Grupos Especiais de Pisteiros de Combate (GEPC) e dos Grupos Especiais de Paraquedistas. Antes disso, a presença de nativos das populações locais fazia-se sentir apenas nas forças regulares ou em milícias de autodefesa dos civis que viviam nas aldeias.
A avaliar pelas informações de José Freire Antunes, o recrutamento para estes grupos — que tinha também o intuito de solucionar o problema urgente de tentar reduzir o número de efetivos oriundos da metrópole, visto que Portugal sentia cada vez maiores dificuldades em mobilizar portugueses para combaterem na guerra — seria voluntário e a sua ação restringia-se, por via de regra, à zona de residência dos seus elementos5. Tanto os GE como os GEP foram constituídos em 1970 com o objetivo de fazer com que o Exército português passasse a dispor de uma tropa especial africana mais resistente ao clima e às condições de vida no mato (chegaram, respetivamente, a ter 7700 soldados e 840 paraquedistas).
Em Angola, onde mais proliferaram estas forças militares (talvez por se tratar de um território vastíssimo e de um cenário de guerra particularmente complexo, onde se digladiavam três movimentos de libertação), surgiram logo em 1966, em Cabinda, as Tropas Especiais (TE). Comandadas pela PIDE/DGS, começaram por integrar sobretudo ex-guerrilheiros, na sequência da rendição de Alexandre Taty, um dos fundadores da UPA, às autoridades portuguesas (levando consigo 1200 homens). No total, chegaram a ser 17 os grupos em atividade naquela região do norte de Angola.
Além das anteriores, foram ainda criadas as seguintes forças de recrutamento local: os Grupos Especiais, formados maioritariamente por africanos voluntários, reforçavam as companhias e os batalhões, havendo, no seu auge, 99 desses grupos; os Fiéis (constituídos por refugiados catangueses que tinham chegado a Angola em 1967, foram organizados em campanhas de caçadores); os Leais (com refugiados da Zâmbia chegados a Angola também em 1967); os Flechas (criados em 1966 com angolanos oriundos do Cuando-Cubango). Fiéis, Leais e Flechas atuavam sob comando militar e debaixo do controlo da PIDE/DGS, e eram bastante ativos na Zona Militar Leste de Angola. Neste último território havia ainda as Milícias e a Organização Provincial de Voluntários de Defesa Civil (OPVDCA), respondendo ambas à PIDE/DGS e às autoridades administrativas.
Os Flechas, talvez o grupo mais conhecido a atuar em Angola6, foram fundados pelo inspetor Óscar Piçarra Cardoso, capitão miliciano que entrara para a PIDE (onde chegou a inspetor-adjunto e a diretor de divisão) na qualidade de responsável pela recolha e pelo tratamento de todas as informações sobre Angola e Moçambique. Corpo de tropas especiais de intervenção controladas pela PIDE (que lhes pagava, por vezes, oferecendo-lhes o direito de saque), os seus elementos foram inicialmente recrutados entre os bosquímanos, um povo nómada caçador do sul de Angola. Foram batizados com o nome de Flechas por combaterem com flechas envenenadas (só mais tarde usariam armas de fogo). Capazes de identificar o rasto de seres humanos (e de todos os outros animais) através dos mais pequenos indícios, foram especialmente eficazes na identificação dos locais de passagem dos guerrilheiros — graças a eles, o Exército português obteve informações pormenorizadas e seguras sobre as movimentações dos inimigos no Leste de Angola —, razão pela qual usufruíam de liberdade de ação para atuarem no terreno seguindo os seus próprios métodos (sendo certo, também, que mantinham contactos estreitos com os serviços secretos rodesianos e sul-africanos). No início da guerra havia apenas oito grupos de Flechas (constituídos normalmente, cada um deles, por 30 homens), mas até 1974 foram criados mais cerca de mil7.
Alguma Gente da Minha Terra, Roberto Chichorro
Os Flechas não tinham qualquer enquadramento militar — desde logo, não dependiam da hierarquia do Exército —, obedeciam apenas à PIDE (depois Direção- Geral de Segurança/DGS) e operavam exclusivamente em Angola. Um desses grupos de Flechas, pelo menos, foi chefiado por um dirigente da UNITA, Tiago Sachilombo, sabendo-se ainda que, após o 25 de Abril, muitas destas tropas africanas, entretanto desmobilizadas, acabaram por reforçar a estrutura militar da UNITA.
Na Guiné, este tipo de forças irregulares tinha a designação oficial de Milícias. Criadas em finais de 1964, a sua intervenção fez-se sentir sobretudo a partir de 1968, com a chegada de Spínola ao comando militar daquela ex-colónia.
Com efeito, a partir do momento em que Spínola começou a pôr em prática o seu programa político, social e militar, tendente à reorganização da Guiné, intensificou-se a formação dessas Milícias (cuja missão passava pela defesa dos aldeamentos), bem como de companhias de Caçadores nativos, todas elas constituídas por guineenses treinados, armados e pagos pelas FAP.8 Vinculadas às suas terras de origem, as Milícias chegaram a dispor de cerca de nove mil homens e seriam lideradas, a partir de certa altura, por Carlos Fabião.
Spínola introduziu várias novidades no comando militar da Guiné, que estabeleceriam uma diferença clara em relação a Angola e a Moçambique: beneficiou as forças locais com o mesmo tipo de distinções que as portuguesas, acabando-se assim com a discriminação relativamente aos africanos nativos (que podiam tornar-se graduados oficiais e comandar certas unidades); promoveu a criação de uma força de elite de comandos africanos (organizada nos mesmos moldes de todas as outras unidades de comandos portugueses, quer na Guiné, quer em Angola e Moçambique) e de dois destacamentos de fuzileiros especiais africanos, todos eles integrados nas Forças Armadas Portuguesas, que assim entraram em contacto com os modelos portugueses de administração.
Sem se afastar muito da doutrina ideológica do regime, o inovador programa de Spínola pretendia mostrar, sobretudo à comunidade internacional, que Portugal seguia à risca a tão proclamada política integracionista, responsável por fazer do Império português uma comunidade supostamente multirracial, multicultural e multicontinental9. Mas visava também seduzir as populações locais e subtraí-las à influência do PAIGC. Para tal, foram desencadeadas várias obras de melhoramento das infraestruturas, a proteção das populações rurais foi reforçada, consolidou-se a estratégia de africanização do exército e a demagogia política enveredou por aquilo que hoje chamaríamos de populismo, com a constituição dos chamados «Congressos do Povo».
Todas estas iniciativas passaram ao papel com a publicação de Por Uma Guiné Melhor (Agência-Geral do Ultramar, 1970), do próprio general, volume que reunia os discursos, as mensagens, as medidas promulgadas e as entrevistas concedidas pelo Governador e Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, durante os dois principais anos da sua atividade. Na sequência da publicação dessa obra, «Por uma Guiné Melhor» e «Guiné para os Guinéus» tornaram-se as senhas de identidade da política de Spínola naquele território, desenvolvida entre 1968 e novembro de 1973 (ano em que regressou à metrópole).
Em agosto de 1971, Amílcar Cabral, no seu Relatório sobre a Situação da Luta, referiu-se expressamente ao caráter das «companhias africanas» e denunciou o facto de elas serem recrutadas através de «aliciamento e corrupção». Depois, na sequência da fracassada invasão de Conacry, em que diversas unidades africanas foram dizimadas, incluindo alguns comandos guineenses chefiados por Spínola (por exemplo, os capitães João Bakar Djaló e Guela Baldé), esse recrutamento tornou-se mais difícil e o general arregimentou criminosos de delito comum e outros marginais.
África em Portugal depois do 25 de Abril
Logo após abril de 1974, passados os primeiros incidentes nos musseques e nos caniços, respetivamente em Luanda e Lourenço Marques, começou a fuga de negros e mestiços com destino ao torrão natal. Das capitais de Angola e Moçambique (para onde se tinham deslocado em busca de trabalho), antevendo o clima de violência que já se perspetivava, foram os primeiros a retornar à sua «pátria» de origem, que tanto podia ser o norte de Angola e Moçambique, como as ilhas de Cabo Verde ou de São Tomé e Príncipe.
Estes grupos de deslocados não despertaram, todavia, a atenção dos jornalistas, muito mais preocupados em relatar as histórias dos retornados brancos rumo à Europa. O mesmo sobre os negros e mestiços que integraram as tropas especiais das Forças Armadas Portuguesas (FAP), a maioria das quais ainda no ativo quando se deu o 25 de Abril.
Para estes soldados, o fim da Guerra Colonial veio evidenciar as rivalidades latentes entre os movimentos de libertação. Incapazes de chegar a acordo quanto ao modelo de governação a instaurar nos novos países, a guerra civil tornou-se inevitável em Angola e em Moçambique. Neste contexto, as tropas africanas que tinham servido nas FAP representavam uma ameaça potencial, daí que muitos dos seus elementos tenham sido perseguidos, marginalizados ou mesmo assassinados. A essa sorte escaparam aqueles que optaram por engrossar as fileiras dos exércitos envolvidos nesses novos conflitos, sobretudo em Angola..
Em Moçambique, com a independência, os antigos combatentes africanos das populações locais foram alvo de diversos tipos de discriminação. Segundo Fátima da Cruz Rodrigues, muitos desses indivíduos foram «internados» nos chamados campos de reeducação, purificação ou de purgas. Como refere Eduardo Pitta, retornado de Moçambique,
desde 1963, ainda no tempo de Eduardo Mondlane, a Frelimo mantinha na Tanzânia os denominados «campos de reeducação». Os mais conhecidos eram os de Nachingwea e Bagamoyo. No Niassa, em Moçambique, ficava o de Mitelela. Para esses campos foram enviados dezenas de milhares de indivíduos. Por esta ordem: negros, mestiços, brancos e indianos. A comunidade chinesa não foi incomodada. Dois terços dos detidos enlouqueceram, morreram de fome ou foram executados. O terço que sobrou ficou reduzido a zombies que mendigam pelas ruas de Maputo, Nampula e outras cidades. Vim a saber que um vizinho, um miúdo que não teria ainda 20 anos, foi abatido ao tentar fugir do campo onde estava. O pico das purgas deu-se entre 1975 e 1990, época em que o totalitarismo teve rédea solta e ninguém piou10.
Estes campos de trabalho tinham como objetivo institucionalizar todos aqueles que a FRELIMO entendesse que tinham colaborado, direta ou indiretamente, implícita ou explicitamente, com o regime colonial e que, por isso, seriam potenciais traidores ou inimigos do movimento de libertação (e, portanto, de todo o povo moçambicano).
Nos primeiros anos após a independência, a FRELIMO incentivava as populações e os grupos de vigilância popular a procurar, identificar e denunciar os «inimigos» da Revolução, outrora cúmplices do colonialismo. Como apesar de tudo podiam ser úteis à construção do novo país, esses indivíduos não foram eliminados fisicamente (com as consabidas exceções, motivadas por vinganças pessoais).
Depois de um período de internamento em tais campos, em que eram submetidos a um processo de «purificação», os condenados podiam finalmente ser considerados aptos a integrar a República Popular de Moçambique. Como explica Elias Jossias,
a partir do momento que são identificados como «colaboracionistas», «comprometidos» ou «inimigos do povo» são colocados à margem da sociedade, vigiados os seus movimentos e posteriormente submetidos a processos de «reintegração» que assumiram características ritualizadas. As reuniões nas sedes dos Grupos Dinamizadores, apresentação em comícios populares como pessoas «purificadas», exposição das fotografias e pequenas biografias nos «jornais do povo» das empresas e locais de habitação, conferências de imprensa de apresentação dos «purificados» e transformados em «homem novo» e que vão merecer destaques em órgãos de comunicação do Estado, como o Jornal Notícias, a Revista Tempo, o Jornal Domingo e a Rádio Moçambique, e os internamentos em «Campos de Reeducação», entre outros actos públicos, são disso o exemplo11.
Na Guiné, cumprida a independência, a desmobilização dos soldados africanos foi bem mais atribulada. Há duas explicações possíveis para o facto de esses antigos combatentes, outrora comprometidos com as FAP, terem sido violentamente perseguidos. Por um lado, não havia ali vários movimentos de libertação a disputar o novo Governo, por outro lado, o nível de compromisso militar, durante a Guerra Colonial, daquelas tropas especiais. Durante as negociações da independência da Guiné — Acordo de Argel (25 de agosto de 1974) —, muitos desses soldados, em particular os comandos, foram acusados de apoiar uma suposta invasão de Bissau, o que nunca chegou a acontecer.12
Na Guiné, o modelo de participação das forças africanas concebido por Spínola atribuiu-lhes um protagonismo que não se verificou em Angola e em Moçambique. Durante o tempo em que foi Governador da Guiné e Chefe das Forças Armadas, Spínola procurou executar a tese federalista defendida no livro Portugal e o Futuro (fevereiro de 1974). Vários passos foram dados nesse sentido: criação de unidades com soldados e comandantes exclusivamente africanos; participação ativa em inúmeras operações militares contra o exército de libertação; crescente autonomia atribuída a essas forças; e criação dos «Congressos do Povo», surgidos na sequência da campanha de propaganda «Por uma Guiné Melhor».
Esta última, assente no pressuposto de que a vitória portuguesa era uma questão de tempo, fora lançada com o intuito de convencer as populações locais de que seriam convidadas a envolver-se cada vez mais na própria administração do território. A integração de amplos contingentes de soldados e oficiais africanos (supostamente o embrião de um futuro exército africano nacional) era um primeiro passo e pretendia demonstrar que eram os próprios guinéus quem defendia e lutava pela manutenção da presença portuguesa em África13.
Durante as negociações que levariam à independência, a delegação portuguesa esboçou inicialmente alguma apreensão face ao que aconteceria a esses combatentes africanos14, porém, nada foi feito para salvaguardar a sua situação. O Estado português comprometeu-se unicamente, no Acordo de Argel, a pagar «pensões de sangue, de invalidez e de reforma a que tenham direito quaisquer cidadãos da República da Guiné-Bissau por motivo de serviços prestados às Forças Armadas portuguesas»15.
Em resultado disso, muitos destes militares tentaram fugir ou viram-se obrigados a regressar às suas terras de origem. Como era expectável, as consequências foram terríveis. Alvo de perseguição pelo Governo e pelas populações, a desmobilização das tropas africanas na Guiné independente foi mais dramática e violenta que em Angola e Moçambique.
Segundo Fátima da Cruz Rodrigues, «os problemas com os antigos combatentes africanos da Guiné começam quando as autoridades portuguesas procedem ao seu desarmamento, seguindo o estipulado no Acordo de Argel. Algumas unidades começaram por recusar-se a entregar as suas armas, mas acabaram por fazê-lo após lhes serem dadas certas garantias». Logo após a partida das autoridades coloniais, muitos desses ex-militares guineenses das FAP foram perseguidos, presos e executados.
O caso de Mário Sani, um dos mais de 600 comandos guinéus das FAP, permite-nos ter uma ideia do que aconteceu a esses militares que Portugal deixou para trás. A história de Mário Sani é contada por Sofia da Palma Rodrigues no site Esquerda.Net:
O «crime» que Mário cometeu foi ter integrado, em 1971, a primeira Companhia de Comandos Africanos das Forças Armadas portuguesas na Guiné. Num contexto em que a tropa era obrigatória para todos os jovens com mais de 18 anos, os Comandos Africanos foram um grupo de elite, de recrutamento local, criado pelo então Governador da província, António de Spínola, para fazer face à intensificação da guerra. Homens fisicamente robustos, capazes de enfrentar as dificuldades do terreno, passaram a ser os escolhidos para tomar a dianteira das operações mais arriscadas. Spínola dizia-lhes que, quando a guerra terminasse, seriam eles quem ficariam à frente dos desígnios da Guiné16.
Depois da independência e da retirada das tropas portuguesas, os guinéus que integraram as FAP foram considerados «traidores de raça e de classe» pelo novo Governo. Merece a pena ler as palavras do próprio Mário Sani:
Quando a guerra acabou fiquei contente, estava livre. Os portugueses não nos disseram nada, absolutamente nada. E deixaram aqui todos os papéis, todos os documentos com a nossa identificação, com os nossos nomes. O PAIGC viu aquilo e saiu à nossa procura. Se nos apanhassem, levavam-nos. Os portugueses traíram-nos, nós que os servimos fomos abandonados sem piedade. Fiquei em Bissau até 1976, tirei a carta de condução e comecei a trabalhar num táxi. Depois, vieram prender as pessoas pouco a pouco. O PAIGC pensava que os Comandos iam fazer uma revolta contra eles, mas isso nunca me passou pela cabeça nem um dia. (…)
Quando vi que as coisas estavam mais complicadas, fugi para Bafatá, planeava uma forma de atravessar para a Guiné-Conacri ou para o Senegal, mas não consegui. Prenderam-me em Bafatá e levaram-me de volta para Bissau. Perguntaram porque é que eu estava nos comandos, eu disse: «Não sei…»; Disseram: «Não sabes? Então vamos-te mostrar para saberes.» Pegaram-me pela camisa, tiraram-me as calças, deixaram-me nu como um recém-nascido. Amarraram-me as mãos atrás e deitaram-me dentro do abrigo. Fiquei lá até ao dia seguinte. Desamarraram-me, estava paralisado, não podia estender os braços, não podia caminhar. Em Bissau, fui para a Segunda Esquadra e depois para a Primeira Esquadra. Lá fiquei até me levarem para Caraxe.
Passei os anos de 1976, 77, 78 na ilha de Caraxe e, no final de 79, saí. Lá, tínhamos de trabalhar obrigatoriamente, lavrávamos, fazíamos agricultura e plantávamos o que comíamos: arroz, amendoim, batata… Era um centro de martírio. A mim, escangalharam-me todo. Recebi tanta pancada que perdi todos os dentes da boca, amarravam-me com uma corda e penduravam-me como um animal… Havia muitos prisioneiros dos comandos, muitos deles morreram lá. No dia que diziam «julgamento popular» já sabias que ia haver fuzilamentos. Obrigavam-te a cavar uma cova — tu é que cavavas o teu próprio buraco — onde os outros te iam enterrar quando fosses fuzilado. Depois de acabares, davam-te um tiro.
(…) Quando o PAIGC te apanhava, pegavam-te e marcavam-te com uma faca: vinham à prisão, metiam a faca no fogo até ficar quente e marcavam-te. Estás a ver? Este é o sinal da faca, estás a ver?
Só consegui escapar de Caraxe porque, como aprendi a dar injeções, trabalhava como enfermeiro a tratar das feridas, ao lado de um médico cubano. Foi ele quem me ajudou. Um dia fiquei doente, ele sentiu pena e mandou-me para Bissau. Quando cheguei a Bissau vi que estava livre e fugi. Nunca mais consegui parar em lado nenhum, a cabeça nunca mais ficou bem: fui para o Senegal, depois para a Guiné-Conacri, depois para a Costa do Marfim… No fim da guerra, tinha mulher e um filho, mas nunca mais vi a minha família, eles tinham medo que se soubesse que eram meus parentes. O meu filho faleceu em 2015, com 40 anos. Teve um acidente de mota e morreu17.
Em suma, se em Angola as tropas africanas acabariam por ser assimiladas no Exército angolano, e se em Moçambique os militares colaboracionistas foram obrigados a apresentar pedidos de desculpa públicos, através das Comissões de Verdade e Justiça, na Guiné-Bissau tudo seria diferente: abandonados pelo Estado português, o novo regime considerou-os uma ameaça nacional e muitos foram perseguidos, torturados e fuzilados.
Como refere Romualda Fernandes, atual deputada pelo PS na Assembleia da República,
os combatentes negros que lutaram ao lado do exército português não sabiam que, com isso, estavam a assinar a sua sentença de morte. O massacre desses guineenses, os fuzilamentos em campos de futebol, a que muitos familiares foram obrigados a assistir, é um dos capítulos mais terríveis da história da nova República da Guiné-Bissau. Depois das independências, o primeiro ato que não fez justiça a Portugal foi a lei da nacionalidade de 1975, que decidiu que só seriam portugueses os brancos que tinham laços de consanguinidade com os nascidos na Metrópole. Os restantes da população africana, para serem considerados portugueses, tinham de estar a residir em Portugal há cinco ou mais anos antes do 25 de Abril, e tinham de fazer prova disso. Esses poderiam manter a nacionalidade portuguesa, mas eram uma minoria muito reduzida. A vinda desses militares foi muito difícil, alguns refugiaram-se no Senegal, onde Léopold Senghor nunca apoiara diretamente a luta armada na Guiné18.
Romualda Fernandes já estava em Portugal há cinco anos quando se deu o 25 de Abril e pôde conservar a nacionalidade portuguesa. Não foi assim com o resto da família. Logo após o 25 de Abril, o pai teve de fugir para França, pouco antes de os militares terem ido a casa dele com o propósito de o fuzilarem.
Nascida em 1954, Romualda era filha de Nicolau Martins Nunes, um funcionário público na Caixa de Providência dos Funcionários Públicos da Guiné. Depois de concluído o Curso Comercial e o Curso de Ciências Económicas (por correspondência), Nicolau Nunes começou a sua carreira profissional como escriturário de 1.ª classe do quadro dos Serviços de Administração Civil e foi depois secretário da Câmara Municipal de Bolama.
Nessa altura, quando estalou a Guerra Colonial, foi capturado pela PIDE e mantido sobre prisão, durante alguns anos, em Bolama. A dada altura, foi transferido para Bissau, onde ficou numa cela contígua à de Rafael Barbosa, um dos fundadores da luta de libertação e defensor da via armada. Nicolau Nunes, que não pertencia ao PAIGC, era contra a resolução militar do conflito. Queria a independência e a autodeterminação — algo que, na sua opinião, era inevitável, face às pressões internacionais —, mas sem violência nem derramamento de sangue. Além disso, segundo ele, o modelo de independência defendido pelos movimentos de libertação não augurava nada de bom.
Saiu da prisão depois de Spínola ter aterrado na Guiné, para comandar a guerra. Diz Romualda:
Quando o meu pai foi libertado, Spínola instituiu a política da «Guiné para os guinéus». Ou seja, a Guiné tinha de ser dirigida para os guineenses. Spínola fez uma primeira reunião em que convocou todos os funcionários públicos da Guiné cujo grau fosse equivalente ou superior ao de secretário. Um dos poucos guineenses que apareceram foi o meu pai, os outros eram quase todos de origem cabo-verdiana. Os rostos da administração, e até da repressão, vinham sobretudo de Cabo Verde, onde já havia liceu. Por essa razão, em Cabo Verde já havia pessoas com formação para integrar os serviços administrativos, o que não acontecia na Guiné. Depois dessa reunião, o general Spínola chamou-o para ser nomeado Secretário-Geral da Caixa de Providência dos Funcionários Públicos da Guiné. Isto na altura em que foi criada na Guiné a Ação Nacional Popular. Nesse contexto, o meu pai fundou um movimento a que chamou «Liga dos Guinéus», de cuja Comissão Central foi presidente, que passou a funcionar dentro da Ação Nacional.
Nicolau Nunes era vice-presidente da Comissão Provincial da Guiné, pela Ação Nacional Popular (a qual faria parte na campanha «Por Uma Guiné Melhor»), quando o deputado pelo círculo da Guiné à Assembleia Nacional, James Pinto Bull, morreu num acidente de helicóptero. Nessa altura, continua Romualda,
o meu pai foi chamado para concluir esse mandato. Na eleição seguinte para a Assembleia Nacional, o Spínola propôs o nome do meu pai como candidato, mas o Governo de Marcello propôs outro guineense, que era médico, em quem teriam mais confiança, Joaquim Baticano. No entanto, o candidato que ganhou as eleições foi o meu pai. O Governo respeitou o resultado, até porque o Spínola estava do lado do meu pai e contava ainda com o apoio da comunidade islâmica da Guiné, a que pertenciam os Balantas, a etnia maioritária na Guiné. Isto apesar de o meu pai ser de outra etnia, os Papeis. Os Balantas, povo guerreiro, foram os que mais tardiamente se aproximaram do sistema educativo colonial e os que mais se envolveram na luta de libertação.
No início de 1972, Nicolau Nunes fez campanha eleitoral em Bissau, como candidato a deputado pelo círculo da Guiné, proposto pela Ação Nacional Popular. Escolhido em eleição suplementar, realizada a 26 de julho de 1972, para suprir, como vimos, a vaga aberta com a morte de James Pinto Bull, o pai de Romualda Fernandes iniciou funções a partir da 3.ª Sessão Legislativa. Nicolau Nunes instalou-se em Portugal no período que assistiu à chegada de centenas de trabalhadores cabo-verdianos, impelidos a abandonar o seu país devido às grandes secas de 1970 e 1971. Essas primeiras bolsas de imigrantes — aqueles que pela primeira vez foram considerados imigrantes em Portugal — dariam origem, por exemplo, ao Bairro 6 de Maio, na Damaia, que até há pouco tempo continuava a ser ocupado maioritariamente por cabo-verdianos.
Quando já ocupava o seu lugar na Assembleia Nacional, Nicolau Nunes providenciou a vinda de Romualda, para aqui prosseguir os seus estudos. Depois de frequentar o Colégio Andaluz, um internato de freiras localizado em Santarém (onde hoje funciona a Escola Superior de Educação), foi para o Liceu Maria Amália, em Lisboa, já com toda a família — pais e irmãos — a viver num apartamento em Benfica, junto ao Centro Comercial Fonte Nova: «Como o meu pai era deputado e morávamos em Benfica, nunca fomos maltratados nem sentimos, nessa altura, qualquer tipo de marginalização. O Eusébio ia a nossa casa convidar os meus irmãos para jogarem à bola. Mas nós éramos uma exceção.»
Durante esse mandato, Nicolau Nunes deslocou-se à Guiné na comitiva do ministro do Ultramar, na sua visita àquela ex-colónia. Repetindo mandato na 4.ª Sessão Legislativa (1972-1973) e na XI Legislatura (1973-1974), teve participação ativa na discussão dos problemas relativos à província da Guiné (nomeadamente, a aprovação do seu estatuto político) e bateu-se pela melhoria das relações entre os cidadãos de diferentes origens que compunham o Império português.
Com o 25 de Abril e a consequente anulação dos mandatos à Assembleia Nacional, o COPCON foi a casa da família de Romualda com a intenção de prender o deputado Nicolau Nunes, mas não o encontraram: Nicolau tinha conseguido fugir para a Guiné. Rapidamente, porém, percebeu que não podia permanecer na sua terra natal, caso contrário iria engrossar o rol dos fuzilados, e escapou para França.
O 25 de Abril libertou a hostilidade dos vizinhos de Benfica, onde Romualda, os irmãos e a mãe continuavam a morar. Na rua, diziam-lhes: «Vocês não são portugueses, voltem para a vossa terra, de onde expulsaram os brancos.» Com a nova lei da nacionalidade, de 1975, tornaram-se todos estrangeiros de um dia para o outro, exceto Romualda, que estava a estudar em Portugal há cinco anos.
Os documentos que tinham perderam validade e as instituições marginalizaram-nos:
Havia tratamentos diferentes em relação aos retornados brancos. As pessoas negras que vieram para cá sentiram que não eram tratadas da mesma maneira que a população branca, que em muitos casos conseguiu resolver as suas situações. Não nos podíamos dirigir às instituições de apoio, pois éramos considerados estrangeiros. Não tínhamos acesso aos apoios disponíveis. Tivemos de lutar pela nacionalidade e pela sobrevivência. A minha mãe começou a arrendar quartos na casa de Benfica, graças a isso conseguimos aguentar-nos. Mas durante esse período houve outros apoios, gerou-se um movimento de solidariedade entre familiares, surgiram redes de entreajuda entre os que já estavam em Lisboa, que conseguiram conservar a nacionalidade, e os que a tinham perdido. Nesta última situação havia muitos angolanos, cabo-verdianos, moçambicanos e guineenses, na totalidade negros, com quem os retornados, apesar de partilharem connosco alguns problemas, nunca se quiseram relacionar. Foi criada a Associação Luso-Africana de Solidariedade Social (ALAS), que organizava cotizações para se entreajudarem. Participámos no primeiro processo de regularização extraordinária, para pessoas que não tinham qualquer tipo de documentos, muitas das quais antigos funcionários públicos, como os enfermeiros guineenses que tinham feito os seus cursos de enfermagem durante a época colonial. Foi preciso regularizar esses diplomas, para que pudessem voltar a exercer. A ALAS ajudou muita gente a obter os documentos necessários, incluindo os requerimentos para obtenção da nacionalidade, junto dos serviços da Administração Interna. O meu pai voltou a obter a nacionalidade portuguesa passados cinco ou seis anos, em 1980, altura em que lhe foi concedida finalmente a reforma.
Uma Lei Racista?
A denominada «Lei de Almeida Santos», de 1975, determinava que apenas aqueles que conseguissem provar que eram portugueses — demonstrando que tinham ascendência portuguesa — teriam acesso à nacionalidade portuguesa. Mesmo se na teoria isso nunca foi claramente assumido, o objetivo da lei era excluir da sociedade portuguesa todos os negros que pretendiam vir para Portugal após o processo de descolonização, ou que aqui residiam há menos de cinco anos (o mesmo não se aplicou aos asiáticos, já que a lei abriu uma exceção para eles). Foi essa a consequência, na prática, do Decreto-Lei 308-A/75, de 24 de junho.
Em 1977, o Diário de Notícias publicou algumas notícias dando conta da contestação à definição de nacionalidade portuguesa consagrada naquele diploma legal. Alguns retornados exigiram que fossem incluídos os «ex-funcionários ultramarinos que se tenham distinguido pela sua lealdade e portuguesismo, e naturais das ex-colónias cujo regresso ao respectivo novo país envolve risco atendível de saúde ou outro».
No mesmo ano, houve quem defendesse a «revogação do decreto gonçalvista que restringe a nacionalidade portuguesa até ao 3.º grau de cidadão nascido em território português da Europa». No ano seguinte, algumas associações de retornados voltaram a exigir a revogação do decreto-lei que veio regulamentar as condições de acesso à nacionalidade, por o considerarem um «despacho racista num Estado democrático».
Para o provar, lembravam a discriminação que consistia em permitir que os cidadãos do ex-Estado da Índia portuguesa preservassem a nacionalidade portuguesa, ao passo que aqueles que tinham nascido nos restantes territórios colonizados por Portugal, apenas porque não eram descendentes de brancos, ficavam impedidos de a manter.
Convém relembrar — não vá alguém esquecê-lo — que, segundo o artigo 4.º deste decreto-lei, perdiam «a nacionalidade portuguesa os indivíduos nascidos ou domiciliados em território ultramarino tornado independente que não sejam abrangidos pelas disposições anteriores». E quem é que estava abrangido pelos três primeiros artigos? Desde logo, os domiciliados nas ex-colónias que tivessem nascido em Portugal continental e nas ilhas adjacentes (e respetivos descendentes até ao terceiro grau), bem como os nascidos no antigo Estado da Índia que declarassem querer conservar a nacionalidade portuguesa. Conservavam ainda a nacionalidade os nascidos em território ultramarino tornado independente que estivessem domiciliados em Portugal continental ou nas ilhas adjacentes há mais de cinco anos em 25 de Abril de 1974.
Almeida Santos, o mentor da legislação em apreço, ter-se-á inspirado nos casos holandês e francês: também os governantes desses países haviam recusado a cidadania aos seus soldados coloniais, originários das Molucas e da Argélia. Após a independência deste último país, em 1962, uma larguíssima parte dos nativos argelinos que tinham combatido ao lado do exército francês — os harkis — foram impedidos de entrar em França. Consequentemente, milhares foram massacrados pelo movimento nacional de libertação argelino.
A intenção da lei da nacionalidade de 1975, segundo o próprio Almeida Santos, era evitar «que viessem todos», de contrário, «um milhão ou mais de pessoas aflitas» viria para Portugal e «o país ia ao fundo». Portanto, a decisão foi deliberada e explicitamente assumida por Almeida Santos: «Era tudo português. Mário Soares e Vasco Gonçalves pediram-me uma lei generosa. Respondi: “Não faço.” Só tinha nacionalidade portuguesa quem pelo menos era bisneto de português pelo nascimento.»
Em apoio daquele decreto, Almeida Santos mencionava ainda o caso inglês como paradigma a evitar. Na sua opinião, a lei da nacionalidade inglesa, suscitada pela independência da Índia em 1947, tinha sido «generosa de mais e Londres tornou-se a capital mais indiana». Por causa dessa generosidade, justamente, a lei seria revogada pouco tempo depois. O objetivo, segundo Almeida Santos, era conceder a nacionalidade apenas «a alguns e evitar que viessem todos», já que «metade do Exército, por exemplo, era africano, e esses soldados queriam ficar com a identidade portuguesa para não serem perseguidos por terem sido do Exército português.»
Ao sugerir que Lisboa se poderia tornar a capital mais africana da Europa — é essa a lógica subjacente ao seu pensamento —, Almeida Santos não contribuía para a formação de opiniões esclarecidas, nem ajudava a refrear os ânimos da população. O mesmo ocorria com outros governantes. Numa reunião do Conselho da Revolução, o então primeiro-ministro, José Pinheiro de Azevedo, manifestou ao responsável pela pasta da Cooperação, Vítor Crespo, apreensão pelo facto «de estarem a chegar na ponte aérea muitas pessoas de cor preta».
Posteriormente, Paula Teixeira da Cruz, retornada nascida em Luanda, em 1960, e ex-ministra da Justiça, pelo PSD, no XIX Governo Constitucional, criticou a visão restritiva em que assentou a lei da nacionalidade de Almeida Santos. Segundo ela, deveria ter havido liberdade de opção, «não gosto de restrições de liberdade». Discordando do argumento segundo o qual Portugal, caso tivesse sido mais magnânimo, arriscar-se-ia a abrir a porta a mais de um milhão, Teixeira da Cruz lembra que «também se dizia que era impossível absorver 500 mil» e que as limitações consagradas na lei não impediram muitos milhares de africanos, das populações locais, de virem para Portugal continental. Em face disso, «houve pessoas que ficaram prejudicadas. Havia essa responsabilidade moral [de Portugal lhes reconhecer o direito a serem portugueses]. Quando Portugal colonizou, não perguntou se podia entrar [em África].»
Embora o decreto-lei não contivesse na sua letra qualquer categoria explicitamente étnica ou racial, o certo é que as definições administrativas nele contidas assentavam, de modo implícito, num pensamento racializante. Enunciada para parecer neutra, a legislação teve efeitos bem reais em pessoas de origem africana que, apesar de portuguesas, foram despojadas da sua nacionalidade, dando assim início ao problema da imigração africana ilegal, cujas primeiras vagas, apesar de em muitos casos coincidirem com a chegada dos retornados brancos, foram geradas pelas restrições da lei de nacionalidade de 1975.
Ao impor novas restrições no que dizia respeito à nacionalidade, através da adoção de um critério implicitamente étnico, o Governo de Portugal reconhecia, por um lado, que a anterior nacionalidade das populações locais era uma nacionalidade de fachada e, por outro, que a unidade do Império — a célebre indivisibilidade territorial da metrópole e das colónias — nunca existira. Numa palavra, que os discursos da integração e da natureza múltipla da identidade portuguesa, da coexistência e da assimilação, não passavam de retórica política.
Êxito total da integração?
Não se sabe ao certo quantos indivíduos com ascendência africana, não brancos, conseguiram manter a nacionalidade portuguesa. Algumas estimativas, porém, consideram que o total de retornados não brancos oscilaria entre os 25 mil e mais de 50 mil indivíduos (Portugal continuou a encorajar a emigração para a África ocidental e oriental portuguesa — Angola e Moçambique — nas décadas de 1950 e 1960).
Fosse assim ou assado, o certo é que a população dos retornados, apesar de constituída maioritariamente por indivíduos brancos, incluía também um número significativo de negros, de mestiços (sobretudo de Cabo Verde) e de indianos (principalmente hindus, católicos e muçulmanos de ascendência goesa provenientes de Moçambique). Não deveriam também eles ser considerados retornados? Porquê confinar a população de retornados considerando apenas os brancos, como está implícito naquele substantivo?
Antes do início da Ponte Aérea (maio de 1975), todos os que se queriam declarar portugueses, fossem brancos, negros ou mestiços, podiam fazê-lo; depois dessa data, com a nova lei, tal generosidade desapareceu. Isso não impediu que continuassem a chegar a Portugal, das ex-colónias, africanos negros que não preenchiam os requisitos exigidos pela nova lei da nacionalidade, os quais passavam agora a ser considerados imigrantes: os que vieram e não conseguiram provar que tinham ascendência na metrópole até à segunda geração foram rotulados como imigrantes. De modo a fechar o acesso à condição de português, Almeida Santos retirou o direito à nacionalidade portuguesa a todos aqueles que, apesar de terem nascido nas colónias antes das independências, não tinham ascendentes, até à segunda geração, no continente. Foi isso que estabeleceu uma distinção entre os retornados brancos e os africanos negros que vieram nos anos subsequentes às independências, tornando-se assim imigrantes. A partir deste momento, a categoria de imigrantes, quantificada nas estatísticas oficiais, passou a incluir os residentes provenientes das antigas colónias africanas.
Em 2021, ainda havia africanos das populações locais que, tendo vindo para Portugal em 1975, continuam à espera da concessão da nacionalidade portuguesa. É o caso de Maria do Céu da Cunha (conhecida como Tia Céu), a fundadora e responsável pela associação de solidariedade social Sol Fraterno, sediada em Oeiras.
Nascida em Angola, Maria do Céu viajou ainda criança para Portugal com a mãe (oriunda da localidade de Maria Teresa, a cerca de 25 quilómetros de Luanda), o padrasto (um português branco que combatera na Guerra Colonial) e os quatro irmãos (filhos do padrasto e da mãe). Maria do Céu, que nunca conheceu o pai — natural de Malanje —, tinha dois anos quando a mãe, então viúva, iniciou um novo relacionamento sentimental.
Maria do Céu, a mãe, o novo companheiro e os quatro irmãos partiram para Portugal no dia 11 de novembro de 1975, porque o padrasto começou a ser perseguido pelo MPLA:
Viemos embora só com a roupa do corpo, nem documentos trouxemos. O meu padrasto teve problemas, quando os portugueses começaram a ter problemas. Os portugueses maus, entenda-se, porque os portugueses que sempre trataram bem os negros foram defendidos por estes, esconderam-nos. O meu padrasto, como pertencera ao Exército português, foi perseguido. No aeroporto fizemos a guia de desembaraço. Quando chegámos a Portugal esse era o único documento que tínhamos connosco. Ficámos a dormir no aeroporto da Portela, que estava cheio de gente. Quem nos dava comida era a tropa portuguesa, comíamos ração de combate.19
Entretanto, foram todos destacados para uma pensão no Algarve, em Albufeira:
Ficámos na pensão Capri, que ainda existe. Fomos vários grupos, brancos, negros, quase nenhuns indianos. Éramos bem tratados na pensão, ainda guardo o cheiro da manteiga Primor que nos davam para barrar o pão de manhã. A população de Albufeira já não nos tratava tão bem. Havia desconfiança das pessoas em relação aos negros, até na igreja, porque nós íamos à missa. Eu fiz em Albufeira a primeira comunhão.
Na escola de Albufeira, lembra, ela e os irmãos sofreram muito. Os colegas punham-nos de parte no recreio, havendo até pais que diziam aos filhos «Não te quero ali com aquela preta.» Na catequese, «os catequistas olhavam-nos de lado, ensinavam que éramos todos iguais, que Jesus era também diferente, que tínhamos de nos amar uns aos outros.»
De dois em dois anos, a família — a mãe, o padrasto e os irmãos — era obrigada a mudar de sítio, tinha de ir para outra terra, o que obrigava as crianças a mudarem de escola e a fazerem novos amigos, recomeçando tudo. Durante essa época, viveram em Faro, Lagos (no parque de rulotes), São Brás de Alportel, Silves (na Pensão Central). Nas férias grandes, no verão, tinham de trabalhar. Em Silves, por exemplo, trabalharam na apanha da alfarroba, da amêndoa, das uvas, etc.
Sobre o padrasto, que não estava casado com a mãe, revela que «Era muito mau, batia muito na minha mãe, bebia muito. Nós víamo-lo a maltratar a nossa mãe sem podermos fazer nada. Ficávamos felizes quando ele vinha para Lisboa trabalhar e nós ficávamos no Algarve.»
Em Lisboa, o padrasto foi construindo uma barraca de madeira, em Linda-a-Velha, no Vale do Jamor. No início da década de 1980, quando a casa ficou concluída, foram todos viver para ali, para a estrada da Rocha, do outro lado da rua, junto ao Estádio Nacional, onde se tinha instalado um grupo grande de timorenses:
Éramos sete na barraca, cinco filhos e o casal. Naquela zona havia brancos, negros, timorenses, moçambicanos, indianos, era uma salada russa. Depois havia muitos bairros, só no concelho de Oeiras havia dez bairros de barracas. Nós estávamos no Vale do Jamor, onde fomos felizes, na medida do possível, e havia outro bairro, no Alto de Santa Catarina. Também havia muita gente que nos olhava de lado. O Balteiro era o bairro dos timorenses, feito pela Cruz Vermelha. No nosso bairro tínhamos de aquecer a água nos baldes de tinta, com uma resistência elétrica por baixo, ligada a uma tomada. Depois tomávamos banho com uma caneca, com que tirávamos a água. A minha irmã mais nova sofreu muito com a asma. Levei-a muitas vezes ao hospital da Estefânia, com ataques de asma. Éramos personas non gratas, muita gente olhava para nós de lado. Só uma pessoa é que tinha telefone em todo o bairro. Quem queria telefonar ia lá, pagava, a dona cobrava por impulso. A minha mãe é analfabeta, mas agora já sabe assinar.
Por causa de uma discussão com o padrasto, num domingo de Páscoa, Maria do Céu saiu de casa:
A minha irmã mais nova partiu uns copos e o meu padrasto preparava-se para lhe bater e eu meti-me no meio. Ele era extremamente nervoso. Fiz queixa na GNR, que o veio buscar. A minha mãe ficou furiosa comigo. Fui viver para o Balteiro, no Vale do Jamor, para casa de um timorense. Depois, comprei no Balteiro uma barraca pequenina para mim. Fui pagando aos poucos. Passados uns meses, a minha mãe deixou o meu padrasto e foi viver comigo, com os meus irmãos. Éramos felizes, porque as portas estavam sempre abertas. Os vizinhos cuidavam das crianças. Havia muita entreajuda, coisa que deixou de se ver nos prédios. Tínhamos os nossos drogados, como o Zé do Brinco, que tinha os cabelos em rasta, era cabrito. Sabíamos que roubavam, mas lá no bairro nunca roubavam.
Maria do Céu trabalha desde criança muito nova. Quando vivia no Jamor, foi para a Cabeleza, uma empresa que fabricava cabos elétricos para as grandes marcas:
Sempre gostei de trabalhar, fazia muitas horas, e comecei a ganhar muito dinheiro. Foi com isso que paguei a barraca no Balteiro. Concorri a vários trabalhos, mas em muitos sítios nem sequer podíamos entrar, porque diziam que eram só para os brancos. No Algarve, em muitos restaurantes não nos deixavam entrar, porque éramos pretos. Recusaram-me várias vezes trabalho apenas por ser preta. Quantas vezes. Isto ainda há dez anos. Mas éramos obrigados a seguir em frente. Magoa, porque somos iguais aos outros, se abrirem aqui uma veia o sangue é igual. Foi uma batalha, uma guerra. Sempre tive dois empregos, ajudei a minha mãe a criar os meus irmãos. Os negros nunca são os escolhidos, quando há brancos também a concorrer a um trabalho. Isto cria-nos uma insegurança enorme. Vales menos, como já ouvi dizer, tu estudaste? É raro o negro que tenha estudado, quanto mais acabar os estudos. De uma certa forma põe-nos sempre à parte. Enquanto o português branco só tem de fazer, o negro tem de fazer e fazer bem. Nós crescemos sempre a ouvir que o preto é burro, é preguiçoso, vem lá da cubata, e quando encontram uma preta que fala bem as pessoas ficam admiradas. Estudaste até onde? Eu tenho o 9.º ano, não fui para a universidade porque eu sempre trabalhei muito. Comecei a trabalhar na cozinha, a limpar, a varrer, a lavar as casas de banho, os trabalhos mais baixos eram para a preta, porque era mesmo assim. Sempre cresci com esse estigma. Sempre fui caminhando. Até que consegui trabalho na Câmara de Oeiras, onde fui subindo, sobretudo na consideração das pessoas, dos vereadores, todo o departamento da Câmara. Subi, subi, sempre à minha custa, e subi sem me deitar com ninguém, porque para se subir, durante esses 20 anos, tinhas de ir para a cama com o chefe, com o diretor. Na Câmara fui sempre bem tratada pelos chefes. Passei a estar nos eventos da Câmara, a servir os coffee break. Fiz muitas horas, nunca dizia que não, nunca me recusei. Há serviço para fazer? Eu faço. Estou muito agradecida à Câmara, porque me deitou a mão.
Sobre a discriminação, Maria do Céu recorda as temporadas em que a família ia até Lamego, onde vivia a família do marido, branco angolano, retornado como os pais:
As pessoas tocavam-nos na pele para ver se a tinta saía. Estávamos em Lamego, porque os meus sogros são de Lamego. Na altura eu estava grávida da minha filha mais nova, que tem hoje 20 anos. Fomos a um concerto do Tony Carreira e quando eu vinha a descer a ladeira, as pessoas, isto há 20 anos, ficavam paradas na rua a olhar para nós. Alguém avisava os outros e todos os lojistas se punham especados à porta para me ver. «Vem aí a preta», diziam. Mas eu passava e, como sou, abanava-me toda, grávida e tudo, com a minha minissaia. Era um escândalo. As pessoas não estavam habituadas, ficavam na porta do café a espreitar como se eu fosse um bicho estranho, isto já em 1998. Olhavam-me com curiosidade, algumas pessoas pediram-se para tocar na minha pele, diziam «Ah, nunca tinha visto…»
Quando vieram para Lisboa, começou a saga. Como Maria do Céu precisava de bilhete de identidade para poder inscrever-se na escola, o padrasto procurou regularizar a situação da enteada. Os irmãos, apesar de terem nascido em Angola, obtiveram de imediato a nacionalidade, pois eram filhos de sangue do padrasto de Maria do Céu.
A história ainda hoje produz alguma irritação em Maria do Céu:
Estou em Portugal desde 1975. Sempre paguei impostos, mas ainda não tive direito à nacionalidade. Eu nasci sob a bandeira portuguesa, porque é que me pedem o registo de Angola? Depois de tantos anos seguidos a viver e a residir cá, as autoridades arranjam sempre desculpas para não me darem a nacionalidade. Por causa deste ou daquele documento. Porque tenho de pedir a contagem, porque não vivo cá há cinco anos, porque caducou um documento e, por isso, todos os anos para trás são anulados, o que implica recomeçar a contagem dos cinco anos. Comecei com um tutor, o Paulo Vistas, o presidente da Câmara de Oeiras, e a esposa. Eles é que são os meus tutores, isto não é normal. Eu tenho 50 anos, quatro filhos portugueses, vivi 16 anos com um português, que é o pai dos meus filhos, que faleceu há 11 anos, e eu para estar em Portugal tenho de ter um tutor, porque estou desempregada. Se não tivesse um tutor mandavam-me para o meu país de origem, o país de onde saí com cinco, seis anos. A minha mãe, por exemplo, só conseguiu a nacionalidade em 2016.
A questão que se levanta, neste ponto, é a seguinte: não deveria Maria do Céu, como muitos outros na mesma situação, apesar de todos os impedimentos legais, ser incluída nas análises sobre os retornados? Incluir os não brancos na categoria de retornados (a maioria deles sem redes familiares e sem acesso aos apoios públicos) é heuristicamente fecundo.
Além de questionar a ideia feita de que os retornados eram todos brancos, isto permite-nos pôr em causa a ideologia do êxito da sua integração. Para os defensores do discurso lusotropicalista da boa assimilação dos brancos oriundos de África, falar de retornados não brancos retira distinção ao conceito (capacidade de adaptação e de correr riscos, empreendedorismo, etc.). Por outro lado, chamando-se a atenção para esses retornados não brancos, muitos deles a viver em bairros degradados, alguns ainda à espera de que lhes seja concedida a nacionalidade portuguesa, com baixíssimos níveis de escolaridade e em situação de desemprego persistente, ou a desempenhar tarefas desprovidas de dignidade laboral, demonstra-se concludentemente que, para esses, a integração não foi tão exemplar como sugere o estereótipo da propensão especial dos portugueses para se miscigenarem e acolherem pessoas de outras culturas.
Por outras palavras: se incluíssemos todos os retornados negros e mestiços, bem como estes imigrantes da segunda metade da década de 1970, poder-se-ia continuar a dizer que o êxito da integração dos retornados foi total?
- 1. Rui Manuel Moura Ramos, «Nacionalidade e Descolonização (Algumas Reflexões a propósito do decreto-lei n.º 308-A/75, de 24 de junho)», Estudos de Direito português da Nacionalidade, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, pp. 63-128.
- 2. João Paulo Guerra, Os Flechas Atacam de Novo, Lisboa, Caminho, 1988, p. 58.
- 3. Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso, Guerra Colonial, Lisboa, Editorial Notícias, 2000, p. 339. Veja-se também Carlos de Matos Gomes, «A Africanização na Guerra Colonial e as suas sequelas. Tropas locais — os vilões nos ventos da História», em Maria Paula Meneses e Bruno Sena Martins (orgs.), As Guerras de Libertação e os sonhos coloniais: alianças secretas, mapas imaginados, Coimbra, Almedina, 2013.
- 4. Fátima da Cruz Rodrigues, «A desmobilização dos combatentes africanos das Forças Armadas Portuguesas da Guerra Colonial (1961-1974)», Ler História, n.º 65, 2013, p. 113.
- 5. José Freire Antunes, A Guerra de África: 1961-1974, Lisboa, Temas e Debates, Vol. 1, 1996, p. 398.
- 6. Fernando Cavaleiro Ângelo, Os Flechas: A Tropa Secreta da PIDE/DGS na Guerra de Angola (1967-1974), Alfragide, Casa das Letras, 2017; John P. Cann, Os Flechas: Os Caçadores Guerreiros do Leste de Angola, 1965-1974, Parede, Tribuna da História, 2018.
- 7. John P. Cann, Contrainsurreição em África. O modo português de fazer a guerra, São Pedro do Estoril, Arena, 1998, pp. 220-227.
- 8. Rui Camacho Duarte, Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização, dissertação de Mestrado em História Moderna e Contemporânea — Relações Internacionais, Policopiado, ISCTE/Instituto Universitário de Lisboa, outubro de 2010.
- 9. Fátima da Cruz Rodrigues, op. cit.
- 10. Eduardo Pitta, Uma Rapaz a Arder. Memórias 1975-2001, Lisboa, Quetzal, pp. 30-31. Há um romance do historiador e escritor moçambicano João Paulo Borges Coelho que aborda o tema dos campos de reeducação: Campo de Trânsito, Lisboa, Editorial Caminho, 2007. Sobre esta obra, veja-se, por exemplo, Rosilda Alves Bezerra, Francisca Zuleide Duarte de Souza, João Batista Teixeira, «Campos de reeducação em Moçambique: a ficcionalização da história em “Campo de trânsito”», Revista Mulemba, 10 (18), junho de 2018, pp. 138-150; ou Nazir Ahmed Can, «Para além da História: Campo de Trânsito de João Paulo Borges Coelho», Via Atlântica, 16, dezembro de 2009, pp. 105-117.
- 11. Elísio Manuel Fernando Jossias, Entre a colónia e a nação: moçambicanos deficientes físicos das Forças Armadas Portuguesas, dissertação de Mestrado em Antropologia, Policopiado, Lisboa, ISCTE, 2008, p. 32.
- 12. Fátima Rodrigues, (2012), Antigos Combatentes Africanos das Forças Armadas Portuguesas. A Guerra Colonial como Território de (Re)conciliação, tese de doutoramento, Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Policopiado, 2012, pp. 174-190.
- 13. Segundo Manuel Amaro Bernardo (em Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros. Guiné 1970-1980, Lisboa, Prefácio, 2007), ter-se-á colocado a hipótese de acolher em Portugal os comandos guineenses.
- 14. Segundo Manuel Amaro Bernardo (em Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros. Guiné 1970-1980, Lisboa, Prefácio, 2007), ter-se-á colocado a hipótese de acolher em Portugal os comandos guineenses.
- 15. Decreto n.º 17/77, de 7 de janeiro, que aprovava o Acordo Especial entre a República Portuguesa e a República da Guiné-Bissau Relativas às Pensões Devidas por Serviços Prestados às Forças Armadas Portuguesas.
- 16. Excertos do testemunho incluído na tese de doutoramento que Sofia da Palma Rodrigues está a realizar em Pós-Colonialismos e Cidadania Global, no Centro de Estudos Sociais da Universidade da Coimbra. DOI: https://www.esquerda.net/dossier/comandos-africanos-os-portugueses-trair... (consultado em 30 de dezembro de 2020).
- 17. Sofia da Palma Rodrigues, idem.
- 18. Romualda Fernandes, entrevista realizada em 6 de abril de 2018.
- 19. Entrevista a Maria do Céu, Oeiras, 7 de abril de 2018. Todas as citações de Maria do Céu provêm desta entrevista.