Fuckin'Globo VII I LUANDA

Dezasseis artistas e um colectivo – Kiluanje Kia Henda, Pamina Sebastião, Mussunda Nzombo, Verkron, Indira Grandê, JaliyaThe Bird, Adriano Kangombe, Maria Gracia Latedjou, Yola Balanga, Thô Simões, Iris Chocolate, Flávio Cardoso, Mwana Puó, Toy Boy, Elena Uambembe, Indira Mateta e Rui Magalhães – aproveitando a energia e as histórias do lugar decidem cada um a sua maneira e com os meios que escolheram explorar as encruzilhadas com que se enfrentam.
Os dilemas e as encruzilhadas são vários: entre o tempo, as identidades sociais ou sexuais e os afectos, entre os hábitos e os costumes e o politicamente correcto, entre a verdade his-tórica e a ficção histórica, entre o preto e branco e as cores, entre os silêncios, as falas e as memórias individuais e os sons da cidade, a abundância e as carências, entre o homem e a natureza, entre outras.
Com trajectórias feitas nos últimos vinte anos e ou ainda a  começar, com interrogações pertinentes que corporificam o necessário distanciamento dos registos impostos, ou o seu posicionamento a propósito das escolhas e condições mais íntimas (Pamina Sebastião), eles são artistas que, como acontece hoje com qualquer cidadão, em Angola e no mundo de hoje estão a meio caminho de qualquer lugar, mas não necessariamente longe de si mesmos.
Interessa-lhes que saibamos o que entendem por privacidade, por a exposição mediática e estar entre as paredes da casa, como captam os sons da rádio ou o dos écrans, do computador ou da televisão, numa espécie de panóptico, a procura do viés apropriado para uma ideia (Flávio Cardoso), entre os silêncios, as histórias e os gestos criativos primordiais para, de certa forma, libertarem-se todos os dias: estes são alguns dos temas que estes artistas exploram nas suas pesquisas artísticas.
O que além do mais é interessante, é que eles são artistas sensíveis à realidade: por vezes parecem absortos numa recordação (Indira Mateta), atraídos por um documento ou pela maneira como ciclos sociopolíticos são forçosamente impostos (Rui Magalhães), por um acontecimento político polémico com profundas repercussões sociais (Mussunda Nzombo), por um objecto ou pela fala de um correligionário (Maria Gracia Latejou): eles pretendem fixar o que lhes seduz, o que lhes perturba ou o que, simplesmente, não lhe deixa indiferente.
Eles sentem-se atraídos por um futuro que ainda cá não está (Verkron): interessa-lhes o quotidiano (Thô Simões), o espectro cromático do espaço público da cidade de Luanda (Íris Chocolate), daí não fugirem à possibilidade de pensar a realidade desde a interdisciplinaridade artística, enfatizando os processos criativos, que expandem o pensamento no contínuo processo de construção de linguagens.
Nos quartos, o espectador poderá interagir com obras não preocupadas, não somente com o estético em si (como fim último da Arte), mas antes de tudo, com a forma-linguagem através da qual a “abertura” da obra se torna acessível ao espectador: eles fazem instalações, vídeo-performances, criam ambientes e trabalham a arte de acção processual e efémera que condensam complexos processos de criação e investigação em Arte, com métodos de trabalho vinculados há categorias teóricas e conceituais específicos. É notória a colaboração entre disciplinas artísticas, hibridismos que desafiam categorizações pré-estabelecidas.
Quem estiver mesmo curioso não deixe de ir, na quinta-feira, ao Hotel Globo, em Luanda: estes artistas são atrevidos. Uns pretendem ocupar-conquistar o espaço, outros deixaram de romantizar sobre o exotismo, preferindo enfrentar os dilemas das realidades que os circundam.
Este grupo de dezasseis artistas e um colectivo prefere explorar as questões mais íntimas, os problemas sociais mais graves, as conversas menos feitas, os modos de ser e de estarem proibidos, as formas e os estilos de fazer mais ousados ou os menos esperados: por todas estas razões é que esta VII edição do Fuckin Globo deve merecer a nossa atenção, ela mostrará outras pulsações da arte contemporânea que se vai fazendo aqui e agora.
* Com Adriano Kangombe

Publicado originalmente no Jornal de Angola, a 17/8/2021

por Adriano Mixinge
Vou lá visitar | 23 Agosto 2021 | arte contemporânea angolana, Fuckin'Globo, luanda