Figuras d'Mindel – Djunga Fotógrafo

Foto dos anos 60, gentilmente cedida por Jorge Martins. Nhô Djunga, no Albergue, com as criançasFoto dos anos 60, gentilmente cedida por Jorge Martins. Nhô Djunga, no Albergue, com as crianças

Sr. Presidente de Cambra,

 

Eu venho dizer você come na porta de meu casa tem um degrau de scada que não tem condição de gente pôr pé. Se você quer saber onde eu mora, você vai na rua de Nha Rosa das Seca, você sobe naquêl muntim que sta na fim de rua, você pergunta quês gente que mora lá, pamode eu sou uma senhora de posição que tude gente conhece. Eu sei como você ê um home que tem juize na cabeça, e por isso você manda ranjar quel degrau de scada de sacada para eu não quebrar meu nariz naquel degrau de scada.

 

Deus defenda se eu vai ter prigo naquel degrau de scada! Eu sou pessoa pra dar você um rabencada de pedra na fio de canela. Você não pensa que eu tem medo de você. Eu não tem medo de você, nem de nenhum gente de Cambra. Se eu quebrar meu nariz naquel degrau de scada, você não passa sabe com eu; se você não sabe quem eu é, você pergunta tude gente de Sanvecente. Eu sou um senhora fina, graças a Deus, mas tambem eu sabe ser desaforada pra quem pisa meu cale. Vocês não sabe pensar, naquel Cambra de nô sê que diga! Se eu não era um senhora que tem iducação, eu mandava vocês tude pra bardamerda.

Vocês quer é boa vidinha na Baía das Gaitas, mas era melhor se vocês mandava ranjar degrau de scada de cada um.

Você disculpa, mas é assim que eu é. Eu fala clare tudo quanto eu pensa na meu coraçom. Se vocês não manda ranjar quel degrau de scada depressa, eu pede praga e meu praga velha pega.

Vocês tem fazide só asnera nês terra de porcaria; morada stá intupide de tude casta de porcaria que chuva trazeu, pamode vocês acabou com riguim. Tude merda que vinha de fora corria na riguim e calçada de rua ficava limpe. E você sabe come tude gente vai baxar trás de casa de gente, pamode pliça já acabou na Sanvecente. Se vocês tinha olho na cara, vocês via come tude stá largade na pôc respeite. Agora só falta gente fazer asnera na meie de rua. Desafor!

Vocês sta dar mandrongue mais consideração que gente de nôs terra, pamode vocês stá intepide de medo duns pliça de Lisboa qu’els chama Pide. Sanvecente já acabou na nada! N’aquês tempe antigue tude cosa era fazide nas direita. Mas agora, tude gente grande, de posição, stá desnortiada. Até senhor Governador, hôme de grande posição, que tem seu peite renquiode de midalha, moda rei de nôs terra, já desnortiou tambê. Els disse como senhor Governador ê nôs pai, mas ê um pai que não vale a pena. Els disse como senhor Governador mandou trazer uns português de Lisboa pra trabalhar na strada das ilha, mas tude pove disse come quês português que veio de Lisboa ê um casta de gente que só quer encher barriga, pamode chuva stá stragar tude strada quês tem fazide. Els disse eu tambem que seu governador btou discurse na ilha de Fogo aonde el disse como quês português tem curso de strada, e se chuva levou strada pa mar, els não tem culpa pamode chuva foi muite forte. Mas agora el manda ramendar tude pra ficar uma coisa más forte. (Ma pêl bem de céu) Els disse eu come tude pove de Santantão stá muite gravode, pamode quês português que tem curso de strada tem gastode dinher cma area naquel terra mas gente ainda não viu resultade de benefíce. Eu recebi um carta de Santantão aonde els manda dizer eu como quês português sta stragar um porrada de conte de reis pa fazê um escola fina que até gente faz sirvice pxada pa linha.

Senhor Governador disse come Lisboa ê que manda dinher, mas el não disse come Lisboa que manda quês português pra vir levar quel dinher trovês. Que Deus manda chuva pra els ver rasultode de seu service. Se senhor Governador tinha vergonha na cara, el mandava racambiar tude quês português de Lisboa. Se ês cria bem de nôs terra, ês mandava quel data de dinher, sem português de Lisboa, e gente das ilha trofegava nele. Nhô Manel Damechó disse come quês dotor d’hospital disse come senhor Governador stava tacode dum doença muite perigosa quê chamada doença técnica. Senhor Governador mandou chamar senhor Dr. Fonseca para fazer ele operação, mas senhor dotor Fonseca disse come el não põe faca pamode não sabe se quel doença stá na cabeça ou na barriga. Boca de pove disse como senhor Governador stá pegar mute gente quel doença.


Senhor Presidente, você toma muite cuidade com o seu engenher de Cambra pamode el não conhece pobréza de nôs terra e sta tacode de mesma doença que senhor Governador. Mesme quel conhece pobréza de nôs terra, el só vai stratar de riqueza de seu gilbera. Ele vai ric pra Lisboa e deixa você na mau posição.

Nunca português de Lisboa ranjou tante nota na nôs terra cma agora! Agora que estou a ver pamode quês gente de Angola tem quês português tromentode. Senhor Salazar, quel quê Rei de Lisboa, disse come tude português que vai pra terra d’África vai pra ensinar amor na nome de Cristo. Mas ê mentira, pamode se els ia na nome de Cristo, desde quel tempe antigue atê hoj-im-dia, ês tude, branco e prete, já era irmão; stava tude na mesma camada.

Els disse eu como senhor Governador vai mandar um tal senhor Bento Levy pra Lisboa aonde ele vai sirvir de recador de gente das ilha, mas el vai ê defender seus asnera diante de um tal senhor Salazar que ê Rei de Lisboa. Pove das ilha não queria senhor Bento pra recador, el queria era senhor engenher Fonseca, mas senhor Governador disse come sr engenher Fonseca não pôde sirvir pamode el fala muite clare. Ele só quer na Lisboa ê gente mude que não pode falar o qu’ele pensa na seu coraçom. Nhô padre disse, diante de eu, come senhor Bento stá falar mentira, pamode el não podia benzer judeu pesode, quanto mais judeu leve.

Você pode dizer senhor Governador come sou pessoa pra ler tude seu cartilha. Eu sei come els mandou vir pliça de Lisboa pra vir spreitar gente das ilha mas eu não tenho mede de pliça de Lisboa, nem de senhor Governador, nem de senhor Rei de Lisboa. Eu só tem mede de Deus na Ceu. Até els disse como senhor Governador tambê era pliça, mas na fim ês ê que fica tude pliçode. Se quês português de strada panhava gente de Santantão daquês tempe antigue, eles panhava de pau bem dade, mas, agora, gente das ilha ê uns coitode que não tem liberdade nem pra dar de pau. Mas tude fica entregode na conta de Deus.

 
Senhor Presidente, você não squeça daquel degrau de scada. Eu não tem más nada para dizer você. Esturdia panhei um topada naquel degrau de scada, eu ficou com um pé molestrade, nem fui pra sirvice da tarde. Você pode perguntar senhor Serafim.

 

Ali vai mantenha pa tude gente de Cambra, grande e piquenim, e vai galopê pa senhor engenher.

Nho Djunga

Stúdio da 'Foto Progresso' do Nhô Djunga Fotógrafo. Fotos cedidas por Jorge MartinsStúdio da 'Foto Progresso' do Nhô Djunga Fotógrafo. Fotos cedidas por Jorge Martins

 

retirado do blog Na Esquina do Tempo, de Brito Semedo 

por Djunga Fotógrafo
A ler | 17 Abril 2011 | Fotografia, Mindelo