Arromba as portas, rega as hortas

A morte que vos espera a todos está a sorrir pra mim. Ela sabe que eu vi o fim. Os caminhos cruzaram-se e perdi as minha pegadas agora, vendo bem, entrelaçadas numa tapeçaria de magia. A força com que me deito faz-me sentir o peito e despegar do preconceito do teorema do eleito. Ficou o que está feito, o que não foi passou, num paralelo que caiu do parapeito quando ela se virou e juntou os corações. Sem preocupações, apenas resoluções. Em saltos quânticos temporais, resolvem-se assim os finais e põe-se a roupa nos estendais, enquanto sonhamos ser mais que os nossos pais. E porque vais? Ficar parado não conta, prefiro ser a ponta da lança daquele que não alcança e que, cheio de confiança, não percebe que caiu na sua própria matança. Por isso avança, arromba as portas, rega as hortas e colhe a tempestade do acumular da idade, sem perder a vontade, faz a tua faculdade e ultrapassa a puberdade, que isso fica-te mal, não é por sinal que levas tudo a mal, é mania, não é saber é querer, continuar a sofrer. Aprende o propósito do verbo morrer, porque enquanto estiveres a viver saberás o que fazer sem sequer o saber, basta ouvir sentir e ver, com os olhos de calma, que encontras na alma. Porque ela chega para todos, não há tensão que afunde a ilusão na presença da verdade. Quem arde queima, quem vê chora, a realidade é que magoa, passo para dois e encontras a broa de estar na vida sempre à toa, com vontade de te achar mas sem nunca reparar que os outros já estão a voar e tu aí a aprender a andar, quanto muito consigo procurar um lugar, aqui, no céu. Vem ao templo se vieres para ser, só, porque és tu, não é o pó. Não te sintas só, desiste dessa apatia porque já estás em companhia.


por Eric Medeiros a.k.a. Eric Hanu
Palcos | 21 Setembro 2020 | arte urbana, pintura, spoken word