Carnaval, Procissões e Paradas - Entrevista a Claire Tancons
MASSIMILIANO SCUDERI: Durante muito anos a tua investigação artística esteve centrada no paradigma do Carnaval aplicado à arte. Podes explicar melhor as razões e as origens culturais para a escolha deste campo de pesquisa? Tem alguma coisa a ver com o conceito de mestiçagem cultural do modernismo e pós-modernismo ocidentais?
CLAIRE TANCONS: Vejo o Carnaval não tanto como um lugar de aplicação da arte, mas como arte em si. Tenho investigado o Carnaval nas Américas desde 2004, de Trinidade ao Brasil, e actualmente em Nova Orleães, o berço do “Mardis Gras”, onde vivo e trabalho, e tenho vindo a pensá-lo como uma Arte Moderna das Américas, ainda por descobrir. Isto é mais uma provocação que brinca com a ideia da descoberta do Novo Mundo. Está enraizada na crença que, tal como proposto eloquentemente por Sylvester Ogbechie (Ben Enwonwu: The Making of an African Modernist (Rochester U. Press, 2008, p.7), “Contextos ocidentais e não-ocidentais devem as suas formas canónicas a apropriações recíprocas geradas no contexto internacional da modernidade”. Estou especificamente interessada em enquadrar o Carnaval no seu “Novo Mundo”, moderno, encarnação que se seguiu à desafectação da Europa, como uma forma de entretenimento popular de massas, e a sua passagem para as Américas na altura do Iluminismo, que acompanhou a colonização europeia. Uma fonte importante para mim é a definição de Modernidade do séc. XIX, por Jonathan Crary, como uma “suspensão da percepção” (Suspensions of Perception Attention, Spectacle, and Modern Culture. The MIT Press, 2001) e olhar o Carnaval nas Américas como uma reapropriação da percepção. Ao contrário da Europa, onde o sentido da visão foi enfatizado em detrimento dos outros, nas Américas, pelo menos no Carnaval, todos os cinco sentidos participam da experiência da arte, mais o sexto sentido que é invocado por possessão espiritual.
Em relação ao termo “mestiçagem”, desconfio das suas conotações biológicas e prefiro o termo “crioulização” que, na minha perspectiva, descreve melhor e, antes de mais nada, o que só pode ser tomado como um processo cultural. À luz da minha citação de Ogbechie, percebe-se que considero a modernidade inerentemente inter ou transcultural, seja na Europa ou nas Américas. Em vez de ver o meu projecto sobre o Carnaval como um projecto relativo à “mestiçagem”, vejo-o como um projecto que pensa a modernidade.
Os desfiles carnavalescos que organizaste surgem como formas de protesto contra a repressão sentida por algumas culturas?
Organizei dois desfiles inspirados no Carnaval. O primeiro, chamado Spring, para a abertura da 7ª Bienal de Gwanjiu, na Coreia do Sul, e o segundo, A Walk into the Night (Um passeio pela noite), para a abertura do CAPE09, a segunda bienal na Cidade do Cabo, na África do Sul, de 2009.
Spring foi inspirado pela Insurreição Democrática Popular de 18 de Maio de 1980 de Gwangju, uma série de protestos estudantis que levaram à democratização da Coreia do Sul. Aconteceu em torno da Praça da Democracia, a 18 de Maio, local onde trinta anos antes se deu a revolta, e foi concebida e realizada por estudantes, descendentes simbólicos dos percursores que lutaram e morreram naquele mesmo lugar. A Walk Into the Night referia-se às debandadas forçadas que aconteceram durante o Apartheid, e que obrigaram as populações não-brancas a abandonar o centro da cidade para as periferias, que se tornaram desde aí novos municípios ou povoações. Aconteceu nos “Company Gardens” (os jardins da Companhia Neerlandesa das Índias Orientais) e encenava o regresso simbólico destas populações com cem participantes, a maioria dos quais participantes do Carnaval da Cidade do Cabo, uma tradição histórica dos “mestiços”.
O meu uso aparentemente indiferenciado das palavras “Carnaval” e “Protesto” foi no ano passado questionado na Universidade de Bocconi, quando falei sobre o meu trabalho num seminário de Luca Martinazzoli, a convite de Andrea Lissoni, comissário da parada Multinatural (Blackout) de Arto Lindsay, para a 53ª Bienal de Veneza. Isto obrigou-me a especificar o local da minha pesquisa sobre o Carnaval e a fonte da minha inspiração, nas procissões nas Américas em que ambos, “Carnaval” e “Protesto”, estão intimamente ligados. O Carnaval foi usado como um meio para encobrir, e às vezes evidenciar, a rebelião, sob o disfarce da máscara e o pretexto da alegria. Um dos maiores exemplos disto foram os motins de Canbolay em Porto-de-Espanha, em 1881, durante os quais os habitantes de Trinidade usaram o Carnaval para lutar contra o poder colonial britânico. Marlon Griffith, um artista de Trinidade que participou no Spring, inspirou-se nos motins de Canbolay para a sua obra Runaway/Reaction (2008) relacionando-os com a Insurreição Democrática Popular de 18 Maio. Exemplos mais recentes são os protestos de massas que aconteceram em Guadalupe (onde nasci e cresci), em 2008. O marchar inconfundível, de ritmo forte e estilo militar, dos grupos carnavalescos de Guadalupe como os Akyio, foi usado nas manifestações de rua, assim como as canções de resistência do Carnaval de Guadalupe foram usadas para transmitir slogans políticos. Nesse ano, o Carnaval foi cancelado com medo de mais agitações, num contexto social e político já por si altamente agitado e explosivo.
O que espero que Spring e A Walk Into the Night digam, é o quanto a resistência política e a cultural estão ligadas e como essa relação se torna visível em práticas artísticas como o Carnaval e outros festivais públicos. Spring e A Walk Into the Night podem ser vistas como a celebração de uma forma de resistência cultural, feita através de práticas artísticas muitas vezes vistas como marginais mas que estão, na verdade, no âmago de debates sociais cruciais.
Numa conversa com o Daniel Birnbaum, Sarat Maharaj fala de Stuart Hall e da sua capacidade para referir, na Grã-Bretanha, “o tema colonial invisível, agora presente no coração do velho império”1. Encontras sentido para estas palavras no teu trabalho e achas que a tua abordagem pode ser considerada uma espécie de “mudança cultural”?
Esse tema colonial invisível de que fala Stuart Hall é, por exemplo, o das Colónias Britânicas Caribenhas, seja Trinidade, Jamaica ou Grenada, que veio à baila nos chamados motins de Notting Hill. Aqui o Carnaval esteve de novo no centro da resistência política e social. Como sabes, o Carnaval londrino de Notting Hill, inspirado no Carnaval de Trinidade, que se tornou ao longo dos anos um Carnaval pan-caribenho e que é agora reconhecido como um festival nacional no Reino Unido, foi palco de protestos violentos, apelidados de motins pelos media, entre os jovens foliões negros e a polícia londrina. Este evento, assim como outras questões relacionadas com a retro-colonização ou a colonização em reverso, foram comemoradas em Territories (1984), de Isaac Julian, cujo resto do trabalho se centra no projecto da ”visão crioulizante”.
Se o meu trabalho é sobre dar visibilidade aos temas invisíveis, então quer fazê-lo com as ferramentas artísticas e as estratégias culturais desses sujeitos, sendo o Carnaval uma delas, entre outras formas de resistência popular. Estou mais interessada na capacitação das comunidades dentro das suas práticas culturais do que na legitimação destas através da sua apropriação pelo “mainstream”. Estando eu interessada no Carnaval do Novo Mundo (“New World Carnaval”) e nos seus homólogos em diáspora pelo Norte da América e na Europa, acho muito mais relevantes o contexto de rua e o formato do desfile, do que a instituição museológica e o complexo expositivo. Nesse sentido, podemos dizer que o meu trabalho opera uma “mudança cultural” baseada nos termos da cultura cujo interesse quer servir.
Ao falar com Vito Acconci durante as últimas eleições nos Estados Unidos, perguntámo-nos qual poderia ser o resultado de uma crioulização da cultura ocidental e se o advento Obama poderia favorecer esta nova tendência cultural. O que achas, há algo a acontecer neste sentido, na América?
Na minha opinião, o debate sobre a crioulização, o que significa e o que implica, foi bem resumido no Créolité and Creolization do Okwui Enwezor, na Documenta 11-Platform (2001). De acordo com o poeta da Martinica Édouard Glissant, e em contraste com Stuart Hall, que localiza especificamente o processo de crioulização no contexto geográfico e histórico do “Black Atlantic”, acredito que o mundo já sofria processos de crioulização que anteciparam a colonização europeia e a sua consequência nas Américas. Nesse sentido, a cultura Ocidental é uma cultura crioula e, no que toca a França por exemplo, traçando um paralelo com o desenvolvimento linguístico na literatura, Glissant fala de Rabelais como o pai da língua francesa como uma língua crioula e da cultura francesa como uma cultura crioula apesar de, e paradoxalmente, os que escapam à natureza processual das alterações culturais se apropriarem da conquista de um processo contínuo de acréscimos culturais em termos nacionalistas.
Assim, a crioulização não é nova. Pode parecer uma tendência nova nos Estados Unidos, mas isso é erróneo, particularmente a partir do ponto de vista privilegiado de Nova Orleães, que é provavelmente uma das cidades mais diversificadas dos Estados Unidos, culturalmente mais próxima do Caribe do que da América do Norte, embora inequivocamente moldada pela história segregacionista e pelo preconceito racial dos Estados Unidos.
O Presidente Obama cristaliza as esperanças e os medos dos que estão em ambos os lados da linha multicultural. Para mim, no entanto, a sua habilidade para formar uma nova visão para a América tem menos a ver com a sua muito debatida herança multiracial, que por si mesma não lhe traz conhecimentos especiais, do que com a sua visão humanista do mundo, além das fronteiras dos Estados Unidos. Por ora, eventos como as “Tea Parties” em Washington, parecem indiciar mais um recuo do que um progresso no que toca a uma visão mais integrada da sociedade norte-americana.
Entre as várias iniciativas para as quais contribuíste, esteve a Prospect.1 New Orleans, a Bienal de Nova Orleães. Como é sabido, a Bienal surgiu também com o objectivo de aliviar uma comunidade em imensas dificuldades. Podes dizer-me mais sobre o projecto e qual a sua repercussão no território e na comunidade em si?
O Prospect.1 (1 de Novembro de 2008 – 18 de Janeiro de 2009) foi concebido por Dan Cameron depois do furacão Katrina, em 2005, para fomentar um desenvolvimento económico através do turismo cultural, sendo que a Bienal é uma das ferramentas deste turismo mais na moda entre os intelectuais. Eu fui comissária associada da Bienal. Embora esta tenha sido celebrada pelo seu sucesso em termos do público e da crítica, sustentado pelos números altos, tanto em termos económicos (cuja estimativa mais alta foram 20 milhões), como de audiências (que oscilaram entre os 89.000 de acordo com uma estatística de Junho de 2009 e os 42.000 de acordo com um comunicado de imprensa do Prospect.1 em Novembro de 2009), há espaço para debater o real impacto e a relevância do evento, em e para Nova Orleães. A estatística do público (disponível para consulta na página web do Contemporary Arts Center New Orleans) revelou que 83% eram brancos, locais ou não locais, enquanto apenas 11% eram negros, 8% locais e 3% não-locais. Apesar da saída de uma porção significativa da população negra a seguir ao Katrina, Nova Orleães continua a ser uma cidade predominantemente negra (62% da população), e o sucesso proclamado da Bienal é mitigado pela falta de público local negro. Da mesma maneira, apesar do município de Nova Orleães apresentar um dos maiores números de negócios nos Estados Unidos, cujos proprietários são negros (27,6% contra os 5,2% do resto da nação – todos os números são do “US Census Bureau” de 2008, disponível online) ainda gostava de saber quantos dos milhões de dólares que foram falados beneficiaram estas pessoas. Não sou uma economista mas entendo que existem benefícios indirectos que podem advir dos trabalhos mantidos ou criados num esquema económico positivo alargado. No entanto, e como sabemos, foram as comunidades negras e empobrecidas de Nova Orleães que sofreram mais e mais longamente com o Katrina, embora tenham existido perdas em todas as comunidades. Para mim é premente perguntar: Qual era a visão da “cidade” do Prospect.1, quem devia beneficiar dela artística e economicamente após o Katrina, e que meios desenhou para chegar a uma população variada?
Estas perguntas, complexas e incómodas, não podem ser respondidas facilmente. No entanto podem ser facilmente indeferidas como sendo ingénuas. De facto, e apesar de eu não conhecer as estatísticas mundiais das bienais, percebe-se que os números do Prospect.1 vêm no seguimento da tendência geral do mundo artístico. A bienal também encorajou tal tendência de forma significativa: a entrada era gratuita e os 83% do público branco, apesar de letrado (no seguimento da tendência geral) era também mais jovem e menos rico (ao contrário da tendência geral). Embora a diversidade não fosse um dos objectivos do Prospect.1 (os quais eram, na sua maioria, de natureza artística e económica) tentou-se alcançar um público negro através de eventos em lugares como o McKenna Museum for African-American Art (Museu Mckenna de Arte Afro-Americana), o New Orleans Museum of African American Art (Museu de Arte Afro Americana de Nova Orleães) e o Lower 9th Ward. Este último é um bairro operário que foi um dos mais afectados pelo furacão Katrina e que tem sido lugar de várias experiências de reconstrução, tais como a muito falada iniciativa “Make it Right” do Brad Pitt, que providencia habitações ecológicas desenhadas por arquitectos de renome mundial, num bairro que fica no local onde os diques rebentaram, e onde as casas não foram apenas destruídas mas levadas pelas enxurradas, literalmente apagadas da paisagem. Numa escala bastante menor, o Prospect.1 contribuiu para o esforço da reconstrução com o Mrs. Sarah’s House, um projecto do Wangechi Mutu, um dos 81 artistas (15 dos quais expuseram no Lower 9th Ward). O Sr. Mutu concebeu um projecto em três fases, para ajudar a Sra. Sarah a reconstruir a sua casa. A Fase 1, nas palavras do artista, era uma “obra permeável ao local, construída como um tributo e lugar de peregrinação para os visitantes do Prospect.1 e especialmente para os habitantes do Lower 9th”. Consistia num “Desenho de luz (que criava) uma espécie de edifício fantasma à noite… uma miragem, uma tentativa de descrever os sonhos da Sra. Sarah e de outros ao voltarem para casa”, “usando os planos para a casa que a Sra. Sarah nunca re-construiu, construindo como um pedestal uma janela que se parece com um edifício dos caminhos-de-ferro de Nova Orleães, no qual espectador pode entrar, caminhar, visitar” (sinopse do artista, 2008). Para a Fase 2, o Sr. Mutu fez uma impressão chamada “Home” (Lar), cujo dinheiro da venda foi usado para criar um fundo e ajudar à angariação de fundos para construir a casa da Sra. Sarah. A Fase 3 aconteceu à cerca de duas semanas quando, depois de reconstruída a casa, esta foi revelada e inaugurada numa cerimonia pública, no dia 11 de Abril de 2010.
A cidade de L’Aquila, em Itália, sofreu no ano passado uma catástrofe natural, um forte terramoto que a deixou de rastos, tal como Nova Orleães e o Haiti. Na tua opinião, a arte e a cultura em geral podem reavivar o sentido de identidade de uma comunidade afectada por tais eventos? Isto aconteceu, por exemplo, em Nova Orleães?
Eu julgo que leva algum tempo registar o impacto cultural e económico desses acontecimentos, de forma que possa ser sustentado, o que ainda tem que ser demonstrado com o Prospect. No geral, desconfio dos apelos feitos em nome de uma população, particularmente em locais culturalmente não emancipados e economicamente empobrecidos como Nova Orleães ou o Haiti. Também acho que existem preocupações legítimas em torno da natureza neo-colonial desta tendência mundial das Bienais, que se inclina para a imposição de um modelo cultural ocidental, como o mais popular e triunfante, em localidades não-ocidentais, cujas práticas artísticas e herança cultural muitas vezes desmentem a noção de que a arte contemporânea é um valor cultural partilhado por todo o mundo.
Voltando a Nova Orleães, pergunto-me até que ponto o público geral, branco ou negro, realmente se interessou pelos trabalhos em exposição? No que toca à população negra, cujas tradições culturais emanam sobretudo dos chamados Clubes de Apoio Social e Prazer e têm a sua forma pública em variadas demonstrações e procissões efémeras, durante o Carnaval, os desfiles Second-Line e os Funerais Jazz, será que a arte contemporânea, legitimada pelo museu, teve algum impacto? Gostaria de perceber até que ponto as práticas artísticas negras que foram apresentadas no “Prospect New Orleans”, como a exposição de Mardi Gras Indian Victor Harris (que eu organizei), foram mais do que simples sinais de valorização da cultura negra lançados na misturada de um evento cultural predominantemente branco, numa cidade predominantemente negra. A questão é também: Quem é que fala de onde, para quem e com que fim? E eu penso que muitas vezes as Bienais fazem uma espécie de ventriloquismo cultural, onde falam dos benefícios supostamente ganhos pelas populações dos locais onde acontecem, definindo à partida o que é bom para elas, de acordo com uma agenda que pode estar muito longe dos objectivos e das aspirações locais. Estou curiosa em saber mais acerca das iniciativas culturais em L’Aquila, para trazer algum alívio do terramoto e de que maneira estas se vão afastar dos modelos já estabelecidos.
Quais os teus próximos projectos?
Terminei agora uma série de viagens de investigação feitas ao longo de 12 meses em mais de 20 países, principalmente na África Austral e Ocidental, assim como na Europa Ocidental, América Latina e no Caribe. Tinham como objectivo expandir o meu campo de pesquisa das Américas para o contexto alargado do Atlântico Negro, do Carnaval para outras tradições relacionadas com as procissões e as máscaras, tendo como pano de fundo os movimentos globais de protesto. Estudei tanto o “Tchiloli” em São Tomé como o Carnaval em Luanda, Angola ou no Mindelo, Cabo Verde, assim como as artes performativas em Lagos, Nigéria, e as procissões anti-capitalistas em Munique, chamadas “Konsumprocessions”. Estou agora a trabalhar sobre dois projectos, relacionados entre si. Um está baseado numa instituição, um projecto de viagem com estreia marcada para o CAC de Nova Orleães, em 2013, cujo título provisório é Carnival: Art to and from New Worlds (Carnaval: Arte de e para Novos Mundos) e que visa envolver práticas artísticas contemporâneas dentro do Carnaval, assim como a actual tendência artística dos desfiles e procissões, que vejo como indirectamente relacionada. Vai acontecer num museu e fora deste com uma exposição, workshops e desfiles. O outro projecto é um livro, chamado Carnival, Procession and Protest. Art, Agency and the Re-Possession of Perception. Este argumenta que o Carnaval nas Américas é uma forma de arte moderna que, ao contrário do modernismo do séc. XIX definido por Jonathan Crary, que ao privilegiar a visão leva a uma “suspensão de percepção”, opera antes uma re-possessão da percepção através de experiências pan-sensoriais.
Comecei também a trabalhar para a primeira edição da Bienal de Harlem, de e para Harlem, bairro proeminente da alta de Manhattan, com abertura marcada para a Primavera de 2012. Estou desejosa de usar aqui a experiência adquirida em Nova Orleães, visto que ambos os locais têm uma forte cultura negra e encaram desafios similares, nomeadamente no que toca à gentrificação. Até agora a abordagem à Bienal de Harlem tem sido feita de baixo para cima, enraizada nas comunidades locais, com comités de consultoria locais e internacionais a trabalhar em várias matérias como curadoria, educação, etc., uma abordagem que visa encorajar a auto sustentabilidade a longo prazo e que é também um desafio a curto prazo, nomeadamente no que toca à angariação de fundos. Estou particularmente excitada com o facto de, para manter a cultura popular de rua do Harlem, a Bienal ter-me pedido para desenhar um modelo para uma parada que será recorrente e que, desde os desfiles UNIA do Marcus Garvey nos anos 20 ao primeiro Carnaval do Harlem em 1947, toque a rica história local feita de… Carnavais, Desfiles e Protestos.
Entrevista a Claire Tancons por Massimiliano Scuderi
in Arte e Critica n°63 - Junho/Julho 2010.
- 1. Sarat Maharaj, “Philosophical Geographies” in Making Worlds/ Fare Mondi (Cat. da 53ª Bienal de Veneza), ed. Marsilio, 2009