Um Museu Vivo de Memórias Pequenas e Esquecidas | Digressão 2024 - 50 anos 25 Abril

Queridos companheiros, companheiras, companheires,

escrevo-vos do presente de 2024, ainda no maravilhamento daquele dia na Avenida da Liberdade, em Lisboa, e das manifestações em todas as outras avenidas por esse país fora, e os dias seguintes e anteriores de torrentes memoriais e importantes momentos de inscrição do passado no espaço público. Em particular, penso na inauguração do primeiro museu nacional dedicado à memória e à resistência antifascista – situado no Forte de Peniche, antiga prisão do Estado Novo para presos políticos. Sem dúvida, um dos momentos mais marcantes, tocantes e significativos das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.

Inscrever e transmitir memória tem feito parte do labor artístico do Teatro do Vestido, pelo menos desde 2014, data em que estreou Um museu vivo de memórias pequenas e esquecidas, no Negócio/ZDB, no Bairro Alto, em Lisboa – um trabalho que iria adquirir uma vida própria ao longo desta última década, em que não parámos de o apresentar em Portugal e no estrangeiro, constantemente acrescentando e polindo novas partes, novas reflexões, que acompanharam esta década de lutas pela memória.

Este trabalho, cuja investigação teve início em 2011, partiu de uma intensa e aprofundada pesquisa em torno das histórias de vida e memórias de pessoas comuns sobre a ditadura do Estado Novo, o 25 de Abril de 1974 e o processo revolucionário que se seguiu a esse dia – marco de todos os começos na nossa vida como país livre. Foi acompanhado de uma enorme pesquisa histórica e da reunião de documentos, artefactos, objectos pessoais - parte de um arquivo sensível, afectivo, mostrado e manuseado ao vivo no espectáculo.

Dividido em 7 partes, com um jantar revolucionário a meio e um debate/conversa final, Um museu vivo é um espectáculo exigente e de grande cumplicidade com quem o vê, uma investigação quase forense sobre aspectos que nos constituem como país, como comunidade, como indivíduos, onde memória colectiva e memória individual se interseccionam e onde alguém que nasceu depois interpela o passado a partir do seu lugar de ‘filha da revolução.’ Tudo isto se desenvolve ao longo de 6h, que às vezes são mais, pois como museu vivo que é se situa neste lugar de interrogação e citação do presente. Neste ano de comemoração dos 50 anos do 25 de Abril assistimos a uma riqueza de expressões, polémicas, divisões em torno da data, que não poderiam senão estar presentes neste novo ciclo de apresentações que se inicia esta semana no TAGV, em Coimbra. Quem sabe o que cada dia até essas récitas nos reservará ainda? De tudo isso se alimenta este museu. Por isso a sua duração aproximada e o seu carácter aberto, em progresso.

A nova composição da Assembleia da República, por seu turno, exige de cada uma e cada um de nós uma consciência do momento crucial em que nos encontramos, esta esquina da história particular onde os caminhos diante de nós se revestem de incerteza e perigo. Mas também da esperança de sabermos o nosso papel neste guião, nesta luta. porque nada acabou ainda.

porque não acaba nunca.
porque foi essa a promessa que herdámos:
a de um país novo.
tudo por construir.

Esperamos por vós nesta nova digressão que aqui se inicia.
E que juntos continuemos a interpelar Abril e Maio e Junho e Julho até Dezembro – todos esses meses de exaltação, vigília e transformação da vida de um povo reprimido até então.

Abraços com Abril nos olhos e nos braços.
Fascismo nunca mais.

Joana Craveiro
27 de Abril de 2024

03.05.2024 | par mariana | 25 de abril, 50 anos do 25 de abril, Joana Craveiro, Teatro do Vestido

Elas também estiveram lá

um filme realizado por Joana Craveiro
uma produção Teatro do Vestido

Um documentário poético sobre a invisibilidade das mulheres em acontecimentos históricos, como a ditadura portuguesa de 1926-1974, ou o processo revolucionário de 1974-75. Combinando histórias de vida, fotografias e documentos originais, o filme reencena essas vidas invisíveis e culmina com uma cena filmada numa pequena sala de cinema, que se acredita ter sido usada pelos censores durante a ditadura portuguesa.

Estreado em sala no âmbito do Festival Olhares do Mediterrâneo – Women’s Film Festival, em Novembro de 2021, foi galardoado com Prémio Especial do Júri pela imensa criatividade, mistura de formatos, do teatro à reportagem, filme de arquivo e linha pedagógica e uma rara erudição de Cinema, a fazer evocar as Histoires du Cinéma de Godard, bem como a explícita citação de filmes portugueses. Mostra trabalho, ideias de cinema, inteligência e humor.”
Elas também estiveram lá, originalmente um espectáculo de teatro estreado em 2018, foi nomeado pela SPA para melhor Texto Português Representado, em 2019.

Conceção, texto e realização: Joana Craveiro

Apoio ao argumento: Bonneville

Câmera: José Torrado

Montagem: José Torrado, Joana Craveiro

Direção de fotografia: José Torrado, João Cachulo

Iluminação: João Cachulo

Direção de som: Rui Dâmaso

Voz-off em estúdio: Sérgio Milhano

Assistência de realização e anotação: Estêvão Antunes

Música original e ambiente sonoro: Francisco Madureira

Direção de arte Teatro do Vestido

Guarda-roupa: Ainhoa Vidal

Apoio criativo em várias frentes: Tânia Guerreiro

Direção de Produção: Alaíde Costa

Assistência de produção: João Ferreira

Gestão Financeira: Leocádia Silva

Com: Ainhoa Vidal, Inês Monteiro, Inês RosaDO, Joana Craveiro, Joana Margarida Lis, Júlia Guerra, Tânia Guerreiro, Vera Bibi

Figuração: Sónia Guerra, Tatiana Damaya

Sónia Guerra e Tatiana Damaya participam neste projeto n contexto de estágio curricular, ao abrigo do protocolo entre o Teatro do Vestido e ESAD.CR

Apoio: Câmera Municipal de Lisboa – Arquivo Municipal de Lisboa | Fotográfico

Co-produção: Teatro do Vestido e EGEAC

 22 Abril 2022 | 22h00 | DesobeDoc 2022
Cinema Trindade - Rua do Almada 412, Porto

veja o tailer

+ informações

20.04.2022 | par arimildesoares | elas também estiveram lá, filme, invisibilidade das mulheres, Joana Craveiro, porto, teatro vestido

Teatro do Vestido apresenta "Dentro do Arquivo"

Dentro do Arquivo
Uma criação do Teatro do Vestido
dentro do Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

um espectáculo inserido na programação de “O Outro como epifania do belo”

Foto ©SCMLFoto ©SCML

Sessões às 16h e 18h, dos dias 23, 24, 25 e 26 de Setembro
Largo Trindade Coelho
Marcações/informações Serviço de Públicos e Desenvolvimento Cultural Direção da Cultura da SCML 21 324 08 69/87/89 culturasantacasa@scml.pt 

Estreado em Setembro de 2018, integrando a programação “Hospitalidade”, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Dentro do Arquivo é uma performance em percurso, por lugares habitualmente inacessíveis. Como processo, a equipa do Teatro do Vestido trabalhou na investigação e análise do arquivo da Santa Casa da Misericórdia. Depois do trauma da destruição dos arquivos iniciais da instituição no terramoto de 1755, a consciência da importância da memória e da preservação do arquivo instalou-se. Hoje, o arquivo da Santa Casa da Misericórdia fornece-nos um retrato social, político e económico de diversas épocas. Uma viagem intimista aos bastidores da memória, que é também um tributo ao paciente labor dos arquivistas.

Concepção, texto, direcção Joana Craveiro 

Interpretação e co-criação Joana Craveiro e Tânia Guerreiro 

Colaboração criativa João Paulo Serafim 

Iluminação e vídeo João Cachulo 

Montagem técnica e operação João Chicó 

Assistência técnica Ricardo Jerónimo 

Produção Alaíde Costa

Assistência produção Sara Ferrada

23.09.2021 | par Alícia Gaspar | dentro do arquivo, Joana Craveiro, santa casa da misericórdia, teatro, Teatro do Vestido

Páginas de um Império Perdido #2 - Alguns filhos disto tudo ou Bairro das Ex-Colónias

Palestra performativa a 27 de Fevereiro, pelas 18h, no Auditório do Padrão dos Descobrimentos, construída a partir da recolha de experiências de uma geração que não viveu directamente estes acontecimentos, antes os recebeu pela transmissão familiar, ou pessoas que regressaram muito novas e quase não têm memórias daqueles outros lugares, uma certa ‘geração da pós-memória.’


Investigação, texto, direcção e interpretação: Joana Craveiro

Desenho de luz: Carlos Ramos
Produção: Cláudia Teixeira / Teatro do Vestido

Entrada gratuita, sujeita a marcação prévia.
Limite máximo: 92 pessoas
Reservas: 213 031 950 // info@padraodosdescobrimentos.pt

Para mais informações, por favor consulte o site da EGEAC

26.02.2016 | par claudiar | Joana Craveiro, palestra, Retornar, Teatro do Vestido

Retornos, Exílios e Alguns que Ficaram

12 e 13 de Setembro às 21h no Festival TODOS, na Escola Superior de Dança, Lisboa

I.

Na sequência do processo de descolonização de 1974-75, milhares de pessoas regressaram das ex-colónias portuguesas. Mas o que quer exactamente dizer este ‘regressar’? Dentre essas pessoas há as histórias daqueles que pouca relação tinham com Portugal, considerando portanto que são exilados e não retornados; outros há que decidiram ficar lá e ajudar a construir um país novo; outros ainda que, embora retornando, não o tinham desejado. Chegados à ‘metrópole’, enfrentaram toda a forma de desafios e provações destinadas aos que começam do zero, num clima de acentuado preconceito para consigo, os “retornados”, os que “vinham ocupar os lugares dos que já cá estavam antes”, tudo isto aliado a imagens de um colonialismo de chibata na mão com que estas pessoas foram representadas no imaginário dos que habitavam a metrópole. Desta história complexa e contraditória localizada no contexto de um também complexo e contraditório processo revolucionário, estamos ainda hoje a tentar discernir os fios com que se entretecem as narrativas oficiais da história de Portugal desse período. Foi por desconfiarmos das narrativas oficiais e também por acreditarmos numa história construída a partir de testemunhos directos dos seus intervenientes - ou seja das pessoas - e talvez, mais fundamentalmente, por não sermos historiadores mas sim criadores teatrais, que fomos à procura dessas pessoas e das suas história e com elas construímos este espectáculo – que é uma viagem por vidas, por traumas, por livros de história, por pequenas e grandes memórias, e pelas nossas próprias perplexidades ante tudo isto.

“No IARN as secretárias eram velhas e sujas e as cadeiras onde os retornados se sentavam quando chegava a sua vez estavam desconjuntadas, tenho a certeza de que nem aguentariam um corpo pesado como o do pai. Estavam lá retornados de todos os cantos do império, o império estava ali, naquela sala, um império cansado, a precisar de casa e de comida…”
(Dulce Maria Cardoso, O Retorno)



II.

Construído a partir de uma aprofundada recolha de testemunhos e histórias de vida de pessoas que viviam nas ex-colónias portuguesas aquando do processo de Descolonização e de independência destas novas nações africanas, este espectáculo foi apresentado pela primeira vez em Janeiro de 2014 no Solar do Dão, em Viseu.
Agora na Escola Superior de Dança, e integrado no Festival Todos, revisitamos estes testemunhos, estas pessoas e fragmentos das suas histórias. sentimos que a missão primordial do Teatro do Vestido neste momento é a de abordar de forma performática fragmentos da história de Portugal que nos possam fazer melhor entender o nosso presente, desafiando aquilo que Eric Hobsbawn descreveu como este “presente permanente” em que todos vivemos. Os processos históricos traumáticos da Guerra Colonial, da Colonização e Descolonização são parte integrante desta tentativa de entendimento deste ‘País Possível’.

 

Direcção, Texto, Espaço Cénico: Joana Craveiro
Interpretação: André Amálio, Inês Rosado, Isabelle Coelho, Joana Craveiro
Iluminação: Cristóvão Cunha
Assistência: Sabine Delgado
Produção: Rosário Faria
Co-produção: Teatro do Vestido/ Teatro Viriato

10.09.2014 | par martalanca | Joana Craveiro, retornados, teatro, Teatro do Vestido