Hûn bixêr hatin | Bem-vindos

Curdo de nacionalidade turca, nasci, cresci e vivi a maior parte da minha vida numa região bastante instável politicamente (Batman, no Sudeste Turco). Ser curdo e reivindicar a cultura curda é tido pela sociedade maioritária turca como sinónimo de inimigo à estabilidade da nação, com todas as consequências sociais e opressões individuais e coletivas que isso acarreta. A consciência social e cultural, mas igualmente a implicação política surgiram, desde cedo, como obrigação. Embora não unicamente, foi através do audiovisual, sobretudo da fotografia, que encontrei um modo de agir e de contribuir pelo testemunho da situação curda.

O conjunto de fotografias aqui apresentado é o reflexo deste percurso que cruza interesses pessoais e coletivos. O álbum Hûn bixêr hatin, que significa “Bem-vindos”, mostra a diversidade da região curda naquilo que é o bem mais precioso da região: pessoas de várias origens étnicas, religiosas e culturais (Alevitas, Ciganos, Yazidis, Nómadas, entre outros). 

Embora a região curda seja muito mais vasta, todas estas fotografias foram captadas dentro das fronteiras turcas, aquilo que chamamos Curdistão Norte (Bakur). Ainda assim, estas fotografias —retratos nos quais podemos identificar trajetórias não lineares e embrenhadas nas vicissitudes da vida, mas também complexidades históricas e sociais — transmitem o sentimento que a população curda, espalhada entre quatro países (Irão, Iraque, Síria, Turquia) mais acalenta no seu quotidiano: o acolhimento do “outro”, do “estrangeiro”. 

Embora sendo tão curdo como eles, enquanto fotógrafo, ou seja, enquanto “outro”, fui recebido com olhares de cumplicidade e generosidade. Afinal, todos nós sabemos que para continuar a viver, numa terra colonizada e alvo de veleidades imperiais, temos de continuar a existir culturalmente, no duplo sentido do termo, antropologicamente e na sua manifestação artística.     

Ismail AYDIN