Os Barcos Negros e dizem as velhas na praia que não voltas. São loucas!

Cara Marta,

Desculpa o silêncio, mas fui apanhado num daqueles remoinhos da praia da Zambujeira do Mar onde, de vez enquanto, se perdia um turista menos experiente ou humilde. Aqueles que puxam para baixo e que nem entendemos que forças centrifugadoras nos sugam para o fundo. Enfim, nadador salvador aqui certificado, por isso, nem vou ao fundo e ainda trago uns quantos de volta para cima. Viva o ISN, leia-se instituto de socorros a náufragos. Mandem mas é os putos para o ISN porque dali preparamos salvadores boys e girls alike. O mar prepara para a vida, ai se prepara!!! Acho que isto os gregos também sabem. 

Estou de volta ao Hotel Filon em Perseus, aí Peraeus, estes corretores automáticos pá inventam muito. Enfim, depois de ter lutado com forças, diria, Adamastoras cá saltei do fundo para me pôr a salvo neste Hotel criado e gerido por quatro amigos. Safe house diria. Que será tão forte como a semente que se planta da forma certa? Pois nada né? Aqui a demanda é clara, amizade e negócio é a proposta. Nada poderia ser mais claro encontrar uma boia de salvação finalmente. É que, Marta, “um e um são dois, dois e um são três e neste caso pelos vistos três e ainda mais um são quatro”. Boas contas para estes amigos. Foram as contas que neste contrato internacional que assinei, não fazem muito sentido, né? Contas que por as if by chance nos vão mandando para o fundo do mar e o burro sou eu. Penso na barcas e no que de pior da nossa história teríamos a aprender, não do que que sabemos mas do que vamos lembrando em novos percursos temáticos do século XXI. O século onde trânsitos humanos e não só nos desafiam o ADN a emergir. Seria o marco da nossa elevada actividade nos negócios negreiros uma acumulação de know how que, para bem e para mal, formaria Males ou filhos da puta? Digo isto de resto sem pinga de orgulho ou soberba. Que raio de herança, diria. Barcos Negros ou Negócios Escuros com almirantes mais tenebrosos que Maquiavel e Governos ou burros ou bem diria Nosferatus.

Daniel García Andújar,The Disasters of War, 2017 Mixed-media installation (foto Marta Lança)Daniel García Andújar,The Disasters of War, 2017 Mixed-media installation (foto Marta Lança)

Como sabes, acho que falei da última vez que te vi, gosto muito de uma pensadora  que se chamava Simone Weil que, entre outras coisas que tentou comunicar, tinha uma profunda certeza. Depois de ter partilhado condições de trabalho nas fábricas, em vez de ficar a discutir trotskismo nas tabernas, do humano feito de filha da putice pouco se pode esperar porque de facto os níveis de cansaço e desumanização são tão fortes que colocam esta população quase num fora de jogo. Numa ilha de mártires e pecadores sem saberem que o são. Olha CEOs inclusive, isso também sei, por ter conhecido alguns de facto tenebrosos e ao mesmo tempo lúcidos.

Escrevi uma pequena frase no telemóvel que partilho aqui: I recognize now, I could not give up on documentary, journalism and academia because it is an essencial human need to better understand our lives. Even if we cannot directly change the conditions of the same to understand is already a way to dignify the human being.

Vou encontrar-me com o teu amigo e ver que mais posso fazer aqui. Parece-me esta nova revolução industrial a terceira, diria, uma tomada não só da terra ou do corpo mas agora do discurso e da mente. Os fluxos migratórios todos rigged ou tramóias assinadas pelos nossos próprios países ou país ou pais. E que outros poderes lhe assistiam se não tentar conseguir o melhor deal, como diz o Trump, para a venda dos seus filhos. Nefastos? Quem? Eles? Está tudo parvo!

Assim, depois de uma escorregadia esparrela em terras gregas e uma fuga de emergência para este hotel, volto a escrever. O governo português tenta comprar filhos de volta e conheci um deles na embaixada para onde corri quando percebi que isto não estava nada a correr bem. Regressa com a família feita de fresco na Grécia e feliz. Saiu em 2015 e está elegível para apoio do governo português. Saímos do nevoeiro? Perguntei na embaixada se podia ter algum apoio deles com as minhas questões de trabalho e sobrevivência aqui e responderam que não podiam resolver questões ou intervir junto de entidades particulares e sim governamentais i.e com os gregos. Diga que esteve aqui, disse-me o conselheiro. Accountable? Quem? 

Entretanto na rua velhos e menos velhos deitados como lixo de uma Europa consumida pela indiferença. Refugiados sem refúgio da perda das suas referências e valores jogados aos mercados negros de tudo um pouco, droga, vagabundice, malandrice ou fanatismos e perigosos como o vazio que se ocupa e inocentes como de facto em tudo isto são. Mão-de-obra barata? Mão-de-não-obra? Emodji de mão. Salve-se quem poderia? Bem, eu já pedi auxílio familiar do estilo ajudem-me a entender isto pá, porque isto é um suga para baixo que mete medo ao Serafim.

Felizmente sou homem, se não achava que este esquema estava bem desenhado para vender moçoilas em mercados negros ou fabricar o amor como quem faz bolachas maria. Enfim, sou um Trans e estas coisas pouco me afetam porque gostei sim da Pimenta e dos cãezinhos e de alguns momentos bons antes de levar com a maluqueira do Wotan outra vez, que é apenas natural visto a mesma ser alemã ou alemão porque isto já não se pode garantir nada baby. Open minds mas os meus desamores anteriores já me deixaram um pouco ferido e solto da ideia de que, quando tenho uma emoção forte, ela é para a cueca.

Estás a ver? É que ele há razões que a razão desconhece e ultimamente nothing is at it seems i.e prédios tão espelhadinhos não parecem nada barcas negras né? E eu nem sei se o que me anda a remoer é esta sensação de ser o homem da vida da Mariza. Cada maluco com a sua musa, né? Mas olha se esta merda é um remoinho pois caraças que puxam turistas ao fundo do mar e no fundo do mar há criaturas estranhas como polvos, as manitas dos chefes sem modos né, que a pobre Pepper tem que aturar porque o meu por acaso é um bacano da beira. Depois as baleias que comem tudo e ainda açoitam com a cauda para chamar a atenção dos marinheiros e mais as criaturas que comunicam como sonares em tons e cores. Enfim, ainda não fui ao templo do Poseidon mas consegui ir à Acropolis ou near by porque pediam 20 euros para pisar mais próximo e eu estou sem folga nenhuma graças a cálculos feitos Deo sabe onde do valor que tem cada português, norueguês, inglês para não falar nos que nem ês são, como os turcos ou os gregos isto anda uma merda de Stock Market em torno dos nossos sonhos, identidades e nacionalidades e que bisontes louros e morenos meteram no comando do mundo, ele é com cada peso pesado… que há que engordar o nosso Marcelo pá ou vamos ser desvalorizados. É que vi uma foto dele tão elegante na Embaixada e eu também, mas a minha linha é mais a do Zé Pedro nos seus piores dias. Vem mesmo de mal trato e pouca mesa familiar onde se come com gosto e amizade. Isto para não falar das ciders Strongbow Marta que sempre me fazem lembrar o teu nome. A Lança que algures imagino possuíres é que eu sou lunático é de família, anarquistas graças a Deus, e ocorre-me com cada coisa que não lembra ao Diabo.

Assim, resta-me acrescentar que me gamaram nas andanças em que me meteu a minha empresa. O meu cartão do cidadão e, mais tarde em sequência, o meu laptop e docs oficiais que comprovam que por maluqueira sou do género masculino e tenho assim o direito de me chamar o que bem entender. Tal como a Pepper. Foi-se tudo e agora, depois de ter da minha empresa respostas cada vez mais estranhas, que implicam ficar nas mãos de sabe-se lá quem e onde. Endividar-me mais ainda para trabalhar e de facto ficar caladinho pois isto foi um gamanço poético ou certeiro na forma como diz tudo sobre esta proposta. Ficas nas lonas e nas lonas podes fazer jogging lá no gym que a gente agradece. Ando cá com umas imagens pá, é o que vale. Quanto mais não seja sempre vamos entendendo o cenário pérfido destas novas tecnologias. Aí Mr. Gates não me referia a si, pois ainda tenho alguma esperança que venha a pagar a minha estadia em Cambridge. Ó pá é que é uma bolsa do caraças né? Ui ui são só para alguns a custo de tantos, mas estas contas não são fáceis de fazer, precisamos de calculadoras sofisticadas como as da Canon. Lindas de morrer, é caso para dizer que o instrumento em si não faz a matemática nem a ética, mas fica difícil explicar a técnicos a diferença entre um realizador e um focus puller. Enfim, “somar bem somei mas amor errei fiz as contas mal”. 
Aguardo resposta da família para saber se me deixam naufragar ou me mandam outra boia ou se resolvem amarar este marinheiro para não lhes causar mais danos. Vejo teu amigo Marta mais logo e depois logo se vê. Preferia ver a Mariza mas ela vai para a Finlândia fazer Deus sabe o quê, aquilo é só bebidos. Não são más pessoas, mas olha não dizem nada pá, são piores que os romenos não entendem lá muito bem o que fun quer dizer e o que faz. Coitada vai ter que cortar uns quantos icebergs para lhes fazer chegar um calorzinho mas ela é tão intensa que ainda os derrete mas é na primeira volta. Tem mas é cuidado com o aquecimento global e esses icebergs a derreter mulher! Somethings are best left alone. Ahahahahah esta ninguém apanha.

Nasceu um Ernesto e a sua importância toda.

por Adin Manuel
Jogos Sem Fronteiras | 10 Outubro 2019 | emigração, Grécia, peripécia, trabalho, trans