Maputo Criativa, projeto artístico em rede

De uma capital com as características de Maputo, só se poderia esperar que fosse uma cidade criativa. Para além de a sua história demonstrar que foi, desde cedo, um lugar privilegiado de encontro de culturas, há que ter em conta que nela sempre habitaram intelectuais, escritores, músicos, artistas plásticos e bailarinos de excelente qualidade. Curiosamente, nem os anos mais críticos do pós-independência, nem a atual crise que a economia moçambicana atravessa, impediram a renovação geracional e conceptual das forças criativas que continuamente emergem na cidade. Multicultural, multilinguística, cosmopolita e com uma cena cultural fresca e efervescente, Maputo pode surpreender o visitante desinformado que de Moçambique só traz a ideia de um país que não consegue descolar de entre os mais pobres do mundo.

É neste espaço dual, que a um só tempo concentra um grande número de criadores e um pequeno número de consumidores de cultura, que nasce, no segundo semestre de 2016, o projeto Maputo Criativa.

Fruto de uma parceria entre o Colectivo Imprevisto e a Universidade Politécnica, o projeto tem por objectivo criar novas oportunidades de divulgação e interacção a artistas com produções independentes, moçambicanos e estrangeiros, a partir do desenvolvimento de uma rede de cooperação na área da cultura. Nesta rede comparecem agentes tão diversos como os media alternativos (a Politécnica Rádio), equipamentos culturais com forte tradição na cidade (Cine-Teatro Gil Vicente) ou o associativismo cultural (Associação de Escritores Moçambicanos). A mobilização desta rede permitiu a criação de um programa de iniciativas que visam a promoção e a divulgação do trabalho de artistas emergentes e, por isso, ainda pouco conhecido pelo grande público.

A apresentação pública deste programa, a 15 de Outubro no Bar-Restaurante Piazza del Campo, no Hotel Rovuma em Maputo, contou desde logo com a performance poética de Obed Lobadias e com a intervenção em registo acústico do duo de Jazz Céu. A música ambiente do evento de apresentação do projeto Maputo Criativa foi selecionada pelo DJ e produtor francês Vaca Seca.

Do programa apresentado consta uma nova rúbrica denominada “Fala, Fala”, a difundir num futuro próximo pela Politécnica Rádio, que propõe aos ouvintes um conjunto de entrevistas não só a criadores e a outros especialistas na área da cultura com uma carreira já consolidada, como também a jovens com ideias inovadoras. As entrevistas serão conduzidas num estúdio improvisado dentro de um “chapa” em movimento pela cidade. Note-se que o “chapa”, transporte público de passageiros mais usado em Maputo, inspirou a imagem de marca de todo o projeto Maputo Criativa: o “chapa-limousine”, uma criação do artista plástico Ricardo Pinto Jorge.

Há ainda a assinalar, neste programa de iniciativas, o lançamento de novos eventos com periodicidade semanal ou mensal: as quintas e sextas-feiras estão já a acolher, na Associação dos Escritores Moçambicanos, intervenções como música ao vivo, performances e projecção de vídeos a partir das propostas apresentadas pelos próprios artistas; por seu lado, o Cine-Teatro Gil Vicente será palco para o INDI Project, que a partir de 9 de Novembro irá trazer à luz, uma vez por mês, novas produções independentes nas áreas da música e das artes digitais. Destaque-se ainda o happening mensal, a ocorrer em diferentes pontos da cidade, com vários tipos de intervenção artística.

A coordenação do projeto Maputo Criativa cabe ao italiano Simone Faresin, artista plástico de formação e dinamizador cultural por assumida vocação. Depois de viver quatro anos em Lisboa, durante os quais percebeu que na capital lisboeta se abre uma porta para outros mundos, Simone decidiu instalar-se em Maputo no início deste ano. Percebeu, quase de imediato, que a cidade possuía uma cena artística diversa e transbordante de talentos, embora com um público restrito e quase silenciada no panorama internacional. Tratando-se de um lugar onde se fala a quinta língua com maior representatividade no mundo, o português, havia que explorar esse mercado potencial vastíssimo. Depois de conseguir um pequeno financiamento para levar alguns jovens artistas moçambicanos a Fortaleza, no Brasil, e, sobretudo, do sucesso desta missão artística em terras de Vera Cruz, Simone Faresin passou a conceber a possibilidade de criação de uma rede de cooperação cultural transnacional a partir de Maputo, mas com os olhos postos nos restantes países de língua oficial portuguesa e, por força das suas raízes, em Itália. Maputo Criativa traduz a conceção dessa possibilidade, apontando para que a próxima paragem do “chapa-limousine” possa ser em Portugal.

 

A adesão a iniciativas e o envio propostas ou sugestões para o projeto Maputo Criativa devem ser feitos através do e-mail: proispu@gmail.com

Consulta de informação mais detalhada aqui.

 

 

 

 

por Lurdes Macedo
Vou lá visitar | 5 Novembro 2016 | arte em rede, cidade, criatividade, Maputo