CAMPUS UNIVERSITÁRIO: uma reflexão para o século XXI a partir do estudo de caso da instalação da Universidade de Cabo Verde

Este artigo debate a relação entre concepções arquitetônicas e modelos educacionais para o ensino superior no século XXI. Para este fim analisaremos o caso da instalação da Universidade de Cabo Verde. É possível vislumbrarmos um projeto arquitetônico com melhor capacidade de atender a uma universidade localizada no continente africano no início do século XXI? Esta discussão será capaz de apontar novos caminhos para arquitetura e ensino superior ou estará refém de paradigmas anteriores, produzidos pelo norte global? Nossa argumentação divide-se em cinco partes. Na introdução, apresentamos uma síntese das respostas históricas que a arquitetura tem dado a diversos modelos de universidade. A seguir, centralizaremos nossa análise na racionalidade arquitetônica do século XX. No item seguinte, demonstramos como o surgimento das universidades é um projeto político amparado pelas estruturas de poder social vigente em cada período histórico. No quarto item, focamos na Universidade de Cabo Verde. Finalmente, analisamos a relação indiscernível entre projetos políticos, pedagógicos e arquitetônicos para a Universidade.

1. ARQUITETURA, PEDAGOGIA E PODER

Ao longo da história das universidades, a questão arquitetônica esteve profundamente ligada a seus diferentes projetos pedagógicos. O nascimento das universidades, na Europa do século XV, é um projeto eminentemente urbano e, portanto, suas instalações ocupam o centro de diversas cidades, como é o caso de Bolonha, Paris ou mesmo Coimbra, centro de formação superior de muitos cabo-verdianos. Nos Estados Unidos, em épocas posteriores, ao contrário, as universidades se instalam longe do “descontrole das cidades”. É neste contexto que nasce e vigora a denominação campus, do latim, campo. Como afirma Carlos Andrade, sobre a noção de campus universitário nascido nos EUA, no prefácio do livro “Arquitetura e Educação: Campus Universitários Brasileiros”, de Gelson Pinto e Ester Buffa: “apoiado em uma ideologia antiurbana, o campus universitário emerge a partir do college do período colonial, como lócus segregado da cidade, ambiente no qual o afastamento da turbulência citadina permitiria o desenvolvimento sem peia da ciência e do conhecimento” (ANDRADE, 2009, p. 01).

Outras denominações seguirão no universo dos territórios universitários: “cidade universitária” ou “bairro universitário”. Mais do que simples nomenclaturas, tais terminologias invertem o sentido agrário do termo “campus”: “no lugar de um campo, a cidade, à imagem da cidade na qual se insere, ainda que especializada, como cidade universitária” (ibidem, p. 02). Apesar de etimológica e semanticamente distintos, em alguns países, como o Brasil, estes termos, “campus” e “cidade universitária”, acabam usados como sinônimos. Estudiosos no tema afirmam, contudo, que a limitação nos serviços oferecidos nos territórios universitários brasileiros, torna mais apropriada a terminologia “campus” (PINTO; BUFFA, 2009, p. 35).

Em termos de projeto pedagógico, as universidades, desde a sua origem, sempre estiveram ligadas à formação das elites intelectuais próximas aos regimes de poder de cada época. Todavia, em finais de século XX, têm surgido propostas para a popularização da universidade (SANTOS, 2006a; RISTOFF; SEVEGNANI, 2006) e o acesso ao ensino superior tem sido reivindicado por diversos movimentos sociais como democratização do conhecimento e da sociedade em geral. Iniciativas como a Universidade Popular dos Movimentos Sociais (UPMS), proposta por Boaventura Santos no III Fórum Social Mundial, tem demonstrado a necessidade de profundas transformações no ensino universitário. Em sua concepção, a UPMS tem “o objetivo de proporcionar a autoeducação dos ativistas e dirigentes dos movimentos sociais, bem como dos cientistas sociais, dos investigadores e artistas empenhados na transformação social progressista” (SANTOS, 2006a, p. 168). Do mesmo modo, o Movimento dos Sem-Terra vem desde meados dos anos 1990 concebendo, articulando e promovendo a formação superior para os seus militantes, inicialmente em parceria com universidades públicas e, desde 2005, por meio de escola própria, a Escola Nacional Florestan Fernandes – ENFF, em São Paulo (TEIXEIRA, 2006). Mais do que formação, a educação superior no MST tem permitido a sistematização científica do conhecimento sobre e a partir do movimento, com a elaboração de pesquisas e monografias de conclusão de curso em diversas áreas. Um dos fundamentos pedagógicos dos cursos da ENFF é a pedagogia da alternância, isto é, o aluno dedica-se igualmente ao tempo/escola e ao tempo/comunidade, garantindo uma maior relação entre teoria e prática: “o aluno, apossando-se do referencial teórico, terá melhores condições para participar do projeto de transformação da sociedade, a construção de uma sociedade com menos injustiças sociais, uma sociedade mais humana” (ibidem, p. 98). 

   

No concernente ao projeto arquitetônico, importa destacar que a arquitetura universitária, enquanto arquitetura oficial tem reforçado, ao longo da história, “a percepção das universidades como locais de saber e representação política” (ROSMANINHO, 2006, p. 230). Um exemplo bastante contundente é a Universidade de Coimbra, cujo projeto da cidade universitária alinhou-se claramente à ideologia do Estado Novo, regime político ditatorial vigente em Portugal de 1933 a 1974. O caráter nacionalista do regime de Salazar foi intencionalmente traduzido pelos autores do projeto da cidade universitária nas suas linhas monumentais, impositivas e grandiosas (ibidem).

A relação entre espaço e poder foi bastante aprofundada em Foucault (1988). Para o autor, a questão espacial não está confinada aos indicadores de distância, outrossim, é uma categoria política e sua demarcação, prática de poder. A arquitetura como ciência do espaço é igualmente categoria política e responde aos desígnios de seus interlocutores, podendo colaborar para produzir e reproduzir ideologias dominantes ou, por outro lado, pode contribuir à autodeterminação e emancipação de atores sociais subalternos. Projetos de instituições universitárias não seriam exceção.

Diante deste quadro sintético, apresentado acima e transcorridos mais de cinco séculos desde as primeiras universidades, quais os rumos para uma concepção espacial em consonância com as diretrizes pedagógicas do século XXI? A partir do estudo de caso da recém-instalada Universidade de Cabo Verde, em África, vislumbraremos algumas hipóteses para esta questão.

2. ANTECEDENTES: OS PARADIGMAS ARQUITETÔNICOS DO SÉCULO XX

No século XX, a arquitetura modernista com seu modelo de cidade funcionalista consolida a divisão territorial das cidades, de acordo com as suas funções, e é enfatizado o conceito de campus universitário com as instalações acadêmicas concentradas e afastadas dos centros urbanos. As universidades fundadas ao longo do século XX em sintonia com o pensamento arquitetônico de sua época, majoritariamente refletirão os preceitos da arquitetura e urbanismo funcionalistas modernistas.

Este era o paradigma predominante, por exemplo, no Brasil cujas universidades foram criadas a partir dos anos 1930, com a justaposição de institutos e escolas pré-existentes, a reforma universitária de 1968, veio mudar significativamente o modelo espacial universitário brasileiro, em consonância com uma outra organização estrutural: de cátedras as universidades passando a organizar-se por departamentos (a menor fração da estrutura universitária). A reforma fortalece, ademais, a pesquisa científica como uma das funções fundamentais da universidade. Consultores internacionais elaboraram o “Manual para Planejamento Integral do Campus Universitário”, consolidando definitivamente o modelo de campus para as universidades brasileiras (PINTO e BUFFA, 2009). Apesar da predominância do modelo de ocupação de território em campus afastado, sobretudo após os anos 60, algumas universidades federais brasileiras se instalam em meio à malha urbana consolidada, como é o caso da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal do Ceará (UFC), com departamentos e faculdades difusos pelos centros urbanos de Belo Horizonte e Fortaleza, respectivamente.

O continente africano também esteve sob forte influência da arquitetura moderna. Le Corbusier, Oscar Niemeyer e outros grandes nomes deste período construíram importantes edifícios no continente. Sob esta ótica foram planejados, por exemplo, os campi da Universidade de Ibadan (1960), na Nigéria e da Universidade Mentouri de Constantine (1970), na Argélia, para citar alguns. Os dois campi foram projetados por renomados arquitetos modernistas: Maxwell Fry e Jane Drew em Ibadan, e Oscar Niemeyer em Constantine. Ambos foram construídos em zonas apartadas dos centros urbanos, conforme o modelo predominante durante todo o século passado.

Em 1933, durante o IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna – CIAM, foi escrita a Carta de Atenas, como ficou conhecido o manifesto de arquitetos urbanistas, no qual era defendido o planejamento das cidades funcionais com a separação dos espaços urbanos conforme sua função: habitar, trabalhar, circular e criar espaços de lazer. A maior experiência urbanística dentro dos moldes propostos pela Carta de Atenas é Brasília, capital do Brasil, projetada pelo arquiteto Lúcio Costa.

Para os arquitetos modernistas, a cidade é traçada a partir de um “vôo de pássaro”, em perspectiva, sempre vista de fora e de cima. Esta matriz conceitual lida melhor com a cidade “ideal” do que com aquela frontalmente oposta à racionalidade do progresso linear, da universalidade e das divisões do espaço por zonas funcionais. O planejamento urbano na sua matriz modernista funcionalista pressupõe não apenas a cidade ideal, mas a construção de um novo homem para habitá-la. Evidente que para os arquitetos deste período, arquitetura e planejamento urbano eram soluções intelectuais e de gabinete. Sem entrar no mérito arquitetônico da produção do período, com valiosas contribuições para a história e pensamento da arquitetura, este modelo de produção teve por base uma esperança exagerada nas benesses da industrialização e das revoluções socialistas do início do século passado.

Os pensadores daquele período acreditavam que a máquina liberaria o homem do trabalho, permitindo uma maior dedicação ao seu tempo livre e de lazer. Em simultâneo, o “homem coletivo e politizado”, reunido nos partidos operários e comunistas, apontava para um modo de vida no qual os grandes espaços de convivência e manifestações populares seriam mais relevantes do que aqueles da vida privada e individualizada. Projetando para este homem, a arquitetura modernista apresentou soluções extraordinárias para a “casa máquina de morar”, conforme defendida por Le Corbusier: quartos e espaços privados reduzidos ao mínimo em favorecimento de uma maior generosidade espacial para os locais de encontro, a sala, em termos habitacionais e centros cívicos em termos urbanos. Contudo, aqueles arquitetos num contexto de transformações sociais não contavam com o avanço do capitalismo ocorrido nas últimas décadas do século, revertendo o bem comum em favor do máximo individualismo. O mercado imobiliário traduziu à sua maneira os conceitos modernistas: manteve os espaços bem projetados e super reduzidos da esfera privada, acrescentando uma hiper redução (ou eliminação) dos espaços de convívio. Desta maneira, há um maior aproveitamento do solo, ou maior ganho econômico em função da sua máxima exploração. Os espaços de lazer também foram reduzidos e cercados (privatizados). Este é o caso das praças públicas, paulatinamente substituídas pelos “playgrounds” dos condomínios fechados, de uso exclusivo dos moradores, ou das praças de alimentação nos centros comerciais. Por sua vez, os centros cívicos e largas avenidas projetados pelos arquitetos modernistas serviram enormemente aos inúmeros e distintos regimes ditatoriais do período.

Os arquitetos modernos projetaram para um homem e uma cidade que nunca existiram. As gerações posteriores, afastadas da elaboração conceitual daquele paradigma, fizeram bom uso de seu modelo construtivo eficaz para atender à lógica de mercado. Em ambos os casos, a cidade e sua natureza de diversidade e espontaneidade, foram continuamente negadas. Até hoje modelos funcionalistas permeiam os quadros da administração pública em tentativas de domar a ocupação do espaço urbano e domesticá-lo à sua vontade. Há um descolamento da matriz modernista em relação à realidade urbana, a qual foi designada pela urbanista Ermínia Maricato de “matriz postiça” (2001, p. 136). Em outras palavras, há um desencontro entre a retórica do planejamento e a sua prática, no qual debates e planos permanecem no mundo das ideias ignorando a prática social de ocupação do espaço.

Após este breve interregno pela história da arquitetura do século XX é possível perceber que o modelo de campus universitário apartado da cidade faz parte do padrão dominante daquele período, no qual era suposto que a função “ensino superior” ocupasse um espaço específico e exclusivo no espaço urbano. Nos últimos 30 anos os dogmas da arquitetura modernista têm sido veementemente questionados, abandonados ou reelaborados.

No entanto, a nova matriz de planejamento urbano desenvolvida no esteio das políticas neoliberais preconizadas pelo Consenso de Washington (1989) não é menos defasada da dinâmica de ocupação dos espaços urbanos do que a matriz anterior. O modelo deste período, designado “planejamento estratégico”, com forte influência especialmente a partir dos anos 90, apresenta um caráter marcadamente empresarial, sob a ótica da eficácia, da eficiência, da mercadoria e do consumo. Deste modo, a cidade é assumidamente um cenário para as ações de marketing, como o caso de Barcelona com a Olimpíada de 92, e deve competir para atrair investidores[3]. Em outras palavras, o planejamento urbano modernista não reconheceu a cidade não-ajustada ao seu racionalismo, e o planejamento urbano pós-moderno tem a ocultado deliberadamente.

Sob o modelo das privatizações e da lógica de mercado, a educação superior sofre imensas transformações neste período: ao invés de reflexão e formação crítica, o ensino superior deve atender à demanda pela formação qualificada ao mercado de trabalho. Inúmeros são os casos de edifícios comerciais adaptados às novas funções de ensino. Asseptizados e despersonalizados, estes espaços colaboram para um profundo processo de alienação e perpetuação das estruturas dominantes.

Se nos anos 70 e 80 estiveram em auge os pensamentos pós-modernistas das cidades-cenário, em oposição irônica à racionalidade anterior, em seu declínio epistemológico serviram bastante bem às necessidades neoliberais de conceber o espaço urbano e a arquitetura. Como encontramos este debate na passagem do século? A realidade da intensa urbanização global, com megacidades de milhões de habitantes, distantes dos planos urbanos de Le Corbusier e Lúcio Costa, impõe e demanda urgentemente outras abordagens sobre o território e sobre os espaços construídos. Fortes influências do pensamento pós-colonial e dos urbanistas e pensadores latino-americanos têm pouco a pouco alterado a perspectiva eurocêntrica, ou melhor, “norte-cêntrica”, nos debates internacionais sobre cidades.

Da América Latina, muitas práticas de planejamento participativo têm apontado para um novo patamar de planejamento rumo à reforma urbana, muito mais próximo de conquistas socialmente igualitárias na ocupação do espaço urbano. Em África, importantes centros de pesquisa vêm produzindo encontros, colóquios e publicações com foco nas especificidades das cidades africanas, ao invés de discuti-las a partir de padrões importados. Neste debate para a implantação do campus universitário da Universidade de Cabo Verde é fulcral tomar-se em conta que o projeto espacial e a ocupação do território podem estabelecer diálogos com distintas e, por vezes, opostas vertentes do planejamento urbano e da arquitetura.

 

3. AS PERSPECTIVAS POLÍTICO-PEDAGÓGICAS DO ENSINO SUPERIOR

As primeiras universidades originárias do modelo contemporâneo foram implantadas na Europa, no final da idade média, sob perspectiva fundamentalmente urbana, como vimos. No cenário político daquele período, o projeto de universidade nasce sob os auspícios das monarquias e do clero. Voltadas para ensino, pesquisa e produção de saber, os interesses das universidades estiveram profundamente ligados aos jogos de poder social, seja à Igreja ou à razão, conforme concebe Kant, à cultura, segundo definições de Humboldt, e, atualmente, ao mercado (BELLEI, 2006, p. 53). Nascida da institucionalização do ensino, sua prática não estava voltada para emancipação social, outrossim, para a formação de elites educadas, com vistas a ocupar cargos nos quadros de Estado e outras instituições. Com o avanço do modo de produção capitalista, a Universidade é um dos lugares privilegiados de produção e reprodução da racionalidade cultural da modernidade. Contudo, o ensino superior sempre foi central ao desenho de valores do Estado, pautando sua missão sob o prisma da função social e nacional.

A partir dos anos 60 e adotando-se como marco as revoltas estudantis de maio de 1968 em Paris, as perspectivas kantianas da razão e humboltianas da cultura têm sido rapidamente substituídas por preceitos basilares à eficácia de mercado (BELLEI, 2006). Neste sentido, as humanidades perdem verbas e espaço em detrimento dos saberes das ciências exatas e biológicas, nomeadamente as engenharias e as novas tecnologias. O saber científico supostamente objetivo e neutro subsidia a formação de técnicos mais voltados ao aumento da eficiência e da eficácia, segundo padrões de medidas da produtividade capitalista, e cada vez menos aptos à reflexão crítica destes próprios padrões.

O avanço dos valores de mercado, acirrados especialmente nas últimas décadas com a consolidação da globalização neoliberal, tem penetrado diversos espaços da vida social e não é diferente na Universidade:

se invertem hierarquias de forma a privilegiar administradores mais do que docentes e pesquisadores; enfatiza-se a percepção do aluno como consumidor e do professor (devidamente rebatizado como “servidor”) como vendedor de pacotes prontos para entrega; e, por fim, institui-se a redução drástica do que se conhecia anteriormente como educação, ou seja, a formação ética do indivíduo para a cidadania e para o exercício das práticas sociais responsáveis, a formas rápidas e “produtivas” de adestramento (ibidem, p. 57, aspas no original).

Com efeito, neste ambiente resta pouco espaço para saberes e conhecimentos não científicos, dotados de outras temporalidades e cujos padrões de medições diferem daqueles usualmente aceitos pela racionalidade cognitivo-instrumental, ligada diretamente ao princípio de mercado para o qual individualismo e concorrência são centrais (SANTOS, 2005, p. 77). A maneira de criar teorias reprime, deslegitima, desacredita e invisibiliza conhecimentos próprios (SANTOS, 2006b, p. 46). Este modelo de produção e transmissão de conhecimento está fundamentado sob os moldes da “educação bancária”, criticada por Paulo Freire (2006), na qual o educando é considerado esvaziado de conteúdo e o educador, o responsável pelo seu preenchimento. A educação bancária é a pedagogia ideal para a lógica quantitativa que caracteriza a “universidade da excelência” (BELLEI, 2006, p. 58), na qual áreas como humanidades, literatura, filosofia e artes perdem espaço por desrespeitar “a exigência básica determinada pela ‘excelência’”, ou seja, a exigência de proteger o poder burocrático e o gerenciamento contábil”, devendo, “no limite, ser excluídas” (ibidem, p. 59, aspas no original).

É desta maneira que a universidade construiu ou colaborou para aquilo que Boaventura Santos designa por “monocultura do saber”. Para o autor, esta é uma das formas mais poderosas de produção da não-existência, isto é, tudo aquilo que está fora dos critérios de verdade da ciência moderna é desqualificado, desprezado e invisibilizado de modo irreversível (2006a, p. 102). A Universidade é um dos veículos por meio dos quais os cânones da ciência se consolidam como exclusivos da produção de conhecimento, e qualquer conhecimento produzido fora dos domínios da ciência e, consequentemente, da universidade, sob este prisma, é classificado de “ignorância”.

Santos apontou, sobretudo, a ciência moderna como grande instrumento epistemicida da modernidade, quando esta deliberadamente arrasa, marginaliza ou descredibiliza todos os conhecimentos não científicos que lhe são alternativos, tanto do norte como no sul (ibidem, p. 155). Para o autor, a ciência, o colonialismo e o imperialismo são aparelhos epistemicidas dominantes em toda a modernidade ocidental. A colonização e o imperialismo foram e são projetos que negam a diversidade de conhecimentos. Todo o sistema de organização no qual se assenta a modernidade ocultou diversas formas de opressão: o racismo, as castas, o sexismo e o colonialismo. Neste último, a educação e o sistema escolar nas colônias foram instrumentos significativos para a manutenção das estruturas de poder. O ensino nos países colonizados foi usualmente direcionado para formar habilidades necessárias para no máximo possibilitar a ocupação de cargos secundários na burocracia administrativa (ALTBACH, 1997). Ministrado no idioma das metrópoles, a educação formal foi altamente eficiente em inferiorizar ou dizimar conhecimentos locais.

No caso de Cabo Verde, a consolidação do ensino formal no país, na segunda metade século XIX, foi uma barreira à difusão, enquanto idioma culto, do crioulo, língua amplamente utilizada no cotidiano. A institucionalização do ensino do português nas escolas, em detrimento da língua materna, criou um contexto de competição desigual no âmbito político, cultural e linguístico, entre aqueles incluídos e os excluídos do acesso aos códigos linguísticos dominantes: “a escola cabo-verdiana exerceu as funções de ratificação, justificação e integração da ideologia e cultura dominantes (modelação do escolar colonizado à imagem-ideal do colonizador)” (CARVALHO, 2007, p. 07).

Na virada de racionalidade proposta por Santos está contemplada uma ecologia de saberes, com base “no reconhecimento da pluralidade de saberes heterogêneos, da autonomia de cada um deles e da articulação sistêmica, dinâmica e horizontal entre eles. […] O conhecimento é interconhecimento, é reconhecimento, é autoconhecimento” (SANTOS, 2006a, p. 157). As populações historicamente silenciadas são partes constitutivas da chamada ecologia de saberes necessários para a transição rumo à suplantação do conhecimento de regulação pelo de emancipação. Nas colônias europeias em África “os modelos educacionais indígenas foram destruídos deliberadamente ou como resultado de políticas que ignoravam por completo as necessidades e tradições” (ALTBACH, 1997, p. 453, tradução do autor).

Para se redesenhar uma outra concepção de universidade, menos conectada aos desígnios de mercado e mais voltada para a emancipação social dos cidadãos, é necessário trazer a ecologia de saberes para dentro das universidades. Isto significa reinstrumentalizar a prática universitária, ou seja, apreender novas maneiras de construção de conhecimento, menos pautadas pelas medidas padronizadas pela racionalidade cognitivo-instrumental. Se as ciências exatas foram responsáveis pelo desenvolvimento do modelo atual de educação e produção científica, é possível que para a universidade do futuro, as humanidades sejam a área de conhecimento mais adequada para fazer da ecologia de saberes, uma prática universitária. Contudo, desenhar um modo de construir conhecimento dentro de um modelo estruturalmente preparado para as convenções de medida atuais não é tarefa simples.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira – INEP, vinculado ao governo brasileiro, organizou de 2004 a 2006 diversos simpósios acerca do Plano Nacional de Educação daquele país. Um deles versava exclusivamente sobre Universidade e Compromisso Social, sob a ótica das políticas de Estado direcionadas para o ensino superior e a sua relação com a emancipação social. No centro do debate estava a relação entre um sistema de ensino superior pequeno, excludente e catedrático em contraposição a um sistema inclusivo, diversificado e democrático. Está assente nesta relação uma tensão entre aqueles que defendem a universidade como um “lugar onde pessoas altamente inteligentes e rigorosamente selecionadas convivem com os melhores doutores e mestres” (RISTOFF e SEVEGNANI, 2006, p. 12) e outros que entendem o ensino superior dentro de um modelo de inclusão, ou seja, um “conflito entre um sistema de educação superior de elite e um sistema inclusivo” (ibidem, p. 13). Em linhas gerais, o resultado deste simpósio concluiu que cabe às humanidades reverter a transformação do ensino universitário em prática de mercado pautada sobre os avanços das ciências duras para um local de construção do pensamento capaz de levar indivíduos a construir suas próprias oportunidades e de contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos de um país.

Sob este aspecto, a universidade, sobretudo pelas humanidades, tem a responsabilidade de incluir conhecimentos historicamente alijados da produção científica, igualmente capacitados para contribuir com a emancipação social e com a construção de uma nação soberana e democrática. A questão que se coloca neste ponto é: como efetivamente abrir espaço para estes conhecimentos, de modo a que façam parte da produção acadêmica, sem que pra isso se incorra numa hierarquização subordinada? Como enfrentar a racionalidade reguladora da universidade para que se cumpra seu papel de tutora e tradutora da ecologia de saberes? Qual a relação entre estes modelos de universidade e a questão arquitetônica e de ocupação territorial? Uma universidade afastada dos “problemas da cidade” não estaria orientada ao modelo de universidade menos includente? Será que uma universidade difusa pelo espaço das cidades seria mais aberta à inclusão de diversas formas de conhecimento?

Estas são questões paradigmáticas que se impõem neste início de século. A Universidade de Cabo Verde, instalada em pleno século XXI em um continente historicamente desconsiderado como produtor do conhecimento científico tem a oportunidade de inscrever uma nova proposta de universidade, cuja tradução passa, necessariamente pelas opções de ocupação territorial e arquitetônicas.

4. BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE CABO VERDE

Cabo Verde é um país relativamente jovem, independente de Portugal há pouco mais de três décadas. O modelo colonial português não privilegiou a qualificação dos recursos humanos em suas colônias: “apesar de mais de quatro séculos nas terras ‘conquistadas’, os portugueses não se mostraram preocupados com as ‘realizações educativas’” (NEVES, 2008, p. 45, aspas no original). As universidades brasileiras foram instaladas após a independência, no início do século XX. Em África, apenas em Moçambique e Angola foram fundadas universidades durante o período colonial, tardiamente, diga-se, nos anos 1960. Mesmo em termos de ensino primário, apenas em 1845 foram instaladas e entraram em funcionamento as primeiras escolas no arquipélago. Contudo, em finais daquele século a situação do ensino primário era bastante precária, “o que revela que o governo colonial não se mostrava interessado numa sólida e eficaz política de ensino para as colônias” (ibidem, p. 65). A questão educacional em Cabo Verde sempre foi uma conquista, a exemplo da implantação do primeiro liceu nacional, em São Vicente, nos anos 1917 (CHANTRES, s/d), após a polêmica seguida ao fechamento do Seminário-Liceu em São Nicolau, em funcionamento desde 1866 (NEVES, 2008, p. 45) e da fugaz existência do Liceu Nacional, na Praia, em fins do século XIX.

Por conseguinte, a tradição educacional nas colônias portuguesas sempre tendeu para o envio dos estudantes à metrópole. Este modelo, de natureza excludente, reforçou o abismo social entre a pequena elite educada e o resto da população. Em Cabo Verde a elite letrada constitui o principal grupo mediador entre os nativos e as autoridades metropolitanas, sobretudo a partir do século XIX, tendo tido um papel fundamental na invenção “da identidade cabo-verdiana enquanto algo essencial ao conjunto das ilhas” (ANJOS, 2002, p. 27). Mais do que contestar o regime colonial, a identidade forjada na viragem dos séculos buscava afirmar um regionalismo específico à Cabo Verde dentro do império português. Ancorada na construção da mestiçagem, a base identitária cabo-verdiana corroborava do discurso ideológico do fascismo português (ibidem, p. 101), ocultando a violência colonial racista e facilitando, internamente, a ocupação de posições privilegiadas na estrutura social pelos mestiços letrados. Até pelo menos os anos 70, os intelectuais cabo-verdianos em sua maioria educados na metrópole “são escritores voltados para uma relação Cabo Verde - Portugal […] à espera do ‘consagrante olhar de Lisboa’” (ibidem, p. 149).

Culturalmente, ainda hoje, os estudantes regressos de Portugal, sobretudo de Coimbra, gozam de status social diferenciado daqueles vindos de outros países. Em adição, “o projeto civilizador português” em Cabo Verde foi realizado, principalmente, por meio da educação” (BARROS apud ELLERY, 2009: 79). A elite cabo-verdiana formada em Portugal ocupou cargos administrativos em diversos países da colônia portuguesa, resultando, inclusivamente, em status diferenciados entre os cabo-verdianos e demais colonizados: “foi formada uma elite intelectual em Cabo Verde que compactuou com o projeto colonial por meio da criação de um conjunto de ideologias que afirmava a superioridade dos mestiços cabo-verdianos, com a justificativa da assimilação” (ELLERY, 2009, p. 102).

Sob o ponto de vista do dominador, a educação colonial cumpriu “uma tripla missão: o conhecimento (elementar), a adaptação e assimilação” (CARVALHO, 2007, p. 250). Até os dias atuais, os livros didáticos usados nas escolas primárias e secundárias em Cabo Verde são em grande parte importados de Portugal. Ao cabo-verdiano em idade escolar são apresentados detalhes da geografia e da história europeias e muito pouco sobre as guerras de libertação em África, em um descolamento de sua própria realidade.

Durante o período colonial, a educação formal foi importante instrumento epistemicida, uma vez que negava as diferenças culturais em favor de uma “universalidade” exclusivamente eurocentrada, produtora da “invisibilidade das colônias e das suas culturas” (SANTOS, 2006a, p. 143). Com vistas a um desenvolvimento autóctone e emancipatório, um projeto de universidade no país deve construir as bases do ensino superior nacional, fortemente atrelado à investigação científica. A longo prazo, isto significa, entre outras coisas, desdobramentos em todos os níveis de ensino, com a produção de material didático-escolar cada vez mais próximo da realidade nacional. Por sua vez, em um contexto pós-colonial de transição paradigmática, deve-se atentar para não reproduzir no país o modelo positivista que alijou das universidades todo o conhecimento não-científico, “considerados locais, tradicionais, alternativos ou periféricos” (SANTOS, 2006a, p. 153).

Diante deste quadro, apresentado muito sucintamente, em 2004 foi instaurada a Comissão Nacional para a Instalação da Universidade de Cabo Verde, cuja missão central era criar as condições necessárias para a instalação da universidade. Entre as principais ações previstas a serem realizadas pela comissão, merece destaque a sua colaboração em apoiar o governo “na construção de um amplo e sólido entendimento político em torno do desenvolvimento do ensino superior, como fator essencial de progresso cultural, científico, técnico, social e econômico de Cabo Verde” (CNI-UNI CV, 2005, p. ii). Parte de um projeto de sociedade, o governo central estava apostando no valor econômico do conhecimento como um meio para a inserção competitiva do país na economia regional e mundial e como um “mecanismo mais eficaz de desenvolvimento humano” (ibidem). 

Neste cenário, é criada a Universidade de Cabo Verde em 2006, dois anos após a instalação da Comissão, reunindo escolas superiores isoladas criadas ao longo dos anos 90, a saber: ISECMAR – Instituto Superior Ciências do Mar (1996); ISE – Instituto Superior de Educação (1995); ISCEE – Instituto Superior das Ciências Econômicas e das Empresas (1998); e INAG – Instituto Nacional de Administração (1998) (ibidem). Ainda está em estudo a possibilidade de inclusão do INIDA – Instituo Nacional de Investigação e Desenvolvimento Agrário (1992), na estrutura orgânica da UNI-CV.

No ano letivo 2008/2009 a universidade ofereceu 60 cursos, entre superiores profissionalizantes, bacharelados, licenciaturas e mestrados, frequentados por mais de 3.200 alunos e ministrados por quase 300 docentes. Ainda que a maior parte dos professores (53%) tenha nível de licenciatura, houve um incremento de 55% no número de mestres e 90% de doutores, em apenas um ano (2007/2008): de 70 para 109, e de 09 para 17, respectivamente (MARQUES, 2009, p. 17).

Em entrevista à revista da UNI-CV, Antonio Correia e Silva, reitor da universidade (2006-2011), destacou a relevância da UNI-CV para “aumentar a acessibilidade social ao Ensino Superior”, acrescentando que “não se trata mais, como foi no passado, de formar pequenas elites. O Ensino Superior em Cabo Verde só pode desempenhar papel de fator de transformação social profunda se os seus formados atingirem uma dimensão crítica” (CORREIA E SILVA, 2009, p. 13). Neste sentido, confirmando o projeto da comissão instaladora, a universidade vem sendo direcionada, segundo Correia e Silva, para ser um “lugar de formação cidadã, uma vez que a nossa missão não se resume à formação para a profissão” (ibidem, p. 15).

4.1. As instalações atuais (2009/2010)

A universidade tem campi em duas ilhas, Santiago e São Vicente, com unidades espalhadas pelo espaço urbano de Praia e Mindelo, num total de cinco conjuntos arquitetônicos principais: (1) reitoria em dois edifícios no Plateau (Praia); (2) vice-reitoria e Departamento de Ciências Sociais e Humanas, em sala alugada e prédio próprio, respectivamente, no centro de Mindelo; (3) Escola de Governação e Negócios na Achada Santo Antonio (Praia); (4) Departamentos de Ciência e Tecnologia e de Ciências Sociais e Humanas, no Palmarejo (Praia); e (5) Departamento de Engenharia e Ciências do Mar, em diversos prédios circunvizinhos, em Ribeira Julião (Mindelo). 

De um modo geral, este conjunto difuso é formado por prédios adaptados às novas funções, a partir da inclusão dos antigos institutos de ensino no projeto da universidade. O atual edifício da reitoria, no Plateau, Praia, é um prédio modernista, de baixo gabarito, protegido da incidência solar por brises soleil, cuja primeira ocupação foi o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Dada a insuficiência de espaço para todas as funções reitorais e administrativas neste prédio, parte das diretorias e centros foram instalados no prédio em frente, conhecido por Escola Grande. São três edificações conjugadas: uma de linhas neoclássicas, construída dentro dos padrões escolares predominantes em inícios e meados do século passado; outra de vertente timidamente modernista, com seu traçado sóbrio e de linhas retas, próprio dos anos 50 e 60, apesar de construção recente; e finalmente, o edifício voltado para a Av. 05 de julho, marcadamente art-deco, com a imponência característica dos prédios públicos deste movimento artístico-arquitetônico. No primeiro funcionou durante toda a época colonial a Escola Central da Praia (Escola Primária). Os demais sediaram o Centro da Mocidade Portuguesa (anos 50 e 60) e posteriormente a Escola de Formação de Professores e o ISCEE, até serem definitivamente ocupados pela UNI-CV.

Os três edifícios, apesar de externamente aparentarem edificações independentes, estão bastante conectados em seu interior, tornando difícil o discernimento de onde começa um e acaba o outro. São pequenas salas emaranhas e improvisadas, com uma planta labiríntica de orientação confusa. Os departamentos estão ali instalados de maneira precária, com déficit de luminosidade ou excesso de sol. As instalações sanitárias são claramente insuficientes para atender o número de funcionários. Para completar, os prédios ainda são compartilhados com salas de aula, cujos alunos se misturam com os departamentos administrativos da universidade, sem a adequada estrutura.

O edifício da ENG, de todos os prédios da UNI-CV, é provavelmente o mais precário em termos arquitetônicos: um grande barracão de porte industrial e telhado de duas águas, que a primeira vista parece ter sido construído para depósito. Em uma planta retangular, seu interior é dotado de uma grande sala de acesso, repleta de sofás num layout de super ocupação do espaço, pouco funcional. Ao redor desta grande sala, estão as salas de aula e de apoio.

Ainda na Praia, as instalações do Palmarejo, embora com inúmeros problemas de projeto, é a edificação mais apropriada ao ensino, entre todas as instalações da UNI-CV. O prédio de linhas sóbrias, de influências modernistas, numa releitura contemporânea, acolhe salas de aula e estruturas de apoio (departamentos, cantina, biblioteca). A rampa de acesso e o hall de entrada foram apropriados como espaços de convívio dos alunos, mesmo com a falta de mobiliário para tal.

Em Mindelo, dos três conjuntos arquitetônicos instalados, dois estão no centro urbano, e o maior deles em Ribeira Julião, bairro afastado da malha urbana consolidada. Em termos de tempo de deslocamento esta unidade não dista mais do que dez minutos do centro, contudo, a precariedade e falta de regularidade nos transportes públicos torna o campi isolado e de difícil acesso. Os campi de Ribeira Julião não são um todo homogêneo, ao contrário, é formado de vários edifícios construídos em distintas épocas, para os mais diversos fins (aulas, residência estudantil, laboratórios, serviços acadêmicos). O conjunto arquitetônico é confuso, prejudicando a orientação entre os prédios e salas de aula e apoio. Nesta estrutura constam a residência estudantil e edificações habitacionais sem uso. Recentemente, foi inaugurado um novo prédio para salas de aula, com quatro andares que se destaca na paisagem, predominantemente de baixo gabarito. De traços pós-modernos e referências a máquinas náuticas, o prédio apresenta misturas em termos volumétricos e de texturas de acabamento. Uma das faces recebe incidência solar direta, o que prejudica a qualidade térmica das salas de aula particularmente, no período da tarde.

As outras instalações no centro de Mindelo não são muito distintas no que concerne à sobreposição de espaços conforme as necessidades, sem um plano geral para orientar o crescimento da universidade. A vice-reitoria está num andar de um prédio de escritórios, misturado com funções alheias à universidade. O DCSH/Delegação São Vicente ocupa a parte posterior do antigo liceu Jorge Barbosa, cuja planta de ocupação obedece aos padrões escolares antigos: grande pátio central contornado por salas de aula.

De um modo geral, as instalações físicas da Uni-CV formam de um conjunto edificado heterogêneo, de sobreposições temporais e funcionais, composto por diversas edificações espalhadas pela malha urbana de duas cidades. As demais sete ilhas habitadas do país não possuem quaisquer instalações da Universidade, e, até o momento, não há planos para tal expansão geográfica. Neste sentido, após quatro anos de implantação, em termos de instalação (e não de parcerias) não é possível vislumbrarmos a “universidade em rede”, conforme o plano estratégico da comissão instaladora (CNI-UNICV, 2005, p. vi). É de fundamental importância tomar esta premissa como base orientadora para direcionar os planos de instalação física da universidade, uma vez que a arquitetura e a ocupação territorial devem necessariamente refletir seus modelos estratégicos e pedagógicos. Neste ponto, vale enfatizar que as novas possibilidades tecnológicas têm influenciado sobremaneira as demandas por espaço físico, o que não deve ser descartado ao vislumbrarmos uma universidade em pleno século XXI. 

A maneira como as instalações prediais se relacionam com as cidades é outro fator basilar de reflexão: para uma universidade, cujo projeto de instalação compreende conhecimento como desenvolvimento, há que se garantir uma implantação orgânica com a sociedade. Do contrário, tender-se-ia a promover eventos de divulgação acadêmica (congressos, cursos de formação, atividades de extensão e outros) exclusivamente para a comunidade universitária. Um campus afastado da malha urbana raramente é convidativo à participação da população, seja pela dificuldade de transporte, seja por estar deslocado da rotina da vida da cidade.

4.2. As propostas para o Campus da Praia

A cada ano há um aumento significativo do número de alunos a ingressarem na universidade, sobretudo pela maior oferta anual de cursos. Por este motivo, as atuais instalações chegaram ao seu ponto de saturação, sendo cada vez mais urgente a previsão de novas salas de aulas e estruturas de apoio.

Desde a sua criação, diversas foram as possibilidades de ocupação do território pela Universidade, debate predominante, sobretudo na Praia. Em Mindelo, a ocupação do território não ganhou relevância até o momento, havendo uma inércia com relação às estruturas espaciais e territoriais herdadas dos antigos institutos.

A Câmara Municipal da Praia destinou dois diferentes locais para a inclusão do ensino superior: a Unidade Operativa de Planeamento e Gestão – UOPG 31 (Monte Vaca, Monte Cristovão, Pedregal e Covão Faro), na saída para o interior da ilha e a UOPG 22 (Saco, Monte Babosa, Simão Ribeiro), no eixo oeste, de ligação com Cidade Velha. Esta última está registrada na publicação de uma das versões do Plano Diretor Municipal[4]. A primeira consta de relatório interno da Uni-CV, mesmo documento no qual estão descritos os motivos para a recusa da área, sobretudo devido à sua proximidade com zonas industriais e de tratamento de lixo (UNI-CV, s/d, p. 05).

Por sua vez, o governo central tem planos de implantar um grande bairro institucional na zona periférica da cidade, a oeste de Palmarejo, em direção à Cidade Velha, denominada Zona K, na qual estaria uma parte de 30 hectares designada para a universidade. Esta parece ter sido a área melhor recebida pelos setores decisórios da Uni-CV, conforme relatórios internos, por apresentar vantagens econômico-financeira (terreno doado); técnico-científicas (proximidade do mar permite desenvolver projetos de investigação sobre energia), economias infraestruturais (proximidade da infraestrutura urbana de água e luz).

No atual estágio decisório, não há ainda um consenso interno na universidade sobre quais deveriam ser as instalações nesta zona. Entre aqueles funcionários instalados no centro urbano alguns discordam da transferência para uma zona afastada. A residência de estudantes é também ponto de polêmica: deve-se condenar os estudantes à falta de convívio com o resto da cidade, sobretudo nos horários noturnos? Ou esta será uma melhor opção visando a uma maior dedicação aos estudos?

Claro está que o governo planeja implantar na referida zona os mais diversos serviços urbanos, contudo, deve-se ressaltar que a economia local apresenta dinâmica insuficiente para deslocar uma grande quantidade ou variedade de serviços para uma zona afastada. No Plateau, região mais antiga da cidade, poucas são as opções, por exemplo, para almoço. No Palmarejo, outro bairro com instalações da Uni-CV, menos ainda são as opções na vizinhança. Portanto, é pouco credível contar com a capacidade de instalação de comércio e serviços na região projetada. Resulta que em seu projeto de instalação, a universidade deverá prever uma boa infraestrutura de atendimento para seus alunos, docentes e funcionários.

Em termos de planejamento urbano, vale fazermos uma pequena digressão sobre a Zona K, um forte indutor do crescimento urbano para o eixo oeste da cidade. Esta indução não é aleatória: há diversos terrenos nas proximidades, em especulação imobiliária (Santiago Golf Club, Monte Babosa, Palmarejo Grande). Grandes obras governamentais nesta direção favorecem, portanto, a valorização do estoque de terras na região. Outro ponto central de argumentação é a fragilidade do crescimento urbano na cidade da Praia ao longo dos últimos anos, com uma forte sobrecarga infraestrutural para o poder público local. A cidade tem apresentado um quadro de crescimento forçado pelas empresas do setor imobiliário, na direção oeste, deixando pelo caminho diversas áreas vazias e ociosas. Esta opção de crescimento faz com que seja necessário cada vez mais investir na expansão da infraestrutura (água, luz, esgotamento, transporte), enquanto bairros infraestruturados não são devidamente adensados, como Palmarejo e Cidadela, no mesmo eixo de crescimento da Zona K, tratando-se de uma deseconomia urbana. Toda a população paga direta ou indiretamente por esta expansão, mas apenas uma parcela muito pequena dos habitantes é beneficiada por este crescimento, nomeadamente, os detentores dos terrenos valorizados no processo.

Palmarejo Grande, projeto da IFH[5], na região imediatamente anterior à zona k, é a nova fronteira de expansão urbana da Praia, voltada para a classe de alto poder aquisitivo. Note-se que na ribeira entre Palmarejo Grande e a Zona K há uma comunidade de características rurais, consolidada há anos, com cerca de 250 habitantes. A comunidade conta com uma escola primária, plantações diversas e currais para animais. Com o avanço da ocupação nas zonas circundantes, há grandes chances da zona tornar-se um futuro bairro carenciado, merecedor de projetos futuros de apoio internacional ou então processos de remoção por parte da câmara, entre outras ações usuais.

O processo é simples e repete um padrão global: com a ocupação pelas classes de maior poder aquisitivo na vizinhança, haverá uma demanda por empregados. A tendência é que estes trabalhadores se instalem o mais próximo possível do trabalho, em áreas adequadas ao seu poder aquisitivo, ou seja, zonas de risco e de precariedade infraestrutural, uma vez que são mais baratas. Muito provavelmente será observado um crescimento paulatino da comunidade existente na ribeira, que sofrerá transformações nos seus hábitos de morar. Devido ao aumento da densidade, será cada vez mais inadequada, em termos de saúde pública, a convivência com os animais; diminuirão as áreas para plantação, resultado da forte pressão pela ocupação do solo com moradia. Os antigos moradores tendem a passar por uma fratura identitária: sofrerão rapidamente um processo de urbanização. Os conflitos resultantes deste crescimento serão parte do cotidiano da cidade: aumento da violência, epidemias. Contudo, apenas serão objeto de atenção do poder público, quando afetarem os bairros abastados na nova vizinhança planejada.

Enquanto a precariedade ficar restrita aos seus moradores, o bairro poderá crescer e se consolidar sem qualquer atendimento pelas demandas por infraestrutura. Este é um processo urbano perverso observado em diversas partes do mundo. No Morumbi, bairro de classe média alta em São Paulo, Brasil, prédios de luxo convivem lado a lado com casas precárias, sem saneamento ou energia. Do mesmo modo a área urbana conurbada entre San Diego (EUA) e Tijuana (México) apresenta diferenças contrastantes: os gramados verdejantes dos campos de golfe regados com a canalização do rio Colorado são o oposto dos bairros sem água em Tijuana. Em outra escala, os processos das maquiladoras norte-americanas implantadas em solo mexicano evidenciam no espaço urbano das duas cidades os enormes contrastes infraestruturais resultando num amplo processo de segregação espacial metropolitano de cariz internacional, neste caso. Na Praia, observamos, em outra escala, evidentemente, o mesmo processo: os adjacentes Kobon (bairro precário) e Palmarejo (bairro planejado de classe média/alta) se consolidaram na mesma época, para citar apenas um exemplo. Ambos são parte do mesmo processo de ocupação de território, no qual vantagens locacionais são acumuladas em uma vizinhança, em detrimento de outra.

O poder público por meio de planos urbanísticos tem colaborado para agravar, de modo geral, as desigualdades sócio-espaciais. O excesso de regulamentação por um lado e a tendência de criminalização de bairros pobres do outro resulta numa profunda “exclusão territorial” (MARICATO, 2007). Ao instalar-se na Zona K, seja com parte ou a totalidade de suas instalações, a universidade integra um processo de ocupação do território o qual tem seguido um padrão dialógico inclusão/exclusão na cidade da Praia. Neste contexto, qual deverá ser a sua responsabilidade social no sentido de garantir um crescimento sustentável para a região?

5. DESAFIOS FUTUROS

Em um cenário de mudanças e turbulências em diversas escalas, da local à internacional, no limiar do século XXI, no continente africano, o debate a partir da implantação da UNI-CV, tem imensa importância e grande potencial para consolidar as transformações radicais que temos observado nas últimas décadas, no concernente ao modelo de universidade, de produção de conhecimento e de padrão de instalação e ocupação de território.

A gestão democrática das cidades, os planos e orçamentos participativos, as propostas de universidade popular são questões de mesma natureza: procuram insurgir-se contra práticas históricas de dominação. Dos edifícios a cidades, urgem práticas arquitetônicas em sintonia com uma matriz emancipatória, na qual algumas perguntas fundamentais impõem-se: qual seria conceitualmente o modelo de campus a responder as demandas de uma universidade jovem, africana, no século XXI? Pode este projeto colaborar para uma ressignificação do pensamento arquitetônico internacional para as próximas décadas? Como aproveitar este momento histórico para fazer emergir questões pedagógicas e arquitetônicas fundamentais para um debate sobre identidade? Como a proposta de campus da UNI-CV poderia marcar o debate internacional sobre cidades africanas?

Tais indagações dizem respeito ao lugar do conhecimento no modelo de desenvolvimento aspirado pelo país. É fulcral pensar em termos pedagógicos e espaciais a universidade do futuro. Em um país jovem como Cabo Verde, a produção de conhecimento tem importância estratégica com vistas ao desenvolvimento, à autonomia e à emancipação face fortes pressões internacionais. Como mencionamos anteriormente, a universidade em sua gênese europeia direcionava-se a formar primeiramente quadros da monarquia e do clero e, posteriormente, quadros da alta burguesia a assumirem postos nos governos. A Universidade Pública de Cabo Verde ao democratizar o acesso a um ensino superior pode vir a romper com um ciclo histórico no qual conhecimento e poder estavam profundamente interligados. O modelo de implantação das instalações universitárias, em vias de debate, tem enorme potencial de levar ao extremo a democratização do conhecimento, por meio de uma relação permeável e permanente entre academia e sociedade.

No início deste artigo, discutimos a relação entre arquitetura e projetos pedagógicos universitários ao longo da história. Das cidades ao redor de universidades às cidades universitárias, o distanciamento espacial destas refletiu e reproduziu o afastamento entre ciência e outras formas de conhecimento. A arquitetura modernista preconizou no século XX as vantagens da separação funcional do espaço urbano, modelo reforçado pela opção por campus universitário afastados. Nos anos 80 e 90, o acirramento das políticas neoliberais introduziu uma nova fase na sociedade de consumo, na qual diversas esferas da vida foram reificadas: da cidade-mercadoria à universidade-produto. A formação de técnicos voltados para o mercado e para a eficiência e eficácia sobrepõem-se a um pensamento crítico da sociedade contemporânea, e neste universo os administradores são mais valorizados que os pesquisadores. Os alunos são consumidores mais que educandos.

Em Cabo Verde, a história da educação relaciona-se profundamente com o regime colonial, produzindo uma elite mestiça apta a intermediar o relacionamento entre os nativos e a metrópole. Os locais de instalação das escolas e liceus é denunciador deste sistema de privilégios: em 1847 foi instalada a Escola Principal na ilha da Brava, a menor ilha povoada, contudo com maior número de famílias brancas. Uma série de disputas internas levou o estabelecimento a fechar e reabrir em diversas ilhas até instalar-se definitivamente em São Vicente, único liceu do arquipélago até meados do século XX (ANJOS, 2007).

Se a localização da maior infraestrutura de ensino da UNI-CV na cidade da Praia aponta para uma nova geopolítica do ensino no país, a escolha do local no eixo de crescimento oeste pouco colabora para o rompimento do ciclo de especulação imobiliária dos últimos anos. Por outro lado, a opção por edificações espalhadas pela malha urbana (ENG, Plateau) em complementação ao campus na Zona K, tem amplo potencial de integração universidade-sociedade, por meio do espaço. Contudo, arquitetura e inserção espacial são de pouca valia se o sistema de ensino for pautado pela hierarquização e pelo distanciamento do ensino das temáticas locais ou pelo uso político-partidário do projeto universitário.

Neste momento de transição paradigmática, tanto em termos pedagógicos quanto arquitetônicos, será a Universidade de Cabo Verde capaz de se posicionar de maneira progressista face a estas questões? Cabo Verde é um país pobre e consequentemente, o seu projeto de universidade pública sofre de enormes fragilidades financeiras, as quais em determinados momentos comprometem definitivamente a autonomia universitária. Imperativos econômicos e políticos, neste contexto, são atores fundamentais nas tomadas de decisão. Se as variáveis de ordem da racionalidade nesta relação arquitetônico-pedagógica terão capacidade de sustentação, a história nos mostrará.

Por enquanto a ausência de discussão pública destas questões e a inércia administrativa pela eficiência orçamentária têm prevalecido sobre uma aposta rumo a uma produção de ensino emancipatório e de um projeto espacial coerente.

 

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Texto publicado originalmente na Revista Palíndromo, Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes. Mestrado em Artes Visuais. v.5., n. 5 (2011) - Florianópolis : UDESC, 2009. pp195-223. Imagens elaboradas por Andreia Moassab e Patrícia Anahory, para a mesa redonda “Campus Universitário: uma proposta para o século XXI” realizada na Universidade de Cabo Verde, em dezembro de 2009, com a presença do arquiteto brasileiro Gelson Pinto. 

A autora agradece o diálogo constante com a arquiteta Patrícia Anahory, cujas reflexões conjuntas foram expressas neste texto.

[3] A compilação de artigos de Otília Arantes, Carlos Vainer e Ermínia Maricato, no livro A Cidade do Pensamento Único apresenta um amplo debate sobre planejamento urbano e urbanismo pós-modernos. Embora esta nova matriz se posicione criticamente aos cânones modernistas, os artigos demonstram o seu ajuste ao capitalismo neoliberal e sua face altamente excludente. Como afirma Francisco de Oliveira na apresentação do livro: “é o urbanismo do apartheid, em sua acepção mais radical e perversa”.

[4] Apesar de publicado na ocasião, vale ressaltar que a capital do país só aprovou seu plano diretor muito recentemente, em 2016.

[5] Imobiliária, Fundiária, e Habitat S.A., sociedade anônima de capitais públicos. Na sua origem chamava-se Instituto de Fomento à Habitação e estava vinculada diretamente ao Estado, inclusive em termos orçamentários. Com a onda de privatizações dos anos 90, a instituição mudou de nome e vocação, abrindo seu capital. Atualmente, apesar de vinculada ao governo, seu orçamento depende do lucro de suas atividades imobiliárias. Na prática, apesar de pertencer ao Estado, a empresa tem um perfil comercial concorrendo diretamente com os empreendedores imobiliários privados.

por Andréia Moassab
Cidade | 22 Maio 2017 | África., arquitetura, campus universitário, história da educação