Cabo Delgado: “A prioridade tem de ser o povo, não os investimentos”

Cabo Delgado: “A prioridade tem de ser o povo, não os investimentos” Cídia Chissungo coordena a campanha nacional #CaboDelgado_também_é_Moçambique. A jovem ativista moçambicana falou sobre esta iniciativa e sobre as expetativas dos jovens em relação à resolução do conflito e ao desenvolvimento económico e social do país. Em entrevista, Cídia Chissungo explicou que, por mais que lhes ”contem a história da radicalização”, os jovens sabem “que este conflito tem a ver com o controlo das áreas em Cabo Delgado e com a questão da exploração dos recursos”.

16.05.2021 | por Mariana Carneiro

"A moçambicanidade está em construção", entrevista a José de Sousa Miguel Lopes

"A moçambicanidade está em construção", entrevista a José de Sousa Miguel Lopes Falar de moçambicanidade é ao mesmo tempo falar do Estado e da Nação, na medida em que ela constitui o seu complemento, vértice de suporte, enquanto estereótipo representativo de base hegemónica da diversidade étnica, racial, linguística, cultural, religiosa, identitária, etc., que foi construído para gerar o sentimento de semelhanças e a partir das quais se pode pensar Moçambique e sentir-se moçambicano. A moçambicanidade está em construção. Nesse sentido, afirmar a moçambicanidade no contexto contemporâneo equivale a afirmar, por identificação ou mapeamento, uma cultura que represente o mosaico nacional não apenas no seu elemento racial, como também nas dimensões multiculturais iniciadas pela empresa colonizadora e que constituem o Moçambique atual.

04.05.2021 | por Alícia Gaspar

Navegando nas artes audiovisuais afro-amazônicas – uma conversa com Francisco Ricardo

Navegando nas artes audiovisuais afro-amazônicas – uma conversa com Francisco Ricardo Francisco Ricardo vive em Manaus desde sua infância e desde então vem desenvolvendo um olhar sensível e crítico para a arte. Em conversa com o artista conheci um pouco da sua trajetória no cinema como diretor de arte que culmina recentemente com o Kikito do Festival de Gramado de 2020 com o filme O barco e o rio (2019). A arte de Francisco conflui dentro de um cenário pulsante de artistas não brancos do norte brasileiro que questionam nossas relações étnico-raciais contemporâneas.

04.05.2021 | por Marco Aurélio Correa

Thó Simões: “A arte urbana revela e denuncia os monstros da alma humana”

Thó Simões: “A arte urbana revela e denuncia os monstros da alma humana” Thó Simões, artista plástico angolano, acabou de apresentar em Luanda a sua mais recente exposição intitulada “Entre Homens e Monstros”. As imagens criadas pretendem alargar o debate sobre as microviolências de uma cidade em constante mutação. O artista foi um dos percursores da arte urbana em Angola com uma trajetória com passagem por Linda-a-Velha, Oeiras, Malanje e Luanda. A prática profissional em agências de publicidade e depois a rua trouxeram-lhe a vontade de intervir politicamente através do mural e da arte urbana. Nesta conversa questiona a forma como a arte pode mudar as vivências de uma cidade e um país em crise económica e social e ainda com os estilhaços da guerra civil e a ocupação colonial.

19.04.2021 | por André Soares

Sankofa: “Acredito que a poesia falada pode curar"

Sankofa: “Acredito que a poesia falada pode curar" Sem desprimor para quem pensa o contrário, eu considero essa discussão importantíssima em Angola. Isso porque a maioria das pessoas desta terra que é Angola, ainda se vê presa pela matriz colonial e pela razão imperial. Na construção dos meus textos eu tento passar a ideia de que precisamos de virar os conteúdos de cabeça para baixo. É necessário rever o que se pensa sobre o saber, como se pensa a história ou as estórias e recuperar os modelos de conhecimento, de produção do saber, de transmissão de experiências de uma geração para outra e incluir outras vozes para escrever outras histórias. Só assim vamos deixar de perpetuar o modelo imposto pelo Estado colonial e o sujeito branco burguês.

16.04.2021 | por André Soares

Raoul Peck: “Não quero provocar só por provocar. Quero revelar”

Raoul Peck: “Não quero provocar só por provocar. Quero revelar” Já ultrapassámos a questão das queixas. Ao fim de centenas de anos de queixas que nunca foram ouvidas, a queixa não resulta! Além do mais, se eu me queixar, vão-me reduzir mais uma vez ao estado de vítima. E, lamento, mas não sou uma vítima. É também uma maneira educada de me dirigir ao outro, de lhe dizer: “Quero só conversar consigo, não esteja tão na retranca.” Quero manter o espectador numa situação permanente de expectativa, sem saber o que virá no plano seguinte, para o manter desperto, atento. Quero bombardear o espectador com coisas fortes, belas, tristes, chocantes, mas verdadeiras. E quero convidá-lo a viajar comigo, não para o magoar, mas para que juntos nos tornemos melhores.

12.04.2021 | por Jorge Mourinha

Sou Quarteira, entrevista a Dino d’Santiago

Sou Quarteira, entrevista a Dino d’Santiago Os meus pais protegeram-me sempre muito para eu não crescer com estigma. Só já bem adulto é que adquiri noção de algumas coisas que vivemos. Como sou do bairro, habituei-me muito cedo a coisas como ser seguido por um segurança de cada vez que entrava numa loja. E em Cabo Verde não havia disso. Éramos todos iguais. Foi lá que me apercebi do racismo de cá. Quando voltei, pensei «eu não estou no meu país. Por mais que tenha nascido aqui eu nunca vou ser um português inteiro, porque sou filho de imigrantes, porque sou negro». Decidi que tinha de ver isto num outro prisma, de mostrar às novas gerações que, independentemente disso, podes ser tudo, podes triunfar.

07.04.2021 | por Sara Goulart Medeiros

Silvia Federici: “Espero que esse momento impulsione uma forte mobilização de movimentos feministas”

Silvia Federici: “Espero que esse momento impulsione uma forte mobilização de movimentos feministas” Sobre governo Bolsonaro, a ascensão de uma nova extrema-direita no mundo e o fundamentalismo religioso que coloca feministas e população LGBT como principais inimigos, Silvia Federici fala em uma nova caça às bruxas: “Não existe o desejo de proteger a vida mas sim o de controlar os corpos das mulheres, assegurar-se de que as mulheres sejam subordinadas, sacrificadas, que possam ser exploradas por suas famílias e pelo capitalismo. É uma questão econômica também, a igreja com essa aparência da defesa da vida, da família, na verdade está defendendo a produção do trabalho não assalariado das mulheres. E quando a igreja vê que não pode mais nos convencer de tudo isso então nos trata como inimigas, cria novas divisões entre mulheres e homens e entre mulheres também. Porque colocam algumas mulheres como aliadas do diabo”.

28.03.2021 | por Andrea DiP

Mediterrâneo: "As mulheres foram apagadas da história da migração"

Mediterrâneo: "As mulheres foram apagadas da história da migração" A imagem da mulher passa pelo estereótipo profundamente enraizado que remonta à antiguidade. É a ideia de que as mulheres estão imóveis, à espera, no espaço do lar e da reprodução da família. Estão, portanto, ancoradas enquanto os homens navegam. Esta é uma das razões pelas quais a migração das mulheres não foi discutida durante muito tempo. Não parece natural imaginar mulheres em movimento.

22.03.2021 | por Brahim Nejma e Schmoll Camille

"Marielle foi morta porque era negra"

"Marielle foi morta porque era negra" Falar de "feminicídio político" corre o risco de reduzir a morte de Marielle a um assassinato político quando é mais do que isso. O assassinato de Marielle também fala da política de assassinato sistémico de mulheres negras no Brasil. Aqui, os nossos corpos são os mais vulneráveis: o próprio Estado considera-os descartáveis. Para mim, Marielle não foi morta porque foi eleita ou porque era uma política, foi morta porque era uma mulher negra, porque era uma mulher bissexual, uma favelada e uma mãe solteira. Se for uma mulher como a Marielle e entrar numa instituição dirigida por um grupo de homens brancos e heterossexuais, está destinada a atrapalhar. Nenhuma pessoa branca teria sido morta desta forma.

22.03.2021 | por Sarah Benichou e Juliette Rousseau

“O samba sempre arruma alguma brecha de contestação”

“O samba sempre arruma alguma brecha de contestação” Como cresci no Rio de Janeiro, numa cidade que tem muito presente a cultura do samba, eu dava de barato essas coisas. Aqui eu comecei a valorizar muito mais e a identificar o que de tão especial existe nessa parte da cultura brasileira. Ter um grupo de samba no Brasil seria apenas mais um grupo, mas aqui em Portugal já torna a coisa muito mais única, porque não há tantos assim. Torna-se num trabalho de apresentação de uma coisa nova, diferente para as pessoas. Isso sempre me estimulou muito.

13.03.2021 | por Filipa Teixeira

Philipp Hartmann: «enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema, este sobreviverá»

Philipp Hartmann: «enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema, este sobreviverá» No final o cinema sempre sobrevive. A minha esperança e otimismo, o qual tentei depositar no filme, é que enquanto existirem pessoas determinadas a lutar pelo cinema ou demonstrar o seu grande amor por ele, este sobreviverá. Pode ser um ato de resistência, e seguramente o é, mas espero que seja o caminho do sucesso na luta. Mas agora, com a pandemia, a situação será mais complicada, porque depende do nosso regresso à “normalidade” e de quanto ajuda os Governos estarão dispostos a dar para os proteger, ou os salvaguardar, quem sabe, de uma próxima pandemia.

12.02.2021 | por Hugo Gomes

“O Teatro Viriato ainda é um oásis no país”

“O Teatro Viriato ainda é um oásis no país” Sento-me em qualquer sítio e toda a gente tem uma história com o Teatro Viriato. O Teatro é da cidade. E, ainda assim, sentimos que há novos públicos, há novas energias, novas possibilidades. É isto que um teatro deve ser. É uma casa onde nos encontramos todos, vindos de não sei de onde. Com coisas em comum para partilhar mas também com coisas que nunca tínhamos visto antes. Por vezes incómodas.

25.01.2021 | por Mariana Carneiro

"Explorar o outro continua a estar na base das nossas sociedades", entrevista ao escritor malgaxe Jean Luc Raharimanana

"Explorar o outro continua a estar na base das nossas sociedades", entrevista ao escritor malgaxe Jean Luc Raharimanana Existem leis, creio eu, relativas à violação das liberdades. As palavras alienantes podem influenciar as massas, mas estas palavras sempre existiram na história da humanidade. É o espírito crítico que eu penso ser urgente apoiar e desenvolver. Prefiro pensar em termos de possibilidades do que em termos de limitações. Como podemos fornecer a todos as ferramentas para criar uma palavra criativa, um movimento de tecelagem em vez de uma palavra destrutiva, um gesto para rasgar?

11.01.2021 | por Alícia Gaspar e Jean Luc Raharimanana

Zezé Gamboa, um percurso no cinema

Zezé Gamboa, um percurso no cinema Zezé Gamboa fala calorosamente das coisas que gosta, episódios de outros festivais, rodagens e problemas que o métier do cinema envolve. As pessoas riem-se pelo empolgamento e exagero. Quer trabalhar em paralelo, os homens no mar e o desespero das famílias na terra.

05.01.2021 | por Marta Lança

Titica

Titica Chegou, acabada de acordar, de saia comprida às riscas e sapato brilhante, alta e altiva. O seu enorme riso interior provocou uma empatia imediata, a ousadia da artista Titica é desarmante. Afectuosa no trato, prefere não falar muito da sua sexualidade, explicando, de forma assertiva e cansada de ter de se justificar, que é “mulher e ponto”. E uma mulher com convicção. A cantora, que diz preferir o carinho do público ao cachet, ganhou o prémio de Melhor Artista de Kuduro em 2011 e sente-se “reconhecida”. Explica que, na sua vida de artista, “tudo acontece de uma forma natural”. Acrescenta porém que, apesar da sua energia tudo fazer acontecer, no palco, Titica encarna “outra pessoa”.

05.01.2021 | por Marta Lança

Arqueologias da Hospitalidade | Entrevista a Yannis Hamilakis

Arqueologias da Hospitalidade | Entrevista a Yannis Hamilakis Tem a ver com a história colonial da Europa como um todo: Vejo este fenómeno de migração do Sul global para o Norte global como a fase mais recente da longa história do capitalismo racializado e do colonialismo. Muitas destas pessoas que estão a tentar atravessar vêm de países anteriormente colonizados pela Europa. Sabemos que a longa história de colonização tem um impacto no presente em termos de desigualdade estrutural, pobreza, despossessão e guerra. Ao mesmo tempo, assistimos à incapacidade da Europa em se reconciliar com a sua própria história.

02.01.2021 | por Alícia Gaspar e Yannis Hamilakis

Tânia de Carvalho: “As liberdades não podem ser negociadas”

Tânia de Carvalho: “As liberdades não podem ser negociadas” A actual geração de jovens é muito crítica ao posicionamento da geração de jovens dos anos 80, que fez e viveu uma guerra. Quer comentar? A geração dos anos 80 sabe muito bem as amarguras de uma guerra, de um conflito, não teve uma juventude ou infância condigna, porque nasceu e viveu num país em conflito; teve os seus sonhos vendidos e destruídos. Muitos dos jovens dos anos 80 tiveram de abandonar o país para viver numa terra que nunca os acolheu, olhou para eles como estrangeiros que vieram estragá-la. Portanto, não estão dispostos, hoje, a perder esta estabilidade conseguida desde 1992.

29.12.2020 | por Tânia de Carvalho

"Como um gesto de força”, conversa com Catarina Botelho e Sandra Vieira Jürgens

"Como um gesto de força”, conversa com Catarina Botelho e Sandra Vieira Jürgens Barcelona e Lisboa parecem-me paradigmas de um sistema neoliberal que explora de forma intensiva espaços e tempos. Parece-me que a crescente densificação que Lisboa está a sofrer é um sintoma disso. Zonas anteriormente sem função definida parecidas com aquelas que fotografei, estão a ser urbanizadas a velocidades antes impensáveis, os passeios ocupados por esplanadas, quiosques... O espaço é rentabilizado de forma intensiva e claro, o centro é o lugar mais saturado.

22.12.2020 | por Hugo Dinis

Arqueologias da Hospitalidade | Entrevista a Rui Gomes Coelho

Arqueologias da Hospitalidade | Entrevista a Rui Gomes Coelho Não podemos entender a resistência às ditaduras ibéricas ou à ocupação da Croácia da Segunda Guerra Mundial, sem a pensarmos no quadro de uma crítica mais vasta à modernidade ocidental e em como esta se impôs através do fascismo e do colonialismo. A crise humanitária atual é um palimpsesto dos legados do colonialismo europeu em várias partes do mundo e na própria Europa. É por isso que quando insistimos em diversificar o arquivo da humanidade de que falava há pouco, temos de ter em conta a desconstrução desses legados. Tudo isto é trabalho arqueológico.

08.12.2020 | por Alícia Gaspar e Rui Gomes Coelho